A formação e limites da Frente Popular de Ronaldo Lessa no governo estadual de 1998

August 7, 2017 | Autor: Rodrigo Aragão | Categoria: Politics, Alagoas, impeachment Suruagy
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Governos encabeçados por partidos da classe trabalhadora em unidade com a burguesia.
Trotsky, Leon. A História da Revolução Russa.
Política adotada na Europa durante Antigo Regime pelos governos absolutistas, que tinham como objetivo alcançar maior desenvolvimento através do acúmulo de riquezas.
Aqui me refiro apenas aos índios do que viria a ser a América Portuguesa.
Forma de transformação das sociedades com vistas à objetivação do modo de produção capitalista, sem que seja necessária uma participação popular, tal como a ocorrida na Revolução Francesa. Lenin aborda tal temática em seu texto: "O programa agrário da socialdemocracia russa na primeira revolução russa" (1905-1907), em que observa o fim do latifúndio nos EUA, enquanto a Prússia transformava a exploração do latifúndio numa exploração burguesa.
Sader, Emir (Org). Gramsci: poder, política e partido.
O Brasil, enquanto colônia portuguesa, existia apenas como local de investimento do capital português.
LESSA, Golbery. Uma nova Alagoas é possível. In: http://novoirisalagoense.blogspot.com/2006/12/ uma-nova-alagoas-possvel.html. Acesso em 06 fev. 2014.
http://www.agencia.cnptia.embrapa.br/gestor/canadeacucar/arvore/CONTAG01_64_711200516 718.html. Acessado em 10 fev. de 2014.
Idem
LIMA, 1998, p.26
Decreto nº 76.593, de 14 de Novembro de 1975.
Fonte: Ministério da Fazenda. 1996
Partido dirigente da Revolução Russa de Outubro de 1917.
Lira, Jailton de Souza. O acordo dos usineiros e os conflitos sindicais na Era Collor em Alagoas. (CEDU/UFPB)
http://www.tse.jus.br/eleicoes/eleicoes-anteriores/eleicoes-1994/resultados-das-eleicoes-1994/alagoas/ resultados-das-eleicoes-1994-alagoas-governador

O termo pântano fiscal refere-se a não fluidez das contas públicas alagoana.
As letras alagoanas eram títulos da dívida que deveriam ser utilizadas apenas para pagamento de precatórios. Porém, acabaram sendo utilizadas para pagar dívidas a empreiteiras e bancos. Essa mesma manobra política ocorreu em outras capitais, o que resultou na instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para apurar a utilização indevida das letras do tesouro.
Ministro da Administração e Reforma do Estado – MARE, responsável pela implantação do Plano Diretor da Reforma do Estado que tinha como objetivo "enxugar" a máquina pública.
Veja, s. ex. 11/06/1997, Silvania Dal Bosco e Leonel Rocha. http://veja.abril.com.br/110697/p_24.html. Acessado em 20/03/2014
Movimento que unificou as diversas categorias dos servidores públicos estaduais em torno, principalmente, da pauta salarial (pagamento dos salários atrasados), mas evoluiu para a exigência do impeachment do Governador Divaldo Suruagy.
UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS
INSTITUTO DE CIENCIAS HUMANAS COMUNICAÇÃO E ARTES
CURSO DE HISTÓRIA – LICENCIATURA





RODRIGO ARAÚJO DE ARAGÃO






A formação e limites da Frente Popular de Ronaldo Lessa no governo estadual de 1998










Maceió/AL
2014
RODRIGO ARAÚJO DE ARAGÃO





A formação e limites da Frente Popular de Ronaldo Lessa no governo estadual de 1998



Trabalho de conclusão de curso apresentado ao Curso de Graduação em História, da Universidade Federal de Alagoas, como requisito parcial à obtenção do título de licenciado.






Orientador: Osvaldo Maciel


_____________________________
Assinatura do Orientador




Maceió/AL
2014
RESUMO


Expusemos, neste trabalho, uma interpretação sobre a formação do governo Ronaldo Lessa de 1998, mais precisamente a crise que levou a sua eleição ser possível e viável. Nosso enfoque é dado no desenvolvimento do capitalismo alagoano para podermos compreender como funciona a nossa economia. No primeiro momento, analisamos a formação do capitalismo Brasileiro e Alagoano, desde a colonização até os dias atuais, tendo como referência a Teoria do Desenvolvimento Desigual e Combinado. No momento seguinte, focamos em compreender as raízes da crise econômica que ocorreu no estado, culminando com a quebra do PRODUBAN e a queda do governador Divaldo Suruagy, em 1997. Caracterizamos os usineiros como culpados devido às gigantescas isenções fiscais obtidas através de seus parlamentares e governadores do estado. Por fim, analisamos a rebelião popular que pôs fim ao governo Suruagy e o crescimento da figura de Lessa como alternativa à esquerda. Porém, longe de fazer as rupturas necessárias com o setor da cana, Lessa articula, ainda na campanha, um governo de caráter de frente popular, ou seja, com a massa trabalhadora apoiando e se sentindo parte do governo, mas sem romper e sem ameaçar nenhum setor da burguesia alagoana.


























SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ........................................................................................................
04
1. O DESENVOLVIMENTO DESIGUAL E COMBINADO .................................
07
1.1 O desenvolvimento desigual ...........................................................................
07
1.2 O desenvolvimento combinado .......................................................................
09
1.3 O desenvolvimento desigual e combinado do capitalismo brasileiro .............
10
2. A QUEDA DE SURUAGY ..................................................................................
20
2.1 O desenho da crise: economia alagoana insustentável ....................................
20
2.2 Instituto do Açúcar e do Álcool (IAA) ............................................................
21
2.3 Programa Nacional de Melhoramento da Cana-de-Açúcar (PLANALSUCAR) ...................................................................................................

22
2.4 Programa Nacional do Álcool – Proálcool ......................................................
24
2.5 O ICMS em Alagoas .......................................................................................
25
2.6 O Acordo dos Usineiros ..................................................................................
26
2.7 A reorganização política alagoana após a reabertura democrática .................
27
2.8 Suruagy: da eleição em 94 a sua queda ...........................................................
30
2.9 Formação e atuação dos movimentos que derrubaram Suruagy .....................
32
3. A ABERTURA POLÍTICA PARA A ESQUERDA ALAGOANA E A FORMAÇÃO DA FRENTE POPULAR ..................................................................

36
3.1 Agravamento da Crise .....................................................................................
36
3.2 A intervenção federal ......................................................................................
38
3.3 Nas Ruas – O SINDPOL e sua nova direção ..................................................
38
3.4 O roteiro da queda ...........................................................................................
39
3.5 O depois da queda ...........................................................................................
42
3.6 O que é Frente Popular? ..................................................................................
43
3.7 A Frente Popular encabeçada por Lessa .........................................................
45
CONSIDERAÇÕES FINAIS ....................................................................................
47
REFERÊNCIAS ........................................................................................................
49
ANEXO .....................................................................................................................
51


INTRODUÇÃO

Logo após o levante popular, que derrubou o então governador de Alagoas Divaldo Suruagy, em 1997, é formado um grupo que ganharia as eleições de 1998 com um programa de caráter popular e discurso de mudanças sociais. A coligação encabeçada por Ronaldo Lessa destoa praticamente de toda a história política alagoana, tendo, pela primeira vez, elementos políticos que não pertenciam à classe originária dos usineiros.
O capitalismo alagoano possui suas peculiaridades, para poder analisá-lo, utilizaremos o estudo realizado por Leon Trotsky sobre a teoria do Desenvolvimento Desigual e Combinado (DDC) que é de extrema importância, porém, ficou restrito ao estudo da sociedade russa. O desenvolvimento da teoria coube a George Novack, com o aprofundamento dos estudos e da produção de uma obra completamente dedicada ao tema. Iremos utilizar, como referência, as obras de Trotsky (História da Revolução Russa) e George Novack (O Desenvolvimento Desigual e Combinado na História).
17 de julho de 1997 foi uma das datas mais marcantes da história de Alagoas, quando milhares foram às ruas pedir o impeachment do governador de Alagoas, Divaldo Suruagy. Essa mobilização resultou em uma conjuntura política bastante favorável às organizações políticas que se colocavam contrárias ao poder político de um setor que, direta ou indiretamente, sempre esteve no domínio do poder político alagoano: os usineiros da cana-de-açúcar.
A contestação ao governo parecia mostrar que a hegemonia política dos usineiros parecia chegar ao fim. O setor sofria sucessivas perdas econômicas, porém, eram constantemente salvos pelo estado; contudo, a situação ficou incontestável depois da quebra do PRODUBAN (banco estadual) e da crise fiscal que atingiu o estado.
Para compreendermos este episódio da história alagoana, é preciso entender qual o contexto histórico do estado. Alagoas estava em uma situação bastante delicada. O impeachment de Fernando Collor de Mello, em 1992, representou uma vitória nacional e estadual para a esquerda, pois abalava um setor histórico importante da oligarquia alagoana. Com o impeachment de Collor, a economia passou a ser regida pelo Plano Real, idealizado pelo Ministro da Fazenda Fernando Henrique Cardoso, que pôs fim à inflação e continuou a abertura econômica iniciada por Collor. A política neoliberal aprofunda e domina todo o país. É aberta a "temporada" de privatizações, diminuição do Estado e posição contrária aos impostos e tributos excessivos para as empresas. É neste contexto que se encontra o governo de Divaldo Suruagy.
Leda Maria de Almeida levanta questionamentos pertinentes ao momento histórico pelo qual passava o nosso estado:

[...]até que ponto as alterações decorrentes do 17 de julho de 1997 podem aprofundar-se e implicar rupturas nas tradicionais estruturas políticas do Estado? Havendo rupturas políticas, o poder oligárquico conseguirá sobreviver nas instâncias políticas e administrativas do governo? (ALMEIDA, 1998, p.20)

Almeida (1998) analisou o período do governo de Divaldo Suruagy (1994 – 1998) no livro Rupturas e Permanências em Alagoas: o 17 de julho em questão. As respostas trazidas neste livro são importantes, porém, incompletas.
Precisamos destacar uma lacuna crucial na análise realizada por Almeida. O debate sobre o caráter do Estado, como bem definiu Karl Marx: "um balcão de negócios da burguesia". Podemos encontrar, entre os representantes dos Poderes Executivo e Legislativo, industriais, latifundiários e grandes comerciantes. Em Alagoas, o poder econômico que dominará, em todas as instâncias, o poder político será estruturado a partir da grande propriedade agrária, pecuária e agroindustrial.
As mobilizações populares exigindo a saída do governador Divaldo Suruagy, forçado a pedir licença médica, abriu espaço para uma ruptura com a oligarquia. Ronaldo Lessa, eleito para governador em 1998 pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB), tendo Heloisa Helena, do Partido dos Trabalhadores (PT), eleita para o Senado, na mesma coligação. Essas figuras surgiram como lideranças políticas durante o combate à ditadura militar. E, vão chegar ao comando executivo estadual, após as mobilizações.
Porém, faz-se necessário pontuar que, mesmo estando no poder executivo, as mudanças não atingiram o Poder Legislativo. A Câmara de Vereadores e a Assembleia Legislativa se mantiveram com ampla maioria dos representantes da oligarquia.
A ruptura não foi consolidada, pois não rompeu com o poder da grande propriedade agrária, pecuária e agroindustrial. Mas, levando em conta o caráter do governo Lessa, podemos notar claramente que se tratava de uma Frente Popular, ou seja, a burguesia alagoana utilizou este governo como peça fundamental para acalmar as massas e pôr o estado em ordem novamente, mas em momento algum pondo em risco os lucros e a segurança do poder oligárquico.
O caminho deste trabalho de conclusão de curso, elaborado em três partes principais, que serão divididas em tópicos específicos. No primeiro capítulo, abordaremos as raízes do capitalismo brasileiro e alagoano, a partir da teoria do DDC. No segundo, analisaremos o processo de Impeachment do Governador Divaldo Suruagy, a partir da perspectiva de Leda Maria de Almeida no livro "Rupturas e permanências em Alagoas: o 17 de julho em questão". Nesse trabalho, serão debatidos os principais argumentos utilizados para justificar o impeachment do Governador de Alagoas e as possibilidades de mudança com Ronaldo Lessa. No terceiro capítulo, iremos averiguar a composição e limitações do governo de Ronaldo Lessa em realizar as transformações em Alagoas.














1. O DESENVOLVIMENTO DESIGUAL E COMBINADO

O capitalismo Alagoano mantém os elementos mais avançados da economia em coexistência com as mais atrasadas. Enquanto temos indústrias que funcionam com a mais alta tecnologia para a produção de plástico, ainda temos, no sertão, a criação de gado sendo realizada da mesma maneira há 300 anos. Para entendermos essa realidade, é necessária a aplicação da teoria do Desenvolvimento Desigual e Combinado (DDC).
A TDDC foi formulada e desenvolvida por Leon Trotsky a partir da observação histórico social dos países atrasados, dentro da economia capitalista. No primeiro capítulo do livro A História da Revolução Russa, Trotsky faz um estudo sobre as condições peculiares do desenvolvimento capitalista russo. Na Rússia, ainda se mantinha a coexistência de características de dois sistemas econômicos antagônicos: o feudalismo e o capitalismo, peculiaridades do atraso do capitalismo russo. Os grandes centros urbanos ferviam com suas fábricas, construções, estradas, operários etc. Enquanto o campo ainda se encontrava com a produção baseada no modelo feudal.

