A ICTIOFAUNA DA REPRESA DE ITUTINGA, RIO GRANDE (MINAS GERAIS - BRASIL) CARLOS BERNARDO MASCARENHAS ALVES\ ALEXANDRE LIMA GODINHO\ HUGO PEREIRA GODINH02 e VASCO CAMPOS TORQUAT03 lDepartamento de Zoologia, Instituto de Ciências Biológicas, Universidade Federal de Minas Gerais - 31270-901 Belo Horizonte, MG 2Departamento de Morfologia, Instituto de Ciências Biológicas, Universidade Federal de Minas Gerais - 31270-901 Belo Horizonte, MG 3Departamento de Programas e Ações Ambientais, CEMIG - 30190-131 Belo Horizonte, MG
(Com 3 figuras) ABSTRACT
The Ichthyofauna of the Itutinga Reservoir, Grande River (Minas Gerais Brazil)
-
Itutinga reservoir, built in 1955, is located 5.5km downstream from the Camar~os dam (the most upstream impoundment in the Grande river). With surface area of l.64km and a small drainage basin, it has a low residence time (12 hours) and little water leveI variation (:t 05m). Limnological profiles made in September 1989, February and June 1990 showed no stratification of the water column in relation to temperature, conductivity, pH and dissolved oxygen. Five quantitative fish samples, between December 1988 and June 1990, using gillnets of 3, 4, 5,6, 7, 8, 10, 12, 14 and 16cm (stretch measure) mesh and qualitative ones using seine nets were made. Twenty-four native fish species and one exotic (Tilapia sp.) were recorded. The higher captures per unit of effort were Pimelodus maculatus, Astyanax fasciatus, lheringichthys labrosus and Schizodon nasutus (numerically), and Hoplias cf. lacerdae,P maculatus, S. nasutus and I. labrosus (in biomass). The reservoir showed low abundance and biomass of fishes. The presence of migratory species (such as Salminus maxillosus, Prochilodus scrofa and P maculatus) probably can be explained by the manual transposition of fishes imprisoned in Itutinga turbines and spillway channel, passage through Camargos dam turbines (Kaplan type) and fish stocking programs. Key words: ichthyofaunistic inventory, Paraná basin, stocking, limnology, migratory species.
.
RESUMO A represa de Itutinga, formada em 1955, situa-se 5,5km a jusante da UHE Camargos (barramento mais a montante do rio Grande). Com área alagada de 1,64km2 e pequena bacia de
Recebido em 28 de maio de 1996 Aceito em 24 de setembro de 1997 Distribuído em 15 de janeiro de 1998 Correspondênciapara: Carlos B. M. Alves E-mail:
[email protected]
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drenagem, é do tipo "fio d'água", com tempo de residência reduzido (12 horas) e pequena variação do nível da água (:t 0,5m). Perfis limnológicos realizados em setembro de 1989, fevereiro e junho de 1990 mostraram desestratificação da coluna d'água em relação à temperatura, à condutividade, ao pH e ao oxigênio dissolvido. Entre dezembro de 1988 e junho de 1990, foram realizadas 5 amostragens quantitativas (redes de malhas 3, 4, 5, 6, 7, 8,10,12,14 e 16cm entre nós opostos) e qualitativas (rede de arrasto). Foram registradas 24 espécies nativas e uma introduzida (Tilapia sp.). As espécies mais representativas em termos de captura por unidade de esforço foram, em ordem decrescente, Pimelodus maculatus, Astyanax fasciatus, /heringichthys labrosus e Schizodon nasutus, em número, e Hoplias cf. lacerdae, P. maculatus, S. nasutus e I. labrosus, em biomassa. A represa apresentou baixa abundância e biomassa de peixes. A presença de espécies rnigradoras (e.g. Salminus maxillosus, Prochilodus scrofa e P. maculatus) explica-se provavelmente pela transposição manual para a represa de peixes aprisionados nas turbinas e no canal do vertedouro de Itutinga, pela passagem de indivíduos através das turbinas do tipo Kaplan da barragem de Camargos e pelos programas de repovoamento. Palavras-chave: inventário ictiofaunístico, bacia do Paraná, repovoamento, limnologia, espécies migratórias. INTRODUÇÃO o estado de Minas Gerais possui 14 bacias hidrográficas (CETEC, 1983) e seu potencial hidráulico está parcialmente explorado por usinas hidrelétricas. O quadro de barramentos sucessivos, que é especialmente significativo