A GESTÃO E O CONTROLE SOCIAL NO BRASIL: UM OLHAR SOBRE O SISTEMA NACIONAL DE ESPORTE E LAZER

June 4, 2017 | Autor: Péricles Maia | Categoria: Políticas Públicas, Esportes, Controle Social, Gestao Esportiva, Esportes radicais
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A GESTÃO E O CONTROLE SOCIAL NO BRASIL: UM OLHAR SOBRE O SISTEMA NACIONAL DE ESPORTE E LAZER

Camila de Jesus Barreto¹ Péricles Maia¹ Raissa Loara Nogueira¹ Temístocles Damasceno Silva²

RESUMO A presente pesquisa buscou analisar a gestão e o controle social das politicas públicas de esporte e lazer, tomando-se enquanto referência de análise, as prerrogativas do sistema nacional de esporte, elucidadas no documento final da II Conferência de Esporte. Enquanto procedimento metodológico trata-se de um estudo exploratório com abordagem qualitativa. No que diz respeito aos instrumentos de coleta de dados, foi utilizado à análise documental. Em relação ao referencial teórico, privilegiaram-se os estudos de Frey (1999) e Boschetti (2009) acerca do processo de análise das políticas públicas. Neste contexto, constatou-se que, apesar da existência de prerrogativas que solidificam a participação popular no processo de construção das políticas pública no país, torna-se necessário a implementação de um processo de conscientização da comunidade esportiva, no que tange a compreensão dos aspectos conceituais que permeiam o fenômeno esportivo bem como as ferramentas de materialização da gestão participativa. Palavras-chave: Esporte. Lazer. Gestão. Controle Social. ABSTRACT This research seeks to analyze the management and social control of public policies of sports and leisure, taking as reference analysis, the prerogatives of the national sport system, elucidated in the final document of the Second Sport Conference. While methodological procedure this is an exploratory study with a qualitative approach. With regard to data collection instruments was used to document analysis. Regarding the theoretical framework, favored up the studies Frey (1999) and Boschetti (2009) about the public policy analysis process. In this context, it was found that despite the existence of powers which solidify popular participation in the construction of public political process in the country, it is necessary to implement a 1 Discentes do curso de licenciatura em Educação Física da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia – UESB. Atualmente, são membros pesquisadores do grupo: Corpo, história e memória Corpohirs – UESB. Além disso, são bolsistas do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação a Docência – PIBID/CAPES/UESB. 2 Docente do curso de licenciatura em Educação Física e responsável pela coordenação de esporte da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia - UESB. Atualmente, faz parte do corpo discente do mestrado em Desenvolvimento regional e Urbano da Universidade Salvador – UNIFACS e encontra-se membro da Associação Latino-americana de Gerência Desportiva – ALGEDE.

process of awareness of the sports community, when it comes to understanding aspects conceptual permeating the sport phenomenon and the realization of tools of participatory management. Keywords: Sport. Leisure. Management. Social control. 1. INTRODUÇÃO Através do surgimento do ministério do esporte, a participação coletiva no processo de construção das políticas públicas de esporte e lazer ganha espaço através da realização das conferências nacionais (BUENO, 2009). Logo, tal ação se apresenta enquanto possibilidade de materialização da gestão participativa, no que diz respeito às ações relacionadas aos fenômenos em questão. Desse modo, estrutura-se por meio das conferências nacionais de esporte e lazer, o sistema nacional de esporte, enquanto ferramenta de materialização da política nacional do esporte. Neste contexto, percebe-se que tal temática, sem dúvidas, é de grande valor na construção de uma sociedade mais consciente. Entretanto, conforme Starepravo (2011), os estudos que fundamentam essa área, ainda são escassos se comparados com outras linhas da política. Sendo assim, acredita-se que este fator pode estar atrelado as razões pelas quais não existam muitas produções acerca do controle social do esporte e do lazer. Logo, a escassez de produção cientifica na área bem como o interesse em investigar o referido setor, foram as molas propulsoras que motivaram o questionamento sobre a configuração do sistema nacional de esporte, no que diz respeito a gestão e ao controle social do esporte e lazer. Logo, através do presente estudo, utilizou-se enquanto referência de análise, as prerrogativas elucidadas no documento final da II Conferência de Esporte. Frente ao aspecto apontado, o presente trabalho buscou contribuir para a ampliação da produção científica, no campo das políticas públicas, servido também como instrumento de avaliação, para o corpo de gestores envolvidos com a temática. Logo, o principal fator motivacional da realização deste estudo perpassa pela afinidade do tema aliado ao processo de formação inicial e permanente dos pesquisadores em questão.

