A globalização e a produção do espaço urbano: um olhar sobre a migração e os impactos sociais na Região Metropolitana de Campinas

June 15, 2017 | Autor: Ednelson Dota | Categoria: Globalization, Social impact, Urban Space
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A globalização e a produção do espaço urbano: um olhar sobre a migração e os impactos sociais na Região Metropolitana de Campinas°

Ednelson Mariano Dota• José Marcos Pinto da Cunha♦

Resumo A globalização, enquanto faceta contemporânea do modo de produção capitalista tem gerado diferentes modelos de capitalismo e de resultados em cada localidade. Estas configurações e a distribuição destes resultados são desiguais, a partir da exploração e da maximização dos recursos distribuídos de forma também desigual pelo território, culminando em novas divisões sociais e espaciais do trabalho. Este artigo visa analisar a globalização enquanto processo de âmbito econômico, mas com relevantes reflexos sociais, e busca a partir da reflexão com vários autores caracterizar quem são e como agem os atores locais e globais, a partir das suas diferentes escalas de atuação. Por fim, analisamos a RM de Campinas como espaço de destaque econômico e demográfico, enfatizando como o crescimento econômico e o aumento das trocas comerciais desta região têm se apresentado em relação aos resultados verificados entre 2000 e 2010, a partir dos Censos Demográficos.

Palavras-chave: globalização; espaço urbano; impactos sociais; RM de Campinas.

Trabalho apresentado no XII Seminário Internacional da Rede Iberoamericana de investigadores sobre Globalização e Território, realizado entre 01 e 05 de Outubro de 2012, em Belo Horizonte-MG. °

Geógrafo, mestre e doutorando em Demografia pelo Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) e Núcleo de Estudos de População (NEPO) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). [email protected]; •

Demógrafo, professor do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH), Departamento de Demografia e pesquisador do Núcleo de Estudos de População (NEPO), ambos da Unicamp. [email protected].



Introdução A globalização, entendida como um dos resultados do desenvolvimento do modo de produção capitalista contemporâneo, tem trazido uma série de resultados distintos para as diferentes regiões do globo. De modo geral, a ideia de que o aumento das trocas de produtos, serviços e informações entre países reduziriam a distância econômica existente entre eles caiu por terra, e observou-se na verdade um aumento nas trocas internacionais concomitantemente ao distanciamento econômico entre os países ricos e pobres. No atual contexto de inserção desigual dos países no mercado global e, consequentemente, de geração de riquezas desproporcionais, observa-se uma clara propensão ao aumento da desigualdade social, não apenas nos países mais pobres, mas também naqueles que sempre foram considerados exemplos de igualdade sob a égide do modo de produção capitalista, como os Estados Unidos e a Suécia (ATKINSON, 2003). O enquadramento em um modelo de desenvolvimento social e econômico relativamente semelhante é apontado como fator causal, visto que, para competir no mercado e “alcançar o desenvolvimento” devem-se seguir políticas direcionadas, que não necessariamente visam atender as demandas sociais de sua respectiva população. Como salienta Sassen (1998:44), “a economia mundial jamais foi um acontecimento planetário; sempre teve fronteiras mais ou menos definidas”. Como processo econômico em nível internacional, a globalização tem culminado em consequências locais. Isto se deve, sobretudo, às mudanças no modo de atuação dos Estados nacionais, que de forma mais ou menos explícita utilizam o Consenso de Washington como modelo de ação política. Este consenso confere as características de atuação, legitima e coloca este modelo de desenvolvimento econômico como único possível e adequado para o sucesso econômico das nações (SANTOS, 2002). Os impactos da globalização em nível nacional, nas estruturas e configurações urbanas, e, mais especificamente, no caso brasileiro, está ainda pouco explorado. O Brasil, como um dos principais mercados consumidores do globo se apresenta atualmente como destino interessante aos fluxos de capitais e investimentos estrangeiros. Como resultado, observase a formação de territórios especializados, alguns focados na produção de informação e no gerenciamento do mercado, como é o caso do município de São Paulo, e outros espaços voltados para a produção física dos produtos, como ocorre de forma muito diversificada no restante do país. Essa divisão regional do trabalho é também uma divisão regional da renda, dos empregos e da população. As dinâmicas geradas por essa distribuição são diversas, e impactam a estruturação das cidades, a produção do espaço urbano, a redistribuição espacial populacional e a mobilidade num contexto mais amplo. Estes processos mostram-se de extrema relevância para as condições de vida da população e, desta forma, a globalização, mesmo que pareça distante do âmbito local, influencia a vida cotidiana da população. Cabe salientar, entretanto, que não vemos a relação entre o local e o global de forma dicotômica, pois esta relação não é direta, mas mediada por uma série de fatores, agentes e interesses que alteram os modelos preexistentes e criam outros em cada espacialidade distinta. O entendimento destas ações nas distintas escalas se mostra relevante, pois são nelas que atuam os diversos agentes, cada um num nível de abrangência segundo suas possibilidade e interesses.

Busca-se neste trabalho analisar alguns resultados da globalização na RM de Campinas. Para tal objetivo, utilizaremos dados dos Censos Demográficos de 2000 e 2010, analisando a evolução de alguns indicadores sociodemográficos no período, além dos dados da balança comercial, que possibilitará a análise da forma e do peso das variações em relação ao comércio internacional para cada um dos municípios componentes da região.