no rio Grande, estender-se-á para a maioria das bacias do estado com a implementação dos planos energéticos da Eletrobrás (Godinho, 1993). Com isto, a hidrografia estadual passará da condição fluvial para a lacustre. Em conseqüência, o curso natural de seus principais rios estará modificado pela sucessão de grandes lagos artificiais, com alterações significativas nas populações de peixes migradores (Godinho & Godinho, 1994). Algumas das alterações sofridas pela ictio" fauna brasileira em razão dos barramentos estão sendo identificadas, incluindo as que dizem respeito às restrições reprodutivas impostas às espécies migradoras ou de piracema (e.g. Agostinho, 1992; Godinho & Godinho, 1994) e as alterações na estrutura das comunidades (Merona, 1986/1987). Ressalte-se que a ictiofauna de grande parte destes ambientes sequer ainda foi inventariada. A conservação e o manejo de comunidades de peixes de represas constituem tarefa multidisciplinar e de longo prazo (Agostinho, 1992), sendo que estudos de casos particulares podem acelerar o desenvolvimento de metodologias necessárias à Rev. Brasil. Biol., 58 (1): 121-129
sua execução. A represa da Usina Hidrelétrica (UHE) de Itutinga pode constituir-se modelo para estudos de represas de pequeno porte, em função de suas características físicas, biológicas e morfométricas, aliadas ao estado atual do conhecimento de sua ictiofauna e limnologia. A represa de Itutinga, formada em 1955, situa-se no alto rio Grande, município de Itutinga, Minas Gerais (21°16'S; 44°40'W). O reservatório possui área de 1,64km2 e acumula . " cerca de' 11 x, ' 106m3 d e agua. O tempo de reSIdenCIada agua e de 12 horas e os seus níveis mínimo e máximo são de 880,0 e 886,Omacima do nível do mar, respectivamente. Todavia, em condições normais de operação, a variação do nível da água é pequena (:t 0,5m) e está sob influência da UHE Camargos, situada imediatamente a montante (= 5,5km). Com exceção do próprio rio Grande, a represa não recebe afluentes significativos. O presente trabalho apresenta os resultados dos primeiros estudos sistematizados realizados na região da represa da UHE Itutinga cujos objetivos foram de inventariar sua ictiofauna; estimar a abundância ictiofaunística através da captura por unidade de esforço (CPUE); e obter dados limnológicos básicos de suas águas. MATERIAL E MÉTODOS Foram realizadas 5 campanhas de amostragem na represa de Itutinga nos meses de dezem-
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ICTIOFAUNA DE ITUTINGA (RIO GRANDE)
bro de 1988, maio e setembro de 1989 e fevereiro e junho de 1990. Em todas as campanhas foram utilizadas redes de emalhar de fundo de 20 metros de comprimento, de malhas 3, 4, 5, 6, 7, 8, 10, 12, 14 e 16cm (medidas entre nós opostos) e altura entre 1,45 e 1,75m. A área total de redes utilizada foi de 24.347m2,distribuídos nas 5 campanhas. As redes foram armadas à tarde e retiradas na manhã seguinte, permanecendo cerca de 16h expostas na coluna d'água da zona litorânea. Para complementação do inventário ictiofaunístico, foram armados 1.175m2de redes de emalhar nos meses de dezembro de 1988 e junho de 1990 no trecho do rio Grande entre a represa de Itutinga e a barragem de Camargos. Estas redes tinham as mesmas especificações daquelas utilizadas na represa. Os peixes capturados foram separados por malha e fixados em solução de formol a 10% no campo. O peso corporal e o comprimento padrão de cada indivíduo capturado foram registrados no laboratório. Complementarmente, estádios de maturação gonadal de espécies consideradas migradoras foram macroscopicamente determinados, como forma de confirmar sua desova no ambiente em estudo.
Nirn = número de peixes da espécie i capturado na malha m; Birn = biomassa, em gramas, da espécie i capturada na malha m; malhas utilizadas:3, 4, 5, 6, 7, 8, 10, 12, 14 e 16; e para toda amostra por: 16 CPUEN
=L
Nm/EPm
m=3 16
CPUEB
=L
Bm/EPm,
m=3
onde: Nrn = número de peixes capturado na malha m; Brn = biomassa,emgramas,capturadana malham; malhas utilizadas:3, 4, 5, 6, 7, 8, 10, 12, 14 e 16.