Sendo assim, a presente pesquisa se caracteriza como exploratória de abordagem qualitativa, visando assim, uma maior compreensão acerca do tema, no campo estudado. Para tal, Mendonça (2009, p.13) afirma que: “a pesquisa exploratória visa criar maior familiaridade em relação a um fato/fenômeno/processo, investigando o estágio em que se encontram as informações já disponíveis a respeito do assunto”. No que se refere aos instrumentos de coleta de dados, utilizou-se: a análise documental. Desta forma, acredita-se que a análise documental constitui um valioso método de coleta de informações, uma vez que podem ser obtidos documentos de diversas fontes, além de serem escritas ou não, primárias ou secundárias. Sendo assim, tal fator, permite um cruzamento de informações a fim de elucidar o objeto da pesquisa. Neste contexto, enquanto referencial teórico, o presente estudo teve como principal base os estudos de Frey (2000) sobre a policy arena, a qual compreende a avaliação da natureza, do impacto e da abrangência das ações politicas. Além disso, utilizou-se os indicadores de análise para políticas sociais de Boschetti (2009), a qual retrata a análise da articulação dos setores envolvidos no processo bem como a verificação das ferramentas de gestão e controle social relacionadas ao setor avaliado. Vale ressaltar que, outros autores foram utilizados no processo de análise complementar da referida investigação. 2. O CONTROLE SOCIAL E A GESTÃO: UMA BREVE REFLEXÃO ACERCA DA IMPORTÂNCIA

DA

CONSCIENTIZAÇÃO

DO

GESTOR

PARA

A

MATERIALIZAÇÃO DA PARTICIPAÇÃO POPULAR. O avanço da cidadania tem ocorrido historicamente por meio das conquistas de direitos, os quais, geralmente, são alcançados através de um constante processo histórico em que os indivíduos, grupos e nações lutam para adquiri-los (BRESSER PEREIRA, 1997). Neste contexto de conquistas, surge o controle social enquanto função administrativa, a qual permite a população, verificar e fiscalizar o cumprimento das ações planejadas pelo estado. Para Correia (2000, p. 67), o aspecto conceitual acerca do controle social estaria vinculado a idéia de:

[...] ser concebido em sentidos diferentes a partir de concepções de Estado e de sociedade civil distintas. Tanto é empregado para designar o controle do Estado sobre a sociedade quanto para designar o controle da sociedade (ou de setores organizados na sociedade) sobre as ações do Estado (CORREIA, 2000, p. 67).

Desta forma, Correia (2000) aponta que o controle social seria a participação do cidadão na gestão, na fiscalização, no monitoramento e no controle das ações da administração pública no acompanhamento das políticas. Logo, o controle social não seria uma “consulta a sociedade”, visto que, a consulta não gera controle sobre nenhum ato, logo, a mesma, nem sempre cria interação ou continuidade da relação entre as partes. Em contrapartida, Ricci (2009, p.9), traz uma atual definição sobre a temática: O conceito de controle social indica, portanto, a participação da sociedade civil na elaboração, acompanhamento e verificação (ou monitoramento) das ações de gestão pública. Na prática, significa definir diretrizes, realizar diagnósticos, indicar prioridades, definir programas e ações, avaliar os objetivos, processos e resultados obtidos.