1.1 O desenvolvimento desigual

Durante toda a história da humanidade, podemos observar a coexistência de elementos mais avançados e elementos mais atrasados em diferentes civilizações, regiões ou Estados. Essas diferenças ocorrem por um motivo muito simples: o mundo não se desenvolve por igual como um todo. A humanidade conhece seu desenvolvimento a partir de necessidades e condições históricas. Nesse entendimento, podemos incluir as mudanças climáticas, a geografia do local, a vegetação, as influências de povos de outras localidades etc. Portanto, ainda hoje há regiões que vão conhecer seu desenvolvimento humano, tecnológico, econômico muito mais rápido do que outras regiões. Esse desenvolvimento desigual é parte de um todo no sistema capitalista, desde sua fase mais inicial, mercantil. Parte de um todo, pois a maioria dos povos estava integrada nesse sistema, cada qual desenvolvendo uma parte da produção mundial. Nesse ponto, Novack (2008) compara o desenvolvimento desigual ao desenvolvimento do ser humano.

A evolução dos distintos organismos humanos é marcada por uma considerável irregularidade. O crânio desenvolveu suas atuais características entre nossos antecessores símios, muito antes das nossas mãos articuladas com o polegar oposto. Somente depois de nossos antecessores terem adquirido a postura ereta e as mãos para trabalhar, é que o cérebro dentro do crânio desenvolveu as suas atuais proporções e complexidades. (NOVACK , 2008 p.26)

Nesta última fase da evolução humana, podemos ver que nem o nosso corpo se desenvolveu todo de forma igual. Podemos encontrar, ainda hoje, resquícios de "primitividade", como, por exemplo, o dente sizo, que na pré-história era utilizado pelos seres humanos para rasgar a carne crua. Com a evolução dos hábitos alimentares, a introdução de carne cozida ou assada, leva o sizo a cair em desuso. Com os grupos humanos, o desenvolvimento não se deu de uma só vez. As sociedades prmimitivas tiveram seu desenvolvimento de forma desigual. A produção de armas, complexificação social, crescimento populacional vai se dar de forma desigual.

[...] A Idade da Pedra durou cerca de novecentos mil anos; a Idade do Bronze, de três a quatro mil anos a.C.; a Idade do Ferro tem menos de quatro mil anos. Contudo, os diversos grupos do gênero humano atravessaram essas etapas em diversas épocas, em várias partes do mundo. A Idade da Pedra acabou por volta de 3500 a.C., na Mesopotâmia; cerca de 1600 a.C., na Dinamarca; em 1492, na América e ainda não se encerra em 1800, na Nova Zelândia. (NOVACK , 2008 p. 27)

Podemos observar, também, sociedades bastante desenvolvidas dentro do mundo Antigo, Clássico e Moderno. São alguns exemplos: o Egito, que durante a História Antiga construiu monumentos nunca antes imaginados, desenvolveu sistema de irrigação, garantindo assim a alimentação e manutenção de um enorme sistema escravista. Ainda na História Antiga, a Mesopotâmia cria a escrita e desenvolve a matemática para fins comerciais. O que nos leva a deduzir que essa civilização tenha sido construída por ávidos comerciantes. No continente europeu, Grécia e Roma, durante o período da história clássica, desenvolvem a filosofia, as artes e a política. Durante toda a Idade Média e Moderna há uma infinidade de produções culturais, científicas, arquitetônicas etc.
Chegamos a compreensão de que o desenvolvimento se dá de forma desigual, de forma diferenciada. O desenvolvimento do capitalismo pode ter diversas faces e níveis de desenvolvimento dentro do mesmo Estado.

1.2 O desenvolvimento combinado

Por volta de 1500, as grandes nações europeias encontravam-se na fase do capitalismo mercantilista. É quando os portugueses, que se encontravam nessa realidade descrita, chegam à América. As diferenças entre Estados e sociedades ficam mais evidentes. É o choque entre os chamados Novo e Velho mundo; entre a Europa e a América; é quando a Idade da Pedra e a do Ferro se chocam, e se dá o início da mecanização. Enquanto os habitantes da América se preocupavam apenas com a subsistência, os europeus estavam na corrida por acumulação de riqueza. O índio, que vivia na América, teve um choque com o desenvolvimento dos homens de pele branca, teve uma "visão do futuro", um pulo de diversas etapas históricas.

Os países atrasados assimilam as conquistas materiais e ideológicas das nações avançadas. Mas isto não significa que sigam estas últimas servilmente, reproduzindo todas as etapas de seu passado. [...] O caráter provincial e episódico de todo o processo admite que efetivamente se repitam, até certo ponto, as distintas fases de cultura em novos núcleos humanos. Sem dúvida, o capitalismo implica a superação destas condições. O capitalismo prepara e, até certo ponto, realiza a universalidade e permanência na evolução da humanidade. Com isto, exclui-se já a possibilidade de que se repitam as formas evolutivas nas distintas nações. (TROTSKY, 2007, p.20)

O índio, que conheceu as armas utilizadas na Europa, não teve a necessidade de descobrir o ferro, a pólvora e o fogo para daí dar o primeiro tiro. O índio pôde simplesmente pegar a arma e dar os seus primeiros tiros. O encontro do Novo Mundo com o Velho gerou consequências irreparáveis e irreversíveis. Aos habitantes do Novo Mundo restou a adaptação/desenvolvimento, que antes demoraria séculos para acontecer, mas que agora teriam de se acostumar em espaço de alguns anos. O capitalismo mercantil já fazia parte de nossa realidade. Porém, com todo o empenho dos colonizadores em explorar o Novo Mundo, essa tarefa não se deu de forma igualitária. Prova disso é que temos, em algumas regiões do Brasil, matas virgens e povos que ainda não tiveram contato com a civilização do homem branco.
O contato com os colonizadores se deu num primeiro momento apenas em algumas regiões litorâneas, posteriormente no interior com a ação dos bandeirantes, que saiam em busca de índios para o trabalho na lavoura. Temos aqui um excelente exemplo do desenvolvimento desigual e combinado. O Brasil, estando integrado ao capitalismo mercantil mundial, tinha como tarefa o fornecimento de açúcar. Mesmo com o sistema escravista tendo sido extinto oficialmente na Europa, ainda no início da Idade Média, aqui no Brasil iria ser reeditado. Isto é, o Brasil passou a utilizar o modo de produção atrasado para alimentar o continente mais avançado.
Podemos concluir que o movimento desigual e combinado é a coexistência, nem sempre pacífica, dos fatores mais desenvolvidos que conhecemos na história alinhado com os elementos mais atrasados. Fatores atrasados que teimam em se apresentar fantasiados de modernos, de repaginados.

1.3 O desenvolvimento desigual e combinado do capitalismo brasileiro

Para compreendermos o capitalismo brasileiro e suas particularidades é necessário voltar um pouco a atenção para as formações clássicas, os capitalismos de Via Prussiana, para realizar a transição ao capitalismo colonial desenvolvido no Brasil.
O desenvolvimento do capitalismo clássico se deu nos Estados Unidos, na Inglaterra e na França. Esses capitalismos têm em comum a ruptura com o modelo arcaico – no caso dos Estados europeus, o Feudalismo –, e a instalação de um novo modo de produção econômica, o Capitalismo. O caminho dos EUA foi o de rompimento com o modo de produção colonial, realizando uma revolução nos anos 1776, pondo fim à dominação inglesa e criando um Estado independente, política e economicamente. Essa revolução, inspirada nos pensamentos iluministas e liberais, vai catapultar o processo revolucionário que gestava na França. Neste, a burguesia alinha-se com o campesinato para derrotar os mantenedores do regime feudal, a Igreja Católica e a nobreza.
O que há de comum entre os três, e deve chamar nossa atenção, são as transformações na base de produção. Esses países vão conhecer o fim da grande propriedade de terra, que dá lugar à pequena propriedade, voltada para a produção de alimentos; o forte desenvolvimento da cultura, da indústria, desenvolvendo a democracia burguesa e a consequente geração de uma massa de trabalhadores: os operários fabris. Mas, mesmo entre os países de capitalismo clássico há diferenças, pois enquanto a nobreza francesa perdia a cabeça na guilhotina, por ordem da nascente burguesia, a nobreza inglesa fechava acordos de concessões com a burguesia conterrânea.
A Via Prussiana, conceito desenvolvido por Lênin, e a Revolução Passiva, desenvolvida por Gramsci, revolucionário italiano, são teorias que se complementam e que vão abordar o desenvolvimento capitalista nos países onde não houve rompimento com o antigo regime. Lênin desenvolve a teoria para abordar o desenvolvimento do capitalismo agrário na Rússia, onde a produção do campo passa para a lógica capitalista sem a necessidade de reforma agrária, mantendo, assim, as grandes porções de terras e o poder de mando dos antigos latifundiários dentro do modo capitalista de produção.
Tal aliança torna-se possível pelo que Gramsci chama de revolução pelo alto, ou seja, uma aliança realizada sem a intervenção das massas. Para compreender tal conceito, devemos ter em mente os fundamentos básicos da ciência política levantados por Marx, em que nenhuma formação social desaparece enquanto as forças produtivas que nela se desenvolveram encontrarem espaço para um movimento progressista posterior. E a sociedade não se coloca problemas sem que as condições necessárias para sua solução tenham se formado. Então, a burguesia e a nobreza de outras nações que assistiram à época do terror francês, cuidaram para que a guilhotina não zunisse e arrancasse suas cabeças. Logo, os Junker´s (grandes proprietários de terra da Alemanha) não tardaram em fazer alianças com a nascente burguesia e evitaram conflitos sobre os projetos de Estado.
O capitalismo brasileiro encontrou uma via diferente: o capitalismo colonial. O Brasil foi incluído no contexto econômico mundial na época do capitalismo mercantilista. Os portugueses quando aqui chegaram, em 1500, buscavam metais preciosos, mercado consumidor e especiarias, o que, no primeiro momento, não foi encontrado. Então, o Brasil passou a ser explorado apenas 32 anos após a chegada da primeira esquadra portuguesa, por motivos de manutenção territorial, pois já havia despertado interesse de outras nações. Entramos no mercado mundial como grandes exportadores de Pau-Brasil, madeira extraída pelos nativos, os indígenas, utilizada para tingir os tecidos europeus. Há o choque entre os nativos, que se encontravam ainda na pré-história, com os portugueses, que já estavam avançados, às vésperas do desenvolvimento industrial. Os índios são rapidamente iniciados nas ferramentas melhor trabalhadas.
A segunda mercadoria exportada pelo Brasil foi o açúcar, trazido de outras colônias portuguesas para o Brasil, onde encontra clima e solo propício para o seu desenvolvimento. Assim, inicia-se, de fato, a colonização do Brasil pelos portugueses. Para iniciar a exploração, o governo português dividiu o território brasileiro; passou linhas retas horizontais no mapa e doou essas terras aos nobres portugueses interessados em cultivar cana de açúcar nas terras do além-mar. Os que recebiam essas terras eram chamados de donatários.

