A II República da Polônia e os imigrantes poloneses no Brasil meridional (1918-1939

May 17, 2017 | Autor: Rhuan Zaleski | Categoria: Ethnicity, Etnicidad, Poloneses
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TRINDADE, R. T. Z. A II República da Polônia e os imigrantes poloneses no Brasil meridional (1918-1939) The II Polish Republic and the polish immigrants in southern Brazil (1918-1939) Rhuan Targino Zaleski Trindade 1 Resumo As relações entre o Brasil e a Polônia, e desta última com seus emigrados, existem desde o último cartel do século XIX, quando ocorre a imigração massiva de colonos poloneses para o Brasil. De 1795, após a tripartição até 1918 com a volta ao mapa europeu, a Polônia não existia enquanto estado independente. O país estava dividido entre os impérios Russo, Alemão e Áustro-Húngaro. Neste período não existia um projeto, isto é, um programa organizado e sistemático capaz de estabelecer um contato mais longevo e extensivo entre os países. As relações da Polônia para com seus emigrados se tornam mais agudas apenas a partir da Independência Polonesa com o final da Primeira Guerra Mundial em 1918, quando é instaurada a chamada II República da Polônia (19181939). Naquele momento começam articulações mais concretas e significativas por parte do Governo Polonês de aproveitar o potencial populacional fruto da diáspora polonesa, inclusive, com ambições coloniais. O foco deste artigo é justamente na instauração de uma política diplomática polonesa e a ação no âmbito educacional e cultural, baseada no envio de intelectuais, professores e militares para as colônias polonesas no sul do Brasil no período do entreguerras.

Palavras-chave: Diplomacia polonesa; imigração polonesa; período entre-guerras. Abstract The relations between Brazil and Poland, and the latter with its emigrants, there since the last cartel of the nineteenth century, when there is mass migration of Polish settlers to Brazil. In 1795, after the tripartition until 1918 with the return to the European map, Poland did not exist as independent state. The country was divided between the Russian, German and Austro-Hungarian empires. At that time there was no project, i.e., an organized and systematic program able to establish a more long-lived and extensive contact. Poland's relations to his emigrants become more acute just from the Polish Independence with the end of World War I in 1918, when it introduced the so-called Second Republic of Poland (1918-1939). At that moment get more concrete and significant joints by the Polish Government to take the population potential fruit of the Polish diaspora, even with colonial ambitions. The focus of this article are just the establishment of a Polish diplomatic policy and action in the educational and cultural spheres, based on sending intellectuals, teachers and military to the Polish colonies in southern Brazil in 1

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the interwar period.

Keywords: Polish diplomacy; Polish immigration; interwar period.

Introdução As relações entre o Brasil e a Polônia, e desta última com seus emigrados, existem desde o último cartel do século XIX, quando ocorre a imigração massiva de colonos poloneses para o Brasil. Contudo, naquele período não existia um projeto, isto é, um programa organizado e sistemático capaz de estabelecer um contato mais longevo e extensivo entre os países. De 1795, após a tripartição1 até 1918 com a volta ao mapa europeu, a Polônia não existia enquanto estado independente. O momento de maior estreitamento ocorre a partir da chamada “febre brasileira” entre 1890-1894, quando milhares de imigrantes poloneses chegam aos estados sulinos do país (RS, PR e SC). Neste período desenvolve-se uma maior preocupação por parte das autoridades, imprensa e intelectuais poloneses para com os compatriotas que constituíam colônias na América do Sul. Instituições, como o Grupo de Lwów2, são criadas para fazer estudos sobre as condições de vida dos emigrados e possibilidades de assentamento de poloneses, em especial, no Paraná. Ademais, criavam-se instituições, as quais propunham a compra de importantes superfícies de terras no Paraná; a instalação de emigrantes; a defesa dos colonos perante a exploração, bem como a satisfação das suas “necessidades espirituais” (escolas, igrejas). As relações da Polônia para com seus emigrados, entretanto, se tornam mais agudas apenas a partir da Independência Polonesa com o final da Primeira Guerra Mundial em 1918, quando é instaurada a chamada II República da Polônia (1918-1939). Naquele momento começam articulações mais concretas e significativas por parte do Governo Polonês de aproveitar o potencial populacional fruto da diáspora polonesa, inclusive, com ambições coloniais. Apenas a partir deste momento é que começam ações