Sendo assim, no Brasil, até o fim da ditadura não se falava em controle social por uma razão óbvia: autoritarismo e participação popular seriam termos antagônicos. Assim, Bravo e Correia (2009) revelam que, somente com o início do processo de redemocratização do país, a partir do fim do governo militar na década de 80, é que a expressão “controle social” passou a ser aclamada. Neste contexto, Rudá Ricci (2009) afirma que, tal conceito foi estabelecido legalmente com a promulgação da Constituição Federal de 1988, a qual estaria incutida elementos e diretrizes de democracia participativa, incorporando assim a participação da comunidade na gestão de políticas públicas. Desse modo, Bravo e Correia (2012) ainda apontam um dado muito relevante neste processo de redemocratização: Há que se considerar que a participação social passa de um status de proibição, no período da ditadura, a um status de obrigatoriedade, impulsionado por um arcabouço legal assegurado na Constituição de 1988, fruto de lutas sociais. Esta mudança ocorre em um contexto bastante diferente. Enquanto existia uma conjuntura de mobilização e efervescência política crescente nos anos de 1980, em que a sociedade civil era hegemonizada por forças progressistas, as décadas seguintes são marcadas por um progressivo refluxo dos movimentos sociais, no contexto

de reestruturação capitalista, receituário neoliberal e de consequentes contrarreformas do Estado (p.132).

Em contrapartida, BRITTO (1992) afirma que: [...] não se pode dizer que o controle social teve sua origem na Constituição Federal de 1988, mas, sem dúvida, a edição da denominada “Constituição Cidadã” foi um marco no delineamento do modelo que vem sendo construído desde então. Nos termos inaugurais do texto-mor (art.1º, parágrafo único), a democracia brasileira já não é exclusivamente representativa, resgatando-se o componente que faltava na aplicação do célebre conceito lincolniano de que a democracia é o regime que realiza o governo do povo, pelo povo e para o povo (p. 122).

Nesta lógica, fica claro que a década de 80 foi marcada por grandes conquistas populares, onde o povo estabeleceu o início de um novo ritmo social, orquestrados pelos mesmos, pelo direito popular e individual de participação política e liberdade de expressão nas suas variadas manifestações. Sobre isso Araujo et. al (2011) ressalta que: Ao final da década de 1980, a sociedade civil passava a assimilar uma nova cultura política de mobilização e isso pode ser percebido pela criação de diversos

movimentos

organizados,

centrais

sindicais,

entidades

profissionais que se colocavam como frentes de pressão direta na conquista de canais de participação popular em assuntos que dizem respeito à coisa pública (p.26).

Contudo, faz-se necessário a compreensão de que os direitos conquistados somente se consolidam quando efetivamente usufruídos, “entretanto, a participação cidadã, que não se reduz à participação eleitoral; é uma forma de exercer ativamente a cidadania, de tornar efetivos os direitos já consagrados em leis e construir novos direitos, através de instrumentos já conquistados” (JANE CARVALHO apud CÔRTES, 2003, p. 116). Tal problemática pode ser compreendida analisando a trajetória do esporte e lazer no Brasil, já que ambos só foram exigidos e reconhecidos como direito social na Constituição Federal de 1988 (ARAUJO et. AL 2011). Sendo assim, é possível perceber o curto espaço histórico onde o mesmo surgiu, embora, é sabido que, existe a necessidade na qual as políticas públicas referentes ao esporte e ao lazer devam ser colocadas em movimento, já que é notória, em diferentes áreas, o fato no

qual a sociedade não conseguirá cobrar dos responsáveis legais, aquilo que ela não compreende como importante e como direito legal. Sendo assim, para que a sociedade se aproprie dos direitos legais conquistados, é de suma importância fazê-los conhecidos. Como exemplo, destacase a Lei nº 10.257 que foi promulgada em julho de 2001 pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso, que assegura a: Gestão democrática por meio da participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade na formulação, execução e acompanhamento de planos, programas e projetos de desenvolvimento urbano (BRASIL, 2001).