[...]. Não podiam vender ou dividir a capitania, cabendo ao rei o poder de modificá-la ou mesmo extingui-la. A posse dava aos donatários extensos poderes tanto na esfera econômica e na esfera de arrecadação de tributos como na esfera administrativa. A instalação de engenhos de açúcar, de moinhos de água, assim como o uso de depósitos de sal, dependiam do pagamento de direitos; parte dos tributos devidos à coroa pela exploração do pau-brasil, de metais preciosos e dos derivados da pesca, cabia também aos capitães donatários. Do ponto de vista administrativo, tinham o monopólio da justiça e autorização para fundar vilas, doar sesmarias, alistar colonos para fins militares e formar milícias sob seu comando. (FAUSTO, 2012 p.19)

Dessa maneira, o Brasil passa a funcionar como uma empresa privada de Portugal, cujo principal objetivo era a produção de açúcar e o extrativismo vegetal e mineral. Não tardaram em aparecer problemas com os donatários, então, o governo português resolveu enviar Tomé de Souza ao Brasil, criando assim o Governo Geral, que tinha como finalidade a organização dessa empresa privada portuguesa.
Os trabalhadores desses engenhos, em sua maioria, eram os índios, no início da colonização, sendo logo substituídos pelos negros africanos. Podemos simplificar essa modificação, dando três motivos: 1 - A Igreja Católica enfrentava a Cisma do Ocidente, perdendo grande número de seguidores, por isso, passa a ver os índios como possíveis fiéis; 2 - A experiência com negros africanos já havia funcionado em outras colônias; 3 - Os indígenas conheciam muito bem a mata, o que facilitava a fuga, ao contrário dos africanos que vinham de outro continente e nada conheciam dessa nova terra.
Montada a engrenagem de produção, o Brasil passa a chamar ainda mais a atenção como uma das terras mais lucrativas do mundo. Não tardou para que holandeses e franceses voltassem à Costa Nacional com o intuito de explorar as potencialidades econômicas dessa terra, mas ambos acabam sendo expulsos pelos portugueses, donos de engenho e comerciantes.
Alagoas era uma das regiões mais ricas do mundo durante o século XVII, e também se tornou palco da mais importante resistência escrava. O Zumbi dos Palmares ficou conhecido por liderar o Quilombo dos Palmares com a intenção de libertar os escravos da região onde hoje são os municípios de União dos Palmares, Atalaia, Viçosa, Messias, Joaquim Gomes, Santana do Mundaú e Pilar. Nesse momento de nossa história ocorreu uma importante aliança entre a oligarquia alagoana e a nacional, com o consentimento da Coroa Portuguesa, para acabar com o Quilombo e evitar que se espalhasse pelo resto da colônia.
No século XVIII, a economia açucareira sofreu a primeira queda quando os olhos se voltaram para a região mineira. O ouro, que a coroa portuguesa tanto havia procurado, finalmente foi encontrado. O Nordeste, nesse momento, conhece o seu primeiro êxodo de capitais e pessoas. Mais tarde, essa mudança do centro econômico se consolidaria com a produção de café no Sudeste, atividade que em pouco tempo passou a figurar quase que totalmente na balança comercial. E a vinda da família Real para o Brasil, em 1808, tirando de vez a centralidade do Nordeste, e transferindo a capital brasileira da Bahia para o Rio de Janeiro.
A economia canavieira, que era acompanhada pela produção de tabaco, recebe, no século XIX, a companhia do algodão, planta cultivada no Agreste e no Sertão, que também é voltada para a exportação em direção ao mercado europeu. Em Alagoas, o caminho que a ferrovia fazia para buscar a cana, agora também buscava o algodão, a exemplo das estações de Rio Largo, local onde o algodão era tratado para em seguida pegar o trem novamente em direção ao porto de Maceió.
A volta da Família Real para Portugal, em 1821, e a posterior Independência Política do Brasil se dá sem nenhum alarde. Podemos entender o 7 de Setembro como um acordo entre a oligarquia brasileira e o capital internacional. A independência vem sem modificar praticamente nada na realidade econômica e política nacional. Nesse momento, a política brasileira passa a dividir-se entre liberais e conservadores. Os liberais queriam menos intervenção do Imperador e liberdade econômica; já os conservadores apoiavam e faziam parte do Estado. Quando a luta pela abolição da escravatura ganha força, o regime imperial perde apoio na mesma proporção.
A abolição da escravatura e, um ano depois, o fim do Império abrem uma nova realidade política no Brasil. Baseado no Manifesto Republicano, lançado ainda no império em 1870, é montada a República Velha (1889-1930). O pensamento liberal passa a ser predominante, culminando no Brasil com o sistema federativo, implantado em substituição ao centralismo imperial. Esse regime federativo ficou conhecido como Política dos Governadores, em que se edificava o poder dos coronéis municipais e das oligarquias estaduais e federal em detrimento dos direitos dos indivíduos e do bem público. Como diz Douglas Apratto Tenório, em seu livro Metamorfose das Oligarquias:

A República Velha é marcada pela hegemonia agrícola e, por via de consciência, pelo domínio das classes agrárias. Apesar da agitação republicana nos salões, a maioria da população não teve envolvimento com os novos rumos políticos. A Proclamação da República em 15 de novembro de 1889 pôs fim à centralização monárquica e, assim, alterou-se a estrutura de poder, pois as decisões políticas passaram a ter como ponto de partida as antigas províncias, agora denominadas Estados. De certo modo, o novo regime foi a concretização dos interesses das oligarquias ou dos grupos detentores do poder econômico nos estados, a quem já não covinha mais um regime de governo que centralizasse na corte, o Rio de Janeiro, a prerrogativa de todas as decisões. (TENÓRIO,2009 p.10)

A oligarquia que foi consolidada em Alagoas foi a canavieira, cultura agrícola que predominou sobre qualquer alternativa econômica. Encerrou, ainda no começo, a possibilidade de diversificação econômica, seja ela de pleito de alimentos ou desenvolvimento de indústria leve. Dessa maneira, os donos dos Bagues que passaram, uma minoria, a dono de engenho e, posteriormente, a usineiros e em sua maioria fornecedores de cana-de-açúcar.
Nos engenhos, durante a primeira metade do século XX, a vida cotidiana parece não ter avançado para a República. Como bem relata José Lins do Rego, em seu livro Menino de Engenho, as memórias do tempo do engenho do avô materno. Mesmo o avô, que é lembrado com afeto, era o grande carrasco de todos os moradores do engenho, que viviam mal, comiam péssimo e trabalhavam horas e horas. Para, além disso, todos os poderes de ditar as leis, julgar e condenar cabia ao dono do engenho. Nada passava sem que ele soubesse e aprovasse. É sobre esse prisma que vão surgir os primeiros povoados e cidades. Esse modo de entendimento político, em que os senhores de engenho se associam com a burguesia brasileira de forma pacífica, sem haver conflitos de interesses. Aliança esta somada à ausência de possibilidade de construção de uma oposição forte, pois aqui não existiu a burguesia revolucionária europeia. Ainda não existiam operários e os camponeses eram recém-saídos da escravidão, ou seja, não conheciam outra forma de organização social.
Desta feita, convivíamos com a ausência de um sujeito revolucionário consciente para fazer frente à oligarquia. Essa realidade vai resultar numa realidade assustadora e carente de lógica. Na mesma medida que o açúcar perdia valor no mercado, aumentava-se a área de plantio da cana. Então, a economia alagoana passa a ser sustentada pela política protecionista e não mais por ela mesma. O sustento da cana acaba sendo, até os dias atuais, estritamente político no plano local e nacional.
No Brasil, a crise de 29 chega provocando forte baixa nas exportações, principalmente do café, principal produto da economia à época. Como medida para sanar os problemas, a burguesia e alguns setores da oligarquia nacional vão apoiar o Golpe de Vargas e a mudança política, a saída do liberalismo para o centralismo político federal. Dava-se, então, o início à Era Vargas. Logo no início de seu governo, aprova uma medida para salvar os cafeicultores, comprando parte de sua produção para estoque, esperando a subida do preço no mercado mundial, a outra parte era queimada, a fim de reduzir a oferta do produto. Também são realizadas reformas importantes no seu primeiro governo e no Estado Novo. Alguns exemplos são a criação da CLT, uma nova constituição federal, a criação de importantes estatais, tentativa de unificação cultural etc. Para enfrentar a crise, o Estado passa a intervir nos mais diversos setores da economia.
Em Alagoas, durante a década de 30, o Governo Federal interviu para evitar a quebra da economia e apaziguar os ânimos nas disputas entre bangueseiros e usineiros, são elas:

Na primeira direção, o governo federal tomou três atitudes da maior importância: a implantação do reajustamento econômico, a criação da comissão de defesa do açúcar e, finalmente, a criação do instituto do açúcar e do álcool. Na segunda direção, tomou várias medidas que culminaram com a promulgação do Estatuto da Lavoura Canavieira. (Andrade, 1997 p.69)

Ao mesmo passo, a indústria têxtil dava uma nova dinâmica à economia alagoana, gerando uma nova massa de trabalhadores e criando o convívio urbano tão necessário para o florescimento de ideias de reflexão sobre a sociedade. É nesse período que vão surgir alguns intelectuais, artistas e políticos progressistas. Dessa maneira, mesmo com ajuda estatal, a cana de açúcar conhece a sua segunda crise.
Em 1955, algo inusitado acontece em Alagoas. Pela primeira vez é eleito para o cargo executivo estadual um político que, mesmo ligado aos setores da cana, possuía um programa de governo diferenciado, o Muniz Falcão. Foi um político surgido na vida pública como delegado trabalhista, deputado e, enfim, governador. Porém, seu governo não dura muito tempo. Logo a oligarquia canavieira se junta e o afasta do poder, utilizando a força física. Fato ocorrido numa sexta-feira, 13, dentro da Assembleia Legislativa, onde os deputados vestiam capas de chuva e sobretudo, num calor de 38°. O motivo dessas vestes era de esconder as metralhadoras que logo seriam utilizadas dentro da casa do legislativo alagoano. O saldo do interstício do governo Muniz Falcão: um deputado morto e, feridos, um jornalista e um funcionário da casa.
Os anos 60 chegam turbulentos em Alagoas e no Brasil. O governo Jango (1961-1964), tendo o apoio de importantes setores de trabalhadores urbanos e rurais, intelectuais e artistas formava uma frente popular, o PCB se mantinha na oposição de esquerda e, do outro lado, a UDN e os integralistas, a direita clássica e os fascistas brasileiros, respectivamente.
No campo econômico, durante as décadas de 50 e 60, a cana irá expandir para novas áreas do território alagoano. A cana, que antes era cultivada apenas nas terras de várzea, onde sua agricultura era muito complicada por ser barro mole e suscetível a enchentes e consequente perda de produção, passa a ser cultivada também nos tabuleiros, aumentando ainda mais sua área de cultivo. Nesse processo, são expulsos os pequenos agricultores que cultivavam alimentos, como feijão, milho, mandioca, para dar lugar à cana. A cana e o latifúndio ganham a luta contra o plantio de alimentos. Além de provocar o maior desmatamento até hoje visto em nosso estado. É também, nesse contexto, que os bangues são vencidos pelas usinas em função da melhoria técnica como bem lembra Manuel Correia:

O Governo instituído em 1964 tinha grandes compromissos com a opção capitalista que fizera e com integração da economia brasileira à economia internacional: daí procurar desenvolver ao máximo a melhoria das condições técnicas e industriais, deixando em segundo plano os problemas sociais, que a seu ver oneravam o crescimento econômico, e os problemas ecológicos, de que a maioria da população brasileira não estava ainda conscientizada. (Andrade, 1997 p. 92)

Com os altos investimentos estatais, o mercado mundial aquecido entre as décadas de 70 e 80, o Brasil passa pelo período que ficou conhecido como Milagre Econômico e a elevação do preço do petróleo pela Organização dos Países Produtores de Petróleo (OPEP). Essa realidade nacional vai azeitar a economia da cana em Alagoas e proporcionar crescimento na marca dos 145,7%, em grande parte devido ao Programa Nacional de Álcool, o PROÁLCOOL. Os efeitos são desastrosos para a população. Enquanto os capitalistas alagoanos, a essa época jovens que foram estudar fora e voltavam para administrar a herança com bastante dinheiro para investir, vão forrar Alagoas de cana em todo seu litoral, chegando até às regiões do Agreste, onde o índice pluviométrico é inferior ao necessário. A produção de alimento passa a ser praticamente toda importada dos estados vizinhos. Enquanto as usinas realizam estudos e desenvolvem novos tipos de cana para determinados solo, os trabalhadores dessa mesma usina vivem em condições de miséria, de insegurança alimentar.
O fim dos anos 80 e o início dos 90 são quando vai se desenhar toda a crise do estado alagoano. As lutas da década de 80, pela redemocratização, geram importantes quadros políticos de esquerda, muitos vindos do movimento estudantil, funcionalismo público e luta pela terra. Movimentos que, durante os anos 60 e 70, ficaram calados pelo medo, tendo poucos que arriscaram a própria vida pela mudança social. A burguesia, tanto na esfera nacional como alagoana, já vinha se preparando para a reabertura numa campanha constante para ser vista como democrática, isenta das mazelas da ditadura.
No final da década de 80 e 90, Alagoas passa a conviver com uma realidade difusa, em que Maceió, por ser a capital, passa a dispor de outros meios econômicos que não a cana, como indústrias, serviços, comércio e funcionalismo. A capital alagoana vai viver na democracia burguesa formal, fato que não exclui as mazelas capitalistas, enquanto o interior convive com uma realidade pior, com o que há de mais atrasado no capitalismo brasileiro, o coronelismo moderno, com as usinas que ocupam mais de três municípios. A economia alagoana fica à mercê da cana-de-açúcar e suas variações; uma economia mantida pela política, sustentada anos a fio para manter o mesmo grupo no poder.
O crescimento da cadeia do plástico, em Alagoas, com a construção de novas plantas no polo industrial José Aprígio Vilela, localizado no município de Marechal Deodoro, e a possível implantação de um estaleiro no município de Coruripe significam uma provável diversificação e industrialização urbana da economia alagoana, mas muito longe de uma contraposição à indústria rural da cana-de-açúcar.
O desenvolvimento desigual e combinado é visto em nosso dia-a-dia da política com o antigo apadrinhamento e mandonismo dos prefeitos e vereadores, mesmo que tenhamos um dos sistemas de votação mais modernos do mundo. Na cultura, ainda podemos observar a subserviência dos trabalhadores, principalmente na zona rural, que enxergam o emprego como um favor cedido pelo patrão. Pensamento que reflete os resquícios da escravidão. Na economia, que o trabalho na indústria moderna, com maquinário de última geração, se combina com o trabalho manual no corte da cana.
No capítulo seguinte, será explorada a temática da economia alagoana, sua formação a partir da cana de açúcar com os bagues, engenhos e usinas, a política federal e estadual de incentivo a essa cultura e a crise originaria da cana nos anos 90.

