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A Polônia sofreu três partilhas no século XVIII entre Áustria (depois Áutro-Hungria), Rússia e Prússia (depois Alemanha), a primeira em 1772, depois 1793 e finalmente 1795 que acaba com a independência da nação. 2 Grupo de intelectuais que se organizaram em torno da Sociedade Comercial e Geográfica de Lwów, na Galícia, então sob domínio austríaco. Sua maior preocupação era com as condições de assentamento dos emigrantes nas colônias do Novo Mundo e foram responsáveis por vários registros in loco do desenvolvimento dos assentamentos poloneses no sul do Brasil.

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mais concretas e significativas por parte do governo polonês e de instituições independentes, voltadas para os emigrados, tendo em vista a manutenção da identidade polonesa e o uso da diáspora como recurso político e econômico. Para isso, são instauradas as instituições diplomáticas e enviados vários intelectuais poloneses com o fito de manter e divulgar a polonidade entre os emigrantes.

1918-1930: Organização inicial do Estado Polonês e primeiras aproximações com os emigrados Com a independência, A Polônia, então dotada de um Estado, começou a desenvolver atividades com seus emigrados que ocupavam diversas colônias no sul do Brasil, ensaiando o estabelecimento de um programa político. Os poloneses compunham, segundo dados de Gluchowski (2005), nos anos 1920, cerca de 17% da população do Paraná, presentes de maneira importante na capital, Curitiba, onde constituía-se uma intelligentsia polonesa-emigrante e notadamente em colônias que circundavam a cidade. Em 1918, o novo governo do polonês ganhou uma oportunidade para redefinir o status de emigrantes e para criar a sua própria política de emigração, mas apenas no final de 1920 que os problemas das comunidades polonesas foram redefinidos e foram feitas tentativas de utilizar a Diáspora para o benefício da Polônia (WALASZEK, 2003). Dembicz e Smolana (1993, p. 22) afirmam que entre 1918/20 a 1939, ocorre uma segunda etapa da emigração massiva, desenvolvendo-se um período de uma “emigração dirigida”, patrocinada e inclusive organizada pelo Estado. Nesse contexto, começam a aportar, intelectuais, operários e imigrantes com qualificação profissional; além da contínua maioria de camponeses. O Estado Polonês começou a preocupar-se com a questão emigratória concentrando-se sobre a política oficial frente à Comunidade polonesa na América Latina. Os membros da diáspora foram, assim, muito bem avaliados como recursos, que a economia e a política polonesa poderiam desenvolver em diferentes aspectos. Uma das primeiras ações da Polônia independente foi a implantação em 1920 do Consulado Geral da República da Polônia no Brasil, justamente em Curitiba que era a cidade “mais polonesa do país”. Este ato significava a consecução de uma estratégia num sentido político e colonial, pensando em aproximar os emigrantes do recente estado polonês.

