A FUNÇÃO DOS PRECEDENTES NA CONCRETIZAÇÃO DO DIREITO GERAL DE PERSONALIDADE: REFLEXÕES A PARTIR DO DIREITO AO ESQUECIMENTO

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A FUNÇÃO DOS PRECEDENTES NA CONCRETIZAÇÃO DO DIREITO GERAL DE PERSONALIDADE: REFLEXÕES A PARTIR DO DIREITO AO ESQUECIMENTO THE FUNCTION OF THE PRECEDENT IN THE IMPLEMENTATION OF THE GENERAL PERSONALITY RIGHT: REFLECTIONS FROM THE RIGHT TO BE FORGOTTEN Revista de Processo | vol. 256/2016 | p. 317 - 345 | Jun / 2016 DTR\2016\19759 Rodrigo Pereira Moreira Mestre em Direito pela Universidade Federal de Uberlândia. Professor de Direito e Pesquisador no ILES/ULBRA de Itumbiara. Advogado. [email protected] Jaquiel Robinson Hammes da Fonseca Mestre em Direito pela Universidade de Marília. Coordenador do curso de Direito do ILES/Ulbra de Itumbiara. [email protected] Área do Direito: Constitucional; Civil; Processual Resumo: A análise da concretização do direito geral da personalidade por meio dos precedentes constitui o objetivo geral deste trabalho. O objetivo específico consiste em interpretar a ratio decidendi do REsp 1.334.097/RJ que estabeleceu a existência do direito ao esquecimento no sistema jurídico brasileiro. Para tanto será utilizado o método tópico-sistemático. A primeira parte será sistemática utilizando-se da pesquisa bibliográfica e doutrina a respeito do direito geral da personalidade, direito ao esquecimento, precedentes e cláusulas gerais. A segunda parte será tópica, pois resultará da análise de precedente do STJ. Palavras-chave: Tópica - Direitos da personalidade - Cláusulas gerais - da pessoa humana Cláusula geral de tutela da personalidade Abstract: The analysis of the implementation of the general right of personality from the precedent is the aim of this study. The specific objective is to interpret the ratio decidendi of the Special Appeal 1.334.097/RJ that established the existence of the right to be forgotten in the Brazilian legal system. For that will be used Topic-Systematic method. The first part is systematically using bibliographic research and doctrine about the general right of personality, right to be forgotten, precedent and general clauses. The second part will be topica as it will result from the analysis of previous High Court of Justice. Keywords: Topica - Personality rights - General clauses - Dignity of human person - General clause of personality protection Sumário: 1Introdução - 2Direitos da personalidade e direito ao esquecimento - 3Teoria dos precedentes e as cláusulas gerais - 4Direito ao esquecimento no STJ: REsp 1.334.097/RJ - 5Conclusão - 6Referências bibliográficas 1 Introdução O novo Código de Processo Civil incorporou em seu texto normativo uma nova sistemática de respeito aos precedentes. Tal inovação representa um grande avanço para a realização dos princípios da igualdade e da segurança jurídica. Todavia, é no campo da concretização das cláusulas gerais que os precedentes adquirem uma grande importância, na medida em que esta técnica legislativa é amplamente utilizada no Código Civil de 2002. Por necessitar de valoração no caso concreto, as cláusulas gerais precisam dos precedentes para garantir que casos iguais obtenham a mesma solução e que os jurisdicionados possam nortear o seu comportamento a partir da interpretação do texto normativo (norma) realizada pelos tribunais brasileiros. Em relação aos direitos da personalidade, a doutrina já se posicionou que estes direitos não estão circunscritos apenas àqueles previstos expressamente pela legislação. Isto porque existe no sistema Páginana 1 jurídico brasileiro um direito geral da personalidade que funciona como uma cláusula geral

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proteção da pessoa humana contra todas as formas de violação dos seus direitos existenciais. Isso indica que é papel da doutrina e da jurisprudência, por meio dos precedentes, indicar os meios de concretização desta forma geral de tutela da pessoa humana ao reconhecer novos direitos específicos da personalidade. Um destes direitos reconhecidos pela via dos precedentes é o direito ao esquecimento que mereceu tutela no REsp 1.334.097/RJ perante o STJ. O direito geral de personalidade e o direito ao esquecimento são direitos ligados intrinsecamente aos princípios da dignidade da pessoa humana e necessários para o livre desenvolvimento da personalidade. A análise da concretização do direito geral da personalidade por meio dos precedentes constitui o objetivo geral deste trabalho. O objetivo específico consiste em interpretar a ratio decidendi do REsp 1.334.097/RJ que estabeleceu a existência do direito ao esquecimento no sistema jurídico brasileiro. Para tanto será utilizado o método tópico-sistemático. A primeira parte será sistemática utilizando-se da pesquisa bibliográfica e doutrinária a respeito do direito geral da personalidade, direito ao esquecimento, precedentes e cláusulas gerais. A segunda parte será tópica, pois resultará da análise de precedente do STJ. 2 Direitos da personalidade e direito ao esquecimento Os direitos da personalidade são entendidos como aqueles direitos essenciais que compõem a medula da personalidade,1 protegem os modos de ser da pessoa humana,2 sendo derivados e necessários para a realização de sua dignidade3 e de seu livre desenvolvimento.4 Sua base é constituída por situações jurídicas subjetivas existenciais5 que visam à proteção e promoção da integridade psicofísica e moral da pessoa. Ao longo dos séculos a doutrina desenvolveu diversas teorias de justificação e configuração dos direitos da personalidade. A primeira delas concerne à teoria do número fechado de direitos da personalidade. Extremamente influenciada pela doutrina positivista, para esta teoria somente seriam direitos da personalidade aqueles que o direito positivo reconhecesse como tais, pois a enumeração de direitos da personalidade seria taxativa. A proteção da pessoa humana ficaria condicionada à tipificação de cada direito da personalidade específico na legislação de direito privado,6 razão pela qual também constitui uma teoria pluralista, pois existiriam vários direitos da personalidade fragmentados.7 Adriano De Cupis, por exemplo, afirma que "todos os direitos subjetivos derivam do ordenamento positivo", acompanhando, aqui, os direitos da personalidade.8 Isto permitia o surgimento de lacunas no momento de proteção da pessoa humana, sendo que quanto mais rigorosa fosse a tipificação, maior seria o número de lacunas no ordenamento jurídico.9 Ademais, neste momento de construção, os direitos da personalidade recebiam o mesmo tratamento dispensado às relações jurídicas patrimoniais cuja violação ficava restrita ao campo da responsabilidade civil ressarcitória.10 O direito geral da personalidade, por sua vez, é construído na Alemanha a partir da interpretação do direito ao livre desenvolvimento da personalidade e do princípio da dignidade da pessoa humana. O direito geral da personalidade protege os diferentes modos de desenvolvimento da pessoa subdividindo-se em: (i) direito à autodeterminação; (ii) direito à autopreservação; (iii) direito à autoapresentação.11 A autodeterminação permite que a pessoa possa configurar a sua própria identidade, bem como assegura a liberdade de não ser afetado massivamente na formação e afirmação desta identidade. Alcança, portanto, a liberdade de profissão e as liberdades de escolha no âmbito da sexualidade.12 A autopreservação ou autoconservação garante ao particular a possibilidade de se resguardar e se proteger da sociedade. Abrange a proteção das informações pessoais por meio da privacidade e da imagem na sua dimensão defensiva.13 O terceiro desdobramento, da autoapresentação ou autoexposição, concerne ao direito da pessoa de se expor ao público da forma que escolher, englobando os direitos à imagem, à honra pessoal, à Página 2