Tendo em vista a lei acima citada, constata-se que o controle social é respaldado por lei. Logo, se faz urgente que a “teoria” seja colocada em movimento. Desse modo, Mezzadri et. al (2006, p. 53) apresentam diversos dados que salientam a ausência da população quanto à representatividade e controle das ações implementadas: O envolvimento da comunidade na elaboração das atividades de esporte e lazer ficou restrito a uma das quinze cidades investigadas, na qual são realizadas seis audiências públicas específicas por ano. Nas demais, a sociedade não participa da elaboração do Plano de Governo. Em outros municípios, a representação da sociedade nas Secretarias Municipais ocorre através das Associações de Bairros.

Neste sentido, vale destacar a área da saúde quanto pioneira nos estudos e nas promoções de Conselhos que promovem espaços para tais construções. Não é em vão, que tal setor possui o número considerável de produções cientificas que abordem o controle social dentro do referido campo de conhecimento (ARAUJO et. al, 2011). Vale citar neste momento, a ausência de representantes gabaritados e qualificados, ocupando os cargos políticos referentes ao esporte e ao lazer, embora se saiba que este não é um problema exclusivo da área. Sendo assim, torna-se limitado o desenvolvimento da reflexão x ação, tendo em vista, que o não entendimento científico sobre o assunto, condiciona as ações implementadas a atividades superficiais, agindo, portanto, como base no senso comum.

Nessa perspectiva, se pode afirmar que o controle social nas sociedades democráticas, teoricamente, emana do povo, já que cabe ao mesmo, o acompanhamento das ações propostas por seus representantes legalmente eleitos, no intuito de executar as políticas públicas projetadas e apresentadas por eles. Contudo, a realidade revela-se de modo diferente, tendo em vista, que a população de modo geral não é educada para fazer valer este controle social e muitas vezes, inconscientemente, é controlada pelo governo, através de programas sociais, de diferentes esferas, que não contemplam suas reais necessidades e direitos. Desta maneira, torna-se necessária uma reflexão sobre a configuração da gestão e do controle social incutidos nas prerrogativas do sistema nacional de esporte, para que se possa ampliar a compreensão sobre o fenômeno em questão. 3. O SISTEMA NACIONAL DE ESPORTE E LAZER E O CONTROLE SOCIAL: POSSIBILIDADES E LIMITAÇÕES Para analisar o controle social dentro do Ministério Nacional do Esporte, é necessária uma reflexão acerca da participação popular na sua construção, caso contrário, torna-se contraditório falar de controle social, sem confrontar, se o mesmo, aconteceu ou não, na criação desse importante ministério. Neste sentido constatouse que: O Ministério do Esporte, criado pela Medida Provisória 103, de 1º de janeiro de 2003, tem como missão “formular e implementar políticas públicas inclusivas e de afirmação do esporte e do lazer como direitos sociais dos cidadãos, colaborando para o desenvolvimento nacional e humano”. Sua tarefa é assegurar e facilitar o acesso de todos a atividades esportivas e de lazer que, quando orientadas, sejam por trabalhadoras e trabalhadores qualificados, como parte do compromisso do governo de reverter o quadro de injustiças, exclusão e vulnerabilidade social que aflige a maioria da população brasileira. Leva em conta, para isso, que o esporte e o lazer são direitos sociais e, por isso, interessam à sociedade, devendo ser tratados como questões de Estado, ao qual cabe promover sua democratização, colaborando para a construção da cidadania (BRASIL, 2004).