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Ademais, o primeiro cônsul foi Kazimierz Głuchowski3, personagem importante para a constituição das atividades polonesas e defensor de uma política nacionalista e isolacionista com relação aos emigrados. Márcio de Oliveira (2009) elucida a existência inclusive de práticas imperialistas polonesas, a partir da reconquista de sua soberania política (1918). Após mais de um século de partilha e dominação, o Estado polonês vislumbrou a possibilidade de transformar seus, por eles considerados, “emigrantes-colonos”, em colonizadores, tal como outras potências europeias haviam realizado em outras partes do mundo. Para o autor “Este objetivo “imperialista”, por mais estranho que soe hoje, estava lastreado em uma comunidade que havia se espalhado e se consolidado”, e que era “organizada nos planos social, cultural e educacional, além de ter se beneficiado de uma conjuntura particularmente favorável nos territórios ocupados às vésperas da reconquista da soberania do Estado polonês” (2009, p. 3). Muitos dos imigrantes instalados no Paraná (e também no Rio Grande do Sul) se viram assim às voltas com interesses nacionalistas e mesmo colonizadores, tendo seu papel migrado, em termos simbólicos e políticos, de colono-imigrante para emigrantecolonizador cujo objetivo final seria criar uma colônia da nação polonesa em terras brasileiras. Tais atividades devem ser observadas também sob o prisma da política externa polonesa, que tinha no Brasil o principal parceiro econômico na América Latina, mesmo que as relações de ambos os países não tenham sido muito próximas. A “distância geográfica, a falta de laços estreitos tradicionais e os objetivos fundamentais da política interna” (BRUDZINSKA, 2012, p. 163), legaram uma intensidade relativamente baixa no diálogo. Entretanto, a existência da grande diáspora polonesa no Brasil “sempre foi um elemento importante da relação polonês-brasileira” (BRUDZINSKA, 2012, p. 170). A partir de 1918 as ações do governo polonês vão ser promovidas principalmente num sentido da manutenção, nas colônias, da identidade nacional/étnica polonesa, isto é, a chamada polonidade. O maior investimento foi na educação e desenvolvimento cultural dos imigrantes a fim de evitar a assimilação e o “abrasileiramento”. Nesse sentido se constitui uma ação étnica do Estado polonês da Segunda República com o envio de emissários às comunidades polônicas para a “animação” das colônias. Estes emissários 3

Em 6 de Fevereiro de 1928, ele fundou a União dos Pioneiros Coloniais (Zwiazek Pionierow Kolonialnych), que defendia a aquisição de possessões ultramarinas para Polônia.

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eram conhecidos como instrutores educacionais (instrukturów), de maneira que deveriam desenvolver cursos, atuar em escolas, criar instituições, promover festividades, atividades recreativas, atuar nas associações polonesas criadas pelos emigrantes, etc. Em conjunto com a chegada dos instrutores, também são criadas uma série de instituições que visam congregar às associações étnicas já existentes criadas pelos colonos poloneses e desenvolver novas, tendo participação do consulado de Curitiba. Um exemplo é o Centralny Związek Polaków w Brazylii (União Central dos Poloneses no Brasil-CZP). Em 1930, foi criado a CZP, que se mantinha em contato com a União Mundial dos Poloneses no Estrangeiro, criada em Varsóvia. A CZP abrangia uma série de instituições polonesas de âmbito educacional, esportivo e agrícola. O estatuto da União Central dos Poloneses no Brasil previa que a sua função seria agrupar numa organização central todos os grupos poloneses, imigrantes e descendentes no Brasil, afim de elevar o nível e desenvolver a vida cultural, educacional, econômica e a trabalhar para a satisfação das necessidades espirituais, como também para a manutenção do estreito contato com a pátria-mãe. O que queremos demonstrar é a preocupação com a identidade nacional por parte dos funcionários poloneses no Brasil na primeira metade do século XX. São eles, membros de uma elite intelectual, podemos afirmar, uma intelligentsia polonesa, os quais vão definir o que é a polonidade (polskość), quais seus marcadores diferenciadores, e vão propor e tentar meios de promovê-la em solo brasileiro para evitar o processo de “abrasileiramento” ou perda da identidade nacional. Ao investigar a atuação de um Estado estrangeiro diante de emigrados já estabelecidos, parece-nos fundamental pensar o conceito de Identidade Social, posto que na mesma medida que se formula uma identidade nacional polonesa na Europa, no Brasil, a comunidade emigrada num contexto interacional distinto formula uma identidade étnica. As duas versões fundamentadas em atributos parecidos vão entrar em contato nas primeiras décadas do século XX devido à base de ação governamental polonesa. Pensamos a identidade social dentro do contexto da proeminência dos atores sociais (agency), bem como da noção de representações sociais (CHARTIER, 2002)4. Se

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No âmbito da história é pertinente a definição do conceito de representação coletiva proposta por Roger Chartier (2002, p. 73). Para o autor, ela permite articular três modalidades de relação com o mundo social: a) o trabalho de classificação e de recorte que produz configurações intelectuais múltiplas pelas quais a