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autodeterminação informativa e à voz.14 Não obstante a possibilidade desta sistematização do direito geral da personalidade, bem como outras formas de sistematização, o importante na sua configuração é a afirmação de uma tutela integral (proteção e promoção) da pessoa humana que começa a partir da concepção do nascituro e que perdura, em determinados casos, até após a morte do indivíduo. Capelo de Sousa afirma que o direito geral da personalidade representa uma proteção e promoção da globalidade dos elementos e expressões da personalidade humana em sua unidade "psicofísico-socioambiental", e de outro lado, também garante os deveres dos outros sujeitos de se absterem de praticar atos que ofendam os bens jurídicos da personalidade alheia, sob pena de incorrerem na responsabilidade civil repressiva ou preventiva.15 O reconhecimento de um direito geral da personalidade é uma das formas de proteção ao livre desenvolvimento da personalidade, consagrado como direito fundamental (ainda que implícito). Atua como um direito fonte, pois a personalidade humana remanesce protegida contra qualquer tipo de violação atual ou futura, sejam estas previsíveis ou imprevisíveis, perfazendo uma tutela global da pessoa humana ao incluir no seu âmbito de proteção bens jurídicos da personalidade que ainda não foram tipificados. Existe, portanto, uma abertura do direito geral da personalidade, de forma sincrônica e diacrônica, à inclusão de novos bens da personalidade que forem surgindo, renovando a proteção da pessoa humana perante novas ameaças.16 Esta abertura acontece pela característica essencial do direito geral da personalidade que é a sua construção a partir da técnica legislativa de uma cláusula geral, que embora possa ser criticado pela sua indefinição ou incerteza (que na verdade é próprio de qualquer cláusula geral), possui como vantagem a sua maleabilidade e a versatilidade para ser aplicado em situações jurídicas novas e cada vez mais complexas17 permitindo a tutela da pessoa humana sempre que sua personalidade restar violada ou ameaçada de violação. É nesse sentido que se reconhece no Brasil um direito geral da personalidade fundado no art. 12 do CC/2002 (LGL\2002\400)18 e no princípio constitucional de proteção à dignidade da pessoa humana, funcionando como uma cláusula geral que concede esta abertura sistemática na proteção da personalidade da pessoa humana. Os direitos da personalidade possuem uma intrínseca relação com o direito ao livre desenvolvimento da personalidade.19 Como parte do seu âmbito de proteção, o direito geral da personalidade aparece como uma especificação do desenvolvimento da personalidade que, por sua vez, possui funções ainda mais amplas. É a conjugação da proteção da personalidade e da liberdade geral de ação que permite a livre formação da individualidade humana. É importante constatar que uma parte da doutrina tem preferido a utilização do termo cláusula geral de tutela da personalidade ou da pessoa humana. Isso porque esta teoria é uma variante do direito geral da personalidade no sistema jurídico brasileiro,20 haja vista que este também compreende a noção de cláusula geral, como já explicitado. A diferença reside no fato da cláusula geral de tutela da personalidade humana enfatizar: (i) a ampliação da realização dos direitos da personalidade por meio de situações jurídicas subjetivas existenciais e não apenas por direitos subjetivos;21 (ii) o reenvio intrassistemático aos princípios do ordenamento jurídico, sobretudo àqueles constitucionais,22 e reenvio extrassistemático a valores fora do ordenamento jurídico, características próprias das cláusulas gerais.23 Esta primeira diferença tem o condão de ressaltar que não é apenas por meio dos direitos subjetivos que a proteção e a promoção da personalidade podem se realizar, pois dentro das situações jurídicas subjetivas, a tutela personalidade pode demandar o exercício de poderes jurídicos, direitos potestativos, autoridade parental, faculdades, ônus,24 autonomia existencial e até mesmo deveres correlatos ou autônomos em relação aos direitos da personalidade. Embora existam aqueles que defendem uma diferenciação mais rígida entre direito geral da personalidade e cláusula geral de tutela da pessoa humana,25 é possível insistir, na esteira das explicações de Daniel Sarmento, que os termos direito geral da personalidade e cláusula geral de tutela da pessoa humana possam ser utilizados como sinônimos caso seja explicitado que a primeira expressão não está restrita à categoria dos direitos subjetivos classicamente considerados pela Página 3

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doutrina civilista.26 2.1 Direitos da personalidade típicos e atípicos: configuração do direito ao esquecimento Para Elimar Szaniawski, o Brasil adota um sistema misto de proteção da personalidade, em que convivem harmonicamente o direito geral da personalidade e os direitos específicos da personalidade. Isso acontece em razão de política legislativa, pois alguns direitos da personalidade merecem atenção especial valendo-se o legislador de sua tipificação em lei, garantindo-lhes uma tutela expressa. Continuando o raciocínio, o autor afirma que esta tipificação não se confunde com um fracionamento infinito conforme aconteceu com a teoria pluralista dos direitos da personalidade. Na verdade, esta técnica permite a criação de microssistemas de tutela da pessoa humana, aumentando ainda mais a proteção da personalidade.27 Em sentido parecido, Enéas Costa Garcia também admite o caráter de complementaridade entre o direito geral da personalidade e os direitos típicos instituídos pelo legislador. Para este autor, com a positivação de direitos específicos pretende-se aumentar ou condicionar a proteção legal, e ainda assegurar diversas formas de proteção jurídica destes direitos. Deste modo, não haveria qualquer tipo de incompatibilidade entre a regulamentação típica e a cláusula geral instituída pelo princípio da dignidade da pessoa humana. Na verdade, para o autor, a aplicação única da técnica de fracionamento dos direitos da personalidade limita a proteção da pessoa humana no ordenamento, por outro lado a aplicação única da cláusula geral tornaria a proteção mais "lenta", isso porque todo e qualquer tipo de violação necessitaria de uma concretização desta.28 Muito embora tenha sido dito que o fracionamento dos direitos da personalidade levaria a uma classificação infinita destes direitos, é possível que dentro desta classificação hajam direitos que tenham o seu conteúdo e alcance mais delineados, merecendo assim uma tutela mais específica dentro de parcelas da personalidade humana. Dessa maneira, o direito geral da personalidade atua como um direito fonte do qual decorre a existência de outros direitos da personalidade29 quando mais delineados pela doutrina e jurisprudência. Contudo, havendo tipificação de algum direito especial da personalidade, o direito geral será aplicado subsidiariamente. Opostamente, se a violação da personalidade não encontrar resguardo nos direitos positivados especificamente, o direito geral atuará em sua plenitude. Isso ocorre porque havendo um dispositivo específico a norma geral não pode ser aplicada, caso contrário a normal especial não teria necessidade de existir.30 Capelo de Sousa também ressalta a relação de complementaridade e subsidiariedade do direito geral da personalidade com os direitos específicos e autonomamente reconhecidos pela lei. Argumenta que os direitos específicos apenas dizem respeito a manifestações parcelares da personalidade humana e obviamente não esgotam a proteção desta. Deste modo, sendo o bem da personalidade mais dinâmico, extenso e evolutivo do que os direitos especiais, a cláusula geral teria a função de completar a proteção da pessoa no ordenamento jurídico.31 Não se vê no Brasil uma impossibilidade de coexistência entre o direito geral da personalidade e os direitos reconhecidos autonomamente no ordenamento. Isso porque, conforme a relação de especialidade apresentada, o direito geral apenas incide na proteção da pessoa quando os direitos especiais não forem suficientes na tutela do ser humano. Devido à amplitude necessária de direitos para a proteção e promoção da pessoa, uma lista de direitos da personalidade típicos e atípicos será sempre exemplificativa. Isto não significa que a doutrina e a jurisprudência não devem procurar delimitar novos direitos que possibilitem uma aplicabilidade mais eficaz para situações concretas em que a personalidade humana estiver sendo violada, ameaçada de violação ou que necessite de ser promovida. O direito ao esquecimento é um destes direitos que tem sido desenvolvido pela doutrina e jurisprudência, tanto no Brasil quanto no exterior. O conteúdo do direito ao esquecimento pode assumir dois aspectos diferentes - todavia não excludentes - concernentes ao: (i) direito de ser esquecido; e (ii) direito a esquecer. O primeiro assume uma perspectiva dirigida a terceiros, ou seja, quem deveria esquecer o seu passado. Já o segundo adota uma visão de primeira pessoa, pois é preciso que o ser humano esqueça o seu próprio passado32 para começar um novo modo de ser e viver, constituindo uma forma de tutela promocional da pessoa humana. Página 4