1. Globalização: como e de que forma? O termo globalização tem sido usado de forma genérica para se referir à relativa unicidade contemporânea nas mais diversas situações, onde modos de vida de uma localidade passam a ser assimilados por outros povos, com costumes e tradições completamente distintos. Podemos citar exemplos em praticamente todos os setores da vida moderna, como alimentação, música, roupas etc. O uso do termo de forma generalista, entretanto, não está dissociado daquilo que acreditamos que de fato ele represente, mas está empregado nos resultados deste processo, que é mais complexo e abrangente. Concorda-se assim com Dicken (2004), para quem “globalization is, then, a complex syndrome of processes, in which actor-networks and macro-structures interconnect in extremely complex ways”. Para Milton Santos, a globalização é o ápice do processo de internacionalização do capitalismo, sendo explicada sobretudo pelo avanço das técnicas e pelo estado da política (SANTOS, 2000). A visão da globalização enquanto processo advém do entendimento de que a forma de organização dos negócios, que segue a lógica espacial das empresas, denominadas transnacionais, é resultado do atual modelo de desenvolvimento do capitalismo, assentado em intensas trocas de capital, produtos e serviços entre as mais diversas partes do globo. Segundo Harvey (1994), a expansão do capitalismo para áreas “inexploradas” é uma necessidade recorrente deste modo de produção, visto que a produção e o consumo devem ser crescentes para que o crescimento econômico possa se realizar. Neste sentido, a incorporação de países (e regiões) periféricos ocorre para suprir a necessidade dos países centrais em aumentar a sua riqueza, e não para que possam usufruir dos resultados positivos gerados, que é observado nos países mais desenvolvidos para uma grande parte da população, enquanto nos países periféricos para pequenas partes do conjunto populacional. Neste contexto, apesar dos esforços constantes1, o que se vê é um aprofundamento da desigualdade social nestes países e da desigualdade entre países ricos e pobres. A visão de Santos (2000) ajuda na distinção da percepção do processo e da realidade empírica na sociedade: para o autor, a globalização é também uma forma de ideologia, que cria a impressão de que o mundo está à mão de todos quando, na verdade, para a grande maioria, restam apenas “migalhas” da riqueza gerada. “Um mercado avassalador dito global é apresentado como capaz de homogeneizar o planeta quando, na verdade, as diferenças locais são aprofundadas” (SANTOS, 2000:19). O aumento da desigualdade e das diferenças tem sido o resultado de um processo que em seu discurso tem o objetivo de reduzir as desigualdades dos países e as condições da população residente em seus territórios. Neste sentido, para caracterizar estes resultados (locais) e compreendê-los à luz dos processos econômicos vigentes (globais), devemos buscar formas de olhar a organização dos processos econômicos e os agentes envolvidos.

1

Ao menos na retórica.

“A tese fundamental é que as transformações ocorridas durante as últimas décadas na composição da economia mundial, acompanhando a mudança na direção de prestação de serviços e das finanças, suscita a renovada importância das grandes cidades como locais destinados a certos tipos de atividades e funções.” (SASSEN, 1998:16).

Falando sobre as implicações da globalização nas grandes cidades, Sassen (1998:18) reflete sobre o impacto que isso exerce sobre a ordem social e econômica. Com isso chama a atenção para o fato de que “o rápido crescimento de indústria financeira e de serviços altamente especializados gera não apenas empregos técnicos e administrativos de alto nível, como também empregos que não exigem qualificação e que apresentam baixa remuneração”. Além dessas novas desigualdades interurbanas “estamos também presenciando novas desigualdades econômicas nas cidades, sobretudo nas cidades globais e em suas contrapartidas regionais”. Para a autora, a globalização tem exercido inúmeros impactos sobre as cidades e os sistemas urbanos. Em alguns casos, contribui para o desenvolvimento de novos pólos de crescimento situados fora das grandes aglomerações urbanas e, em outros, aumenta o peso das aglomerações urbanas principais. Para compreender a complexidade dos resultados gerados, Dicken (2004) propõe uma metodologia para a análise da globalização numa perspectiva estrutural, através do comportamento dos diversos agentes e como estes comportamentos podem alterar os resultados nos níveis locais. Esta perspectiva de análise diferencia cinco grandes atores, com representatividade e interesses convergentes e/ou conflitantes, que resulta nos distintos modelos de capitalismo, além de diferentes configurações espaciais em cada parte do globo. Os agentes considerados pelo autor são: as corporações transnacionais, os Estados nacionais, os consumidores, o trabalho (enquanto instituição) e a sociedade civil (DICKEN, 2004). A partir do resultado das disputas entre os atores, cria-se uma relação dialética, pois as características do capitalismo em cada nação culminam em relações distintas entre atores, assim como estas relações molda de forma específica o modo de produção (DICKEN, 2004), temporal e espacialmente, distribuindo a partir destas configurações os bons e maus resultados que gera. O modo de produção na globalização é a nova divisão internacional do trabalho, que visa à maximização dos lucros a partir da exploração da mão-de-obra e recursos de países periféricos. Para isso, transfere a produção com baixo valor agregado para estes países, pagando menos para a geração dos insumos básicos necessários para a manutenção das economias dos países centrais. Esta divisão reforça as desigualdades internacionais, ao mesmo tempo em que é vista com bons olhos pelos países pobres, pois representa desenvolvimento e progresso, mesmo que estas positividades fiquem restritas a pequenas parcelas da população. Segundo Evans (1979), as desigualdades sociais geradas pelo atual modelo de produção se assenta na manutenção de um equilíbrio delicado entre os três parceiros [burguesia estatal, transnacionais e o capital local, que] milita contra qualquer possibilidade de um tratamento sério às questões de redistribuição de rendimentos, mesmo que membros da elite expressem um apoio ao princípio teórico da redistribuição dos rendimentos (EVANS, 1979:288 apud SANTOS, 2002:33)