Partindo dos princípios da democratização e inclusão social, o Ministério Nacional de Esporte diz estabelecer relações éticas de parcerias entre as entidades, acerca do esporte educacional, de rendimento e de participação. Neste sentido, “a Conferência Nacional do Esporte, instituída pelo Decreto Presidencial de 21 de janeiro de 2004, configura-se como um espaço de debate, formulação e deliberação das Políticas Públicas de Esporte e Lazer para o país” (BRASIL, 2004).

Boschetti (2009), em sua análise, constata no que diz respeito ao assunto que: Na Constituição Federal, foram estabelecidas diretrizes de descentralização com autonomia das esferas governamentais e participação da sociedade no controle das ações governamentais, como base para estruturação das relações entre os poderes públicos das três instâncias e entre estes e a sociedade civil na implementação das políticas sociais.” (BOSCHETTI, 2009 p. 15)

Nessa perspectiva, no que tange as propostas aprovadas na plenária final, da II Conferência Nacional do Esporte, no Eixo I deste referido documento comprova-se que: O Sistema Nacional de Esporte e Lazer compreende o esporte educacional, o esporte de participação e o esporte de alto rendimento, não excludentes entre si, articulados de forma equânime em uma estrutura aberta, democrática e descentralizada que envolve os municípios, os estados e a união, nos âmbitos públicos e privado, primando pela participação de toda a sociedade (BRASIL, 2004).

Ao mesmo tempo, Frey (2000), ao explicar sobre a Política regulatória, a qual se resume às ordens e proibições, decretos e portarias, afirma que: Custos e benefícios podem ser distribuídos de forma igual e equilibrada entre os grupos e setores da sociedade, do mesmo modo como as políticas também podem atender a interesses particulares e restritos. Os processos de conflito, de consenso e de coalizão podem se modificar conforme a configuração específica das políticas. (FREY, 2000 p. 224)

Entretanto, faz-se importante frisar, que embora o decreto diga, no Eixo I, ser articulado de modo equânime, empiricamente, é possível afirmar, que não é isso que tem acontecido na realidade, tendo vista, que há uma atenção maior para o esporte de alto rendimento no país, que foi potencializada nos últimos anos, em decorrência dos megaeventos sediados pelo país. Outro fator que comprova essa hipótese são as políticas públicas “emergências” que foram desenvolvidas para atender a tais eventos, como exemplo a Copa do Mundo de Futebol que aconteceu em 2014 e as Olimpíadas que acontecerá em 2016, onde foram realizadas obras de mobilidade urbana, reformas e construções de estádios, segurança e etc. levando-se pouco em consideração, as demandas da população e suas reais necessidades. Em resultante, é que a população de fato se beneficia com algumas dessas políticas, em outros casos, como na construção de estádios/arenas em estados que não possuem campeonatos e tradição no futebol, como no o Amazonas, tais construções ainda não encontraram utilidades, o que comprova uma falta de maturidade pelos organizadores/gestores dos megaeventos.

Ainda neste Eixo, observa-se que: O Sistema Nacional de Esporte e Lazer tem por objetivo consolidar a Política Nacional do Esporte bem como criar mecanismos que garantam a execução e acessibilidade da mesma em todas as esferas da federação, e definir os papéis das entidades dirigentes do esporte e lazer. [...] Criação de pastas específicas de Esporte e Lazer nas esferas estaduais e municipais (Secretarias, Fundações, Autarquias), com autonomia administrativa e orçamentária, conselhos específicos e planos de desenvolvimento, para implementação e continuidade de políticas de esporte e lazer em todas as dimensões visando a inclusão social, e definindo prazo máximo para essa criação.[...] As competências de cada agente do Sistema Nacional de Esporte e Lazer devem ser pautadas pela colaboração e comprometimento, em respeito às características próprias de cada uma, sua autonomia e pertinência, priorizando a inclusão social, sendo que, sem prejuízo de suas prerrogativas. (BRASIL, 2004).