Utilizando-se somente os peixes capturados na represa, estimou-se para cada malha m a captura por unidade de esforço em número (CPUENm) e em biomassa (CPUEBm)por:
Além das amostragens quantitativas com redes de emalhar, foram feitas coletas qualitativas através de arrastos com redes de tela mosquiteira nas margens da represa para a captura de espécies e indivíduos de pequeno porte. Foram determinados os valores de penetração de luz (medida pelo disco de Secchi), temperatura, condutividade elétrica, pH e oxigênio dissolvido da coluna d'água de metro em metro da superfície ao fundo nos meses de setembro de 1989, fevereiro e junho de 1990 em três pontos da represa.
CPUENm=NrnlEPm
RESULTADOS E DISCUSSÃO
CPUEBm
= BrnlEPm,
onde: Nrn
=número de peixes capturados na malha m;
Brn = biomassa, em gramas, capturada na malha m; . 2 EPrn = esforço de pesca, em 100m, de rede da malha m; m = tamanho da malha (3, 4, 5, 6, 7, 8, 10, 12, 14 e 16cm).
As CPUEs também foram estimadas para cada espécie i por: 16 CPUENi
=L
Nim/EPm
m=3 16 CPUEBi
=L m=3
onde:
Bim/EPm,
Foram capturadas 25 espécies, distribuídas em 3 ordens, 9 famílias, 17 gêneros. Todas as espécies, com exce~o de Pseudopimelodus zungaro, ocorreram na represa de Itutinga. A Tabela I contém a lista taxonômica das espécies capturadas com os respectivos nomes populares utilizados na região. Em Itutinga, a riqueza de espécies foi baixa se comparada às das represas de Camargos (montante) e de Fumas (jusante). Camargos apresentou 36 espécies (Mourgués-Schurter & Silva, 1994). Em Fumas, Santos et ai. (1994) registraram 30 espécies, capturadas exclusivamente com redes de emalhar entre junho de 1992 e maio de 1993. Sua riqueza, entretanto, poderá atingir cerca de 45 espécies, se incluídas coletas posteriores com redes de espera e de arrasto (G. B. Santos, com. pes., 1995). A baixa riqueza em Itutinga provavelmente Rev. Brasil. Biol., 58 (1): 121-129
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TABELA I Lista das espécies de peixes capturadas na região da represa de Itutinga. Superordem Ostariophysi Ordem Characiformes
Nome popular
N° do lote*
Família Characidae Subfamília Tetragonopterinae Astyanax bimaculatus (Linnaeus, 1758) Astyanax fasciatus (Cuvier, 1819) Bryconamericus stramineusl Eigenmaoo, 1908 Piabina argenteal Reinhardt, 1866 Subfamília Salmininae
lambari
MZUSP 51449
lambari-do-rabo-vermelho
MZUSP 51448
piaba pequira
Salminus hilarii Valencieooes,1849
tabarana
Salminus maxillosui Valenciennes, 1849
dourado
MZUSP 51463
Família Erythrinidae Hoplias d. lacerdae Ribeiro, 1908
traíra, trairão traíra
MZUSP 51459
Leporellus vittatus (Valencieooes, 1849)
tinIburé
MZUSP 51458
Leporinus friderici (Bloch, 1794)
piapara
MZUSP 51461
Leporinus octofasciatus Steindachner, 1917
flamenguinho tinIburé
MZUSP 51446
Schizodon nasutus Kner, 1864 Família Prochilodontidae
campineiro
MZUSP 51457
Prochilodus scrofa Steindachner, 1882 Família Parodontidae
curinIba
Apareiodon piracicabae (Eigenmaoo, 1907) Ordem Siluriformes
canivete
MZUSP 51464
espada
MZUSP 51447
lheringichthys labrosus (Kroeyer, 1874)
mandi-bicudo
MZUSP 51453
Pimelodus maculatus Lacépede, 1803
mandi-amarelo
MZUSP 51462
bagre-sapo
MZUSP 51452
Hoplias malabaricus (Bloch, 1794) FamíliaAnostomidae
Leporinus striatus Kner, 1859
MZUSP 51460
Família Sternopygidae Eigenmannia virescens Valencieooes,1847 Família PinIelodidae
Pseudopimelodus zungaro3 (Humboldt, 1833) Família Loricariidae Hypostomus aff. myersi Gosline, 1947
cascudo
Hypostomus aff. strigaticeps (Regan, 1908)
cascudo
4
Hypostomus sp. A
cascudo
4
Hypostomus sp. B SuperordemAcanthopterygii Ordem Perciformes
cascudo
/
Família CicWidae Geophag~s cf. brasiliensis (Quoy & Gaimard, 1824) Tilapia sp.5
cará
MZUSP 51451
tilápia
MZUSP 51450
*Númerodos lotes tombados na coleção ictiológica do Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo. 1 =capturada na represa com arrasto; 2 =capturada na represa por pescador =espécies depositadas em três lotes (MZUSP 51454, sp.; 5 =espécie exótica à bacia do rio Grande.