Desta forma, sendo a questão da distribuição de renda ponto chave para que os bons resultados alcancem maiores proporções, é o embate de interesses, entre quem comanda o trabalho e aqueles que efetivamente trabalham que pode resultar em perspectivas mais coerentes do ponto de vista social.

1.1 Agentes e escalas em tempos de globalização Quem são os agentes, como e onde eles agem é ponto chave para a compreensão da distribuição dos resultados da globalização. Uma das considerações mais relevantes sobre estes pontos é que, quando falamos em escalas não estamos nos referindo às escalas cartográficas, pois num contexto de grande complexidade, como as relações de poder e seus resultados efetivos, o campo de ação de cada um dos agentes varia de forma relevante, produzindo sobreposições de interesses e de ações em cada porção do território (DICKEN, 2004). Desta forma, a escala aqui considerada é a geográfica, para uma maior apreensão dos processos, que não necessariamente casam com os limites políticos dos países e regiões. A ação das transnacionais ocorre em escala global, diferentemente da ação dos Estados, que preponderantemente age na escala da nação2. O trabalho, enquanto instituição, e a sociedade civil organizada trabalham na escala local e, portanto, influenciam e são influenciadas pelas relações de poder de seus respectivos países. A escala, neste sentido, tem um papel central nas possibilidades de (re)negociação, visto que, enquanto as forças sociais atuam principalmente em escalas reduzidas, os seus interesses (salários, participação nos resultados etc.) são negociadas em nível global, a partir de comparações de preços entre países3. As condições territoriais diferenciadas são geradas, segundo Dicken (2004), a partir das interações entre os atores, que efetivam as mudanças nas configurações geográficas da economia global nas diferentes escalas. Neste sentido, salienta ainda que a força de cada agente se assenta na habilidade de extrair vantagens localizacionais, ou seja, cada ponto do território tem um valor, e a possibilidade de extrair dado valor representa a força de um ator frente aos outros. O espaço urbano brasileiro pode ser apontado com um dos grandes exemplos do produto gerado a partir da ação dos atores no território: Martine e McGranahan (2010) salientam que a transição urbana brasileira foi um processo de exclusão e geração de desigualdades, podendo inclusive ser utilizado como exemplo para outros países realizarem uma transição socialmente mais justa. O processo de urbanização no Brasil ocorreu de forma rápida e

não se processou de forma harmoniosa, tendo sido particularmente difícil para os contingentes mais pobres que, apesar de representar parcela majoritária do crescimento urbano e um motor essencial do desenvolvimento nacional, raramente tiveram seu lugar contemplado na expansão urbana (MARTINE; MCGRANAHAN, 2010:11).

2

A escala regional seria a mais interessante para pensar as influencias entre países, excetuando os EUA, com maior força política e econômica. 3 O trabalho é o principal meio de redistribuição de renda, sendo que as empresas buscam regular o preço da mão-de-obra globalmente, culminando assim numa impossibilidade de negociação justa.

O espaço urbano é ponto chave para a reprodução do capital, local em que se assenta parte relevante dos investimentos econômicos. Harvey (2011) cita que a produção das cidades há muito é a base para a reprodução do capital, tanto pela necessidade das moradias quanto pela crescente valorização destes locais, que culmina numa cumulativa duplicação do valor inicialmente investido. A cidade é o lócus de reprodução social, local na qual se realizam as atividades cotidianas. O processo de produção e reprodução do espaço urbano, neste sentido, reflete diretamente nas condições de vida da população, visto que modifica os usos e direcionam os fluxos populacionais (DOTA, 2011), alterando de forma efetiva a configuração dos lugares e a distribuição das pessoas pelo espaço.

2. Concentração e desconcentração no Estado de São Paulo Sendo a globalização a faceta mais recente do modo de produção capitalista, no Brasil o Estado de São Paulo é a área mais integrada a este mercado, local de onde a maior parte das empresas transnacionais controla e produz seus bens e capitais em território brasileiro. A concentração exercida pelo Estado de São Paulo remonta ao século XIX, época em que o café se expandiu por quase todo o estado e criou riquezas e infraestrutura, que posteriormente foi a base para a industrialização brasileira. A industrialização de substituição, durante a Segunda Guerra Mundial e, a partir da década de 50, a chegada das primeiras multinacionais iniciou o período de internacionalização da economia brasileira, e propiciaram a São Paulo a continuidade como principal centro econômico do país. O vigor econômico do Estado de São Paulo e a desigualdade regional em âmbito nacional culminaram em relevantes fluxos populacionais, que segundo Singer (1976), podem ser explicados a partir da estagnação das áreas de origens associado à desigualdade regional, que tornava outros lugares mais atrativos. Assim, desde a década de 40 o estado paulista recebe relevantes fluxos de migrantes, que foram essenciais para o desenvolvimento paulista observado na segunda metade do século XX, e que levou o estado a concentrar em 2010 aproximadamente 21,6% da população brasileira, conforme Figura 1.