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O direito ao esquecimento é uma figura híbrida.33 O direito de ser esquecido está intrinsecamente ligado ao direito à privacidade e ao direito à honra, enquanto o direito a esquecer deriva do direito à identidade pessoal, pontos de vista complementares na formação do direito ao esquecimento. Importante esclarecer que o esquecimento liga-se tanto ao viés negativo, quanto à perspectiva positiva da privacidade. No primeiro caso, a privacidade é apreendida como "o modo de ser da pessoa, que consiste na exclusão do conhecimento pelos outros daquilo que se refere somente a ela".34 Assim, na concepção negativa clássica, a privacidade se apresenta como um direito de defesa, um direito de excluir do conhecimento alheio aspectos da vida pessoal de cada um. O direito à honra, na vertente objetiva, guarda relação com a projeção social do respeito que o ser humano goza em sociedade, tutelando a reputação da pessoa em face do ambiente social.35 Na perspectiva subjetiva, é determinada pelo respeito e consideração que a pessoa possui por si própria.36 Neste viés, o direito ao esquecimento assume também a sua posição clássica de direito subjetivo de impedir a veiculação ou exploração de episódios desabonadores que interessam ser esquecidos,37 em especial o passado judicial criminal.38 Em relação ao viés positivo da privacidade, esta é entendida como o direito de manter o controle sobre as suas informações,39 denominado autodeterminação informativa. O reconhecimento da perspectiva positiva da privacidade é uma construção derivada da atual sociedade pós-industrial, cuja a principal fonte de riqueza é a própria informação, surgindo a necessidade de regulamentar os direitos e deveres sobre este novo recurso.40 Neste diapasão de novas configurações da privacidade, cujo protagonismo concerne à sociedade de informação e consequentemente à internet, este direito não está mais ligado ao secretismo e exclusão de informações pessoais de terceiros. A privacidade no contexto da internet significa o poder dos indivíduos de decidirem quais as informações serão reveladas, para quem e com qual objetivo.41 Do direito à autodeterminação informativa derivam alguns princípios que devem ser obedecidos para a proteção da privacidade. Dentre eles se encontra o princípio da finalidade, visto que o propósito da coleta de dados deve ser previamente conhecido e as informações devem ser eliminadas ou tornadas anônimas quando não forem mais necessárias, ou quando tiverem alcançado os seus objetivos.42 É justamente deste princípio da finalidade que se retira um direito ao esquecimento, pois o responsável pelo tratamento de dados não pode manter as informações ou deve mantê-las de forma anônima depois que os fins foram obtidos.43 Todavia, com o avanço ainda maior da tecnologia, principalmente com a memória eterna eletrônica e a eficiência dos motores de busca na internet, atualmente é muito difícil escapar do seu passado quando tudo na rede mundial de computadores é gravado e armazenado de forma permanente.44 Neste contexto, a reivindicação atual do direito ao esquecimento é a eliminação automática das informações pessoais depois de transcorrido um prazo determinado.45 Seria, assim, um direito de deletar a informação no seu devido tempo,46 colocando nesta um prazo de validade.47 A efetivação de tais perspectivas do direito ao esquecimento na sociedade de informação ainda enfrenta uma série de obstáculos concernentes à sua aplicação prática que precisam ser esclarecidos como: (i) a possibilidade de apagar informações copiadas por terceiros; (ii) contra quem exercer o direito ao esquecimento; (iii) como verificar se a informação foi realmente eliminada; (iv) quando e porque o direito ao esquecimento pode ser invocado; (v) a necessidade de criação de tecnologias que possibilitem a aplicação prática do esquecimento semelhantes às chamadas Privacy Enhancing Tecnologies,48 entre outros que não podem ser aqui desenvolvidos. O direito ao esquecimento está intrinsecamente ligado ao livre desenvolvimento da personalidade e à dignidade da pessoa humana, por isso deve ser considerado um direito da personalidade atípico. Levando em consideração o direito ao esquecimento sob o prisma da autodeterminação e da identidade pessoal Antoinette Rouvroy afirma que "l'une des conditions nécessaires à l'épanouissement de l'autonomie individuelle est, pour l'individu, la possibilité d'envisager son existence non pas comme la confirmation ou la répétition de ses propres traces, mais comme la possibilité de changer de route, d'explorer des modes de vie et façons d'être nouveaux, en un mot, Página 5

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d'aller là où on ne l'attend pas (...). C'est bien ce "droit à une seconde chance", la possibilité de recommencer à zeró (...)".49 3 Teoria dos precedentes e as cláusulas gerais Por certo que o Novo Código de Processo Civil (NCPC) trouxe em seu bojo diversas inovações em relação à adaptação do processo civil ao modelo constitucional de processo. Dentre elas está a existência de precedentes formalmente vinculantes que complementam, inclusive, a noção de fontes do Direito brasileiro. Abandona-se a noção exclusivamente persuasiva do precedente com a finalidade de garantir uma maior racionalidade ao Direito.50 Tal determinação possui texto normativo no art. 927,51 complementado pelo art. 489, § 1.º, VI,52 em que os precedentes se relacionamento com a teoria da decisão judicial. O precedente é a norma jurídica usada pelos Tribunais Superiores para decidir um caso particular anterior e que pode ser utilizada para solucionar casos similares que se apresentem posteriormente53 ao mesmo tribunal ou tribunais e juízos hierarquicamente inferiores. Nas palavras de Michele Taruffo: "O precedente fornece uma regra (universalizável, como já foi dito) que pode ser aplicada como critério de decisão no caso sucessivo em função da identidade ou - como acontece em regra - da analogia entre os fatos do primeiro caso e os fatos do segundo caso".54 Portanto, os precedentes são as razões de decidir generalizáveis que podem ser identificadas por meio de decisões judiciais.55 A política de vinculação dos precedentes, ou seja, a determinação de seguir um precedente anteriormente aplicado é chamada de stare decisis.56 Por sua vez, o stare decisis possui uma vinculação horizontal e uma vinculação vertical. A primeira consiste na determinação de que o precedente deve ser seguido pela própria corte que o produziu, pois não existe segurança jurídica e igualdade se o tribunal não aplicar os seus próprios precedentes. A vinculação vertical parte do pressuposto que as demais cortes e juízos de hierarquia inferior devem seguir os precedentes emanados das cortes superiores.57 Os fundamentos dos precedentes geralmente são reconhecidos nos princípios da igualdade e da segurança jurídica. Diz-se princípio da igualdade, porquanto casos iguais devem ser tratados igualmente. Os tratamentos desiguais são permitidos apenas quando forem necessários para a realização da própria igualdade material. Como direito fundamental na Constituição Federal de 1988 (art. 5.º, caput), a igualdade também deve ser respeitada no momento da decisão judicial, ou seja, tratar casos iguais de forma igualitária.58 O princípio da segurança jurídica, ao seu turno, é invocado em razão dos precedentes garantirem certa estabilidade ao ordenamento jurídico. Isso porque, enquanto o Poder Legislativo produz o texto normativo, o Poder Judiciário é responsável pela sua interpretação, chegando à norma. Assim, a aplicação do precedente garante a possibilidade dos cidadãos preverem as consequências dos seus atos baseando-se na interpretação do texto normativo (norma) aplicada pelos tribunais.59 Neste último ponto, os precedentes ganham a função de evitar aquilo que no Brasil ficou conhecido como jurisprudência lotérica60 ou juris-imprudência,61 em outras palavras, evitar o constante desrespeito à aplicação dos precedentes tanto pelas cortes inferiores, quanto pela própria corte que emanou o precedente. Assim, garantindo uma maior previsibilidade nas decisões judiciais, assegura-se a efetivação do princípio da segurança jurídica. Isto não quer dizer que a aplicação dos precedentes ocorra de maneira mecânica por meio do método da subsunção. A fundamentação dos precedentes está na seleção das decisões judiciais anteriores que sejam similares ao caso que está sendo julgado (questões fáticas) e, posteriormente, a articulação dos argumentos jurídicos utilizados na decisão judicial capaz de criar uma regra geral ( ratio decidendi) que possa ser utilizada em casos posteriores. Não havendo semelhança capaz de determinar a aplicação do precedente, será caso do juiz utilizar a técnica do distinguishing.62 O distinguishing ocorre quando se verifica que o caso concreto que está sendo decidido não se amolda ao precedente invocado. Em razão da diferença dos fatos entre o caso decidido anteriormente (precedente), e aquele julgado no processo, não é possível transpor a ratio decidendi de uma situação para a outra.63 A importância desta posição está no entendimento que o precedente também exige interpretação.64 Primeiro, a interpretação dos fatos para encontrar o precedente aplicável ao caso similar. Segundo, Página 6a

