A historiografia do nazismo e a narrativa da experiência pessoal.

June 9, 2017 | Autor: Gustavo Monteiro | Categoria: History, Historiography, Theory of History, Holocaust Studies, Nazism
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A historiografia do nazismo e a narrativa da experiência pessoal. Gustavo Feital Monteiro Mestrando em História pela Universidade de Brasília Orientador: Wolfgang Döpcke E-mail: [email protected] Resumo: Este trabalho aborda a historiografia do nazismo e do Holocausto na procura de identificar as principais questões presentes nos estudos desenvolvidos e destacar a relevância das memórias e dos diários para o aprofundamento da compreensão de tais eventos. Através do embasamento na narrativa pessoal, é a intenção deste estudo defender a relevância da singularidade da experiência, e apontar as possibilidades da análise histórica na observação das interpretações daqueles que viveram e escreveram sobre o seu passado. Palavras-chave: Nazismo, historiografia, narrativa Abstract: This paper addresses the historiography of Nazism and the Holocaust in attempting to identify the main issues addressed in past studies and to highlight the importance of memories and diaries to deepen the understanding of such events. Through the foundation in personal narratives, it is the intention of this study to defend the relevance of the uniqueness of the experience, and indicate the possibilities of historical analysis in observing the interpretations of those who lived and wrote about their past. Key-words: Nazism, historiography, narrative. Introdução: Partindo de uma análise da historiografia do Holocausto e do nazismo, pode-se compreender o desenvolvimento das metodologias de estudo deste tema que, desde o final da segunda guerra, apresentam diferentes formas de observação e escrita do passado. Debates tal qual a determinação da existência e origem de uma possível ordem dada para o início do extermínio; o envolvimento e o papel de Hitler no desenvolvimento do antissemitismo; a participação da população alemã com os programas do partido; assim como as atitudes de pessoas comuns frente à violência

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permanecem, até hoje, como pontos sobre os quais se formaram diversas argumentações relevantes, mas não definitivas, sobre o nazismo. As particularidades derivadas de cada perspectiva analítica predominante contribuíram para o estabelecimento de aspectos metodológicos que influenciaram os estudos destes eventos pela história ao longo dos anos. Porém, alguns aspectos permanecem ainda pouco abordados. A existência de diversos testemunhos e narrativas pessoais da experiência, tanto dos sobreviventes quanto das vítimas que pereceram, não costumam ser abordados como fundamentação empírica principal para análise histórica dos eventos que tais sujeitos descrevem. Os livros de Primo Levi, como É isto um homem?1, assim como a memória Noite2 de Elie Wiesel, sem mencionar os diários de Anne Frank 3 e Hélène Berr4, são apenas alguns exemplos das obras que demonstram a procura de seus autores de registrar e transmitir a sua experiência pessoal, relatando eventos que, até mesmo para eles, pareciam irreais demais para serem compreensíveis5. Apesar da diversidade de obras conhecidas, estudos da história que se baseiam em tais narrativas se restringem às formas de representações do Holocausto, seja ela na literatura ou em outros gêneros textuais e artísticos6. A análise de tais fontes possibilita uma compreensão do nazismo a partir de perspectivas que são diferenciadas devido à sua proximidade dos acontecimentos e à presença da singularidade da experiência vivida. O foco não se constitui nas políticas e discursos antissemitas, na organização burocrática ou no extermínio dos judeus em si. Ao invés, se permite a observação de seu reflexo sobre a vida cotidiana daqueles que sofreram, praticaram ou observaram diretamente tais eventos, e nas formas como tais experiências foram transmitidas em narrativa. O Holocausto, partindo deste ponto, não se restringe somente à morte dos judeus, seja nos campos como Auschwitz ou nas florestas do leste europeu. Ao se delimitar o significado da Shoa apenas ao extermínio, exclui-se o longo e complexo processo que ocorreu anteriormente, no qual se encontram as leis, a propaganda e as práticas que estiveram presentes na Alemanha desde o início do governo nacionalsocialista em 1933. A observação do antissemitismo na vida cotidiana na Alemanha e em outros países através de suas variadas práticas, desde o discurso na propaganda até a violência, contribui para uma percepção da particularidade dos sujeitos históricos, principalmente dos judeus que estavam vivenciando tal momento, assim como também