2. A QUEDA DE SURUAGY

No primeiro capítulo, fizemos uma rápida análise da formação política e econômica do Brasil, fazendo um recorte em Alagoas. A partir da Teoria do Desenvolvimento Desigual e Combinado, podemos ver como se dava as singularidades de Alagoas durante a formação do Brasil.
O capitalismo alagoano manteve as características da época colonial: o domínio da grande propriedade agrária, pecuária e agroindustrial, ou seja, a cana-de-açúcar ocupara um papel de grande peso na economia do estado. O poder econômico da grande propriedade e da monocultura domina, em todas as instâncias, o poder político. Quando não puder comandar diretamente influenciarão apoiando seus representantes para serem os dirigentes do estado. No século XIX o poder econômico será a partir dos engenhos de banguê, na segunda metade do século XX será estruturado no mesmo setor, só que mostrara uma face mais moderna com a instalação das Usinas.
Porém, toda a modernização do setor sucroalcooleiro alagoano, mediante incentivos estatais, acaba por não promover o desenvolvimento da economia, pois os tais incentivos vinham acompanhados de medidas protecionistas que acabavam por blindar a produção alagoana da concorrência e desviar os possíveis avanços tecnológicos e econômicos do estado.
Neste capítulo iremos abordar as medidas e incentivo e proteção a produção da cana-de-açúcar alagoana, a evolução da crise fiscal e política que o estado de Alagoas sofreu nos dos anos de 1990 decorrente do acordo dos usineiros, que culminou com o colapso econômico do estado. A queda do governador, que sofreu uma tentativa de impeachment e foi obrigado a se licenciar do cargo, a quebra do banco do estado (Produban) foram os desdobramentos mais marcantes desse período.

O desenho da crise: economia alagoana insustentável

A economia baseada na monocultura tem diversas limitações e necessita de um grande amparo econômico do Estado para sobreviver. Em Alagoas:

(...) A grande propriedade agrária, pecuária e agroindústria, que tem sido, desde a época da colonização, o centro da nossa sociedade, apesar de sempre incorporar substanciais desenvolvimentos tecnológicos e fazer outras mudanças para adequar-se às conjunturas, reproduz continuamente um padrão técnico e gerencial abaixo de seus concorrentes brasileiros e internacionais, uma produtividade agrícola e industrial inferior, uma situação financeira instável, uma relação predatória com o meio-ambiente, o aparelho do Estado, a infraestrutura pública e a mão-de-obra.

Em Alagoas, a monocultura da cana-de-açúcar, como seu principal motor, já demonstrou diversas vezes que tem limitações. Esta economia, mesmo enfrentando diversas crises, vem sendo mantida com proteção do estado. São generosos benefícios fiscais e programas de incentivo à produção, dessa forma, são despejados bilhões nas contas dos usineiros sem nenhuma contrapartida.
Essa injeção de dinheiro público, ao invés de gerar desenvolvimento, implica em uma dependência do setor açucareiro das políticas do estado. Para tanto, o controle do estado assume grande importância, pois, a partir dele, serão desenvolvidos e aplicados os programas de incentivo à economia açucareira.
Durante todos os governos de Alagoas, os programas de incentivos à produção açucareira ocuparam a parte mais importante do programa econômico do estado.

2.2 Instituto do Açúcar e do Álcool (IAA)

O crescimento da produção de açúcar nas regiões sul e sudeste do Brasil atingiu negativamente a produção em Alagoas. O enorme montante de capital disponível nessas regiões faz a produção nascer mais moderna e eficiente do que na região Nordeste, além de ocasionar conflitos:

No Estado de São Paulo, o desenvolvimento da indústria canavieira deu-se após a década de 1920, com a crise do café, ocasionando uma rápida expansão da área cultivada com cana-de-açúcar. Com isso, surgem conflitos entre os usineiros das Regiões Nordeste e Centro-sul e o Estado é chamado para mediar essa disputa.

Criado em 1933, no contexto da crise de 1929, o Instituto do Açúcar e do Álcool (IAA) tinha como objetivo:

(...) regular o mercado de açúcar e álcool sendo o principal mecanismo de regulação a implantação de cotas de produção. Também limitou a usina a produzir, no máximo, 60% de toda cana em suas próprias terras, sendo o restante fornecido por produtores independentes.

Representava a intervenção direta do Estado na economia canavieira, tendo atuado com medidas protecionistas em defesa dos usineiros. Apesar de controlar a produção nacional e estabilizar os preços, a ajuda financeira estatal acaba onerando o Estado em bilhões.
Em Alagoas, o IAA será salvador da produção açucareira alagoana. Contudo, as medidas tiveram efeito retrógrado, pois atrasam e travam o desenvolvimento tecnológico das usinas, já que mantêm os lucros dos usineiros sem nenhuma contrapartida.

Programa Nacional de Melhoramento da Cana-de-Açúcar (PLANALSUCAR)

O Programa Nacional de Melhoramento da Cana-de-Açúcar (PLANALSUCAR) foi promulgado pelo Ministério da Indústria e do Comércio em 1971 e tinha como objetivo o desenvolvimento tecnológico a partir da pesquisa científica do melhoramento da cana. Essa medida foi encontrada pelo governo para promover a modernização no setor. Segundo Lima:

A partir desse decreto (Decreto-lei n° 4.870 de 01/12/65), formou-se grupos de trabalho e de estudos sobre a Zona da Mata da região Nordeste e sua situação socioeconômica para elaborar propostas de modernização da agroindústria canavieira. As propostas elaboradas, nesse processo, partiam da necessidade de diversão das atividades agrícolas nas microrregiões onde predominava a atividade canavieira; a modernização e diversificação das atividades industriais que tivessem a cana como principal matéria-prima; e a reforma agrária em regiões canavieiras subaproveitadas, para absorver a mão-de-obra excedente gerada com a reorganização do setor. (LIMA, 1998, p. 32)

Essa proposta feita pelo governo militar de 1965 foi amplamente rejeitada pela oligarquia alagoana e acabou por não ser posta em prática. Desta maneira, o governo tentou por outra via tornar a economia menos onerosa, com o desenvolvimento de novas variedades de cana, substituindo a CO-333 pela CB45-7 na década de 70 e, posteriormente, as canas RB-70141, RB 70194 e CO 997 (LIMA, 1998). As novas variedades de cana desenvolvidas apresentavam teor superior de sacarose. Todos esses investimentos foram feitos com verbas provenientes do IAA, e levaram a uma maior produção de açúcar. Porém, os empréstimos feitos pelo Estado não foram pagos pelos usineiros.
Alagoas teve um percentual grande na dívida contraída pelos usineiros com o Estado, como mostra a tabela:

Credores
%
INSS
Banco Brasil
IAA
REC. FEDERAL
PROCURADORIA DA FAZENDA NACIONAL
33,94
9,57
17,53
12,39
8,97
Fonte: IPEA (1984:69) PAIXÃO (1994:83).

Participação de Alagoas nas dívidas do setor sucroalcooleiro brasileiro (%)

A tabela demonstra a facilidade dos usineiros em conseguir financiamentos do Estado, sem compromisso de pagamento e com isenção de impostos.
Em Alagoas, através do Banco Estadual (PRODUBAN) eram destinados os empréstimos dos usineiros, sem restrição de crédito e sem cobrança, cabendo ao IAA a responsabilidade se ser avalista. Ou seja, colocava os próprios usineiros como responsáveis pela cobrança de suas dívidas. O montante da dívida chegou a R$ 75,6 milhões, sendo R$ 33,6 milhões de usinas cooperadas e R$ 42 milhões de usinas não cooperadas. Esses empréstimos serão uma das pontes da falência do antigo banco estadual.

Programa Nacional do Álcool – Proálcool

O Programa Nacional do Álcool (Proálcool) foi criado em 1975, pelo governo militar brasileiro de Ernesto Geisel, como forma de enfrentar a primeira crise mundial do petróleo. A rápida elevação do preço da matéria prima levou diversos países de todo o mundo a enfrentar fortes crises econômicas e as mais devastadoras consequências: juros elevados, queda na taxa de crescimento, déficit na balança comercial etc. A crise atingiu diversos países. Segundo Araken Lima:

Ressalta-se que o efeito dessa crise, na economia dos países do terceiro Mundo, atingiu diferentemente os países exportadores de petróleo e os não exportadores. Os primeiros se beneficiaram do aumento de preços do petróleo e, apesar da recessão, da diminuição da demanda e do volume de suas exportações, conseguiram se proteger e capitalizar parte da renda petrolífera em projetos de infraestrutura e industrialização.
Já a segunda categoria de países, isto é, os não-exportadores de petróleo, foram atingidos duramente com a combinação de recessão econômica internacional e a alta dos preços do petróleo. Este último, somado ao aumento dos preços dos produtos alimentícios e fertilizantes químicos agravaram consideravelmente o déficit do balanço de pagamentos destes países, cujos recursos foram atingidos, também, pela queda dos preços de diversas matérias-primas no mercado internacional e a redução de suas exportações industriais, consequência da recessão mundial. (LIMA, 1998 p.19)

No Brasil, a crise provocada pelo aumento do preço do petróleo é um dos fatores que ajuda a levar ao fim o período conhecido como milagre econômico. O crescimento econômico dos períodos de 1969 a 1973 foi baseado no arrocho salarial aos trabalhadores e na repressão aos movimentos sociais, aumentando assim o lucro dos capitalistas. Porém, essa realidade não incomodava a classe média, que se sentia satisfeita por conta do crescimento econômico e da oferta de empregos. Quando a crise atingiu o Brasil, a inflação tomou conta da economia, rebaixando os salários. Dessa forma, a classe média foi tirada da zona de conforto e passou para uma oposição aberta ao regime militar.
A recessão econômica mundial colocou em xeque a economia brasileira dependente da exportação de produtos primários, que sofreu queda brusca em diversos setores, principalmente a cana-de-açúcar.
A exportação do açúcar havia atingido sua maior alta em 1963, devido ao embargo econômico que os EUA impuseram a Cuba, por conta da Revolução e a entrada na área de influência socialista. O embargo trouxe consequências para a exportação da cana-de-açúcar, que passou de 1,67% (1960) para 79,13% (1963) do total da participação no mercado norte-americano. O crescimento levou o governo brasileiro a fazer pesados investimentos no cultivo da cana para que os usineiros pudessem expandir o plantio.
Mas, com a recessão, os preços do açúcar sofreram forte queda no mercado internacional. Em 1974, a tonelada era avaliada em US$ 656, em média, e cai para US$ 258 no ano seguinte. Esses fatores, somados à alta no preço do petróleo e à queda no preço do açúcar, fez o Brasil procurar novas formas econômicas de superar a crise.
A saída encontrada para salvar os usineiros dos baixos preços praticados no mercado externo foi aumentar o consumo interno dos derivados da cana. Dessa maneira, foi criado o Proálcool, o programa visava o aumento do consumo interno do álcool como combustível de veículos automotores de passeio e o aumento da quantidade de álcool misturado à gasolina. Essa medida salvará os usineiros e estimulará a produção de novos veículos movidos a álcool.
Em Alagoas, o número de destilarias quintuplicara, passando de quatro em 1977 para vinte em 1981. O Proálcool é a intervenção do Estado para salvar os usineiros da crise.