exclusivamente de Itutinga;
tomus
4
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local; 3 = capturada exclusivamente no rio Grande a montante MZUSP 51455 e MZUSP 51456) com denominação Hypos-
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se deve ao fato da represa ser antiga, possuir área
inferior às áreas das duas outras (Camargos = 2 2 76km e Fumas = 1.456km ), drenar um pequeno trecho livre do rio Grande (= 5,5km) e não receber outros afluentes significativos. A composição em espécies de Itutinga pode ser considerada estabilizada. Espécies cuja reprodução foi interrompida com o barramento não mais ocorrem ou, se ocorrem, sua presença é fruto de peixamentos realizados pela CEMIG. As amplitudes de comprimento e peso das espécies, bem como suas características migratórias (Tabela 11), demonstram domínio de espécies de pequeno porte e/ou capazes de concluir seu ciclo de vida em ambiente lêntico. Agostinho et aI. (1992) mostraram a tendência de domínio da composição ictiofaunística de represas após alcançar a estabilidade por espécies de pequeno porte, baixa longevidade e elevado potencial reprodutivo. Foram capturados 494 exemplares com redes de emalhar. Destes, 38 foram coletados no rio Grande a montante da represa. A Figura 1 repre-
senta as CPUEs em número e biomassa por tamanho de malha. A malha 3cm foi a mais produtiva em termos numéricos. Como esperado, há tendência de menores capturas de indivíduos com o aumento da malha. As malhas mais produtivas em biomassa foram 4, 5 e 6cm. Estes dados demonstram que a ictiofauna é dominada por espécies de menor porte. As espécies mais capturadas nas malhas maiores foram mandis-amarelos (P maculatus), curimbas (P scrofa) e trairões (H. cf. lacerdae). A malha 16cm não capturou nenhum indivíduo. Na Figura 2 está expressa a CPUEN das principais espécies. Nota-se predomínio de mandis, seguido por mandis-bicudos (I. labrosus), lambaris (A. fasciatus), campineiros (5. nasutus) e trairões. Na CPUEB (Fig. 3) destacaram-se trairões, mandis, campineiros e mandis-bicudos, em ordem decrescente. Ressalte-se a presença da curimba no rol das espécies mais capturadas em biomassa. Poucos exemplares foram capturados, porém todos eles
TABELA 11 Amplitudes de comprimento padrão (em) e peso corporal (g) das espécies coletadas na represa de Itutínga (1988-1990). Espécie
N
Comprimento padrão Mínimo Máximo
Peso corporal Mínimo Máximo
Migração'
Pimelodus maculatus
119
7,8
30,2
7
504
Sim
Hoplias cf. lacerdae Schizodon nasutus
78
13,6
53,3
34
2.830
Não
76
11,5
24,4
21
245
Não
lheringichthys labrosus
67
9,4
22,4
11
166
Não
Astyanax fasciatus
55
8,2
12,5
10
40
Não
Hypostomus spp.
12
9,9
23,2
27
304
?
Leporinusfriderici
12
11,7
27,5
24
482
?
Hoplias malabaricus
10
14,8
26,7
52
328
Não
Astyanax bimaculatus
8
7,3
10,6
10
30
Não
Eigenmannia virescens
3
19,6
24,6
14
27
?