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gera a observação de como estes personagens percebiam o seu contexto, as reações da população ao seu redor e o desenvolvimento das práticas desse antissemitismo no seu cotidiano. Após uma breve análise das tendências historiográficas do nazismo e do Holocausto, este trabalho procurar-se-á apontar as possibilidades de estudo no qual, baseando-se em fontes narrativas da experiência pessoal, contribuiria para um maior aprofundamento e compreensão das vidas dos indivíduos que estavam presentes, vivenciaram e sofreram com o antissemitismo nazista. Através dessa abordagem, é objetivo a percepção de que a escrita da história que evidencia a subjetividade, a particularidade e a singularidade da experiência vivida é uma forma metodológica pouco explorada no estudo do nazismo e do Holocausto, e que, devido a isso, se diferencia das análises predominantemente realizadas até então. Historiografia e a escrita da história alemã. Em diversos momentos, Friedländer7 aponta determinadas características que identificou como principais na pesquisa histórica, e procura evidenciar as direções metodológicas da historiografia juntamente com as causas para tais inclinações. Segundo o autor, as questões levantadas, os temas abordados e os parâmetros explicativos encontrados para o aprofundamento em cada objeto de pesquisa dentro do amplo tema do nacional-socialismo foram oriundos, principalmente, de elementos políticos do contexto alemão pós-1945 e do relacionamento com a memória, sendo esta tanto a individual dos sobreviventes quanto a coletiva nacional. Essa dificuldade em lidar com a carga histórica do Holocausto pôde ser observada principalmente nos historiadores alemães. Acadêmicos letrados que, apesar de terem sido, em sua maioria, adultos durante o período nazista, inclinaram-se a ficar em silêncio e voltar à normalidade após a guerra, em vez de explorar e problematizar o recente passado da Alemanha8. Tal período de silêncio pendurou durante cerca de quinze anos, nos quais até mesmo os sobreviventes do Holocausto, estes sendo de qualquer nacionalidade, possuíram suas experiências reprimidas devido à ausência de interesse dos ouvintes. Como Friedländer descreve: The silence did not exist within the survivor community. It was maintained in relation to the outside world and was often imposed by shame, the shame of telling a story that must appear

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unbelievable and was, in any case entirely out of tune with surrounding society.9 Somente no final dos anos 70 e início dos 80 expandiram-se com maior evidência as abordagens dos estudos históricos devido a novos questionamentos gerados em diversas origens, presentes tanto no campo acadêmico quanto no artístico 10. Durante esse período de cerca de duas décadas, tais debates e formas analíticas foram influenciadas, em grande parte, pelas tendências políticas da Guerra Fria11. À medida que a terceira geração amadurecia no final dos anos 90, formavam-se historiadores que não possuíam os mesmos problemas dos seus avós e pais em sua relação com o passado alemão, havendo um distanciamento ainda maior devido à reunificação do país, o que possibilitou uma diminuição das interferências do contexto político. A partir dessa época, os estudos historiográficos se desenvolveram procurando suprir a curiosidade social, mas ainda mantinham determinadas características em comum ao mesmo tempo em que encontravam dificuldades particulares tanto nos aspectos abordados quanto na metodologia narrativa12. Talvez a principal característica dessa dificuldade em aceitar o passado se apresente como a focalização dos estudos na burocracia e na forma metodológica do extermínio, mantendo a perspectiva das vítimas sem ser mencionada. Ao abordar predominantemente o sistema em si, estabeleceram-se padrões analíticos que prevaleceram sobre outras formas de estudo em trabalhos posteriores. Segundo Friedländer: Historical writing about the Holocaust has increasingly attempted to circumvent such problems by focusing on the mechanisms that led to the "Final Solution" within Nazism itself, or on the logistics, the technology and the bureaucratic processes of its implementation, on the agencies of extermination and the behavior of the perpetrators. For example, in regard to his The Destruction of the European Jews, Raul Hilberg stated that he had mainly concentrated on the "how" rather than on the "why" of that history. Such historical inquiry into the mechanisms of the "Final Solution" is the very basis of our knowledge and undoubtedly, remains a primary task. But, ultimately, the "why" over-shadows all other concerns.13 Porém, tais tendências são geradas por determinadas dificuldades enfrentadas pelos historiadores ao abordar este período em específico, e evidenciam a procura por superá-las a partir de diferentes metodologias. Pois mesmo com um