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entendermos o mundo, o real, como um campo de lutas, lutas estas simbólicas (BOURDIEU, 1998) que envolvem o poder de enunciação e de nomeação, então podemos imaginar a importância que compreende a formulação de um discurso, ainda mais quando envolve aspectos de pertencimento, que acabam conformando grupos, os quais podem ser levados à ação conforme apontou Weber (1994). Segundo Bourdieu (1998) existe quase um “ato mágico”, envolvendo o poder (simbólico) de uma formulação definidora aceitável no corpo social, de modo que apenas os “porta-vozes”, as camadas privilegiadas socialmente, tem o poder de fazer a enunciação, a nomeação. Os poloneses enquanto grupo, por exemplo, são classificados como tais por esses representantes, estes “porta-vozes”, agentes de identidade (GIMENEZ, 1997), membros da intelligentsia, os quais recebem o poder para enunciar do próprio grupo, fazendo um caminho de mão dupla: “o representante faz o grupo que o faz”. A nomeação pode ter, portanto, um poder unificador e produzir uma diferenciação do grupo, do “nós”, com “os outros”. Entendemos a identidade, a partir destas ponderações, como “um processo ao mesmo tempo pessoal e coletivo, onde cada indivíduo se define com relação a um “nós”, que por sua vez, se diferencia dos “outros’” num ambiente interacional específico. Tal diferenciação é confirmada a partir de representação(ões), não apenas dada e atribuída por uma ilusão do espírito e/ou intencionalidade deliberada, mas também uma escolha correspondente a uma necessidade de reconhecimento e identificação presente no inconsciente coletivo, ou seja, a constituição de um pertencimento, baseado no autorreconhecimento e no heterorreconhecimento lastreados por marcas estabelecidas por atores interessados e com poder para instituir seus discursos. Este processo de atribuição de um significado social construído pressupõe abstrações refinadas, como a noção de um passado e um destino comum, em que se lida com história e memória (PESAVENTO, 2001: 8-9). Um destes discursos, o da identidade nacional ou nacionalismo, é construída(o) e conformada(o) por agentes interessados, os quais formulam representações, que diante de um poder (simbólico) de dizer e fazer crer (BOURDIEU, 1998), são estabelecidas no

realidade é contraditoriamente construída pelos diferentes grupos que compõem uma sociedade; b) As práticas que visam a fazer reconhecer uma identidade social a exibir uma maneira própria de ser no mundo e c) as formas institucionalizadas e objetivadas em virtude das quais representantes – instâncias coletivas ou indivíduos singulares – marcam de modo visível e perpétuo a existência do grupo, da comunidade ou da classe. O autor enfatiza, então, as lutas por representação.

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mundo social num contexto interacional. Esta identidade nacional gera um sentimento e ideia de pertencimento a uma entidade (nacional) mais ampla, uma comunidade imaginada (ANDERSON, 2008), identificada por uma série de atributos5 (THIESSE, 2001), símbolos essenciais para a auto-representação e distinção das pessoas que se identificam com a nação. Uma instituição com poder (simbólico) para impor as representações e interessada nas consequências que a identificação nacional poderia formular é o EstadoNação (HOBSBAWM, 2008), o predecessor do nacionalismo. Segundo Hobsbawn, (2008, p. 110-111) “[...] o nacionalismo poderia se tornar um instrumento enormemente poderoso para o governo, caso conseguisse ser integrado no patriotismo estatal, para torna-se seu componente emocional central”. A identidade é construída com base na cooptação de intelectuais, que criam modelos de identificação (normalmente fundamentados na cultura popular para garantir a aceitação dos cidadãos) as quais promovem a união e a exclusão de determinados indivíduos. Um poder homogeinizador baseado em símbolos (língua, cultura, atributos biológicos, etc.) e heterogeinizador, que serve como mediador/criador do real, num contexto de concorrências e competições e de um jogo de interesses, ou seja, uma luta de representações (CHARTIER, 2002). Outro discurso “identificador social” é constituído no Brasil com a presença, entre outros, de imigrantes europeus, isto é, o processo de constituição grupal étnico que conforma identidades e etnicidade, os quais diferenciam um grupo dos outros, ou seja, um processo de etnogênese. Nesse contexto, identidades já preexistentes, como as identidades nacionais, podem ser reconstruídas sobre outros véus, em condições interacionais distintas. A fim de desenvolver estas questões, há que demarcar as dinâmicas impostas para a delimitação do grupo étnico e, logo, a constituição de uma identidade étnica. Segundo Barth (1998), a definição de um grupo étnico se dá na interação social, geradora de processos de inclusão e exclusão, tendo como resultado a delimitação de fronteiras. Para a constituição destas, são escolhidos ou modificados traços que servem como elementos de distinção e de diferenciação social (STREIFF, POUTIGNAT, 1998), características compartilhadas, estabelecidas como símbolos identitários, as quais 5