Figura 1. Gráfico da proporção de população residente no Estado de São Paulo em relação ao Brasil e à região Sudeste. 1872-2010 60% 50% 40% 30% 20% 10% 0% 1872 1890 1900 1920 1940 1950 1960 1970 1980 1991 2000 2010 São Paulo no Brasil

São Paulo no Sudeste

Fonte: FIBGE. Censos demográficos de 1872 a 2010.

A influência e a concentração exercida sobretudo pela Região Metropolitana de São Paulo culminaram na formação de uma das maiores aglomerações urbanas do mundo, que é considerada a grande metrópole nacional (IBGE, 2008), devido a influencia exercida em todo o território nacional. O crescimento demográfico é um indicativo da centralidade do estado paulista, entretanto, no âmbito intraestadual, as dinâmicas apresentam-se tão diferenciadas quanto aquelas observada em nível nacional. A concentração econômica exercida pelo Estado de São Paulo começa a se reduzir a partir da década de 1970, em dois sentidos: do estado em relação ao país, e da RM de São Paulo, principalmente da capital para o restante do estado. Esta desconcentração não foi um processo automático, mas influenciado por políticas voltadas para a redistribuição da indústria, de forma a privilegiar outros pontos do território. Segundo Negri (1994:174) a preocupação com o “caos urbano” inicia-se nos anos 60, fazendo com que os governos federal e estadual planejassem e iniciassem a implementação destas políticas4. A partir deste objetivo, várias foram as ações direcionadas para que outros pontos fossem inseridos no processo de alocação industrial. Segundo Negri (1994), os programas mais relevantes para a descontração ocorrida no Estado de São Paulo foram o PROINDE (Programa de Interiorização do Desenvolvimento), o Programa de Cidades Médias e o Programa de Descentralização Industrial, sendo todos os programas de nível estadual. No contexto geral, o objetivo destes programas era fazer investimentos em infraestrutura que tornassem outros pontos do território atrativos, e dessa forma descentralizasse os investimentos da RM de São Paulo. Os investimentos destes programas ocorriam na interligação rodoviária dos principais centros urbanos, e na adequação da infraestrutura básica dos municípios, como pavimentação das principais vias, pontes e viadutos para facilitar acesso, além de saneamento básico e escolas primárias (NEGRI, 1994). A atratividade exercida por algumas áreas do interior a partir dos investimentos estruturais aliada aos problemas da grande aglomeração culminou no sucesso dos programas, com a desconcentração se efetivando. Dentre os pontos principais para o entendimento deste processo, pode-se citar, para a capital, a especulação imobiliária, que encarecia o custo da terra, os problemas de aglomeração, como o transito e as enchentes, que influenciavam a produtividade da mão-de-obra, além da organização dos sindicatos Negri (1994:204). Neste contexto de desconcentração, as cidades médias do interior já apresentavam na década de 60 uma importante base industrial de nível local e regional (BAENINGER, 1999). Mas foi apenas a partir da desconcentração industrial que de fato a infraestrutura relativamente desenvolvida do interior, herança da época do café, passou a receber investimentos de indústrias de maior amplitude. A ação estatal, com investimentos direcionados foi de grande importância nesse processo. Segundo Cano (1988 apud Baeninger, 1999), aqueles com maior peso foram: a implantação da refinaria de petróleo em Paulínia, os investimentos no PROÁLCOOL, com importantes rebatimentos nas regiões de Campinas e Ribeirão Preto, a instalação de institutos e empresas tecnológicas em Campinas, além da indústria aeronáutica e militar no Vale do Paraíba. Segundo Baeninger (1999) a desconcentração industrial sentido interior foi fruto da combinação de vários fatores: (1) de forças endógenas, entendida como a infraestrutura e a rede urbana estabelecida no interior; (2) do processo de modernização da agricultura, que 4

Em 1959, a Grande São Paulo detinha 41,0% do valor das transformações industriais do país, e 73,8% do total do estado (NEGRI, 1994).

direta e indiretamente influenciava a criação de postos de trabalho na indústria para reparação e manutenção, e nos serviços para o transporte e armazenagem dos produtos; (3) as deseconomias de aglomeração, que direcionaram os investimentos da RM de São Paulo para áreas interioranas, e os (4) incentivos governamentais e seus reflexos. A partir destes fatores, o Estado de São Paulo observou um crescimento importante do seu interior, inclusive com a constituição de três novas regiões metropolitanas5 e a formação de um eixo urbano-industrial de grande proporção, incluindo as Regiões Metropolitanas de São Paulo, Santos, Campinas e a nova, do Vale do Paraíba, conforme Tabela 1. Tabela 1 Proporção de população do Estado de São Paulo em regiões metropolitanas6 e não metropolitanas. 1980, 1991, 2000 e 2010. População e proporção

RM de Campinas RM da Baixada Santista RM de São Paulo Restante do Estado de São Paulo

1980

1991

2000

2010

1.269.559

1.852.813

2.332.988

2.792.855

5,1

5,9

6,3

6,8

957.889

1.214.980

1.473.912

1.662.392

3,8

3,9

4,0

4,0

12.549.856

15.369.305

17.852.637

19.667.558

50,3

48,9

48,3

47,7

10.175.934

12.999.175

15.314.841

40,8 41,4 41,4 Fonte: FIBGE. Censos Demográficos de 1980, 1991, 2000 e 2010.