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distanciamento

temporal e com a ausência de um cenário político com ideologias radicalizadas, o nazismo e o Holocausto ainda se constituem como objetos de estudo diferenciados devido ao impacto dos seus eventos na sociedade contemporânea. Lüdtke procurou focalizar nesta ausência de estudos dos indivíduos e de suas vidas cotidianas na história e, através da Alltagsgeschichte14, era sua intenção estudar a vida cotidiana na Alemanha sob o governo nacional-socialista, assim como as formas pelas quais a população percebia e se adequava às políticas do governo. Segundo ele, o objetivo de tal atividade era demonstrar que os perpetradores não eram marionetes sem vontade própria, assim como os judeus não eram vítimas indefesas15. Duas características são identificadas por Lüdtke na percepção do “cotidiano” como objeto de estudo. A primeira delas se refere ao conceito de “normalidade”, através da qual a vida se organiza e procura estabelecer uma estabilidade baseada na repetição de ações rotineiras. Já a segunda procura observar que os sujeitos são objetos de estudo tanto quanto são sujeitos históricos. Ou seja, suas atitudes podem tanto refletir o seu contexto político, social e cultura, como também podem ser ativos participantes das práticas sociais, seja reforçando-as ou opondo-se a elas16. Mais recentemente, alguns historiadores procuraram aprofundar reflexões teóricas e metodológicas sobre tal perspectiva de análise, sendo Friedländer e Young dois daqueles que mais demonstraram tal preocupação em seus trabalhos17. Ambos partem de pontos semelhantes em sua defesa de um estudo histórico que incorporasse a individualidade das percepções e a experiência dos sujeitos que estavam inseridos em tais contextos, e apontam que, através da focalização nos processos de extermínio, na política e na burocracia do estado, a historiografia deixou de abordar os judeus como indivíduos devido à subjetividade da sua narrativa histórica18. Para Friedländer: The reintroduction of individual memory into the overall representation of the epoch implies the use of the contemporaries' direct or indirect expressions of their experience. Working through means confronting the individual voice in a field dominated by political decisions and administrative decrees which neutralize the concreteness of despair and death. The Alltagsgeschichte of German society has its necessary shadow: the Alltagsgeschichte of the victims.19

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A narrativa da experiência no nacional-socialismo Porém, ainda se observa a necessidade de fundamentação empírica na realização de tais pesquisas. As fontes nas quais os sujeitos registraram acontecimentos cotidianos e a sua participação individual dentro de seu contexto específico não são abundantes, e principalmente se estabelecem em cartas, memórias pessoais e diários. Devido à característica subjetiva de tais elementos, estas fontes não foram incorporadas ao estudo histórico do nazismo e do Holocausto como objeto central na historiografia predominante. A distinção entre história e memória – na qual a primeira é um estudo dos acontecimentos enquanto que a segunda é a forma pela qual tais acontecimentos foram percebidos – é o fator principal que contribui para a focalização dos historiadores em um enquanto deixa-se de abordar o outro na busca pela objetividade. Young aponta que tal distinção entre história e memória não somente aumenta uma distância artificial entre ambos, mas também faz com que o historiador perca o valor do testemunho do sobrevivente na pesquisa histórica.20 Este autor também defende que a incorporação da memória dos sobreviventes nos estudos históricos permite a observação de como tais eventos foram percebidos enquanto se desenvolviam, uma vez que a narrativa das reflexões dos acontecimentos, juntamente com a descrição em seus escritos daquilo que viram e presenciaram, faz parte da realidade histórica.21 Para Young: This is why we need to find a middle road by which the living memory of the eye-witness might be assimilated to the historical record without using it only rhetorically to authenticate any given narrative, without allowing it to endow the surrounding narrative with the seeming naturalness of the survivor's voice.22 Percebe-se que a dificuldade de estudo do nazismo e do Holocausto é reconhecida não somente pela incapacidade dos historiadores de compreender e estudar sobre estes eventos que marcaram o século XX. Mais do que isso, os acontecimentos também desafiam a compreensão daqueles que os viveram e tentam, em seus escritos pessoais, descrevê-los. Ao atribuir vozes e rostos a estes indivíduos, procura-se inserilos na narrativa histórica, possibilitando uma percepção mais próxima da vida pessoal e da realidade histórica que foi construída por eles. Garbarini, em seu livro chamado Numbered days, narra:

