A Experiência de Inclusão e Mobilização Social pelo Ministério Público de Minas Gerais

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QUATORZE

Paulo Cesar Vicente de Lima 1 Vitor Vieira Vasconce/os2

14.1. INTRODUÇÃO O Brasil, país de dimensões continentais, multifacetado, apresenta-se atuahnente como uma das nações mais promissoras do planeta.Tem atraído os olhares e vultosos recursos de investidores dos mais variados matizes. Conquanto vivamos um período de crescimento econômico pujante, certo é que a alarmante desigualdade social ainda é um problema preocupante e que não se coaduna com o status de 6ª economia do mundo. Esse paradoxo revela-nos que a racionalidade do mercado não tem tido o condão de contribuir para minimização das iniquidades sociais, pelo menos em ritmo análogo ao da acumulação. Num contexto de fragmentação social, seja decorrente da lógica neoliberal, seja decorrente de um processo de formação histórica complexo, muitas reflexões têm surgido acerca da necessidade de se buscar uma maior participação cidadã e controle social como estratégia de fortalecimento do sistema democrático e da sustentabilidade do desenvolvimento. O Ministério Público Brasileiro, nos termos Constituição Federal de 1988, teve reconhecida a condição de instituição permanente, 1

Promotor de Justiça, Coordenador da CIMOS - Coordenadoria de Inclusão e Mobilização Sociais do Ministério Público de Minas Gerais,Especialista em Direito Público, Mestre em Desenvolvimento Social. Contato: [email protected]

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Consultor Legislativo de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Assembleia Legislativa de Minas Gerais. Doutorando em Geologia. Mestre em Geografia. Especialista em Solos e Meio Ambiente. Bacharel em Filosofia. Graduando em Geografia.Tecnico em Meio Ambiente.Tecnico em Informática Industrial. Contato: [email protected]

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autônoma e independente. Tr:ua se dt· li111~.,u l'\\l' ll l 1.11 .1 justiça, cujm membros passaram a dispor de garanti.1, l .1p.,1l'' de proporcionar-lhe, uma atuação absolutamente isenta e imparcial. '0 111 este rol de gara11 tias, a instituição dispõe de condições para contribuir para a eficáci,1 social dos direitos e garantias fundamentais e para a consecução dos objetivos da República Federativa do Brasil, consoante artigo 3° da Carta Máxima. Esse arcabouço de princípios e garantias convolou o Ministério Público em verdadeira instituição advogada da sociedade, proporcionando uma relação de confiança, que deve ser fomentada, como forma de legitimação social da própria atuação ministerial. Frente à atual transição paradigmática na seara da Teoria do Direito, o juspositivismo ou positivismo jurídico tradicional e legalista deixa de ser tido como suficiente e em seu lugar em erge um novo paradigma de base filosófica eclética: o neoconstitucionalismo, caracterizado pela hµ sca de eficácia social dos ,direitos fundamentais consagrados na Constituição (Lima, 2007). E neste cenário que ganha destaque a atuação preventiva e resolutiva do Ministério Público. N essa perspectiva, a Procuradoria Geral de Justiça de Minas Gerais, por meio da Resolução nº 8, de 2009, implementou uma nova estratégia d e atuação através da criação da Coordenadoria de Inclusão e Mobilização Sociais do Ministério Público do Estado de Minas Gerais - C IMOS, como órgão de assessoramento do Procurador-Geral de Justiça. Buscou-se criar um espaço organizado dentro do Ministério Público que pudesse dedicar-se às questões da participação cidadã, inclusão social, debates e forma ção, funcionando como local de interlocução com os suj eitos sociais através d e uma interface com a sociedade civil organizada.A CIMOS, nesse contexto, busca contribuir para o acesso à justiça, entendido em um conceito amplo, não apenas como acesso ao judiciário, mas abrangendo todos os m eios legítimos para se alcançar a justiça (Lopes e Maia, 2008: 3). Em sua aproximação com a sociedade, a CIMOS atribui dignida~e política ao direito, na acepção de Miranda (2007), na medida em gue busca dar visibilidade às necessidades carências, reivindi cações e formas de ver e viver no mund; de grupos normalm ente excluídos social e economicamente. Ainda nessa este ira, as reivindicações de direito desses grupos acenam para interpretações gue ultrapassam os diplomas jurídicos, mas os incluem em uma perspectiva