2.5 O ICMS em Alagoas

A receita estadual na década de 80 era composta pelos ICMS (Imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual, intermunicipal e de comunicação), IPVA (Imposto sobre Propriedade Veículos Automotores), Imposto sobre transmissão de Causa Mortis e ITCD (Doação de Bens e Direitos). Desses, o ICMS é o mais importante, chegando a ocupar a importância de mais de 90% da arrecadação do estado.
O setor sucroalcooleiro era o principal contribuinte do ICMS, após as primeiras crises do IAA, não tardou em procurar fechar acordos de incentivos e isenção fiscal. Segundo a Secretaria da Fazenda do Estado de Alagoas, há um decréscimo vertiginoso da participação dos usineiros na arrecadação tributária, passando de 58,02, em 1983, para míseros 1,48, em 1991. (LIMA, 1998, p.36)

2.6 O Acordo dos Usineiros

Em 1988, foi firmado um acordo fiscal entre o então governador de Alagoas, Fernando Collor de Melo (1987–1989) e os usineiros alagoanos. O acordo versava sobre as dívidas do setor com o Estado. Esse acordo, que deixará um rombo de bilhões nas contas públicas do estado, será o início da crise que culmina com a tentativa de impeachment do governador Divaldo Suruagy (1995–1997), em 1997.
O início do problema se deu com a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) em reconhecer a ilegalidade da cobrança de ICMS na cana própria, o que gerou o fim da cobrança. Os usineiros alagoanos, aproveitando a decisão do STF, entraram com Ação Administrativa na Secretaria da Fazenda, requerendo a devolução da cobrança do que foi pago "indevidamente". A ação foi negada, o que levou os usineiros a entrarem com uma Ação Judicial de Restituição do Indébito. Mas é com a intervenção do governador Fernando Collor que conseguirão uma decisão favorável, levando ao famigerado "acordo dos usineiros":

O segundo passo dos usineiros foi recorrer ao poder judiciário através de uma Ação Judicial de Restituição do Indébito. Porém, antes mesmo da decisão em primeira instância, o governador da época, Fernando Collor, interveio para transacionar com as empresas reclamantes, de onde gerou a lavratura dos 'Termos de Transação do Indébito da Cana'. Tais termos foram pactuados em duas ocasiões. O primeiro, no dia 15/07/88, envolveu 19 empresas; o segundo, no dia 19/04/89, mais 12 empresas. (LIMA, 1998, p.45)

Além do direito à restituição, o acordo garantia que o valor calculado seria de acordo com os índices oficiais para cobrança tributária existente, seriam eles: OTN, BTN, TR e UFIR. O resultado foi que, com a inflação em alta, o montante repassado de dinheiro aos usineiros chegou aos milhões. O valor, que seria de R$ 131,80 milhões, com a correção passou para R$ 358,05 milhões, ou seja, 291,81 milhões a mais do que o suposto direito.
O resultado dessa política financeira foi desastroso. Para repassar o dinheiro do acordo aos usineiros, o governo teve de retirar verbas de todas as áreas sociais. A economia alagoana sofreu estagnação durante o final das décadas de 80 e 90, sendo o único estado do Nordeste a ter o índice de crescimento da arrecadação negativo de - 0,98%, em 1996.

2.7 A reorganização política alagoana após a reabertura democrática

O fim da Ditadura Militar no Brasil, regime que durou 20 anos – de 1964 a 1985 – impõe a reorganização das instituições políticas. O fim do bipartidarismo, representado pela ARENA (Aliança Renovadora Nacional) e MDB (Mobilização Democrática Brasileira), abre espaço para o surgimento de novas agremiações políticas e a saída da clandestinidade de partidos postos na ilegalidade, como PCB (Partido Comunista Brasileiro) e PC do B (Partido Comunista do Brasil).
A ARENA, principal agente da ditadura, com o intuito de se desvincular da imagem de líder do Regime Militar, cria um novo partido, o Partido Democrático Social (PDS), liderado, em Alagoas, por Divaldo Suruagy, ex-interventor no governo do estado (1975-1978) e governador eleito (1983-1986), com a companhia de Guilherme Palmeira, Fernando Collor de Mello e Geraldo Bulhões.
O PMDB segue a tendência nacional de abrigar figuras de centro, centro-esquerda e esquerda, em Alagoas com Ronaldo Lessa, Selma Bandeira e democratas liberais, como Teotônio Vilela, além de realizar alianças com PCdoB e PCB. Dessa maneira, está posto o primeiro desafio às forças políticas alagoanas: quem sairia com o capital político de novidade democrática, quem conseguiria encampar o discurso da mudança, quais partidos e quadros políticos tomariam a dianteira da reorganização política em Alagoas?
A reorganização política se inicia com profunda mudança no seio da esquerda. A queda do Muro de Berlim põe em dúvida o modelo revolucionário defendido pela esquerda. A partir da década de 1980, surgiram novas formulações de socialismo, tendo sido o mais conhecido, no Brasil, o modelo do Partido dos Trabalhadores – PT, baseado na luta contra-hegemônica, baseada na disputa dos movimentos sociais e do parlamento, completamente diferente do modelo revolucionário bolchevique.
As lutas, que outrora contestavam o sistema capitalista, agora reclamam a existência de um regime democrático. Nesse cenário, de aparente superação do socialismo, triunfam, com bastante força, as políticas neoliberais, executadas a partir das cartilhas do FMI, BIRD etc., com o intuito de retirar o Estado de suas funções e passá-las para a iniciativa privada, garantindo assim as altas taxas de lucro dos capitalistas.
Porém, a forma como reabrir e reorganizar a política e a economia, em Alagoas, gera briga intra-oligáquica, um setor adota a roupagem de grupo político do bem, democrática e renovadora, enquanto o outro setor está no poder. E, dessa maneira, vai se mantendo a dança das cadeiras entre as oligarquias.
A primeira disputa aberta ocorre na eleição para a prefeitura de Maceió, em 1985, com a vitória do setor identificado como progressista de centro-esquerda, porém, não avança para proposições mais concretas, ficando somente no discurso. Djalma Falcão é eleito numa aliança entre PMDB/PC do B/PSB, com 56.174 votos, acaba não conseguindo governabilidade e termina o governo sozinho, sem o apoio dos partidos aliados de outrora que passam para a oposição. O fracasso da gestão é resultado de uma bancada parlamentar com maioria oposicionista e da falta de projeto concreto da esquerda para o estado. Dessa forma, a direita clássica acaba por angariar o capital político.
Na eleição para o governo do estado, ocorrida no ano seguinte, em 1986, o candidato pela coligação PMDB/PTB/PC do B/PSC, Fernando Collor sai como grande vencedor, derrotando Guilherme Palmeira, representante direto dos usineiros, e Ronaldo Lessa, candidato identificado com a esquerda. Porém, a experiência do PMDB e de seus aliados se dá de forma semelhante à da prefeitura de 1982, as mudanças não vêm e os seus aliados, PTB, PC do B e PSC, saem frustrados.
A má administração da prefeitura de Maceió, por parte do PMDB, resulta na vitória de setores mais conservadores nas eleições de 1988. A prefeitura fica nas mãos da coligação encabeçada por Guilherme Palmeira, composta pelo PFL e PDS. Aliado à perda da prefeitura, temos a diminuição considerável de representantes na Casa Legislativa Municipal. O resultado das eleições nas cidades alagoanas representa um avanço significativo do PFL, hoje DEM. Os números das prefeituras são: "PFL(35), PTB(18) e PSC(3). O PMDB, mesmo detendo o governo estadual, elegeu apenas 31 e tanto o PDT como o PSB elegeram três prefeitos cada" (CARVALHO,1993, p.52)
Os anos de 1990 reservavam golpe ainda mais forte na esquerda nacional e, principalmente, na alagoana. A candidatura de Collor, o Caçador de Marajás, à presidência da República cresce em todo o país com a imagem de mudancista, político moderno, que utiliza os recentes recursos da televisão para realizar sua propaganda e do espaço político aberto pelo desgaste do governo José Sarney. Collor acaba ganhando de Lula nos dois turnos, com larga maioria dos votos em Alagoas e em sua capital.
Com a saída de Collor do governo do estado, quem assume é o seu vice Moacir Andrade. Andrade, pertencente ao MDB durante a ditadura tendo depois migrado para o PMDB, crítico do regime militar, teve seu mandato de deputado cassado em 1969 e era considerado como defensor dos servidores públicos na luta por melhores condições trabalhistas e salariais. Porém, seu governo foi marcado pelo enfrentamento com os servidores, que sofriam os reflexos da inflação em alta somada aos primeiros sintomas da crise provocada pelo acordo dos usineiros, o que acabou por manchar sua imagem de centro-esquerda.
A eleição de Geraldo Bulhões para o governo do estado (1991-1995) é marcado pelo aprofundamento da recessão econômica brasileira. Seu governo foi marcado pelo forte enfrentamento com os servidores públicos. As greves por reajustes salariais duravam meses, o aparelho sindical foi levado ao enfrentamento direto com a gestão Gente Boa (slogan do governo GB), mas sem conseguir grandes vitórias para a categoria.
Enquanto durou a gestão Geraldo Bulhões, o setor da educação vivenciou paralisações que comprometeram o ano letivo (chegando a ser anulado por conta do descumprimento completo do calendário escolar e dos componentes curriculares obrigatórios, sem nenhuma forma de recomposição). Contudo, o governo não descontava os dias parados dos vencimentos dos servidores, muito menos reprimia as paralisações. Tão pouco oferecia qualquer proposta de acordo satisfatória, como se simplesmente deixasse o tempo passar.
As gestões desastrosas dos governadores alagoanos, a continuação do acordo dos usineiros e a política neoliberal aplicada nacionalmente geram um quadro de aprofundamento da miséria social e incertezas econômicas e políticas em Alagoas.
Tal conjuntura propicia o reaparecimento de figuras já testadas no poder estadual. Divaldo Suruagy, ex-interventor e governador eleito do estado, volta à cena política com a promessa de "salvar" o estado, mas o que se vê é um agravamento ainda maior da crise política, econômica e social.

2.8 Suruagy: da eleição em 94 a sua queda

A crise econômica que atingiu Alagoas, no final dos anos 80 e início dos 90, marca a volta de Divaldo Suruagy à política. Trajando a imagem de solução, é eleito governador do estado por ampla maioria nas eleições de 1994, tendo alcançado 79,39% dos votos válidos.
Quando Suruagy assume, no dia 1° de janeiro de 1995, o Brasil havia mudado bastante, se comparado ao período em que foi governado por ele de 1975 a 1978 (ARENA) – 1983 a 1986 (PDS). A artimanha econômica, empregada por Suruagy em outrora, em que a correção monetária, a partir dos altos juros praticados no país, possibilitava o mascaramento do déficit das contas no estado. No entanto, o Plano Real, implementado um ano antes (1994) de Suruagy assumir o governo, acaba com tal possibilidade. O plano econômico do então presidente da república, Fernando Henrique Cardoso, pôs fim à prática de diversos estados e agravou ainda mais a crise em Alagoas. Porém, o governo tinha de obedecer à constituição:

1) tão logo assumiu o governo, Suruagy concede um aumento da gratificação dos cargos comissionados, e eleva os salários que, inconstitucionalmente, estavam abaixo do salário mínimo;
2) Em janeiro de 95, o Congresso Nacional aprova o aumento dos parlamentares que assumiram em fevereiro de 95, fazendo com que, pelas vinculações previstas na constituição Estadual, isso implicasse aumento dos salários de todo o Poder Judiciário e Legislativo, onde estavam abrigados os mais próximos das elites políticas alagoanas
3) Devido à concessão de aumento do salário mínimo em maio de 95, pelo governo federal, o governo estadual reajusta o soldo dos policiais militares em cumprimento de decisões judiciais. (ALMEIDA, 1999, p.102)

Essas medidas levam o estado a se afundar cada vez mais em dívidas impagáveis. A folha de pessoal salta de 35 milhões, no início do ano, para 85 milhões no final de 1995. A saída encontrada pelo governador Suruagy foi a emissão de títulos da dívida pública, sob administração do banco Maxi Divisas, mas, o mercado financeiro não apresentou interesse na compra dos títulos da dívida alagoana, pois os juros praticados não eram tão rentáveis como em outrora, quando a inflação fazia com que os papeis da dívida fossem muito lucrativos. Então, o governador decide utilizá-los para amortização de dívidas com empreiteiras e bancos, ficando o funcionalismo público sem receber seus vencimentos. Outro fator que agravou a situação do governador foi a falta de dinheiro para regularizar o pagamento dos funcionários públicos, o que gerou sentimento de revolta nos militares, professores, profissionais da saúde etc. Somado a esses fatores, Suruagy se encontrava sob séria acusação de ter agido inconstitucionalmente, direcionando recursos de título não reconhecidos pelo Poder Judiciário local para empreiteiras e bancos.
A economia alagoana, até os dias atuais, encontra muito peso no funcionalismo público e, durante esse período, ficou praticamente parada, o comércio com as ruas vazias, e os funcionários públicos passando fome. Somado a tudo isso, Suruagy:

[...] ainda conservava o antigo modelo de governar em que o diálogo com a sociedade era subestimado, com o povo afastado do centro das decisões e as soluções buscadas, como tempos passados, nos gabinetes presidenciais. Esse modelo que deu certo em suas administrações anteriores, já não surtia efeito nessa nova conjuntura de redefinição do papel do Estado na economia. (ALMEIDA, 1999, p.108)

A historiadora Leda Maria resume bem o principal problema do ex-governador: o modelo anacrônico de governo não trazia resultados satisfatórios para a população que iniciava uma organização para retirá-lo do poder. O sindicato da Polícia Civil – Sindpol, a Associação dos Policiais Militares de Alagoas – ASMAL – e o Sindicato dos Trabalhadores em Educação – Sinteal – tomaram a linha de frente do Fora Suruagy. As políticas neoliberais, que assolavam a população como um todo, trazem para junto dessas categorias os produtores de leite de Batalha (município alagoano) e o Movimento do Sem Terra – MST, além do movimento estudantil, que volta para as mãos de estudantes progressistas.
Durante esse período, Alagoas é marcado por intensos protestos, culminando com o do dia 17 de julho, quando os servidores públicos, junto com policiais civis e militares, se concentram na Praça da Assembleia Legislativa, onde votaram o afastamento do governador Suruagy. O governador não acreditava que seria afastado, pois possuía maioria no legislativo, mas a situação de confronto eminente entre policiais civis e militares e a população contra o exército fez que, antes do fim da votação, o governador pedisse afastamento.