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People’s efforts to render their suffering meaningful are discernible in their diaries. So, too, are their repeated doubts about these efforts because of their ongoing suffering. Thus, the potential exists to explore these men’s and women’s construction of narratives – what was historically imaginable to them – and the ways in which such narratives molded their possibilities for agency – both the actions they took and the strategies they developed to make sense of the destruction of their worlds.23 Dessa forma, os registros pessoais não são tidos como comprovação factual dos acontecimentos24, uma vez que a presença do indivíduo em determinados contextos, a sua observação dos eventos e a narração de sua experiência se constituem em elementos distintos no estudo histórico. O desenvolvimento de tal base observa a forma pela qual esses três pontos se conectam, ou seja, como a experiência se transforma em narrativa pessoal e como esta pode ser abordada na observação do discurso que atribuiu significado ao vivido e ao seu contexto. Conclusão Este trabalho buscou identificar algumas das principais tendências presentes na historiografia, assim como apontar outras perspectivas metodológicas de estudo que possibilitam abordagens diferenciadas do nazismo e do Holocausto. O relato pessoal destes indivíduos que vivenciaram o nazismo é mais do que o registro de suas experiências, significando também a sua própria memória como vítimas de um dos mais marcantes eventos da história contemporânea. O objetivo principal de tais autores nesta atividade foi dar sentido à sua experiência e ao seu contexto, atribuir significado ao vivido e tentar compreender os acontecimentos caóticos que se desenvolviam, por mais irreais que pudessem parecer. As respostas que encontram às questões por eles mesmos levantadas variam de acordo com aquilo que presenciam, com os boatos que escutam e com as reações do público às políticas do governo que observam. Young abrange o registro pessoal característico de uma escrita que possui grande relevância para a visualização das diferentes formas pelas quais os sujeitos atribuíam significado ao seu contexto e ao seu próprio passado: As most historical theorists now acknowledge, the legitimacy and value of historical sources cannot rest solely on their factual element, in which case readers would be endlessly troubled by conflicting versions. Instead of disqualifying competing accounts, the critical reader accepts that every Holocaust writer has a different story to tell, not because what 1128

happened to so many others was intrinsically different, but because how victims and survivors have grasped and related their experiences comprises the actual core of their story. In this view, it is not a matter of weather one set of facts is more veracious than another, or whether the facts have been transformed in narrative at all. The aim of an inquiry into literary testimony is rather to determine how writers’ experiences have been shaped both in and out of narrative. Once we recognize that the “facts” of history are not distinct from their reflexive interpretation in narrative, and that the “facts” of the Holocaust and their interpretation may even have been fatally interdependent, we are able to look beyond both the facts and the poetics of literary testimony to their consequences.25 O estudo da vida cotidiana, com ênfase na subjetividade individual, procura demonstrar como a experiência dos agentes históricos foi mais complexa e profunda do que análises baseadas em outras perspectivas possibilitam visualizar. Tais sujeitos, enquanto inseridos em contextos, no mínimo, turbulentos, tentam atribuir sentido àquilo que observam, refletindo e agindo de acordo com a sua compreensão dos acontecimentos. A ligação do sujeito com a sua experiência se dá através de seus escritos, onde a subjetividade da linguagem e a objetividade dos fatos se mesclam na narrativa. 1

LEVI, Primo. É isto um homem? Rio de Janeiro: Rocco, 2013. WIESEL, Elie. Noite. Rio de Janeiro: Ediouro, 2002. 3 FRANK, Anne. O diário de Anne Frank: edição integral. 47ª ed. Rio de Janeiro: Record, 2015. 4 BERR, Hélène. O diário de Hélène Berr: um relato da ocupação nazista de Paris. Rio de Janeiro: Objetiva, 2008. 5 Chaim Kaplan pode ser citado como outro exemplo da procura de registro. Ao iniciar seus diários, escritos no gueto de Varsóvia, ele afirma que não iria relatar sobre nada que não visse com seus próprios olhos. Tal procura pelo testemunho visual possui o objetivo, para o autor, da confirmação dos acontecimentos que, mesmo tendo sido vistos e presenciados, ainda assim permaneciam como inacreditáveis. Ver YOUNG, James E. “Toward a Received History of the Holocaust”. History and Theory. Vol. 36, No. 4, 1997. 6 Além dos estudos da historiografia, podem-se apontar as obras literárias, cinematográficas e demais gêneros artísticos como meios de reprodução dos eventos relacionados ao nazismo e ao Holocausto. Poesias como a Death Fugue de Paul Celan, filmes como O Pianista e A Lista de Schindler, a obra Maus de Spiegelman, assim como os testemunhos orais dos sobreviventes, se constituem como exemplos da diversidade de formas pelas quais o Holocausto e o nazismo vêm se demonstrado presente na mentalidade social. Tamanha diversidade gerou, por si, trabalhos que focalizam nas formas de representação do Holocausto como o livro organizado por Bernard-Donals e Glejzer, Witnessing the disaster, assim como também a obra de Friedländer, Probing the limits of representation, em BERNARD-DONALS, Michael; GLEJZER, Richard (ed.). Witnessing the disaster: Essays on representation and the Holocaust. University of Wisconsin Press, 2003, e FRIEDLÄNDER, Saul (org). Probing the limits of representation: Nazism and the final solution. Cambridge, Mass: Harvard University Press, 1992. 7 Saul Friedländer, por ser um sobrevivente do Holocausto, aborda com propriedade a dificuldade de conciliação entre memória pessoal e estudo histórico do passado, principalmente entre os historiadores alemães. Dessa forma, além de escrever as obras The years of persecution e The years of extermination, também escreveu suas memórias pessoais do período de infância durante a segunda guerra, em When memory comes. Ver FRIEDLÄNDER, Saul. Nazi Germany and the Jews: The years of persecution, 19331939. New York: Harper Collins, 1998, FRIEDLÄNDER, Saul. Nazi Germany and the Jews: The years 2