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de gue as normas são partes de um processo histórico em gue os suj eitos sociais constroem um direito vivo e gue se encontra nas relações sociais diárias (Wolkmer, 2005: 104). Os movimentos sociais constituem-se em espaços de convergência para emergência de experiências e práticas que inauguram significações e expectativas de direitos que avançam além do arcabouço sociojurídico hegemônico (Santos, 2002; Sousa J unior, 2008: 146). Essas novas identidades e institucionalidades criam a figura do suj eito coletivo de direito, uma nova natu reza j urídica, que em sua busca por emancipação cidadã, distingue-se do contexto j urídico referente aos direitos individuais e m esmo dos direitos difusos homogêneos (Sousa, 2001: 61). A CIMOS, ao trazer para si a atuação na mobilização e inclusão social, participa desse processo ao estimular o autorreconhecimento e o empoderamento desses suj eitos coletivos de direito. Dúvidas não há de que uma das principais formas de exclusão é a linguagem, o que se acentua, em se falando do jargão jurídico, acessível a poucos. O indivíduo em situação de vulnerabilidade social costuma sentir a linguagem jurídica como opressora, identificando no operador do direito contraparte da elite que, pela linguagem o u pelos demais aparatos da justiça, historicamente levaram esse indivídu o e seu grupo social a uma situação de marginalidade (Lopes e Maia, 2008: 5). A CIMOS procura, então, modificar essa relação popular com o mundo jurídico e com o Ministério Público, esforçando-se por faze-la amigável e ferramenta de acesso eficaz aos direitos sociais. Em razão disso, a C IMOS funciona como a porta de entrada do Ministério Público no diálogo com os m ovimentos sociais, na medida em que faz a interlocução desses com as diversas áreas da instituição. N esse contexto, as principais formas de atuação da C IMOS envolvem a mobilização em situações de conflito social e de violações de direitos, buscando o empoderamento popular dos grupos marginalizados. Suas atividades envolvem reuniões e audiências públicas com as comunidades, intermediação com órgãos governamentais competentes, execução de proj etos sociais com entidades parceiras, elaboração de materiais informativos, geração e divulgação de doutrina jurídica para a proteção desses grupos marginalizados. Os principais grupos sociais envolvidos são moradores de rua, sem-teto, catadores de materiais recicláveis, agroextrativistas, veredeiros e populações impactadas por empreendimentos minerários.

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A C IMOS também rcprcsc 11t.1 o M1111 ,11·110 P{1blico junto .111 CNDDH - Centro Nacional de l)l'lt·~.1 dr 1)11v1Los l lumanos d.1 População em Situação de Rua e 'atadores dl' Materiais Reciclávci,, entidade que tem por objetivo defend er e pro mover os direitos destr, grupos sociais em situação d e vulnerabilidade. O CNDDH é u111 .1 parceria entre o Ministério Público de Minas Gerais, o Movimento Nacional de População de Rua, o Movimento Nacional dos C ata dores de Materiais Recicláveis - MNCR-, a Conferência Naciona l dos Bispos do Brasil - CNBB -, a Pastoral Nacional do Povo d.1 Rua e a Secretaria Nacional dos Direitos Humanos da Presidên ci.1 da República. Através dessas estratégias, pretende-se contribuir para eficácia social dos direitos fundamentais, alcance dos objetivos da Repúbli c:1 Federativa do Brasil, sobretudo a partir do fomento à participação, controle e formação de capital social.

macro- objet ivos qu e prcvcl·111 o 1011 1(·111 11 d1· pnl1111 ." p11hl1 t.1s p~1ra a melhoria dos indicadores e p,11.1 .1 t1 .111, lw 111.H,.10 d:1 rea li dade social; o aprimoramento da intc rl m 11,.10 ( 0111 outros ó rgãos e instituições e o aprimoram ento do acesso th soc iedade ao Ministério Público. A Coordenadoria fo i reg ionalizada co m a criação de 4 Coordenadorias R egionais, qu e em 2012 foram. então ampliadas para 7, conforme mapa a seguir (Figura 1). As Coordenadorias Regionais,j untamente com a Coordenadoria-Geral, têm por objetivo "promover a interlocução e a articulação entre os Promotores de Justiça, instituições públicas e a sociedade civil organizada, visando a garantir a efetivação da participação social nas políticas públicas e institucionais". Pretende-se que a CIMOS seja uma porta de entrada das demandas sociais no âmbito ministerial, mas também possa articular com os promotores naturais encaminhamentos buscando fomentar a participação cidadã na formulação de políticas públicas e no seu necessário controle social.

14.2. ORGANIZAÇÃO E ESTRUTURA A partir da criação da CIMOS em 2009 foi possível uma maior interação do Ministério Público de Minas Gerais com grupos organizados da sociedade civil que reivindicam direitos não efetivados, embora garantidos formalmente na Carta Máxima. Procurou-se privilegiar uma atuação preventiva e resolutiva, através da mobilização, mediação e inclusão a partir da lógica de pessoas e grupos que até então não dispunham desta porta de entrada na instituição ministerial. A CIMOS consolidou-se inicialmente como uma forma de superar obstáculos, de abrir portas para algo novo, sair da zona de conforto e ir ao encontro do outro, com práticas cuja oitiva e diálogo são essenc1a1s. A partir de sua criação foi nomeado um Procurador de Justiça, seu coordenador e um assessor direto, que trabalharam em constante contato com as organizações da sociedade civil, buscando avaliar, refletir e construir caminhos juntos para superar possíveis violações de direitos. No ano de 2011, a CIMOS passou por completa reestruturação, seja devido ao sucesso de atuações regionalizadas em outras áreas de atribuição do Ministério Público, seja em razão das prioridades institucionais estabelecidas no M apa Estratégico 2010-2023 do MPMG que, na dimensão R elacio nam ento Externo, enuncia três

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Coordenadorias Regionais de Inclusão e Mobilização Sociais

Promotor Pado cesar Y,cenle de Lima Carto~nha:Vitor Víeara Vascoocem lbembro 2012 . Conlocrne ResolJção PGJ nG 7312012

cim ~ s

AMPMG M inistério Público do bt.ado (N M1Nl C.,,-..S,

Figura 1 - Coordenadorias Regionais da CIMOS.

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No artigo 2º da R eso lução P( :,1 7•1/ !O1 1 for.1111 estabelecidas 3 as atribuições da Coordenado ria d e l 11
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