2.9 Formação e atuação dos movimentos que derrubaram Suruagy

Os anos 1980 são de extrema importância para os movimentos sociais, partidos políticos e sindicatos. Nesse período, o assenso das lutas pela democracia faz surgir diversos tipos de organização de diferentes vertentes.
Pelo Brasil, temos a formação do PT, partido que continha as principais correntes da esquerda nacional. Por todo o país ocorria a reorganização dos sindicatos, que voltavam a ter direções combativas, que levaram à organização regionais dos Encontro da Classe Trabalhadora (ENCLAT`s), como preparação para o congresso nacional CONCLAT (Congresso da Classe Trabalhadora), que mais tarde seria fundada a CUT (Central Única do Trabalhadores). Em 1985, é fundado, em Cascavel (PR), o MST (Movimento dos trabalhadores Sem Terra), movimento protagonista das maiores lutas pela reforma agrária na América Latina e principal organização que puxou o fora FHC e a volta da UNE (União Nacional dos Estudantes) para a legalidade.
As lutas democráticas postas em debate nos anos 1980 levaram à formação de uma nova vanguarda de luta. Em Alagoas, essa vanguarda ocupa o espaço político à esquerda dos governos Geraldo Bulhões e Suruagy, inclusive sendo ponta de lança do impeachment deste último.
O PT em Alagoas, apesar de muito pequeno, chama a atenção para suas correntes organizadas com regimento interno próprio, como a Democracia Socialista (DS), Convergência Socialista (CS) e Articulação de Esquerda (AE), tendo forte influência nos sindicatos.
O movimento sindical que ressurge em Alagoas é muito fraco. Os sindicatos, limitados basicamente à capital, onde concentravam a maior parte da vida política, são rapidamente empurrados para o economicismo, em que as lutas se resumiam às pautas salariais e ao corporativismo, criando a mentalidade de que cada categoria deveria cuidar de sua pauta. Isto devido à miséria em que se encontrava Alagoas e a herança colonial escrava, representada nos baixíssimos salários. Esse modelo de sindicalismo absorve toda energia dos grandes dirigentes, fazendo com que, em muitos casos, os quadros sindicais não soubessem agir frente à possibilidade de se tornar parlamentar.
No movimento dos trabalhadores do campo, a Federação Estadual dos Trabalhadores da Agricultura de Alagoas (FETAG/AL), principal representação filiada à CUT, contava com 89 sindicatos e mais de 100 mil trabalhadores filiados, porém, essa organização passava longe de ter autonomia para tocar suas políticas, como lembra o economista Cícero Péricles.
Longe da autonomia necessária para a representação dos trabalhadores e dos pequenos produtores rurais alagoanos, a entidade demonstra um alto grau de dependência das iniciativas do aparelho de Estado. A FETAG/AL está distante de ser a estrutura capaz de enfrentar, no plano político, a representação conservadora e patronal do campo alagoano, composta pela Cooperativa dos Usineiros, Associação dos Plantadores de Cana de Alagoas/ASPLANA e Federação da Agricultura do Estado de Alagoas. A fragilidade da política levou a FETAG a alinhar-se com o governo Collor, a assumir as campanhas de Renan Calheiros, em 1988, de Collor presidente e, novamente, Renan Calheiros em 1990. (CARVALHO, 1993 p.75)
Então, temos uma realidade cruel, em que a principal mão de obra alagoana, principal geradora de riqueza de nosso estado, não consegue avançar para o enfrentamento do modelo econômico do estado. Os usineiros, além de serem os maiores detentores de terras no estado, ainda passavam por cima de diversos direitos trabalhistas e usavam da super-exploração de mão de obra, mantida pelo medo e pela violência institucionalizada. Muitas organizações políticas se resguardam de tal tarefa, entendendo que mandar o militante para essa tarefa é sinônimo de mandá-lo para a morte.
O movimento estudantil, recém-saído da ditadura militar, não consegue ajustar a linha política para o novo momento político democrático em que vivia o Brasil. A luta agora não era mais contra o regime político autoritário, mas sim por educação de qualidade, com maior investimento, democracia universitária, mais vagas nas universidades etc.
Porém, o movimento estudantil acaba sendo utilizado apenas como trampolim político, com as forças atuantes não sabendo colocar a base para se mover nas entidades. O claro aparelhamento dos Diretórios Centrais de Estudantes (DCE`s) e Centros Acadêmicos (CA`s) impede a continuidade das lutas estudantis. Mas, é desse setor a origem de diversos quadros.
Temos também, neste período, o desenvolvimento do movimento feminista, que encampou lutas importantes e conquistaram direitos básicos até então negados pelo poder público, como a Delegacia da Mulher. Entidades puderam fazer pesquisas e divulgar os números da violência e os direitos da mulher, melhorando, dessa maneira, o combate à violência.
A violência, não apenas contra a mulher, é uma constante em Alagoas, tendo atrelamento de instituições e figuras públicas envolvidas. Essa realidade leva, ainda no início dos anos 1990, a união de 35 entidades da sociedade civil em torno do Fórum Permanente Contra a Violência em Alagoas. A necessidade de existência desse fórum deixa às claras a fragilidade da democracia, da vida civil alagoana, em que o poder dos coronéis, o poder do mando, ainda permanece. Entretanto, esse poder de mando é rompido e as organizações vão além. Nos momentos de crise de governo, as massas provocam e abrem o racha entre o sistema e elas mesmas para por outra alternativa em seu lugar. Em 1997, essas massas, que sofriam com o poder do mando, rasgam o manto sagrado das oligarquias. Manto sagrado, pois até a igreja os apoiava.
Em 1990, devido à crise econômica pela qual passava o Brasil, o IAA seria extinto, restando aos usineiros disputar os escassos recursos nacionais. Recursos escassos, pois o Estado brasileiro, nesse período, iniciava sua obediência cega às cartilhas do Fundo Monetário Internacional (FMI), Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD) e Banco Mundial, em que a tese primordial era a diminuição das intervenções do Estado na economia. Nesse sentido, o Estado deveria deixar de ser paternalista, mas isso ficou apenas em tese. Com os espaços ocupados pelos usineiros não tardou a surgir acordos e isenções de impostos e encargos.





















3. A ABERTURA POLÍTICA PARA A ESQUERDA ALAGOANA E A FORMAÇÃO DA FRENTE POPULAR

Nos capítulos anteriores, tratamos do desenvolvimento e das peculiaridades do capitalismo nacional, tendo como foco a instalação e reprodução da elite canavieira de Alagoas. Debatemos também a reorganização dos movimentos sociais e partidos de esquerda em nosso estado, movimentos estes responsáveis pela queda de Divaldo Suruagy. A importância de trabalhar esses temas é poder chegar mais seguro à contenda da formação do governo de Ronaldo Lessa e conseguir caracterizar, precisamente, qual seu caráter de governo.

3.1 Agravamento da Crise

Os últimos momentos de Divaldo Suruagy, à frente do Governo Estadual, foram marcados por dois fatores determinantes: a falta de apoio do Governo Federal de Fernando Henrique Cardoso e por intensas mobilizações dos trabalhadores. As opções feitas pelo governador, na tentativa de solucionar os problemas econômicos, não obtiveram êxito e acabaram o afundando num pântano fiscal, além do fato dele estar respondendo em uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) por crime de falsidade ideológica e improbidade administrativa, caso envolvendo as letras alagoanas.
O estado, que deveria pagar R$ 104,3 milhões em títulos, viu-se impossibilitado de honrar tal compromisso. O Governo Federal rompe com uma tradição antiga de sempre socorrer os estados em crise enviando mais dinheiro. Pelo contrário, o Governo Federal chama o governador alagoano para fazer cortes profundos nas contas públicas. Como saída para "enxugar" a máquina pública é dado início ao Plano de Desligamento Voluntário (PDV), que consistia em funcionários públicos pedirem demissão do serviço público, recebendo indenização em troca. O programa, em parte, revela-se um sucesso de fazer o ministro da Administração, Luiz Carlos Bresser Pereira, sentir invídia. Mas, a solução acaba por se transformar em outro problema gigantesco. Com adesão de metade do funcionalismo, faltou dinheiro para pagar todas as indenizações, além da maior parcela das adesões terem ocorrido nas áreas essenciais do serviço público, por exemplo, a saúde.

"O remédio virou veneno. As escolas que estavam em greve desde setembro do ano passado por causa de salários atrasados nem começaram as aulas de 1997, deixando 100.000 crianças sem ensino. Dos 211.000 alunos da rede estadual, perto de 80.000 não concluíram o ano letivo de 1996. Em vários lugares do país, é comum encontrar um posto de saúde fechado porque faltou dinheiro, gente que morre na fila à espera de atendimento e situações semelhantes. Em Alagoas isso também acontece – a tragédia é que não há a quem recorrer, pois a carência tornou-se completa. Simplesmente todos os 120 postos de saúde estão suspendendo o atendimento por falta de médicos, que saíram com o PDV. Para colocar os hospitais e postos em funcionamento o governo precisa recontratar médicos e pagar até 800 reais por equipe de plantão, quando o salário básico de um médico é de 560 reais por mês. Cinco hospitais públicos funcionam com menos da metade da capacidade. A dengue traça uma linha crescente entre os alagoanos nos últimos três anos. Em 1994 foram 387 casos confirmados. No ano passado, 1.441. O índice que chama mais a atenção é o de mortalidade infantil. Em 1996, de cada 1.000 crianças nascidas vivas 87 morriam antes de completar 1 ano. O índice é 238% maior que dois anos antes".

A crise e a fome por qual passavam os funcionários públicos levaram muitos ao desespero do suicídio, optavam por ceifar a própria vida a conviver com a miséria. O soldado Leandro Alves do Carmo, 30 anos, estava há sete meses sem salário e matou a tiros a esposa, as duas filhas, feriu o caçula e se suicidou. O caso ganhou repercussão nacional e ocupou as manchetes dos jornais do estado. O governador, quando questionado sobre sua responsabilidade no caso, justificou como sendo meramente psicológico, afirmando, nas entrelinhas, que o suicídio do soldado em nada tinha relação com estado de desespero que o funcionário se encontrava (Idem).
A crise econômica alagoana era visível. No centro da capital, local onde há grande concentração de estabelecimentos comerciais, costumeiramente lotado em dias úteis, calhou a conviver com o marasmo. As lojas passavam o dia praticamente vazias, a falta de circulação de dinheiro de origem estatal gerou inúmeras demissões em empresas privadas, principalmente no setor de comércio e serviços. O crédito chegara ao fim para os servidores, devido à falência do PRODUBAN seus cheques não eram mais aceitos. Sem o banco estadual, os funcionários públicos já não conseguiam crédito junto às financeiras ou lojas. Os servidores passaram a ser taxados de mau pagadores. (ALMEIDA, 1999)

3.2 A intervenção federal

O Governo Federal modificou a relação com o Governo Surugy, como aconteceu em outros momentos. O Golpe Branco, como ficou conhecida a intervenção federal, foi aceito pelo então governador numa reunião com o presidente Fernando Henrique Cardoso. Na ocasião, o presidente indicou o nome para a Secretaria da Fazenda, indicação de confiança do Ministro da Fazenda Pedro Malan. Na prática, Alagoas já não era mais governada por Suruagy, pois a medida o impossibilitava de tomar decisões e assinar qualquer papel sem prévia autorização do novo secretário e, por consequência, do presidente da República.
Dessa maneira, o Governo Federal rompe com antiga prática de sempre fornecer mais dinheiro aos estados falidos. Agora, o estado era obrigado a sangrar na própria carne, reduzir gastos, enxugar a máquina pública e recriar a administração. Esse modelo de gestão ficou conhecido como FMI dos estados. Pois vinha sendo posto em prática em outras unidades da federação. Essa política se alinha com a tendência neoliberal imposta pelos capitalistas.

3.3 Nas Ruas – O SINDPOL e sua nova direção

Em 1996, o Sindicato dos Policiais Civis de Alagoas (SINDIPOL) elege uma nova direção: a chapa Unidade Policial. A chapa era encabeçada pela corrente O Trabalho, do PT, corrente de orientação trotskista mais radical existente àquela época, dentro do Partido dos Trabalhadores. Com a nova direção eleita, o SINDPOL passa a ser ponta de lança das mobilizações contra o governador e chama atenção pela coragem no enfrentamento à cúpula da Secretaria de Segurança Pública. As outras categorias de servidores públicos veem neles um exemplo de luta, juntando-se às mobilizações e aumentando o movimento. (ROCHA, 2012)
Caso raro na história alagoana, até então, são os militares nas mobilizações. Atraídos para as ruas, reforçam as mobilizações. As forças que outrora reprimiam, agora engrossam as fileiras da luta pelo impeachment de Suruagy, organizados pela Associação dos Oficiais (ASSOMAL) devido às dificuldades de organização da Associação dos Cabos e Soldados. Mesmo sofrendo perseguições por parte do governo, os líderes da PM, Major Paulo e Major Paiva, continuam na luta por identificar disposição em sua categoria.