17.100.878 41,5

Apesar da importância relativamente menor das regiões metropolitanas no contexto estadual, a maior parte da população vive numa organização socioespacial metropolitana, fruto da desconcentração industrial e demográfica, que culminou no crescimento das cidades e expansão da industrialização para as cidades médias, principalmente aquelas mais próximas da capital e cortada por rodovias. A complexidade social do contexto metropolitano, que pode ser observada em todas as grandes cidades do país, seria uma reprodução das desigualdades na escala local. O território, local na qual se assentam os atores da globalização é utilizado de forma diferente por cada um deles. A localização espacial, portanto, é a busca pela maximização dos potenciais ganhos e, consequentemente, culmina na criação de distinções espaciais relevantes, tanto na escala local - com os bairros representando claramente a divisão social do trabalho - quanto na escala regional, onde a infraestrutura disponível é reflexo da divisão espacial do trabalho.

5

A RMBS, formada por nove municípios foi criada a partir da Lei Complementar nº 815, de 30/07/1996 e a RMC, composta por dezenove municípios, foi criada pela Lei Complementar n° 870, de 19/06/2000. Vale registrar ainda que a RMSP foi instituída pela Lei Complementar federal nº 14, de 8/06/1973, e disciplinada pela Lei Complementar estadual nº 94, de 29 de maio de 1974. Formada por 39 municípios, as diretrizes da RMSP estão colocadas na Lei Complementar nº 1.139, DE 16/06/2011. A RM do Vale do Paraíba foi criada a partir da lei complementar estadual 1166/2012. 6 Devido a recente constituição, manteve-se a RM do Vale do Paraíba com o “restante do Estado de São Paulo”.

Pensar nos fluxos, para tanto, mostra-se essencial, pois são eles que determinam em grande medida as características e a posição de determinado lugar na hierarquia urbana. É o caso da RM de Campinas, que sendo um dos principais focos dos fluxos advindos da desconcentração a partir da capital, apresenta-se hoje como uma das áreas mais dinâmicas e economicamente importantes do país. Cabe salientar, entretanto, que os processos verificados na segunda metade do século XX no Estado de São Paulo não criou homogeneidade, mas o crescimento econômico significou em grande medida desigualdades, fruto do próprio modelo de desenvolvimento capitalista.

3. O contexto da RM de Campinas A Região Metropolitana de Campinas apresenta-se atualmente como uma das áreas mais dinâmicas do Brasil, e um dos principais resultados tem sido um intenso crescimento demográfico, maior do que a média do estado e do país7. A centralidade exercida pela RM de Campinas para os fluxos populacionais extrapola os limites estaduais, visto que recebe relevante contingente de migrantes de outros estados, que representou 38,9% dos migrantes entre 1986 e 1991, 32,5% entre 1995 e 2000, continuando relevante entre 2005 e 2010, tendo representado 35,0% dos migrantes, conforme Tabela 2.

Tabela 2. Proporção dos migrantes segundo origem. RMC. 1991, 2000 e 2010. Interestadual

Intraestadual Intrametropolitano

Total

1991

38,9

43,0

18,1

288.645

2000

32,5

45,3

22,2

291.370

2010

35,0

38,9

26,1

349.869

Fonte: Censos Demográficos de 1991, 2000 e 2010.

Apesar de ainda receber uma relevante proporção de migrantes de outros estados, o chama atenção na dinâmica migratória desta região é o aumento da relevância movimentos intrametropolitanos. A ascensão da migração intrametropolitana já esperada (ver DOTA, 2011; CUNHA, 2010), visto que o processo de metropolização conurbação acabam por constituir, em grande parte, uma única área urbana.

que dos era e a

A migração intrametropolitana apresenta características distintas em relação às outras modalidades migratórias: o fato deste migrante acumular um maior conhecimento da região culmina numa migração com maior propensão às questões habitacionais. Neste sentido, os fatores com maior relevância para o direcionamento dos fluxos populacionais estão ligados à produção e estruturação do espaço urbano e, portanto, os fluxos de capitais e investimentos nas cidades podem ser importantes indicativos da formação ou não de lugares atrativos aos migrantes, inclusive de forma seletiva, a partir de loteamentos populares ou de alto padrão. Em relação à questão habitacional, o crescimento do número de domicílios na última década foi maior do que o crescimento populacional para todos os municípios da região (Figura 2), culminando numa redução do número médio de pessoas por domicílio, que passou de 3,55 em 2000 para 3,21 em 2010. 7

Segundo o IBGE, entre 2000 e 2010 o crescimento geométrico médio anual da RM de Campinas foi de 1,83%, enquanto o Estado de São Paulo cresceu 1,08% e o Brasil 1,16%.