Segundo Thiesse (2001), há uma check list, um código de símbolos internacionais que define o que todas as nações devem ter: uma história estabelecendo a continuidade da nação; uma série de heróis modelos dos valores nacionais; uma língua; monumentos culturais; um folclore; lugares memoráveis e uma paisagem típica; uma mentalidade particular; identificações pitorescas – costumes, especialidades culinárias ou animal emblemático.

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instituem a crença em uma origem comum, podendo ser reforçadas e/ou modificadas. Esta origem é buscada no passado (por exemplo, lembranças da colonização e imigração) a fim de estabelecer uma identidade de grupo, no caso, com predicados étnicos. É no século XIX, sob a égide da ocupação estrangeira, que configura-se um nacionalismo polonês, o qual podemos verificar através da categoria polonidade, nascida no contexto da emergência dos nacionalismos europeus do século XIX, o que Hobsbawm (2009, p. 206) denomina nacionalismo político. Este era baseado na língua, na etnia e na autonomia estatal, vinculados à direita política, porém com a especificidade do caso polonês, onde não havia um estado capaz de promover o nacionalismo da forma tradicional. Hobsbawm (2009) analisa que o nacionalismo polonês voltava-se a recuperação do estado, fundamentado numa comunidade mais religiosa que linguística com um trabalho de formulação feito por intelectuais poloneses nacionalistas engajados na luta independentista. Portanto, o que existiria seria um protonacionalismo. A promoção estatal do nacionalismo polonês ocorre somente com a independência em 1918, e sob a ditadura de Piłsudski (1926-1935), adquire contornos modernos, tal e qual formulado por Hobsbawm. Nesse ínterim, o governo polonês para além de estabelecer a polonidade em âmbito nacional, identifica possibilidades e a necessidade de configurar o mesmo sentimento além-mar, entre os emigrados na América. Em contrapartida, nas colônias, a polonidade é outra construção, uma formulação acerca do sentimento nacional, ou uma vinculação com o país natal moldada ainda no século XIX e conformada por lideranças, isto é, porta-vozes do grupo, num contexto histórico interacional étnico específico da sociedade acolhedora e diferente do polonês na Europa. Este processo de idealização de si mesmo, feito por um grupo, estabelecendo fronteiras, é influenciado por diversos outros âmbitos sociais, políticos e institucionais. Governos, religião, instituições étnicas, considerando-se aqui também as escolas, intelectuais e líderes, são algumas destas influências contribuintes para o desenvolvimento e estabelecimento do caráter identitário. As escolas étnicas polonesas, as quais haviam se desenvolvido através dos trabalhos dos colonos desde finais do século XIX, foram alvo importante da ação governamental polonesa e das suas aspirações políticas, uma vez que vários professores e instrutores culturais foram enviados para as escolas existentes. Além disso, novas instituições foram criadas, tendo o patrocínio do consulado e a presença de professores Rev. História Helikon, Curitiba, v.3, n.6, p.126-142, 2º semestre/2016.