Tal eixo demonstra que teoricamente existe relação entre as esferas governamentais e que, as tais, discorrem de modo igualitário, lembrando que este é o

ideal

apresentado

pela

conferência,

de

modo

que

desperta

diversos

questionamentos acerca de sua veracidade quanto à aplicação. Neste sentido, Boschetti (2009) apresenta no aspecto 3, referente a gestão e controle social democrático o seguinte indicador de relação entre as esferas governamentais: (...) o principal interesse é compreender os papeis assumidos em cada uma das esferas – federal, estadual e municipal – na perspectiva de identificar se há autonomia das instâncias, se a definição de atribuições respeita e fortalece a descentralização na formulação e execução do política e/ou programa social analisado; objetiva verificar a quem cabe a definição de normas e diretrizes, a quem cabe a responsabilidade de financiamento e se ocorre complementação na aplicação dos recursos ou se há sobrecarga de alguma(s) instância(s); se há superposição de ações e competências; se existe estrutura institucional adequada (recursos materiais, financeiros, equipamentos e pessoal) e necessária à implantação da política social (p.15).

Dessa maneira, as prerrogativas do documento final da II Conferência indicam: Promover a articulação entre as escolas públicas e particulares e comunidades com intuito de abranger várias classes sociais, junto às ligas, associações e federações escolares ou não, sempre que possíveis ONGs e OSCIPs ligadas ao segmento (BRASIL, 2006);

Sendo assim, nota-se as atribuições dos órgãos gestores Estaduais e Municipais de Esporte e Lazer, definindo assim, articulações entre o estado e organizações não-governamentais: É cada vez mais frequente a participação de organizações nãogovernamentais (ONGs) na defesa de direitos e na execução de políticas

e/ou programas sociais. Nesse sentido, é fundamental avaliar e compreender a relação que se estabelece entre os órgãos públicos e as organizações não-governamentais (ONGs) que atuam na implementação da política e/ou programa avaliado; algumas questões podem nortear a análise: qual é o papel e a responsabilidade do Estado e das organizações nãogovernamentais na condução da política e/ou programa? O Estado assume a primazia da responsabilidade ou ocorre transferência de ações e responsabilidades para a sociedade? O Estado financia e repassa recursos para as ONGs? O Estado acompanha a aplicação dos recursos pelas ONGs? As ONGs atuam na perspectiva de defesa dos direitos ou executam programas com recursos públicos? Neste caso, o fazem com respeito aos direitos de cidadania ou atuam na perspectiva de benemerência e filantropia? (Boschetti, 2009, p. 16).

Logo, pode-se observar que essa ‘policy arenas’ trata-se de uma Política Regulatória, tendo em vista que, teoricamente, tal decreto visa tornar igualitário, a distribuição dos custos e benefícios nos diferentes setores e grupos da sociedade, como Frey (2000) relata que: Políticas regulatórias trabalham com ordens e proibições, decretos e portarias. Os efeitos referentes aos custos e benefícios não são determináveis de antemão; dependem da configuração concreta das políticas. Custos e benefícios podem ser distribuídos de forma igual e equilibrada entre os grupos e setores da sociedade, do mesmo modo como as políticas também podem atender a interesses particulares e restritos. Os processos de conflito, de consenso e de coalizão podem se modificar conforme a configuração específica das políticas (p.224).

Contudo, é importante salientar que apenas referendar métodos e técnicas de avaliação e não proporcionar uma discussão pautada que permita a saída da zona de conforto, a partir da reflexão crítica sobre o desenvolvimento de qualquer política, torna-se sem sentido, haja vista, que a discussão e produção cientifica, deveria de algum modo movimentar a “realidade” que está proposta e consequentemente, dá acesso ou despertar o interesse da população a fazer uso do controle social respaldado pela constituição (SILVA;BARRETO;NOGUEIRA, 2015). Nesta lógica, Boschetti (2009) apresenta uma coerente observação sobre o referido tema: A ênfase na aplicação de um arsenal de métodos e técnicas avaliativas, desprovido de criticidade acerca do conteúdo e papel do Estado e das políticas sociais no enfrentamento das desigualdades sociais, levou a uma profusão de produções teóricas sobre avaliação, mais preocupadas com a medição e desempenho de uma suposta intervenção técnica e neutra do Estado, do que interessadas em revelar suas funções e papel na produção e reprodução das desigualdades sociais (p.3).