3.4 O roteiro da queda

No dia 8 de maio de 1997, ocorre a ocupação do Palácio dos Martírios. A ação foi organizada pelo Movimento Unificado dos Servidores Públicos (MUSP), que, a partir da chegada de movimentos do campo à Maceió, vindo do interior do estado por conta do Grito da Terra Brasil, realizou a ocupação do Palácio do Governo. O MUSP consegue ser recebido pelo governador, porém, a negociação é interrompida abruptamente e os servidores retirados à força pela Tropa de Choque, que reprime também quem estava do lado de fora do palácio, esperando o resultado da negociação. Os servidores ficam sem nenhuma solução. No dia seguinte, devido à forte repressão sofrida pelos servidores, é chamado um grande ato público, contando com a presença de movimentos sociais e estudantis, contra a repressão.
Dia 14 de maio, é ocupada a Assembleia Legislativa, durante um ato público. Em plenária, o comando de mobilização propõe a criação de uma Assembleia Popular para garantir a ocupação, tocando as tarefas básicas e, o mais importante, construir uma saída vitoriosa para o movimento.
Nesse momento, duas posições são apresentadas. A proposta do O Trabalho, defendida pelo SINDPOL, era a de uma Assembleia Popular que visasse construir o movimento de resistência por baixo, nos bairros, escolas, locais de trabalho etc. "A Assembleia Popular deveria unir todos, prefeituras falidas, entidades democráticas, movimentos sociais, no combate pela recuperação do funcionamento do Estado, atender as exigências democráticas e sociais do povo trabalhador contra a política de Suruagy". (ROCHA, 2012, p. 18)
A outra posição, que acabou sendo a vencedora, foi a ocupação da Assembleia para desgastar o governo e os deputados da base aliada. Sendo assim, a ocupação se esvaziou até que terminou com o enterro simbólico dos deputados da bancada governista. (ROCHA, 2012)
No interior do estado, as mobilizações chegavam em caravanas organizadas com o intuito de denunciar os deputados apoiadores de Suruagy em seus currais eleitorais. Acompanhando a denúncia, foi realizado um plebiscito, em praticamente todo o estado, sobre a permanência do governador no cargo. O resultado do plebiscito foi de 97% da população favorável à saída de Suruagy do governo. (IDEM)
Os policiais civis entram mais uma vez em greve no dia 11 de julho de 1997. Essa greve serviu de incentivo para que 8.200 militares também deflagrassem greve no dia seguinte. Nesse momento, o estado estava praticamente com todo o funcionalismo parado. No dia 15 de julho, ocorre a Marcha Silenciosa, percorre a Avenida Siqueira Campos em direção ao Centro; no caminho, estudantes e trabalhadores se unem à mobilização. Os militares, com sua história marcada pela repressão aos movimentos sociais, estavam ombro a ombro com civis pertencentes aos movimentos sociais, com partidos de esquerda, com a juventude. Na chegada ao Centro, o movimento se dirige ao Palácio dos Martírios, onde estava o governador com alguns poucos seguranças. Que, obviamente, não seriam capazes de garantir sua integridade física, caso o movimento decidisse por entrar no Palácio. Alguns setores do movimento ainda pensaram em ocupar o palácio, mas são contidos.
A força demonstrada pelo movimento, organizado no MUSP, assustou Suruagy, que recorreu ao pedido de ajuda a FHC, sendo atendido prontamente. Foram enviados para Alagoas homens do Exército Brasileiro, para que "normalizassem" o estado e assegurassem que Suruagy ficasse no governo até o final. O Exército, na rua, passa a proteger os símbolos do poder. Os prédios da Assembleia Legislativa, do Palácio dos Martírios e do Tribunal de Justiça.
O dia fatídico chega. No dia 17 de julho de 997, o dia da queda de Suruagy, se iniciou com 15 mil servidores em greve. O ato convocado para a Praça Dom Pedro II, onde fica a Assembleia Legislativa, tinha como finalidade pressionar os deputados estaduais a aprovarem o impeachment do governador. A praça se encontrava num cenário de guerra civil. "... De um lado o povo, cansado da miséria, do desemprego, do atraso nos salários, do desmantelamento dos serviços públicos, e do outro, o exército convocado às pressas para proteger Suruagy e as elites dominantes de Alagoas". (Idem)
Com os dois lados tendo posse de armas de fogo, o conflito parecia uma questão de tempo. O Exército toma posição de combate na Praça e no telhado da Igreja da Catedral, enquanto os policiais tomam posição de combate no prédio do Arquivo Público e da Biblioteca Estadual.

"Chega então a prefeita Kátia Born, que tenta convencer os soldados a abandonarem suas posições. Neste momento, a massa invade a praça, as tensões explodem, tiros são disparados durante quinze minutos, o corre-corre é generalizado. O exército recua para a frente da Assembleia Legislativa deixando a praça ocupada pelo povo, a sensação é de total descontrole. No confronto, três pessoas são feridas a bala: o policial Militar Sebastião de Oliveira, o policial Civil Gilson Pedro do Nascimento e o agente administrativo Antônio Fernandes Neto Filho". (ROCHA, 2012: p.22)

Discursos acalorados são feitos, em um deles foi dito que ou o governador saía ou ninguém sairia com vida da Assembleia. Temendo o pior, os deputados votaram pelo impeachment de Suruagy, mas, o mesmo se antecipou e pediu uma licença de 180 dias do exercício do cargo, livrando-se, dessa maneira, de uma penalidade que o impedisse de concorrer a cargos eletivos nas próximas eleições. O afastamento pedido por Suruagy acaba por configurar um impeachment popular, pois o afastamento de 180 dias acaba por se tornar permanente. O mandato da gestão é terminado por Manoel Gomes de Barros (Mano), vice de Suruagy.



3.5 O depois da queda

A tentativa de manter Suruagy no poder até o último momento representava a apreensão do presidente FHC de que o movimento se espalhasse pelo resto do Brasil, tendo em vista que sua política econômica vinha sendo bastante questionada, e em vários estados se iniciavam mobilizações. No Congresso, foi criada uma Comissão Parlamentar Mista, encabeçada por Michel Temer, presidente da Câmara e do PMDB, mesmo partido do agora ex-governador alagoano. Esta Comissão foi criada com o intuito de discutir, propor mobilizações e soluções para Alagoas.
Após a queda, a saída encontrada pelo Presidente foi o envio de pessoas de sua confiança, como o Ministro da Casa Militar, general Alberto Cardoso e a Ministra da Justiça, Irís Rezende, para ajustar o problema fiscal no qual Alagoas estava "atolado". O pagamento das folhas atrasadas e do PDV é dado como alternativas à venda da Companhia Energética de Alagoas (CEAL) e da Companhia de Saneamento e Abastecimento de Água de Alagoas (CASAL), tendo os acertos realizados pela sua equipe econômica para ter a liberação de R$ 120 milhões. Em seguida, quando o vice-governador Manuel Gomes de Barros (popularmente conhecido como Mano) assume o governo inicia sua gestão, assinando: "Um protocolo com Fernando Henrique Cardoso onde se compromete com a aceleração das privatizações e a renegociação do acordo com os usineiros, portanto, preparar mais ataques e destruição". (ROCHA, 2012, p 27-28.)
A resposta a essa nova realidade foi dada nas eleições seguintes. As lideranças responsáveis pela queda de Suruagy ainda lançaram o Comitê em Defesa de Alagoas, contando com diversas entidades civis, inclusive a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Uma reunião de emergência foi realizada com participantes de 11 estados e foi aprovada a Declaração ao Povo Brasileiro. Porém, com tudo voltando à "normalidade", o movimento esfria.
As eleições do ano seguinte (1998) não ocorreram com a normalidade esperada. A burguesia alagoana estava dividida e sem um quadro político preparado para disputar o governo do estado. Mesmo Mano, que seria o candidato mais provável das oligarquias, acaba por ver sua campanha se esfarelar com o abandono de sua vice Ceci Cunha e a longa lista de acusações de irregularidades na campanha. Os deputados, caminho natural para se pleitear o cargo de governador, encontravam-se com suas imagens gastas devido ao apoio até o último momento a Suruagy.
As figuras políticas que cresceriam na opinião pública foram as de centro esquerda da época. O 17 de julho funcionou como um reset na política alagoana, mas os setores da oligarquia recomeçaram com muita vantagem. A primeira vantagem seria a de seu tamanho, os partidos de esquerda, como o PT, não contavam com mais de 200 militantes, tendo sua vida muito restrita à capital, as caravanas organizadas para o interior, com o intuito de denúncia do governo, não tiveram o efeito organizativo de militância orgânica. Desta forma, os currais eleitorais do interior continuaram firmes na reprodução e na eleição de seus quadros políticos. Esse fato fica claro quando observamos a Assembleia Legislativa eleita em 1998, tendo apenas dois petistas eleitos: Paulo Roberto e Paulo Fernando, tendo um total de apenas seis (6) ligados à coligação que elegeu Ronaldo Lessa. Ou seja, mesmo a centro-esquerda crescendo, a máquina eleitoral das oligarquias consegue ser mais forte, fazendo, dessa forma, o voto comprado, o voto de favor e o voto de ameaça ser bem maior que o voto de opinião.
A vida política do estado era restrita à capital, e isto fica mais evidente quando olhamos os números dos votos por município recebidos pelos candidatos ao governo. Em Maceió, Ronaldo Lessa recebe nada menos que 203.111, sendo eleito no total com 387.021, ou seja, a capital definiu a eleição em favor da mudança, pela eleição de um candidato que não era claramente pertencente às oligarquias canavieiras.
A burguesia alagoana, ou seja, a oligarquia canavieira, sabia que não conseguiria eleger um representante direto. Dessa maneira, busca alianças com setores de centro para assegurar seu comando. Em nenhum momento há ruptura de Lessa com os setores das oligarquias. Ronaldo Lessa foi eleito com o voto e com o apoio das massas que derrubaram Suruagy. Porém, orquestrou um governo de conciliação de classes, um Governo de Frente Popular.

3.6 O que é Frente Popular?

Frente Popular não é nome de uma coligação. É um conceito político. Frente Popular se caracteriza por governos encabeçados por partidos da classe trabalhadora, mas que estão em aliança com a burguesia. Em momento de normalidade política, o partido da classe operária fica de fora do governo, apenas servindo como "oposição responsável". Porém, no momento de acirramento da luta de classes, os partidos da classe trabalhadora que se encontra em aliança com a burguesia, passam a ser apoiados por parte da classe dominante para assumir as tarefas do governo.
Hoje (2014), o Brasil é governado por uma Frente Popular, que foi implementada em 2002/2003. É encabeçada pelo PT, partido que já havia demonstrado, durante a década de 1990, que não representava perigo à burguesia, e foi escolhido por um setor minoritário do empresariado brasileiro para governar para eles, passando, logo nos primeiros anos, a ter apoio da maioria.
Esse apoio surge pela necessidade de se utilizar novas figuras políticas para que a burguesia implante as reformas que fazem o capitalismo funcionar de forma saudável a sua manutenção. Ou seja, amenizar o impasse da governabilidade dos partidos clássicos da burguesia e a influência que os partidos operários possuem nos movimentos sociais.
Um rápido balanço dos primeiros anos do governo Lula confirma a tese da Frente Popular. Em seu primeiro ano de mandato, vimos a implementação da Reforma da Previdência (algo que o governo FHC havia tentado sem sucesso), o avanço nas privatizações, a paralisação da reforma agrária, a não democratização dos meios de comunicação etc. Todas essas bandeiras não cumpridas, aliadas às reformas prejudiciais aos trabalhadores, caracterizam um governo voltado para a burguesia.
Porém, não raramente, se escuta falar que o governo do PT é o governo do povo. Tal afirmação é feita com base no forte apoio social que esse partido possui nas três principais entidades dos três principais movimentos sociais. Leiam-se CUT – maior central hoje no Brasil, UNE – maior entidade estudantil e a direção do MST. Estas são entidades que estão na base de sustentação do governo petista.
Outro exemplo de Frente Popular que podemos citar é Allende, no Chile. Governo que gozava de grande apoio popular. A diferença de Allende para o PT, no Brasil, é que a experiência lá foi levada até as últimas consequências. Ou seja, a frente popular é a última cartada da burguesia, antes de governar através da ditadura fascista ou da classe trabalhadora perceber que este governo não os representa e tomar o poder.