População

RM de Campinas

Vinhedo

Valinhos

Sumaré

Santo Antônio de…

Pedreira

Paulínia

Monte Mor

Nova Odessa

Jaguariúna

Itatiba

Indaiatuba

Hortolândia

Holambra

Engenheiro Coelho

Cosmópolis

Campinas

Artur Nogueira

Americana

7,00 6,00 5,00 4,00 3,00 2,00 1,00 0,00

Santa Bárbara…

Figura 2. Gráfico das taxas de crescimento médias anuais de população e domicílios. Municípios da RMC. 2000-2010.

Domicílios

Fonte: FIBGE. Censos Demográficos de 2000 e 2010.

O vigor do setor imobiliário, neste sentido, pode ser apontado como um dos fatores explicativos do expressivo crescimento da migração intrametropolitana, pois a dinâmica vigente cria oportunidades e relativiza outros fatores de permanecia, como a distância casatrabalho. Cabe, entretanto, duas questões para um melhor entendimento quanto aos processos desta última década: como medir os impactos da globalização para torná-la comparável com outros indicadores? Os processos urbano-metropolitanos nesta região estão culminando em respostas socialmente melhores? Primeiramente, temos clara a dificuldade de se quantificar impactos um processo tão amplo e complexo como este, pois as suas raízes se assentam nos mais diversos ramos e setores, de distintas formas em cada um. Pela sua amplitude, buscaremos neste momento apenas um dos seus aspectos, que pode nos dar ao menos uma noção daquilo que ocorreu na última década nesta região. Para tal objetivo nos utilizaremos das importações e exportações, considerando que uma das principais características do atual momento, segundo Santos (2000), é a fluidez de capitais e mercadorias pelo espaço globalizado. O uso destes dados mostra-se relevante se considerarmos que as transnacionais estão entre os principais atores da globalização, e são, justamente, as que mais têm participação no comércio internacional, importando e exportando produtos e componentes entre suas filiais. Pode-se considerar, desta forma, que os dados da balança comercial expressam a divisão territorial do trabalho (ARROYO, 2012), podendo ser um interessante indicador para a compreensão das desigualdades territoriais. Na Tabela 3 podemos verificar a evolução das exportações, importações e da movimentação (exportação somada a importação) entre os anos de 2000 e 2010. O

incremento na movimentação verificado no período chegou a 138,6% para a região, variando de forma distinta em cada município8.

Tabela 3. Variação das exportações, importações e movimentação bruta (%). Municípios da RMC. 2000-2010 G * 3 Americana 1 Artur nogueira 2 Campinas 2 Cosmópolis 3 Engenheiro Coelho 1 Holambra 1 Hortolândia 1 Indaiatuba

Exportação Importação Movimentação Participação Participação (a) (b) (a+b) 2000 2010 46,4 4,5 89,2 8,5 5,2 341,3 116,1 722,6 0,1 0,1 69,5 17,6 103,0 31,3 22,2 1686,8

-1,8

196,3

0,8

1,0

-50,3

1.564,4

-44

0,7

0,2

273,2

377,5

322,9

0,1

0,2

308,3

389,2

5,7

11,6

441,4

574,1

3,7

10,4

1045,9 937,6

1 Itatiba 3 Jaguariúna

784,2

211,8

331,1

0,9

1,7

40,2

-33,7

-36

25,7

6,9

2 Monte Mor 3 Nova Odessa

96,8

295,6

195,8

1,6

2,0

39,1

128,5

65,8

1,6

1,1

1 Paulínia 3 Pedreira

381,3

304,6

323,5

7,8

13,8

-0,7

1.101,9

53,9

0,3

0,2

6,1

135,3

88,8

1,1

0,8

23,2

115,9

2 Santa Bárbara d’Oeste 2 Santo Antônio de Posse 1 Sumaré 2 Valinhos 1 Vinhedo RM de Campinas

105,5

0,2

0,1

397,4

542,5

491,4

5,9

14,6

87,2

177,1

133,2

2,3

2,2

600,3

569,0

577,8

2,0

5,6

104,7

158,2

138,6

100,00

100,00

Fonte: Secretaria de Comércio Exterior. *Grupo segundo evolução da participação da balança comercial.

Quando se observa a participação dos municípios no início (2000) e final (2010) do período, transparecem diferenças relevantes entre eles. Primeiramente cabe salientar a redução da concentração dos fluxos em Campinas, que detinha 31,3% dos negócios em 2000 e reduziu sua participação para 22,2% em 2010. Além da metrópole, chama à atenção a queda de participação de Americana e Jaguariúna, que somadas passaram de uma participação de 34,2% em 2000 para 12,1% em 20109. Em relação aos municípios que aumentaram a sua participação no período, salienta-se Holambra, Hortolândia, Indaiatuba, Itatiba, Paulínia, 8

O crescimento médio do PIB per capita da RM de Campinas entre 2000 e 2009 foi de 130,00%, sendo que apenas Paulínia apresentou leve redução de 3% no período. Apesar da limitação deste indicador, aqui ele nos serve para demonstrar que o crescimento econômico regional no período ocorreu de forma relevante. 9 Devemos considerar que existe uma limitação analítica nos dados de importação e exportação, pois estes valores podem variar de forma significativa de um ano para outro. Apesar disto, a análise num período mais longo de tempo, como realizado aqui, tende a minimizar este problema, visto que em geral a variação observada entre os anos pode ser considerada “natural”, não perfazendo algum evento raro que possa ter ocorrido num respectivo ano.