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interpretação das próprias razões de decidir para descobrir a norma generalizável do precedente que possa ser aplicada aos casos posteriores, em especial para o caso em exame. Neste diapasão, aplicar um precedente é uma forma de argumentação jurídica,65 em especial a argumentação ligada à teoria da tópica.66 A tópica dentro de um sistema jurídico aberto assume importante papel na interpretação e aplicação das cláusulas gerais e conceitos jurídicos indeterminados. Classicamente contrapõem-se dois modelos de sistema jurídico: o sistema jurídico fechado e o sistema jurídico aberto. O primeiro sistema está relacionado aos dogmas do positivismo jurídico. Adentrando suas construções teóricas, para o positivismo jurídico existe uma primazia da lei sobre as outras fontes, dogma do direito chamado de "monismo jurídico". Num sistema de construção escalonada a lei é superior às outras fontes, razão pela qual é a única fonte de qualificação, ou seja, situa-se em um grau hierárquico superior.67 Outro dogma do positivismo jurídico é a completude ou plenitude do ordenamento jurídico, entendendo que o sistema jurídico é fechado, ou seja, possui "uma norma para regular cada caso", não existindo nenhuma espécie de lacuna.68 Em especial, a técnica legislativa utilizada por este positivismo é a de enumerações exaustivas ou taxativas, indicando que somente aquilo que estava previsto na lei poderia ser considerado como direito subjetivo. A superação do entendimento do sistema jurídico como um sistema fechado ganha força com a proposta de Claus-Wilhelm Canaris. Sua teoria parte da constatação de que a ideia de sistema deve conter dois grandes elementos: a ordenação e a unidade. A ordenação exprime "um estado de coisas intrínseco racionalmente apreensível, isto é, fundado na realidade" enquanto a unidade visa "não permitir uma dispersão numa multitude de singularidades desconexas, antes devendo deixá-las reconduzir-se a uns quantos princípios fundamentais".69 O papel do sistema é identificar e realizar a adequação de valores e a unidade interior do ordenamento jurídico.70 Assim, para este autor, levando em consideração esse papel de adequação valorativa e unidade interior, o sistema jurídico só pode ser concebido como uma "ordem axiológica ou teleológica de princípios jurídicos gerais".71 São os princípios gerais que garantem a unidade do sistema jurídico. Claus-Wilhelm Canaris indica que este tipo de sistema é aberto, pois existe uma incompletude do conhecimento jurídico e uma constante mutabilidade dos valores jurídicos que fundamentam o sistema.72 Neste diapasão, Maria Helena Diniz defende um sistema jurídico aberto, incompleto e que está sempre em relação com outros sistemas, podendo então ser um sistema lacunoso caso haja uma incongruência ou alteração entre eles.73 Contribuem para a abertura do sistema: as cláusulas gerais; os conceitos jurídicos indeterminados; e as enumerações exemplificativas. As cláusulas gerais, por sua vez, constituem uma técnica legislativa que se contrapõe à regulamentação casuística, garantindo uma maior mobilidade do sistema jurídico.74 Segundo Judith Martins-Costa, isso não significa apresentar respostas prontas para todos os problemas da realidade que se apresentam ao Direito, pois estas respostas devem ser construídas, paulatinamente, pela jurisprudência.75 Assim, continua a autora: "Considerada, pois, do ponto de vista da técnica legislativa, a cláusula geral constitui uma disposição normativa que utiliza, o seu enunciado, uma linguagem de tessitura intencionalmente 'aberta', 'fluida', ou 'vaga', caracterizando-se pela ampla extensão do seu campo semântico. Esta disposição é dirigida ao juiz de modo a conferir-lhe um mandato (ou competência) para que, à vista dos casos concretos, crie, complemente ou desenvolva normas jurídicas, mediante o reenvio para elemento cuja concretização pode estar fora do sistema; esses elementos, contudo, fundamentarão a decisão, motivo pelo qual não só resta assegurado o controle racional da sentença, como, reiterados no tempo fundamentos idênticos, será viabilizada, por meio do recorte da ratio decidendi, a ressistematização desses elementos, originariamente extrassistemáticos, no interior do ordenamento jurídico".76 Como se percebe, a concretização das cláusulas gerais, além do pensamento sistemático, também precisa da argumentação tópica,77 realizada pelo estudo e aplicação dos precedentes judiciais. Assim, não só apenas o direito geral de personalidade (ou cláusula geral de tutela da personalidade) pode se beneficiar de uma cultura de respeito aos precedentes (stare decisis), mas também as demais cláusulas gerais do Código Civil de 2002, quais sejam: (i) a função social do contrato; (ii) 7a Página

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boa-fé objetiva; (iii) cláusula geral dos danos morais (art. 186); (iv) abuso do direito; (v) enriquecimento sem causa etc. Isto ocorre porque a lei não é suficiente para garantir um tratamento igualitário para as pessoas quando está em jogo a aplicação das cláusulas gerais, pois tal técnica legislativa precisa passar pela interpretação e valoração dos tribunais brasileiros.78 Os precedentes auxiliam no sentido de garantir que situações iguais terão a mesma aplicação das cláusulas gerais, como ocorre na identificação do direito ao esquecimento a partir de uma proteção geral da personalidade humana no sistema jurídico brasileiro. O que deve ser visualizado, contudo, é que a cláusula geral não é uma carta branca para a discricionariedade judicial, pois deve ser interpretada conforme as balizas intrassistêmicas (encontradas no ordenamento jurídico) e extrassistêmicas, as quais fazem referência a realidades fáticas fora do ordenamento jurídico. Dessa maneira, o precedente não pode surgir totalmente dissociado do reenvio aos princípios constitucionais que atuam conjuntamente com a cláusula geral. 4 Direito ao esquecimento no STJ: REsp 1.334.097/RJ A análise de um precedente precisa passar por um primeiro ponto interpretativo que é a identificação do precedente aplicável para a situação apresentada. Tal processo de assimilação é realizado por meio de um raciocínio eminentemente analógico, pois se o caso atual apresenta a mesma questão ou algo semelhante, então o precedente aplica-se ao acontecimento. Por outro lado, caso a questão não seja semelhante, será necessária a realização do distinguishing, indicando a não aplicação do precedente ao caso concreto apresentado.79 Essa análise é realizada observando-se as circunstâncias fáticas da situação pretérita (precedente) e da situação atual que está sendo julgada. Identificada a similitude entre os casos, passa-se para a interpretação da efetiva razão que levou à decisão do caso concreto (ratio decidendi). Neste segundo momento ocorre a separação da ratio decidendi e o obter dictum, qual seja, as demais passagens na motivação da decisão que não tem influência direta na resolução da lide.80 Como bem demonstra Daniel Mitidiero, existe um discurso para a resolução do caso que é apresentado ao juízo, consistente na motivação judicial, e um segundo discurso voltado à sociedade e à formação do precedente judicial. A ratio decidendi é identificada pelas razões generalizáveis adotadas como meio necessário e suficiente para chegar à solução do caso.81 Observados estes pontos, analisar-se-á o REsp 1.334.097/RJ que reconheceu a aplicação do direito ao esquecimento no sistema jurídico brasileiro. 4.1 Delineamento dos fatos e do contraditório As circunstâncias de fato que permearam o julgamento do REsp 1.334.097/RJ dizem respeito à veiculação da imagem de determinado cidadão,82 que se envolveu na denominada Chacina da Candelária em 1993, em um episódio do programa televisivo Linha Direta, veiculado em 2006. Ocorre que o cidadão envolvido foi absolvido no Tribunal do Júri por unanimidade dos votos dos membros. Procurado pela rede de televisão, a pessoa recusou a gravar entrevista e demonstrou que não tinha interesse em vincular a sua imagem a tal fato desabonador. O cidadão argumentou que foi levado aos telespectadores o conhecimento de um fato que gerou um ódio social, unindo a sua imagem à questão da chacina. Alegou que esta situação violou a sua privacidade, anonimato e direito à paz. Isso acabou tendo consequências negativas na sua vida profissional e social, tendo que se desfazer de seus bens e mudar de comunidade para preservar a sua própria segurança pessoal. Pediu, por fim, uma indenização no valor de 300 (trezentos) salários mínimos a título de danos morais. Em primeira instância o pleito foi julgado improcedente. O TJRJ, por sua vez, julgou procedente o pedido para reconhecer o direito ao esquecimento como derivado do princípio da dignidade da pessoa humana e mitigar a aplicação do direito fundamental à liberdade de imprensa. Condenou a emissora de televisão a pagar o valor de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) de indenização. No recurso especial, a emissora de televisão alegou a inexistência do dever de indenizar, pois programas policiais que retratam acontecimentos criminais são muito comuns no Brasil e no exterior. Página 8