Em consoante, a autora acrescenta que: “a avaliação de políticas sociais públicas deve ser orientada pela intencionalidade de apontar em que medida as

políticas e programas sociais são capazes e estão conseguindo expandir direitos, reduzir a desigualdade social e propiciar a equidade (p. 4)”. Sendo assim, percebe-se até aqui, que há certa utopia nos diferentes eixos, tornando possível a qualquer pessoa leiga sobre a temática, porém com senso crítico, perceber que o ideal construído na conferencia é fantasioso ou no mínimo omisso (SILVA; ALMEIDA;SILVA, 2015). Nesta perspectiva, Frey (2000) aponta que: Segundo a concepção do modelo de policy cycle, o processo de resolução de um problema político consiste de uma seqüência de passos. Mas, na prática, os atores político administrativos dificilmente se atêm a essa seqüência. Isso vale especialmente para programas políticos mais complexos que se baseiam em processos interativos, cuja dinâmica é alimentada por reações mútuas dos atores envolvidos (p. 229).

Ademais, o autor revelar que: Vale assinalar que o modelo heurístico do ‘policy cycle’ é um tipo puro idealizador do processo político, na prática dificilmente este se dá de pleno acordo com o modelo. Porém, o fato de os processos políticos reais não corresponderem ao modelo teórico não indica necessariamente que o modelo seja inadequado para a explicação desses processos, mas sublinha o seu caráter enquanto instrumento de análise (p.229).

Seguindo a linha de que a ‘policy cycle’ por vezes é idealizador de um processo político, percebe-se, claramente, que de fato isso se encaixa dentro do Ministério do Esporte, que apresenta o profissional de Educação Física em diferentes momentos como agente intermediário no controle social, mas que na verdade é substituído a todo o momento, pela figura dos ex-atletas. Comprovadamente, o Eixo II referente aos recursos humanos e formação, destaca que: Devem ser definidas as diversas esferas de atuação dos profissionais de esporte e lazer (com formação superior em educação física, agentes comunitários de esporte e lazer, profissionais da saúde, comunicação, entre outros), indicando para cada área profissional as suas atribuições específicas e compartilhadas, o nível de formação e qualificação profissional exigida e a necessidade ou não de registro profissional, observando-se as legislações vigentes [...] Constituem âmbito de atuação da educação física as seguintes competências: coordenar, planejar, programar, supervisionar, dinamizar, dirigir, organizar, prescrever, avaliar e executar trabalhos, programas, planos e projetos, bem como prestar serviços de auditoria, consultoria e assessoria, realizar treinamentos especializados, participar de equipes multidisciplinares e interdisciplinares e elaborar informes técnicos, científicos e pedagógicos, todos nas áreas de atividades físicas e do esporte, exercidas por profissionais habilitados (BRASIL, 2004).