3.7 A Frente Popular encabeçada por Lessa

A coligação encabeçada por Ronaldo Lessa, em 1998, reunia doze legendas partidárias: PDT/PT/PST/PTN/PPS/PSN/PMN/PSB/PV/PRP/PCdoB/PTdoB. Dentro dessa aliança se encontrava parte dos elementos mais progressistas da política alagoana. A outra chapa pertencia à direita clássica, composta por: PTB/PMDB/PFL/PGT/PSDB, encabeçada por Manuel Gomes de Barros (Mano), representava a direita clássica, representava abertamente o setor oligárquico. A vitória de Lessa, no primeiro turno, com maioria absoluta dos votos, renova de esperança a classe trabalhadora alagoana. Porém, se ocorreu ruptura, até onde ela se deu?
A ruptura se dá, no caso de Lessa, apenas no discurso, e, mesmo assim, restrito ao início do primeiro mandato. Como já foi supracitado, num Governo de Frente Popular não há ruptura com a burguesia, nem tampouco com setores oligárquicos. O governo é gestado para ser um exímio negociador e conciliador de classes. Dando concessões a classe trabalhadora e aumentando os lucros dos capitalistas.
Em Alagoas, a classe trabalhadora com a qual o governo deveria fazer concessões não é o operariado clássico, fabril, como temos no ABC paulistano, até porque em Alagoas ela não existe com quantidade e força. A classe que gera a maior parte de riqueza no estado é o operariado do campo, os trabalhadores das usinas, que carece de organização, de sindicatos combativos. Nesse sentido, a ponta de lança das mobilizações para derrubada de Suruagy e a eleição de Ronaldo Lessa são o funcionalismo público e alguns poucos setores do campo ligados à luta pela terra, e não diretamente os trabalhadores das usinas.
Essa realidade, de falta de organicidade no movimento dos trabalhadores rurais, impõe limitações cruéis às transformações iniciadas em 17 de julho. O exemplo básico para provar tal afirmação seria a composição da Assembleia Legislativa, que comprovava a inviolabilidade dos currais eleitorais no interior do estado.
Esta realidade, maioria conservadora na Assembleia Legislativa, faz com que o governo de Ronaldo Lessa perca rapidamente seu caráter de esquerda e realize acordos com setores e personalidades que até então era objeto de suas denúncias. O governador, que se elegera prometendo governar próximo das entidades civis, junto com o povo, acaba por fazer vários acordos com as oligarquias canavieiras. Levando ao rompimento do PT com seu governo em 2000, retirando seus militantes das secretarias que ocupavam no governo. Sendo seguidos por movimentos que deixam de apoiar Lessa.
Esses acontecimentos repercutem nas eleições seguintes para governo, em 2002, quando a esquerda alagoana sai dividida com Judson Cabral, pelo PT; Ricardo Barbosa, pelo PSTU e Ronaldo Lessa, pelo PSB. Essa configuração eleitoral ainda conta com a volta de Collor na disputa pela majoritária ao governo. Nesse momento, a ideia do voto útil ganha bastante força, levando Ronaldo Lessa novamente à vitória, numa campanha anti Collor. Nesse momento, inicia outro governo Lessa, menos identificado com as lutas sociais, que culmina com o apoio nas eleições de 2006 ao representante do setor claramente oligárquico, Teotonio Vilela Filho (PSDB). Essa volta de um representante direto ao executivo é possível graças à calmaria política no estado e a boa situação econômica vivida no Brasil e pelos usineiros.
















CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao finalizar a monografia, acreditamos ter conseguido apresentar as peculiaridades da formação do capitalismo alagoano, demonstrar os limites econômicos, sociais e políticos impostos pela monocultura da cana-de-açúcar e as fronteiras existentes no governo da Frente Popular.
Como vimos no referido trabalho, a formação do capitalismo alagoano é marcado e controlado pelo setor mais atrasado da nossa economia nacional, o canavieiro. Atrasado por gerar empregos extremamente precarizados (cortadores de cana) e a mais valia extraída ser apenas a absoluta. Pois, a única forma de diminuir os custos no corte da cana é diminuir os salários ou aumentar as horas trabalhadas sem crescer o salário. E não permitir que outro setor da economia cresça por dois motivos: 1- Para a produção do açúcar é necessário o cultivo de vastas áreas, o que impede que ocorra a agricultura familiar e/ou cultivo de outras culturas; 2- A indústria canavieira requer grande quantidade de mão de obra barata. Caso outras indústrias se instalassem no estado, os trabalhadores provavelmente prefeririam o trabalho na indústria a continuar trabalhando no corte da cana.
Como constatamos, a monocultura da cana é um "câncer" dentro de nossa economia política. Responsável pela formação do estado, hoje é mantida, em sua maioria, apenas pela força política das desonerações fiscais, artifício utilizado pelos usineiros que, temendo perder seus privilégios, se enraízam cada vez mais nas estruturas do Estado e aprovam diversos programas de incentivo à produção e recuperação econômica. Medidas estas que serviram apenas para perpetuar a monocultura açucareira em detrimento do desenvolvimento do estado alagoano. As medidas tomadas pelo Estado em favor dos usineiros levam Alagoas à falência, tendo na desoneração do ICMS da cana a principal causa.
A crise econômica alagoana tem seu "estopim" durante o governo de Divaldo Suruagy, governador eleito como possível salvação para a crise, mas que não se adequou aos tempos de democracia, tendo em vista que sua "escola política" foi formada durante a ditadura militar. Suruagy fez um governo afastado da população e restrito aos gabinetes. A crise econômica abre uma crise política, em que o povo, insatisfeito, resolve tirá-lo do poder executivo alagoano. Nesse momento, aparece como figura alternativa à oligarquia canavieira Ronaldo Lessa (candidato ao governo) e Heloisa Helena (candidata ao senado), formando a Frente Popular (FP), na qual os trabalhadores, líderes sindicais, movimentos sociais, estudantes depositariam a esperança de um governo que os representasse. Mas a FP não tardou em demonstrar os seus limites.
As rupturas tão esperadas não vieram. Mas observamos, ao logo do trabalho, algumas mudanças. Pois a FP se diferencia dos governos tradicionais pelas medidas progressistas adotadas, como não podemos deixar de reconhecer dentro do governo Lessa: a valorização dos servidores públicos, o avanço em áreas como saúde e educação e uma gestão mais próxima do povo. Porém, as permanências foram muito mais fortes. A economia alagoana continuou sendo a base da economia alagoana, os usineiros continuaram comandando e dando as cartas em nossa política econômica.
As ilusões geradas pela Frente Popular alagoana desencadearam na formação de figuras autorizadas a falar pela esquerda, mas, para garantir a governabilidade, sem gerar "choques" e/ou "rupturas" com o setor canavieiro, Lessa realiza acordos que o afasta da esquerda e, consequentemente, perde a autoridade em falar pela esquerda.
Lessa acaba seu governo (2006) sem ser reconhecido pela esquerda como um de seus pares. Seu segundo mandato é marcado por acordos com usineiros e parlamentares, historicamente reconhecidos como figuras da direita. A então senadora Heloísa Helena lança-se candidata à presidência da república pelo PSOL – Partido Socialismo e Liberdade, agremiação recém-fundado por dissidentes do PT. Heloísa Helena afasta-se da gestão do Lessa, rompe com o governo petista, mantendo, dessa forma, seu nome na esquerda nacional. Mas, suas declarações e recebimento de apoio político de nomes da direita, nas últimas duas eleições para tentar voltar ao senado, tira boa parte de sua legitimidade com setores da esquerda.
A importância desse trabalho consistiu em apresentar a abertura política promovida pela crise de 1997 e os limites do governo de Frente Popular, encabeçada por Lessa. Limites esses impostos pelo caráter de classe do Estado, privilegiando apenas a burguesia, no caso específico do peculiar Capitalismo Alagoano, a oligarquia da cana.



REFERÊNCIAS



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ANDRADE, Manuel Correia de. Usinas e destilarias das Alagoas: uma contribuição ao estudo da produção do espaço. Maceió: EDUFAL, 1997.

BIANCHI, Alvaro. O desenvolvimento desigual e combinado: a construção de um conceito. In: http://blogconvergencia.org/blogconvergencia/?p=935. Acesso em 20 jan. 2014.

CARVALHO, Cícero Péricles de Oliveira. Alagoas 1980-1992: A esquerda em crise. Maceió: EDUFAL/LUMEN/ENGENHO, 1993.

DIÉGUES JÚNIOR, Manuel. O Banguê nas Alagoas: traços da influência do sistema econômico do engenho de açúcar na vida e na cultura regional. 3° Ed. Maceió: EDUFAL, 2006.

GRAMSCI, Antonio. Apud SADER, Emir. O conceito de revolução passiva. São Paulo, Expressão Popular, 2005.

HEREDIA, Beatriz Maria Alasia de. Formas de dominação e espaço social: a modernização da agroindústria canavieira em Alagoas. São Paulo: Marco Zero, 1988.

LESSA, Golbery. Uma nova Alagoas é possível. In: http://novoirisalagoense.blogspot.com/ 2006/12/uma-nova-alagoas-possvel.html. Acesso em 14 jan. 2014.

LIMA, Araken Alves de. A crise que vem do verde da cana: uma interpretação da crise Financeira do Estado de Alagoas no período 1988-96. Maceió: EDUFAL, 1998.

NOVACK, Georg. O desenvolvimento desigual e combinado na história. São Paulo: Editora Instituto José Luís e Rosa Sundermann, 2008.

PRADO JÚNIOR, Caio. História econômica do Brasil. 10° Ed. São Paulo: Brasiliense,

ROCHA, Luiz Gomes de. A participação do SINDPOL na queda do Governo Suruagy. 2° Ed. Maceió: Nosso Mundo, 2012.

TENÓRIO, Douglas Apratto. Metamorfose das oligarquias. Maceió: EDUFAL, 2009.

TROTSKY, Leon. A história da Revolução Russa. São Paulo: Editora Instituto José Luís e Rosa Sundermann, 2007.

VASCONCELOS, Ruth. Governo Ronaldo Lessa: Ruptura ou Continuidade. In: http://www.fundaj.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=2053:alagoas-governo-ronaldo-lessa-ruptura-ou-continuidade&catid=58:observanordeste&Itemid=414. Acesso em 22 jan. 2014.



Fontes básicas

Revista Veja. São Paulo – 11/06/1997.
Revista Veja. São Paulo – 23/07/1997.
Gazeta de Alagoas, Maceió – editorial de política dos dias 02, 04, 05, 06, 07 e 11 de agosto de 1998.





















ANEXO

1- Resultado das eleições para deputado estadual de 1998
CANDIDATOS 
COLIGAÇÃO
Nº DE VOTOS
1. Antônio Albuquerque
PPB/PSC/PL/PRTB/PRN/PSD
29.129
2. João Beltrão
PTB/PMDB/PFL/PGT/PSDB
20.350
3. Rogério Teólifo
PTB/PMDB/PFL/PGT/PSDB
20.296
4. Marcelino dos Santos
PTB/PMDB/PFL/PGT/PSDB
18.614
5. Isnaldo Bulhões
PTB/PMDB/PFL/PGT/PSDB
28.421
6. Celso Luiz
PTB/PMDB/PFL/PGT/PSDB
16.986
7. Antônio Holanda
PTB/PMDB/PFL/PGT/PSDB
16.151
8. Cícero Amélio
PDT/PT/PST/PTN/PPS/PSN/PMN/PSB/PV
14.717
9. José Júnior de Melo
PTB/PMDB/PFL/PGT/PSDB
14.668
10. Francisco Tenório
PDT/PT/PST/PTN/PPS/PSN/PMN/PSB/PV
14.500
11. Arthur de Lima
PTB/PMDB/PFL/PGT/PSDB
14.284
12. Eliziane Costa
PTB/PMDB/PFL/PGT/PSDB
13.968
13. João Beltrão
PTB/PMDB/PFL/PGT/PSDB
13.869
14. Fernando Gaia
PTB/PMDB/PFL/PGT/PSDB
13.709
15. Gervásio dos Santos
PTB/PMDB/PFL/PGT/PSDB
12.760
16. Marcos Antônio Nunes
PSL
12.740
17. Lucila Toledo
PTB/PMDB/PFL/PGT/PSDB
12.736
18. Cícero Ferro
PTB/PMDB/PFL/PGT/PSDB
12.820
19. Antônio Carlos Rezende
PSL
10.707
20. Paulo Fernando dos Santos
PDT/PT/PST/PTN/PPS/PSN/PMN/PSB/PV/PRP/PCdoB/PTdoB
10.458
21. Petrúcio Bandeira
PDT/PT/PST/PTN/PPS/PSN/PMN/PSB/PV/PRP/PCdoB/PTdoB
9.845
22. Maria do Rosário Braga
PSL
8.853
23. Délio Almeida
PPB/PSC/PL/PRTB/PRN/PSD
8.820
24. Paulo Nunes
PDT/PT/PST/PTN/PPS/PSN/PMN/PSB/PV/PRP/PCdoB/PTdoB
7.465
25. Ismael Juda
PDT/PT/PST/PTN/PPS/PSN/PMN/PSB/PV/PRP/PCdoB/PTdoB
6.512
26. Gilvan Gomes de Barros
PTB/PMDB/PFL/PGT/PSDB
12.558
27. Temóteo Correia
PTB/PMDB/PFL/PGT/PSDB



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