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Ademais, observou que não houve violação da privacidade do cidadão, pois os fatos televisionados são públicos e o programa de televisão é realizado em forma de documentário. Aduziu, por fim, que é inconcebível o acolhimento de um direito ao esquecimento que pudesse prevalecer sobre o direito de informar, afinal, o cidadão se tornou uma peça chave do acontecimento e contar a história sem se referir a ele deixaria o programa sem nenhuma lógica. 4.2 Fundamentação jurídica da decisão A primeira questão debatida pelo STJ, no voto do relator Min. Luís Felipe Salomão, diz respeito à admissibilidade do recurso especial em detrimento do recurso extraordinário. Tais indagações não dizem respeito à conclusão do Tribunal pelo reconhecimento do direito ao esquecimento do cidadão, devendo ser consideradas como obiter dictum. Posteriormente, passa o Tribunal a analisar o conflito de direitos que se apresentam para seu julgamento. Argumentando a respeito de outros precedentes, o relator demonstra que o conflito entre o direito de liberdade de imprensa e os direitos da personalidade são bastante comuns na corte, mas que o caso apresentado representa uma nova faceta de proteção à dignidade da pessoa humana, pois relacionado ao reconhecimento do direito ao esquecimento. Assim, para o tribunal, o direito ao esquecimento é o direito de não ser lembrado, contra a sua vontade, de fatos passados desabonadores, em especial de situações criminais. Continua afirmando que o direito ao esquecimento ganha força no ambiente atual marcado pela atuação da internet, pois as notícias divulgadas neste meio não são facilmente esquecidas. O relator passa a explicar a proteção europeia em relação ao direito ao esquecimento na área das informações pessoais divulgadas na internet. Embora não verse explicitamente sobre o caso concreto (que trata de divulgação televisiva de fato criminal passado) e, portanto, possa ser considerada a argumentação como obiter dictum, é certo que tal posicionamento pode conter um caráter persuasivo para a solução de casos futuros que versem sobre o direito ao esquecimento na rede mundial de computadores.83 No caso específico apresentado, o relator começa explanando as teses contrárias ao reconhecimento do direito ao esquecimento no sistema jurídico brasileiro: "(i) o acolhimento do chamado direito ao esquecimento constitui atentado à liberdade de expressão e de imprensa; (ii) o direito de fazer desaparecer as informações que retratam uma pessoa significa perda da própria história, o que vale dizer que o direito ao esquecimento afronta o direito à memória de toda a sociedade; (iii) cogitar de um direito ao esquecimento é sinal de que a privacidade é a censura do nosso tempo; (iv) o mencionado direito ao esquecimento colidiria com a própria ideia de direitos, porque estes têm aptidão de regular a relação entre o indivíduo e a sociedade, ao passo que aquele finge que essa relação não existe - um 'delírio da modernidade'; (v) o direito ao esquecimento teria o condão de fazer desaparecer registros sobre crimes e criminosos perversos, que entraram para a história social, policial e judiciária, informações de inegável interesse público; (vi) ou uma coisa é, na sua essência, lícita ou é ilícita, não sendo possível que uma informação lícita transforme-se em ilícita pela simples passagem do tempo; (vii) quando alguém se insere em um fato de interesse coletivo, mitiga-se a proteção à intimidade e privacidade em benefício do interesse público e, ademais, uma segunda publicação (a lembrança, que conflita com o esquecimento) nada mais faz do que reafirmar um fato que já é de conhecimento público; (viii) e, finalmente, que programas policiais relatando acontecimentos passados, como crimes cruéis ou assassinos célebres, são e sempre foram absolutamente normais no Brasil e no exterior, sendo inerentes à própria atividade jornalística".84 Não obstante tais argumentos, o relator alega que na atual sociedade de hiperinformação está ocorrendo uma profunda modificação nas esferas pública e privada da vida humana. Desta situação torna-se necessário o reconhecimento de novos direitos ou novas perspectivas de direitos já consagrados pelo ordenamento jurídico. Por outro lado, também reconhece que a liberdade de imprensa é essencial para a caracterização de um Estado Democrático de Direito, mas não deixa de observar que nenhum direito fundamental pode ser considerado absoluto, devendo respeitar os direitos à privacidade, à honra e imagem das pessoas. Em caso de violação destes direitos é cabível a reparação por dano moral ou material (art. 5.º, X, da CF/1988 (LGL\1988\3)). Isso porque os direitos da personalidade estão intrinsecamente relacionados à dignidade da pessoa humana. Página 9

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Quanto à alegação da emissora de televisão de que o programa policial possui um cunho histórico e documental, o relator afirma que de fato os crimes passados podem servir para demonstrar a evolução ou regressão da pessoa humana em sociedade, mas os programas policiais devem ser vistos com cautela. Neste ponto, tem-se que determinadas situações são retratadas pela mídia de forma exacerbada e com cunho de populismo penal, como é o caso do programa Linha Direta. Assim, reconhece que o direito ao esquecimento "pode significar um corretivo - tardio, mas possível das vicissitudes do passado, seja de inquéritos policiais ou processos judiciais pirotécnicos e injustos, seja da exploração populista da mídia".85 Com fundamento nos ensinamentos de François Ost, o relator explica que o Direito possui instrumentos de estabilização do passado como a prescrição que, por sua vez, consistem em um direito ao esquecimento programado. Continua afirmando que o direito ao esquecimento aplicado ao respeito à vida privada determina que as pessoas, que não são personagens públicos, possam, depois de algum tempo, serem deixadas em paz e recair no anonimato. Isso se aplica, inclusive, para os condenados que já pagaram a sua dívida com a sociedade e buscam a sua ressocialização. Posteriormente, são trazidos para a argumentação jurídica precedentes persuasivos da jurisprudência comparada. Neste ponto são citados os casos: (i) Marlene Dietrich (Tribunal de Paris; (ii) Melvis vs. Reid (Tribunal de Apelação da Califórnia) e; (iii) Lebach (Tribunal Constitucional alemão). Todos eles reconhecendo o direito ao esquecimento como um direito da pessoa humana. No direito brasileiro o relator afirma que o direito ao esquecimento decorre da principiologia da dignidade da pessoa humana, dos direitos fundamentais e do direito positivo infraconstitucional. Quanto a este último aspecto são citados os seguintes institutos: (i) da prescrição; (ii) do prazo máximo para inscrição de informações negativas do consumidor em bancos de dados (art. 43, § 1.º, do CDC (LGL\1990\40)); (iii) da reabilitação criminal (art. 93 do CP (LGL\1940\2)); (iv) do sigilo da folha de antecedentes após cumprimento da pena (art. 202 da LEP (LGL\1984\14)). Contrapondo o direito ao esquecimento com a liberdade de informar, o relator afirma que a veracidade da informação não é o único requisito para garantir a licitude da sua divulgação. Embora na apuração do crime exista um interesse público, este interesse se esgota no momento em que a resposta do direito penal cumpre com sua finalidade. Assim, veda-se a "eternização da informação". 86 Na situação específica dos processos criminais, o reconhecimento do direito ao esquecimento representa uma evolução cultural da sociedade ao garantir a esperança de ressocialização ao condenado. Tratando-se do caso concreto, observou-se que, apesar da Chacina da Candelária ser um acontecimento histórico brasileiro, a notícia poderia ter sido veiculada sem a identificação do nome e imagem do cidadão. Permitir a transmissão do programa com a identificação precisa da pessoa seria autorizar uma segunda violação da sua dignidade. Por fim, foi mantida a condenação em danos morais no valor de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais). O voto do relator foi acompanhado por unanimidade. 4.3 Ratio decidendi e formação do precedente Neste precedente o STJ decidiu que o direito ao esquecimento deriva do princípio da dignidade da pessoa humana e dos direitos da personalidade. A ratio decidendi do precedente determina que a pessoa acusada em um processo penal tem o direito de não ser lembrada deste fato desabonador após decorrido determinado tempo, ou seja, tem o direito de ser esquecida. A violação do direito ao esquecimento, por sua vez, gera o dever de indenizar em razão dos danos morais causados. Como nenhum caso possui exatamente as mesmas características da situação apresentada no precedente,87 também é forçoso concluir que em casos similares também deve ser reconhecido o direito ao esquecimento. Assim, embora o precedente verse sobre a divulgação do episódio em rede de televisão, caso o fato desabonador seja veiculado em outro meio de comunicação (a exemplo da internet), isto não afetará a aplicação do direito ao esquecimento. Além disso, apesar de no caso concreto a pessoa ter sido absolvida pelo Tribunal do Júri, ficou esclarecido na fundamentação que os cidadãos que forem condenados também têm o direito ao esquecimento, afinal, não é possível garantir uma ressocialização da pessoa se ela for estigmatizada pela sociedade. A absolvição no processo criminal não é fator determinante para a aplicação Página do 10