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of extermination, 1939-1945. New York: Harper Collins, 2007, e Friedländer, Saul. When memory comes. Farrar, Straus and Giroux, 1979. 8 FRIEDLÄNDER, Saul. History and Memory: Lessons from the Holocaust. Genève: Graduate Institute Publications, 2014. 9 FRIEDLÄNDER, Saul. “Trauma, Transference and "Working through" in Writing the History of the "Shoah"”. History and Memory, Vol. 4, No. 1, 1992, pág. 48. 10 As produções cinematográficas e televisivas tiveram grande relevância em gerar interesse público por este tema, influenciando também em estudos mais aprofundados ou partindo de abordagens diferenciadas pelos historiadores. De tais produções, podem-se mencionar a adaptação em filme do diário de Anne Frank, que, já nos anos 50, tinha adquirido ampla divulgação e reconhecimento. Segundo Friedländer, “In short, for millions of readers or viewers, she represented the epitome of a wise, young, wistful, and innocent universal victim, an image that Western society of the 1950s was all too eager to accept.” FRIEDLÄNDER, Saul. History and Memory: Lessons from the Holocaust. Genève: Graduate Institute Publications, 2014. Outra produção relevante foi a exibição da minissérie Holocaust, feita pela NBC voltada ao público americano e exibida em 1978, na qual se abordava a trajetória de duas famílias, sendo uma delas judaica e a outra nazista, durante o Nacional Socialismo. Por último, também se aponta o filme Shoa, produzido por Claude Lanzmann e exibido em 1985, o qual se constitui em um documentário onde se apresentam entrevistas com sobreviventes do extermínio, testemunhas dos crimes e também perpetradores nazistas, possuindo mais de nove horas de duração. Cada uma destas produções, apesar de estarem distribuídas em períodos distantes entre si, demonstra a procura social pela abordagem desse período a partir de diferentes métodos e perspectivas, sendo que, na historiografia, os estudos que estavam sendo realizados ainda sofriam com o silêncio que, mesmo sendo aos poucos superado, ainda interferia na escrita da história alemã. FRIEDLÄNDER, Saul. “History, memory, and the historian: dilemmas and responsibilities”. New German Critique, No. 80, 2000, pág. 6. 11 Sobre o envolvimento de Friedländer com os debates, pode-se mencionar o estudo de Aschheim em ASCHHEIM, Steven E. “On Saul Friedländer”. History and Memory, Vol. 9, No. 1/2, 1997, pág. 22. 12 FRIEDLÄNDER, Saul. “History, memory, and the historian: dilemmas and responsibilities”. New German Critique, No. 80, 2000, pág. 7. 13 Id. Ibid. pág. 12. 14 A história do cotidiano, em tradução para o português, é considerada por Revel como um ramo da micro história que se desenvolveu na Alemanha nos anos de 1970, assim como a história da vida privada ocorreu na França, em REVEL, Jacques. Jogos de escalas: A experiência da microanálise. Rio de janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1998. Esta metodologia de abordagem possui com Lüdtke um dos seus primeiros e principais historiadores, o qual afirmava que “It studies the everyday toil and festive joys of men and women, the young and the old, individuals emerge as actors on the social stage.” em LÜDTKE, Alf (ed.). The history of everyday life: Reconstructing historical experiences and ways of life. Princeton University Press, 1995, pág. 4. 15 Lüdtke enfatiza que a Alltagsgeschichte não procura minimizar a culpa dos perpetradores ou o sofrimento das vítimas, mas sim demonstrar como os perpetradores estavam pessoalmente envolvidos e em como viam a sua participação pessoal no processo, assim como as vítimas também procuravam reagir e se adaptar às pressões na sua busca pela sobrevivência. Segundo o autor, “historical actors were (and are) more than mere blind puppets or helpless victims.” Id. Ibid. pág. 5. 16 Nas palavras de Lüdtke: “the focus is on the forms in which people have “appropriated” – while simultaneously transforming – “their” world.” Id. Ibid. pág. 7. 17 Friedländer segue essa argumentação devido, principalmente, à sua própria experiência como sobrevivente. Em seu livro When memory comes, ele aborda as suas memórias como um refugiado do nazismo, sobrevivendo escondido enquanto seus pais foram enviados a Auschwitz. Da mesma forma, ele procura, na obra Nazi Germany and the Jews, abordar a experiência pessoal das vítimas e dos perpetradores. Ver FRIEDLÄNDER, Saul. When memory comes. Farrar, Straus and Giroux, 1991. Young, por sua vez, se baseia nas observações de Friedländer e procura aprofundá-las em outras questões da escrita da história, como a relação entre necessidade de embasamento empírico com a subjetividade da interpretação pessoal pelos agentes históricos. Ver YOUNG, James E. “Between history and memory: The uncanny voices of historian and survivor”. History and Memory, Vol. 9, No. 1/2, 1997. 18 YOUNG, James E. “Interpreting Literary Testimony: A Preface to Rereading Holocaust Diaries and Memoirs”. New Literary History Vol. 18, No. 2, 1987. 19 FRIEDLÄNDER, Saul. “Trauma, Transference and "Working through" in Writing the History of the "Shoah"”. History and Memory, Vol. 4, No. 1, 1992, pág. 53. O termo working through é constantemente abordado por Friedländer no seu estudo da análise de uma memória. Outro estudo relevante que aborda o