Leporinus octofasciatus
3
10,6
22,2
20
242
Sim
Leporinus striatus
3
10,9
12,1
19
34
Sim
Tilapia sp.
3
8,0
16,8
16
180
Não
Prochilodusscrofa
2
. 38,6
48,0
1.429
2.660
Sim
Geophagus cf. brasiliensis
2
7,0
7,8
12
19
Não
Leporellus vittatus Salminus hilarii
1
11,2
11,2
21
21
Sim
1
27,2
27,2
310
310
Sim
Salminus maxillosus
1
46,0
46,0
1.600
1.600
Sim
'Segundo Miyamoto (1990) e Lamas (1993).
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Malha (cm) 3
-=====J -=::J ]
4 5
.c=J
6 7 8
-D
10 12
O
14
E=:J
16
15
Fig. 1-
12 9 6 3 O CPUEN Ond./100 m2)
200
400
CPUEB
(g/100
600 m2)
CPUEs por malha na represa de Itutinga (1989-1990).
possuíam peso corporal considerável. A presença desta espécie, caracteristicamente migradora (Miyamoto, 1990; Lamas, 1993), na represa de Itutinga pode ser explicada pelos programas de repovoamento realizados pela CEMIG. O mesmo pode ser dito em relação ao dourado (5. maxillosus), cujo exemplar foi capturado na represa por pescador profissional. Segundo informações da
CEMIG, durante o período de estudos (19881990), houve a soltura de cerca de 23.000 alevinos de curimbas (P scrofa), 2.000 de piaparas (como Leporinus friderici é localmente designado), 1.200 de piaus (L. elongatus) e 100 de pacus (Piaractus mesopotamicus). Dados de peixamentos anteriores não são disponíveis.
Espécie H. malabaricus Hypostomus
spp.
L. frjderici A. bimaculatus
-
-li -li
-.
H. cf. lacerdae S. nasutus A. fasciatus I. labrosus P. maculatus Outros
-
--o
2
4
6
CPUENOnd./100 Fig. 2 -
CPUEN
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por espécie na represa de Itutinga (1989-1990).
8 m2)
10
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Espécie Hypostomus
spp.
L. friderici H. malabaricus A. fasciatus P. scrofa I. labrosus
s. nasutus
... .. .... -I
~
P. maculatus H. cf. lacerdae
Outros
-li o
400
800
1200
CPUEB(g/100 m2) Fig. 3 - CPUEB por espécie na represa de Itutinga (1989-1990).
Dos indivíduoscoletados, 130 (29%) pertencem às espécies consideradas de piracema, destacando-se 119 mandis-amarelos (26%). Esta espécieparece não se reproduzir no trecho entre as barragens de Itutinga e Camargos, uma vez que a análise macroscópica de suas gônadas revelou somente fêmeas em repouso sexual e machos em estádio de maturação intermediária. A significativa captura em número e em biomassa de P. maculafus, espécie considerada migradora moderada (Miyamoto, 1990), deve-se em parte ao transporte de jusante para montante de peixes aprisionados nas turbinas e no canal do vertedouro durante as operaçõesde manutenção da usina e manejo do nível da água da represa (Alves, obs. pes.). A maioria dos peixes transportados é constituída de mandis-amarelos, campineiros, mandis-bicudos e piaparas. A ocorrênciade espécies migradoras em Itutinga também pode ser explicada pela passagem de indivíduos através do vertedouro ou das turbinas do tipo Kaplan da UHE Camargos, situada imediatamente a montante, onde elas também ocorrem. Turbinas Kaplan reconhecidamente permitem a passagem de indivíduos jovens e adultos (Davies, 1988). A passagem de peixes por barragens hidrelétricas deve ser melhor investigada e sua pesquisa, por isto, incentivada.