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direito ao esquecimento. 5 Conclusão O direito geral da personalidade atua como uma cláusula geral que, por sua vez, carece de preenchimento valorativo no momento de sua interpretação e aplicação ao caso concreto. Apesar de definir a proteção da pessoa humana em qualquer situação de violação da sua personalidade, tal âmbito normativo precisa ser delimitado de forma específica para cada situação concreta. Neste ponto, merece maiores atenções a normativa dos precedentes no novo Código de Processo Civil. Os precedentes representam a principal forma de concretização das cláusulas gerais, pois o respeito aos precedentes (stare decisis) garante uma aplicação igualitária e mais segura das cláusulas gerais. Igualitária em razão de proporcionar que casos iguais ou semelhantes possam ser julgados de forma igual. Segura porque garante uma previsibilidade dos jurisdicionados no momento de conduzir as suas relações jurídicas em sociedade. Dessa maneira, o direito ao esquecimento, como direito da personalidade atípico, constitui uma das formas de concretização do direito geral de personalidade reconhecida por meio de um precedente do STJ no REsp 1.334.097/RJ. Tal decisão contribui imensamente para a valorização da pessoa humana no ordenamento jurídico brasileiro ao criar um verdadeiro precedente para a proteção dos direitos da personalidade em face da sociedade de informação contemporânea. Isso porque, o direito ao esquecimento garante ao ser humano a possibilidade de se desvincular de fatos desabonadores passados em busca de desenvolver livremente a sua personalidade. 6 Referências bibliográficas ABBOUD, Georges. Do genuíno precedente do stare decisis ao precedente brasileiro: os fatores histórico, hermenêutico e democrático que os diferenciam. In: DIDIER JR., Fredie et al. (coord.). Precedentes. Salvador: JusPodivm, 2015. ALMEIDA, Luiz Antônio Freitas de. Violação do direito à honra no mundo virtual: a (ir)responsabilidade civil dos prestadores de serviço da internet por fato de terceiros. In: MIRANDA, Jorge; RODRIGUES JÚNIOR, Otávio Luiz; FRUET, Gustavo Bonato (org.). Direitos da personalidade. São Paulo: Atlas, 2012. ARRUDA ALVIM WAMBIER, Teresa. A vinculatividade dos precedentes e o ativismo judicial Paradoxo apenas aparente. In: DIDIER JR., Fredie et al. (coord.). Precedentes. Salvador: JusPodivm, 2015. ASCENSÃO, José de Oliveira. Direito civil:teoria geral. 2. ed. Coimbra: Coimbra Ed., 2000. vol. 1. BOBBIO, Norberto. O positivismo jurídico. São Paulo: Ícone, 2006. ______. Teoria do ordenamento jurídico. São Paulo: Edipro, 2011. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial 1.334.097/RJ. Relator Min. Luís Felipe Salomão. DJe 10.09.2013. CAMBI, Eduardo; HELLMAN, Renê Francisco. Jurisimprudência: a independência do juiz ante os precedentes judiciais como obstáculo à igualdade e a segurança jurídica. Revista de Processo. vol. 231. p. 349. São Paulo: Ed. RT, maio 2014. CANARIS, Claus-Wilhem. Pensamento sistemático e conceito de sistema na ciência do direito. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2008. CANTALI, Fernanda Borghetti. Direitos da personalidade:disponibilidade relativa, autonomia privada e dignidade humana. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009. CASTRO, Luis Martínez Vázquez de. El principio de libre desarrollo de la personalidad en el ámbito privado. Madrid: Civitas, 2010. Página 11

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1 DE CUPIS, Adriano. Os direitos da personalidade. São Paulo: Quorum, 2008. p. 24. 2 PINTO, Carlos Alberto da Mota. Teoria geral do direito civil. 3. ed. Coimbra: Coimbra Ed., 1999. p. 87; SESSAREGO, Carlos Fernández. ¿Qué es ser "persona" para el Derecho?. Revista de Derecho PUCP. n. 54. p. 289-333. p. 300. Lima, 2001; ASCENSÃO, José de Oliveira. Direito civil:teoria geral. 2. ed. Coimbra: Coimbra Ed., 2000. p. 90, vol. 1. 3 GOMES, Orlando. Introdução ao direito civil. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1974. p. 168. Para o autor: "Sob a denominação de direitos da personalidade, compreendem-se direitos considerados essenciais ao desenvolvimento da pessoa humana, que a doutrina moderna preconiza e disciplina, no corpo do Código Civil (LGL\2002\400), como direitos absolutos. Destinam a resguardar a eminente dignidade da pessoa humana". 4 ZANINI, Leonardo Estevam de Assis. Direitos da personalidade. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 94. 5 TEPEDINO, Gustavo. A tutela da personalidade no ordenamento civil-constitucional brasileiro. In: ______. Temas de direito civil. Rio de Janeiro: Renovar, 2008. p. 52. 6 GARCIA, Enéas Costa. Direito geral da personalidade no sistema jurídico brasileiro. São Paulo: Juarez de Oliveira Ed., 2007. p. 186. 7 CANTALI, Fernanda Borghetti. Direitos da personalidade:disponibilidade relativa, autonomia privada e dignidade humana. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009. p. 77. 8 DE CUPIS, Adriano. Op. cit., p. 27. 9 GARCIA, Enéas Costa. Op. cit., p. 181. 10 Idem, p. 191-192. 11 PIEROTH, Bodo; SCHLINK, Bernhard. Direitos fundamentais. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 177. 12 Idem, p. 177-178; MARTINS, Leonardo. Liberdade e igualdade. In: _____. Liberdade e estado constitucional:leitura jurídico-dogmática de uma complexa relação a partir da teoria liberal dos direitos fundamentais. São Paulo: Atlas, 2012. p. 49. 13 PIEROTH, Bodo; SCHLINK, Bernhard. Op. cit., p. 178; MARTINS, Leonardo. Op. cit., p. 50. 14 MARTINS, Leonardo. Op. cit., p. 50; PIEROTH, Bodo; SCHLINK, Bernhard. Op. cit., p. 179-180. 15 SOUSA, Rabindranath V. A. Capelo de. O direito geral de personalidade. Coimbra: Coimbra Ed., 1995. p. 93. Na conceituação de Éneas Costa Garcia: "O direito geral da personalidade é o conceito indeterminado normativo segundo o qual a pessoa deve ser tutelada globalmente em todos os aspectos que compõem a sua personalidade (físico, espiritual, moral), prevenindo e sancionando qualquer comportamento antijurídico que represe menoscabo à dignidade da pessoa humana, frustrando ou embaraçando o livre desenvolvimento da personalidade do titular" (Op. cit., p. 87). 16 PINTO, Paulo Mota. Notas sobre o direito ao livre desenvolvimento da personalidade e os direitos de personalidade no direito português. In: SARLET, Ingo Wolfgang. A constituição concretizada: c onstruindo pontes com o público e o privado. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2000. p. 67-69. Página 14