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uso deste termo na pesquisa histórica é o de LaCapra em Writing history, writing trauma. Ver LACAPRA, Dominick. Writing history, writing trauma. Baltimore: Johns Hopkins University, 2001. 20 YOUNG, James E. “Between history and memory: The uncanny voices of historian and survivor”. History and Memory, Vol. 9, No. 1/2, 1997, pág. 50. 21 Id. Ibid. pág. 55. 22 Id. Ibid. pág. 52. 23 GARBARINI, Alexandra. Numbered days: Diaries and the Holocaust. Yale University Press, 2006, pág. 6. 24 Tozzi procura estabelecer a escrita da experiência pessoal em uma “epistemologia do testemunho”, baseando-se em três autores sobreviventes de “terrorismo de estado”, a denominar: Calveiro, um sobrevivente da ditadura argentina; Levi e Klemperer, ambos sobreviventes do nazismo e do Holocausto. Nesta epistemologia, as obras de tais sujeitos, assim como outras similares, não podem cair no fundacionalismo empiricista, ou seja, servir como comprovação de acontecimentos através de sua relação com outras documentações. Segundo ela, estes testemunhos são, em si, formas de transmissão do conhecimento, que contribuem para a constituição dos eventos como acontecimentos históricos. Embora Tozzi não cite, Young já tinha realizado afirmações semelhantes anteriormente, aprofundando e elaborando de forma mais clara o estabelecimento de tais narrativas como reconstrução da experiência, em “Rather than coming to Holocaust diaries and memoirs for indisputable “factual” testimony, however, the critical reader might now turn to the manner in which these “facts” have been understood and reconstructed in narrative.” Em YOUNG, James E. “Interpreting Literary Testimony: A Preface to Rereading Holocaust Diaries and Memoirs”. New Literary History, Vol. 18, no. 2, 1987, pág. 406 e TOZZI, Verónica. “The epistemic and moral role of testimony”. History and Theory, Vol. 51, n° 1, 2012. 25 YOUNG, James E. “Interpreting Literary Testimony: A Preface to Rereading Holocaust Diaries and Memoirs”. New Literary History Vol. 18, No. 2, 1987, pág. 421.

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