Sumaré e Vinhedo, que somados passaram de 26,1% em 2000 para 57,9% em 2010, tendo mais do que dobrado a sua parcela. Neste contexto, para facilitar a análise que segue, dividiremos os municípios entre (1) aqueles que tiveram aumento significante de participação entre 2000 e 2010 (Aumento); (2) aqueles com variação pequena (Manutenção) e (3) aqueles com queda significativa na participação (Redução)10. Esta divisão possibilitar-nos-á a verificação dos possíveis impactos sociais da variação das trocas mercantis realizadas pelos municípios. Deste modo, pode-se analisar se o esforço realizado pelos municípios para atração de investimentos que muitas vezes tem um alto custo através da redução de impostos e cessão de áreas tem apresentado resultados socialmente interessantes. Para a divisão analítica proposta: os municípios com aumento da participação (1) são aqueles que apresentaram crescimento maior do que 30%; os municípios com redução de participação (3) são aqueles que apresentaram decréscimo maior do que 30%; os municípios no grupo “manutenção” (2) foram aqueles com variação entre -30% e 30%, dados considerados a partir da variação da movimentação (importações somadas às exportações) entre 2000 e 2010.

3.1 Resultados: onde estão? A partir da divisão dos municípios em três grupos, como já salientado, buscamos analisar alguns indicadores básicos em relação à renda e à condição de ocupação do domicílio, dois pontos centrais para as condições de vida da população nas áreas urbanas. Resultados interessantes puderam ser observados, como, por exemplo, as mudanças nos percentuais em relação à faixa de renda (Tabela 4). Para todos os grupos é perceptível o aumento da proporção de domicílios nas três primeiras faixas de renda, e uma redução nas faixas de maior renda.

Tabela 4. Rendimento domiciliar em salários mínimos segundo grupos de município. RMC. 2000-2010. Aumento

Manutenção

2000

2010

Variação (%)

2000

2010

até 1 SM

5,0

5,5

8,6

4,6

7,5

64,0

de 1 a 3 SM

17,5

30,9

76,0

15,2

28,2

de 3 a 5 SM

21,5

28,5

32,7

17,7

5 a 10 SM

34,6

25,3

-26,9

mais de 10 SM

21,3

9,9

-53,8

Redução

Variação (%) 2000

2010

Variação (%)

2,1

3,7

71,8

86,0

14,3

29,3

105,3

24,0

35,4

20,4

27,4

34,0

30,9

23,9

-22,6

34,7

28,2

-18,7

31,6

16,4

-48,3

28,5

11,5

-59,7

Fonte: Censos Demográficos de 2000 e 2010.

Estas mudanças, entretanto, ocorreram de forma distinta segundo os grupos de municípios: em relação às duas primeiras faixas de renda, houve um maior crescimento para os municípios com redução de participação (101,0%), seguidos pelo de manutenção (80,9%) e, 10

Na Tabela 3 está apresentada a divisão dos municípios segundo grupos.

com menor proporção, aqueles com aumento de participação (61,0%). Apesar do diferencial entre os grupos, a redução da renda foi substancial, sendo que o percentual de redução daqueles com maior renda (entre e 10 e mais de 10 salários mínimos) foi semelhante, entre 35% e 37%. Fica claro, neste sentido, que houve uma redução generalizada na renda domicílios da região, que apesar dos diferenciais por grupos de municípios, não relevante. A redução na renda média dos domicílios chegou a 21,7% para o aumento na participação, 23,4% para o grupo “manutenção” e 24,4% para o redução de participação.

média dos se mostrou grupo com grupo com

A Tabela 5 salienta outro dado interessante. Apesar do crescimento do número de domicílios maior do que o crescimento populacional11, como visto anteriormente, o percentual de moradores proprietários se reduziu na RM de Campinas enquanto o percentual de domicílios ocupados pagando aluguel observou aumento relevante em todos os grupos, fato que assevera que a produção do espaço urbano regional está servindo mais aos especuladores e investidores do que para a população que ainda não tem sua moradia. Cabe salientar que na condição de domicílio próprio estão contidos também aqueles que estão financiados, ou seja, todos estes que foram adquiridos na onda de crédito da última década.

Tabela 5. Condição de ocupação dos domicílios segundo grupos de municípios. RMC. 2000-2010. Aumento

Manutenção

Redução

2000

2010

Variação (%)

2000

2010

Variação (%)

2000

2010

Variação (%)

Próprio

72,2

68,5

-5,1

72,2

72,8

0,8

71,1

67,1

-5,6

Alugado

16,3

23,3

42,9

15,2

20,2

32,9

19,2

25,3

31,8

Outros

3,8

8,2

115,8

12,5

7,0

-44,0

9,7

7,6

-21,6

Fonte: Censos Demográficos de 2000 e 2010.

Em relação à migração, fator primordial para a compreensão da dinâmica de desenvolvimento da RM de Campinas vê-se dados que não fogem do padrão. Percebe-se que em relação à condição de ocupação, por exemplo, apresentam-se relativamente semelhantes segundo grupo de municípios, não oferecendo, desta forma, ganhos em relação aos outros grupos. Cabe salientar, a partir dos dados da Tabela 6, o grande diferencial apresentado em relação à propriedade do domicílio, que dentre os migrantes é sempre maior para os intrametropolitanos12, mas ainda bem abaixo em relação aos nãomigrantes.