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17 SOUSA, Rabindranath V. A. Capelo de. Op. cit., p. 93. Nas palavras de Fernanda Cantali: "Em síntese, o direito geral de personalidade tem como objetivo salvaguardar a pessoa humana em qualquer circunstância, tanto mediante os especiais direitos da personalidade consagrados pela legislação constitucional e infraconstitucional, como também diante de qualquer situação que não atenda à realização da personalidade, eis que o projeto constitucional em vigor de valorização e proteção da dignidade da pessoa humana não se coaduna com a tipificação de situações previamente determinadas pelo simples dado de que não exaure as possibilidades oferecidas pela realidade" (Op. cit., p. 82). 18 "Art. 12. Pode-se exigir que cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade, e reclamar perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei." 19 CASTRO, Luis Martínez Vázquez de. El principio de libre desarrollo de la personalidad en el ámbito privado. Madrid: Civitas, 2010. p. 168. 20 MIRANDA, Jorge; RODRIGUES JÚNIOR, Otavio Luiz; FRUET, Gustavo Bonato. Principais problemas dos direitos da personalidade e estado-da-arte da matéria no direito comparado. In: ______. Direitos da personalidade. São Paulo: Atlas, 2012. p. 19). Ademais, alguns autores utilizam como sinônimos a cláusula geral de tutela da personalidade humana e direito geral da personalidade, quais sejam: CANTALI, Fernanda Borghetti. Op. cit., p. 253-254; SZANIAWSKI, Elimar. Direitos de personalidade e sua tutela. São Paulo: Ed. RT, 2005. p. 136-137; ZANINI, Leonardo Estevam de Assis. Op. cit., p. 265-267. 21 TEPEDINO, Gustavo. Op. cit., p. 50-51; MORAES, Maria Celina Bodin de. Danos à pessoa humana:uma leitura civil-constitucional dos danos morais. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 117-118. 22 PERLINGIERI, Pietro. Direito civil na legalidade constitucional. Rio de Janeiro: Renovar, 2008. p. 239-240. 23 JORGE JÚNIOR, Alberto Gosson. Cláusulas gerais no novo Código Civil. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 40. 24 MORAES, Maria Celina Bodin de. Op. cit., p. 118. 25 Ana Carolina Teixeira e Renata de Lima Rodrigues afirmam: "Com efeito, não há que se confundir tal proposta com aquilo que apregoa a teoria monista. Na lógica da cláusula geral de tutela da pessoa humana, estamos diante de uma única norma - que se concretiza em várias outras com poder de decisão diante de situações concretas - a abarcar uma multiplicidade de direitos subjetivos de personalidade e demais situações jurídicas existenciais, as quais são infinitas, e não de um único direito geral de personalidade, a englobar todos os nuances da personalidade humana, como apregoa a teoria monista, o que, a rigor, as diferencia em tudo e por tudo" (Aspectos gerais dos direitos da personalidade. In: TEIXEIRA, Ana Carolina Brochado; RIBEIRO, Gustavo Pereira Leite. Manual de teoria geral do direito civil. Belo Horizonte: Del Rey, 2011. p. 244). 26 SARMENTO, Daniel. Direitos fundamentais e relações privadas. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 101-102. 27 SZANIAWSKI, Elimar. Op. cit., p. 128. 28 GARCIA, Enéas Costa. Op. cit., p. 161-163. 29 Basicamente no mesmo sentido de quando se fala no princípio da dignidade da pessoa como fonte dos direitos fundamentais materiais. 30 GARCIA, Enéas Costa. Op. cit., p. 164-170. 31 SOUSA, Rabindranath V. A. Capelo de. Op. cit., p. 559-560. Página 15

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32 KOOPS, Bert-Jaap. Forgetting footprints, shunning shadow. A critical analysis of the "right to be forgotten" in big data practice. Scripted. vol. 8. n. 3. p. 231-232. dez. 2011; ROUVROY, Antoinette. Réinventer l'art d'oublier et de se faire oublier dans la société de l'information? Versão aumentada do capítulo publicado sobre o mesmo título In: LACOUR, Stéphanie. La sécurité de l'individu numérisé. Réflexions prospectives et internationales. Paris: L'Harmattan, 2008. p. 25. 33 CHOERI, Raul Cleber da Silva. O direito à identidade na perspectiva civil-constitucional. Rio de Janeiro: Renovar, 2010. p. 263. 34 DE CUPIS, Adriano. Op. cit., p. 139. 35 ALMEIDA, Luiz Antônio Freitas de. Violação do direito à honra no mundo virtual: a (ir)responsabilidade civil dos prestadores de serviço da internet por fato de terceiros. In: MIRANDA, Jorge; RODRIGUES JÚNIOR, Otávio Luiz; FRUET, Gustavo Bonato (org.). Direitos da personalidade. São Paulo: Atlas, 2012. p. 247. 36 VASCONCELOS, Pedro Pais de. Direito de personalidade. Coimbra: Almedina, 2006. p. 76; VERA, Miguel Ángel Encabo. Derechos de la personalidad. Madrid: Marcial Pons, 2012. p. 92. 37 SILVA, Edson Ferreira da. Direito à intimidade. 2. ed. São Paulo: Juarez de Oliveira Ed., 2003. p. 76. Muito embora sobre a perspectiva da primeira pessoa o direito ao esquecimento também represente a possibilidade de um novo começo para o condenado criminalmente, haja vista que os dois prismas não são excludentes. 38 Veja-se também o Enunciado 531 da VI Jornada de Direito Civil: "A tutela da dignidade da pessoa humana na sociedade da informação inclui o direito ao esquecimento. Justificativa: Os danos provocados pelas novas tecnologias de informação vêm-se acumulando nos dias atuais. O direito ao esquecimento tem sua origem histórica no campo das condenações criminais. Surge como parcela importante do direito do ex-detento à ressocialização. Não atribui a ninguém o direito de apagar fatos ou reescrever a própria história, mas apenas assegura a possibilidade de discutir o uso que é dado aos fatos pretéritos, mais especificamente o modo e a finalidade com que são lembrados". 39 RODOTÀ, Stefano. A vida na sociedade de vigilância:a privacidade hoje. Rio de Janeiro: Renovar, 2008. p. 109; PEREIRA, Marcelo Cardoso. Direito à intimidade na internet. Curitiba: Juruá, 2008. p. 145. 40 GONÇALVEZ, Maria Eduarda. Direito da informação:novos direitos e formas de regulação na sociedade da informação. Coimbra: Almedina, 2003. p. 7. 41 TERWANGNE, Cécile de. Privacidad en internet y el derecho a ser olvidado/derecho al olvido. Revista de Internet, Derecho y Política. n. 13. p. 54-55. feb. 2012. 42 RODOTÀ, Stefano. Op. cit., p. 59. 43 TERWANGNE, Cécile de. Op. cit., p. 58. 44 ROSEN, Jeffrey. The right to be forgotten. Stanford Law Review. vol. 64. n. 88. p. 88-92. Stanford, feb. 2012. 45 TERWANGNE, Cécile de. Op. cit., p. 60-61. 46 KOOPS, Bert-Jaap. Op. cit., p. 236. 47 WEBER, Rolf H. The right to be forgotten: more than a pandora's box? Journal of Intellectual Property, Information Technology and Electronic Commerce Law. vol. 2. p. 126-127. jul. 2011. 48 Idem, p. 120-130; KOOPS, Bert-Jaap. Op. cit., p. 229-256; TERWANGNE, Cécile de. Op. cit., p. 60-61; ROSEN, Jeffrey. Op. cit., p. 88-92.