Como apresentado no eixo acima, ao profissional de educação física é atribuído papeis fundamentas, por isso, a crítica aqui, não é diretamente aos exatletas que são colocados nestes cargos, mas sim, a qualquer outro agente que esteja executando as funções que não são destinadas a eles. Sem contar, a contradição que há dentro do sistema que, perceptivelmente, não garante que o que está no decreto, não respeitando, portanto, o que foi construído através de um longo processo político. O Ministério do Esporte assegura, no âmbito do controle social, a participação e inclusão de todos no processo, desde a aprendizagem das práticas esportivas e recreativas até as de alto-rendimento nos aspectos do planejamento, execução e avaliação. Também às práticas de identidade culturais brasileiras e de outras nacionalidades, em consonância com a Política Nacional de Esporte, observando os princípios éticos de inclusão, democratização e desenvolvimento humano e visando o projeto histórico de sociedade comprometido com a reversão do quadro de injustiça, exclusão e vulnerabilidade social. No Eixo III, que corresponde a Gestão e Controle Social, está escrito que “o Sistema Nacional de Esporte e Lazer tem por princípio a gestão democrática da esfera pública, objetivando o exercício pleno da cidadania, por meio da participação e da inclusão social”, bem como, valorizar “as gestões que se dão por meio de Conselhos, Conferências, Fóruns e Câmaras Setoriais, entre outros, garantindo, assim, a participação popular”. Dentre as atribuições referentes ao Conselho Nacional, Estadual e Municipal de Esporte e Lazer, encontra-se: “realização das audiências

públicas

semestralmente;

(BRASIL,

2004)”.

Percebe-se

então,

analisando os tópicos apresentados no eixo III, que há intenção de que esta a participação popular seja realizada, todavia, apenas intenção não é suficiente. Tais políticas apresentadas nos eixos acima, se mostram como direito reclamável judicialmente, de caráter universal, embora, sejam eventual e incerto, tendo em vista, que a qualquer momento pode ser reformulado. Sobre a natureza e tipo dos direitos e benefícios previstos e/ou implementados, Boschetti (2009) revela que, a análise politica perpassa por: “conhecer e explicitar suas propriedades e qualidades intrínsecas, de modo a mostrar a tendência evolutiva, bem como sua possibilidade de responder à determinada situação social e contribuir para reduzir

desigualdades sociais (p.11)”.

Desta forma, a autora aponta uma análise mais

profunda sobre o processo de materialização da ação política, no intuito de ampliar a compreensão sobre o referido tema. 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS É notória a legalidade da participação popular no que tange o esporte e ao lazer no Brasil, tendo em vista, as prerrogativas do sistema nacional de esporte. Todavia, percebe-se que tal ferramenta democrática encontra-se refém da boa vontade do gestor desportivo, seja por negligencia deste agente social seja pela falta de conhecimento da comunidade esportiva acerca dos instrumentos de gestão participativa. Somando-se a isso, ressalta-se a importância da conscientização e apropriação da população em geral, no que diz respeito a compreensão do esporte e lazer enquanto direitos sociais. Ainda neste sentido, destaca-se a necessidade de novos estudos na área, no intuito de compreender o fenômeno em questão de maneira mais profunda, tendo em vista, o processo embrionário das pesquisas na referida área.

REFERÊNCIAS ARAUJO, S.M.; JARA, I.C.; MAGALHÃES, Y.C.S. O processo de participação democrática e controle social nas políticas públicas de esporte e lazer. In: ARAÚJO, S.M. (Org.). Conselhos Estaduais de Esporte e Lazer no Nordeste Brasileiro: Participação popular e Controle social em questão. São Luís: Edufma, 2011, p.17-80. BHOSCETTI, I. Avaliação de políticas, programas e projetos sociais. In: Serviço Social: direitos sociais e competências profissionais. São Paulo, 2009. BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Congresso Nacional, 1988. BRASIL. Lei nº 10.257, de 10 de julho de 2001. Regulamenta os arts. 182 e 183 da Constituição Federal, estabelece diretrizes gerais da política urbana e dá outras providências.. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 10 de julh. 2001. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/leis_2001/l10257.htm> Acesso em: 25/05/2015. BRASIL. MINISTÉRIO DO ESPORTE, PORTARIA Nº 13 DE 03 DE FEVEREIRO DE 2006. II Conferência Nacional do Esporte - Documento Final. Disponível em: http://portal.esporte.gov.br/conferencianacional/conferencia2/textoBasico.jsp Acesso em: 16 de Junho de 2015.

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