Tabela 6. Condição de ocupação dos domicílios segundo grupos de municípios e condição migratória. RMC. 2010. 11

A comparação entre 2000 e 2010, através do Censo Demográfico, salienta que houve uma melhora relevante em relação ao número de pessoas por cômodos nos domicílios na RM de Campinas. Esta melhoria ocorreu para todos os grupos aqui considerados, com aproximadamente 80% dos domicílios com até 1 morador por cômodo. 12 A questão habitacional é um dos principais motivadores da migração intrametropolitana. Ver Dota (2011 e 2012) e Cunha (1994, 2010 e 2011).

Aumento

Manutenção

Estado de Outros NãoIntrameEstado de Outros NãoIntrametropolitano São Paulo Estados migrante tropolitano São Paulo Estados migrante Próprio

65,2

50,1

37,8

75,3

62,4

48,0

42,9

78,5

Alugado

26,8

41,6

54,2

16,5

29,7

46,2

48,7

14,3

Outros

8,0

8,3

7,9

8,2

7,9

5,8

8,4

7,2

Tabela 6. Continuação. Redução Intrametropolitano

Estado de São Paulo

Outros Estados

Nãomigrante

Próprio

53,8

40,8

30,3

74,6

Alugado

38,4

52,5

62,4

18,1

Outro

7,8

6,6

7,2

7,2

Fonte: Censo Demográfico de 2010.

Outro ponto a ser ressaltado se refere à atratividade migratória exercida pelos municípios, conforme Tabela 7. Os dados apresentados reforçam a importância da integração e interdependência dos municípios, pois mesmo com dinâmicas econômicas distintas, não se observam fluxos populacionais seguindo a mesma tendência. Percebe-se, neste sentido, que existe uma complementariedade, onde os fluxos populacionais não seguem o mesmo sentido dos fluxos econômicos. As possíveis explicações devam se assentar no mercado de terras, que é um dos fatores mais importantes para o direcionamento dos fluxos populacionais na RM de Campinas (DOTA, 2012).

Tabela 7. Composição da migração segundo grupos de municípios. RMC. 20002010. (%) Intrametropolitano Aumento

2000 27,2

2010 Variação 37,4

Estado de São Paulo 2010

Variação

37,4

2000 44,5

28,7

Outros Estados 2010

Variação

-35,7

2000 28,2

33,9

20,2

Manutenção* Campinas

28,0

45,7

63,0

44,9

24,5

-45,5

27,1

29,8

10,1

10,2

34,5

238,7

46,0

24,1

-47,7

43,8

41,4

-5,5

Redução

28,1

39,7

41,7

46,9

27,9

-40,4

25,0

32,3

29,1

Fonte: Censo Demográfico de 2010. *Menos Campinas.

Percebe-se, neste sentido, que o direcionamento dos fluxos populacionais perpassa, necessariamente, pela análise da fluidez de capitais principalmente em escalas de análise mais amplas, que modificam as configurações territoriais em cada local, afetando a sociedade de múltiplas formas. Fica evidente, neste sentido, que no caso de regiões de

relevante integração, como as metropolitanas, outros fatores atuam conjuntamente, gerando lugares complexos e distintos entre si ao longo dos municípios.

Considerações Finais O desafio de analisar a globalização e buscar resultados empíricos na RM de Campinas possibilitou uma série de avanços, desde observar que o processo é mais complexo e multifacetado do que aparenta ser, até chagarmos a conclusão de que pensar nos resultados territoriais efetivos que ele tem gerado mostra-se extremamente relevante para que estes possam ser mais positivos no âmbito social. A atração de investimentos através de grandes empresas, que se usa de forma constante como política de desenvolvimento municipal e regional, pode não significar ganhos efetivos para a população, pois os salários gerados por esta podem não cobrir o investimento para esta atração. A evolução econômica dos municípios durante a última década, através do PIB per capita ou da variação da balança comercial mostrou-se clara: crescimento sustentado e relevante para todos eles. Entretanto, esses resultados não representaram nos dados aqui analisados mudanças relevantes para a população. Entre os Censos Demográficos de 2000 e 2010 observou-se redução na renda média dos domicílios, redução da proporção de domicílios próprios e aumento da proporção dos alugados, além de dinâmicas populacionais que não apresentam lastros com os fluxos econômicos, denotando que não está havendo rebatimentos positivos diretos para a população. Cabe ressaltar os questionamentos gerados nesta primeira análise, visto a realidade regional frente outras partes do país. Se uma região dinâmica e com grande crescimento não observa dados efetivamente melhores, como pensar em outros pontos do território nacional? Como qualificar políticas voltadas para atração de investimentos se estes não resultam em melhorias? Estas primeiras análises deixam saliente que esta face mais recente do modo de produção capitalista per se não irá se traduzir em ganhos sociais relevantes, a não ser que políticas específicas criem no Brasil um novo contexto de desenvolvimento econômico, diferente do modelo atual. Neste sentido, a atuação política de representatividade dos interesses sociais será de alta relevância para que os bons frutos gerados pelo modo de produção de fato permaneça no país e, além disso, seja distribuído de forma mais igualitária.

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