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49 ROUVROY, Antoinette. Op. cit., p. 6. Tradução livre: "(...) uma das condições necessárias para o desenvolvimento da autonomia individual é, para o indivíduo, a oportunidade de considerar a sua existência não como uma confirmação ou a repetição de seus próprios traços, mas como a possibilidade de mudar de rumo, para explorar modos de vida e novas formas de ser, em uma palavra, para ir aonde não esperamos (...). Isso é o 'direito a uma segunda chance', a oportunidade de recomeçar do zero (...)". 50 ZANETTI JR., Hermes. Precedentes normativos formalmente vinculantes. In: DIDIER JR., Fredie et al. (coord.). Precedentes. Salvador: JusPodivm, 2015. p. 409. 51 "Art. 927. Os juízes e os tribunais observarão: I - as decisões do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade; II - os enunciados de súmula vinculante; III - os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos; IV - os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional; V - a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados." 52 "Art. 489. (...) § 1.ºNão se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que: (...) VI - deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento." 53 COLE, Charles D. Stare decisis na cultura jurídica dos Estados Unidos. O sistema de precedente vinculante no common law. RT 752/11. São Paulo: Ed. RT, jun. 1998. 54 TARUFFO, Michele. Precedente e jurisprudência. Revista de Processo. vol. 29. p. 200. São Paulo: Ed. RT, set. 2011. 55 MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo curso de processo civil:tutela dos direitos mediante procedimento comum. São Paulo: Ed. RT, 2015. p. 610. 56 COLE, Charles D. Op. cit., p. 11. 57 MITIDIERO, Daniel. A tutela dos direitos como fim do processo civil no estado constitucional. RePro 229/69-70. São Paulo: Ed. RT, mar. 2014. 58 MARINONI, Luiz Guilherme. Eficácia de precedente firmado em ação coletiva de âmbito estadual. In: _____. Soluções práticas. São Paulo: Ed. RT, 2011. vol. 2, p. 207. No mesmo sentido: DIDIER JR., Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael Alexandria de. Curso de direito processual civil: teoria da prova, direito probatório, decisão, precedente, coisa julgada e tutela provisória. 10. ed. Salvador: JusPodivm, 2015. p. 468. 59 PEIXOTO, Ravi. Op. cit., p. 152-153. Tomando a mesma posição: DIDIER JR., Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael Alexandria de. Op. cit., p. 469-470. 60 GOUVEIA, Lúcio Grassi de; BREITENBACH, Fábio Gabriel. Sistema de precedente no novo Código de Processo Civil brasileiro: um passo para o enfraquecimento da jurisprudência lotérica dos tribunais. In: DIDIER JR., Fredie et al. (coord.). Precedentes. Salvador: JusPodivm, 2015. Página 17

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61 CAMBI, Eduardo; HELLMAN, Renê Francisco. Jurisimprudência: a independência do juiz ante os precedentes judiciais como obstáculo à igualdade e a segurança jurídica. Revista de Processo. vol. 231. p. 349. São Paulo: Ed. RT, maio 2014. Nas palavras dos autores: "Com efeito, o juiz é independente para que não seja sujeitado a interferências ilícitas do poder político, do poder econômico, do poder da mídia e de todos e quaisquer corruptores. Entretanto, enquanto membro de um Poder da República, o juiz está sujeito à Constituição, às leis e também aos precedentes judiciais. Tal sujeição não significa subordinação indevida, já que o magistrado de primeiro grau deve observar as decisões dos Tribunais Superiores, cuja função é conferir unidade à interpretação do direito". 62 STRECK, Lenio; ABBOUD, Georges. O NCPC e os precedentes - afinal, do que estamos falando? In: DIDIER JR., Fredie et al. (coord.). Precedentes. Salvador: JusPodivm, 2015. p. 177. 63 LUCCA, Rodrigo Ramina de. O dever de motivação das decisões judiciais. Salvador: JusPodivm, 2015. p. 307. 64 ABBOUD, Georges. Do genuíno precedente do stare decisis ao precedente brasileiro: os fatores histórico, hermenêutico e democrático que os diferenciam. In: DIDIER JR., Fredie et al (coord.). Precedentes. Salvador: JusPodivm, 2015. p. 405. 65 SCHAUER, Frederick. Precedente. In: DIDIER JR., Fredie; et al. (coord.). Precedentes. Salvador: JusPodivm, 2015. p. 49. 66 TARUFFO, Michele. Op. cit., p. 199. 67 BOBBIO, Norberto. O positivismo jurídico. São Paulo: Ícone, 2006. p. 162-166. 68 BOBBIO, Norberto. Teoria do ordenamento jurídico. São Paulo: Edipro, 2011. p. 115. Nas palavras de Hans Kelsen: "Trata-se de uma ficção de que a ordem jurídica tem uma lacuna significando que o direito vigente não pode ser aplicado a um caso concreto porque não existe nenhuma norma geral que se refira a esse caso. A ideia é a de que é logicamente impossível aplicar o Direito efetivamente válido a um caso concreto porque falta a premissa necessária. (...) A ordem jurídica não pode ter quaisquer lacunas. Se o juiz está autorizado a decidir uma disputa como legislador no caso de a ordem jurídica não conter nenhuma norma geral obrigando o réu à conduta reclamada pelo queixoso ele não preenche uma lacuna do Direito efetivamente válido, mas acrescenta ao Direito efetivamente válido uma norma individual à qual não corresponde nenhuma norma geral" (KELSEN, Hans. Teoria geral do direito e do estado. São Paulo: Martins Fontes, 1998. p. 212-213). 69 CANARIS, Claus-Wilhem. Pensamento sistemático e conceito de sistema na ciência do direito. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2008. p. 12-13. 70 Idem, p. 23. 71 Idem, p. 280. 72 Idem, p. 281. No mesmo sentido está a lição de Karl Larenz ao constatar que: "O sistema interno não é, como se depreende do que foi dito, um sistema fechado em si, mas um sistema 'aberto', no sentido de que são possíveis tanto mutações na espécie de jogo concertado dos princípios, do seu alcance e limitação recíproca, como também a descoberta de novos princípios; seja em virtude de alterações da legislação, seja em virtude de novos conhecimentos da ciência do Direito ou modificações na jurisprudência dos tribunais" (Metodologia da ciência do direito. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2009. p. 693). 73 DINIZ, Maria Helena. Compêndio de introdução à ciência do direito. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 449-450. 74 ENGISCH, Karl. Introdução ao pensamento jurídico. 7. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2009. p. 233-234. Nas palavras do autor: "O verdadeiro significado das cláusulas gerais reside no domínio da técnica legislativa. Graças à sua generalidade, elas tornam possível sujeitar um Página 18

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mais vasto grupo de situações, de modo ilacunar e com possibilidade de ajustamento, a uma consequência jurídica. O casuísmo está sempre exposto ao risco de apenas fragmentária e 'provisoriamente' dominar a matéria jurídica. Este risco é evitado pela utilização das cláusulas gerais". 75 MARTINS-COSTA, Judith. O direito privado como um "sistema em construção": as cláusula gerais no projeto do Código Civil (LGL\2002\400) brasileiro. Revista de Informação Legislativa. ano 35. n. 139. p. 8. Brasília: Senado Federal, jul.-set. 1998. 76 Idem, ibidem. 77 CANARIS, Claus-Wilhem. Op. cit., p. 271. 78 ARRUDA ALVIM WAMBIER, Teresa. A vinculatividade dos precedentes e o ativismo judicial Paradoxo apenas aparente. In: DIDIER JR., Fredie et al (coord.). Precedentes. Salvador: JusPodivm, 2015. p. 263. 79 MITIDIERO, Daniel. Fundamentação e precedente - Dois discursos a partir da decisão judicial. Revista de Processo. ano 37. vol. 206. p. 72-73. São Paulo: Ed. RT, abr. 2012. 80 LUCCA, Rodrigo Ramina de. Op. cit., p. 288. 81 MITIDIERO, Daniel. Fundamentação e precedente... cit., p. 61-78. 82 Não será utilizado o nome da pessoa justamente para preservar o seu direito ao esquecimento. 83 Pela possibilidade do obiter dictum ser utilizado como precedente persuasivo vide: LUCCA, Rodrigo Ramina de. Op. cit., p. 288. 84 BRASIL. STJ. RESp 1.334.097/RJ. rel. Min. Luís Felipe Salomão. DJe 10.09.2013, p. 27. 85 BRASIL. STJ. RESp 1.334.097/RJ. rel. Min. Luís Felipe Salomão. DJe 10.09.2013, p. 37. 86 BRASIL. STJ. RESp 1.334.097/RJ. rel. Min. Luís Felipe Salomão. DJe 10.09.2013, p. 37. 87 Nas palavras de Teresa Arruda Alvim Wambier: "Há técnicas de uniformização decisória que têm como pressuposto a identidade integral das situações: os fatos e a questão jurídica, stricto sensu, são absolutamente iguais. Não necessariamente o quadro fático subjacente integralmente considerado: mas, dentre os fatos, aqueles tidos como relevantes pelo direito para a incidência (ou não) da consequência sobre o qual se discute. Seriam, então, idêntico, os traços eleitos pelo legislador como essenciais a hipóteses de incidência da consequência" (Op. cit., p. 269).

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