As amplitudes dos parâmetros físico-químicos amostrados (temperatura, condutividade, pH, oxigênio dissolvido e transparência da água) na represa encontram-se na Tabela III. Os perfis da coluna d'água relativos a estes parâmetros revelaram não ocorrer estratificação da coluna nos três pontos amostrados. Os dados físico-químicos das águas da represa de Itutinga sugerem que trata-se de ambiente de características oligotróficas, com tendência à neutralidade e pouco material em suspensão a julgar pelos baixos valores de condutividade e grande transparência. Esta situação tende a ser mantida no futuro próximo, pois, Itutinga é uma pequena represa com tempo de residência da água reduzido TABELA 1lI Amplitudes de parâmetros limnológicos na represa de Itutinga (1989-1990). Parâmetro
Amplitude Minimo I Máximo
Temperatura (°e)
18,1
25,8
Condutividade elétrica (!!S/em)
14,2
16,3
Oxigênio dissolvido (% saturação)
70,3
103,9
pH
6,2
7,4
Transparência (m)
0,9
3,8
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TABELA IV Captura por unidade de esforço em número (CPUEN) e em biomassa (CPUEB) em represas e lagoas de Minas Gerais. O esforço de pesca considerado foi de 100m2 de redes das malhas 3 a 16cm nas represas e 3 a 14cm nas lagoas. Local
1
Bacia hidrográfica
CPUEB (kg)
CPUEN
Fonte
Represa de Itutinga
Paraná
3,06
34,8
presente trabalho
Represa de Marimbondo
Paraná
8,98
121,1
Santos et aI., 1994
Represa de Fumas
Paraná
8,14
292,0
Santos et aI., 1994
Represa da Pampulhal
São Francisco
31,03
113,0
Godinho et ai., 1992
Represa da Pampulha2
São Francisco
41,16
120,6
Godinho et aI., 1992
Lagoa Carioca
Doce
30,29
74,2
Godinho et ai., 1994
Lagoa Dom Helvécio
Doce
22,19
78,9
Godinho et aI., 1994
Lagoa Ferrugem
Doce
12,80
345,0
Godinho et aI., 1994
Lagoa Jacaré
Doce
28,06
116,3
Godinho et aI., 1994
Lagoa Palmeiras
Doce
8,92
90,7
Godinho et aI., 1994
Lagoa Timboré
Doce
13,73
105,0
Godinho et aI., 1994
=de julho/89
a abril/90; 2 = de março/91 a janeiro/no
(12 horas), e abastecida quase que exclusivamente pelas águas de Camargos, o que impede seu eventual enriquecimento. A condição oligotrófica de Itutinga reflete-se na reduzida abundância em número (CPUEN) e biomassa (CPUEB) de peixes aí capturados comparativamente a outros ambientes lacustres de Minas Gerais (Tab. IV). Durante o estudo, a pesca profissional, com apenas um pescador atuando regularmente na represa, e a pesca amadora eram reduzidas. As principais espécies capturadas são o trairão, campineiro, piapara (L. friderici) e curimba no reservatório, e lambari (A. fasciatus) no trecho do rio Grande entre as represas de Itutinga e Camargos (obs. pes.). Programas de repovoamento com espécies migradoras nativas da bacia poderão ser conduzidos com peixes provenientes de estações de piscicultura ou capturados a jusante de Itutinga e submetidos à reprodução induzida no local (Rezende et aI., 1996), como forma de incrementar a atividade. Os dados levantados permitem-nos concluir, em relação à represa de Itutinga, que sua ictiofauna é mais pobre em espécies do que as das represas de Fumas e Camargos; as abundâncias em número (CPUEN) e biomassa (CPUEB) de peixes são inferiores a outros corpos d'água de Minas Gerais; a presença de espécies migradoras pode Rev. Brasil. Biol., 58 (1): 121-129
ser explicada pelos programas de repovoamento da CEMIG, pela translocação de peixes de montante para jus ante e pela eventual passagem de indivíduos pelas turbinas da barragem de Camargos; suas águas são oligotróficas sem tendência à estratificação devido, em parte, ao pequeno tempo de residência da água. Agradecimentos -
Agradecemos
ao Departamento
de Pro-
gramas e Ações Ambientais (MA/PA) da Companhia Energética de Minas Gerais (CEMIG) pelo apoio logístico e financiamento das coletas; ao Df. Júlio C. Garavello (UFSCar) pela identificação taxonômica das espécies; ao Laboratório de Computação Científica (LCCIUFMG) pelo uso de suas instalações nas análises dos dados; ao Dr. Francisco A R. Barbosa, chefe do Laboratório de Limnologia (ICBIUFMG), pelo empréstimo de equipamentos e ao revisor anônimo pelas suas sugestões ao manuscrito.
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ICTIOFAUNA DE ITUTINGA (RIO GRANDE)
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