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imigrados da Polônia. Cursos para professores foram desenvolvidos, a fim de formar docentes provenientes das colônias. O idioma e a prática da manutenção de outros signos identitários eram o principal foco de atuação a fim de manter/criar/estreitar as relações dos imigrantes e descendentes com a “pátria-mãe”. Por vezes, as atividades traziam um aspecto novo, já que eram diferentes do trabalho prévio realizado pelos imigrantes, o qual era permeado pela constituição de uma identidade polonesa particular, moldada na diáspora e antes da existência do estado polonês, bem como compartilhada por várias gerações de descendentes nascidos no Brasil e com a cidadania brasileira, de certo modo, já inseridos na sociedade englobante brasileira. Esse diálogo do nacionalismo procedente da Polônia e seus instrutores e funcionários diplomáticos com a identidade étnica dos polono-brasileiros constituídos pela diáspora fundamentalmente do final do século XIX, são a tônica de possíveis disputas referente à influência da II República frente seus imigrantes, bem como, ponto fulcral da ação polonesa no Brasil: a manutenção da polonidade. Existe assim, um conflito também entre as lideranças polonesas estabelecidas com as enviadas tardiamente. Um elemento importante no assentamento dos imigrantes poloneses é o fato de que, desde o início da imigração, vários sacerdotes e missionários católicos acompanharam os fluxos migratórios, tornando-se lideranças nas comunidades, onde a Igreja Católica era parte fundamental da construção identitária étnico/nacional polonesa e da configuração social local. Foram esses sacerdotes que ajudaram na organização inicial dos poloneses, na construção das capelas e igrejas e, notadamente, no desenvolvimento das sociedades culturais e das instituições étnicas, tornando-se lideranças. Contudo, desde fins do século XIX, houve contendas entre elementos religiosos (sacerdotes e lideranças leigas), chamados “clericais”, que defendiam a ingerência do clero polonês emigrado, contra elementos anticlericais, (enviados da polônia e intelectuais poloneses locais) conhecidos como “liberais”. As divergências ocorreram, sobretudo, no âmbito cultural e educacional, mas em alguns momentos transferiram-se para a política6, iniciando antes da independência Weber (2015), para um período anterior ao da Independência polonesa, afirma que Simão Kossobudzki, um ex-militante em prol da independência da Polônia e participante de revolução de 1905, que engajou-se no grupo da Kultura [organização laica-anticlerical], mesmo tendo organizado o Diretório PolonoBrasileiro do Partido Republicano de Araucária, teve inviabilizada sua candidatura a deputado pelo Partido Republicano, em virtude da rejeição de seu nome pelo clero polonês, que controlava o voto nas colônias. 6

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polonesa, mas recrudescendo após sua ocorrência, quando chegam os funcionários governamentais, representantes consulares e instrutores (instruktorów), muitos dos quais vão tomar parte da contenda ao lado do bloco mais anticlerical. No Brasil, nos anos 1920, são criadas inclusive duas instituições rivais cada qual congregando um grande número de escolas polonesas: a Oświata, ligada à Igreja Católica e a Kultura, vinculada aos “anticlericais” e “liberais”. Para além da manutenção da polonidade e da atenção aos emigrantes, por mais sui generis que possa parecer (HUNCZAK, 1967), a Polônia tentou implementar uma migração ativa e uma política de colonização na América do Sul, com o Brasil e a Argentina como alvos principais. No final dos anos 1920 um delegado do recém criado Gabinete de Emigração Polonês, visitou o Brasil e investigou possibilidades de assentamentos poloneses. Logo após a independência, a Polônia se viu em conflitos fronteiriços com a Alemanha, a Tchecoslováquia, a Lituânia e a URSS. Com esta última, envolveu-se numa guerra entre 1920-1921, em que o Exército Vermelho chegou na periferia da capital Varsóvia, antes de ser repelido. A Alemanha também não aceitou em nenhum momento, antes de 1934, suas fronteiras orientais com a Polônia. Esta geopolítica desastrosa e os problemas relacionados à organização de um estado recente, portanto, limitaram a atuação nos assentamentos poloneses na América do Sul nos primeiros anos pósindependência. 1930-1939: O reforço do Estado Polonês e a Campanha de Nacionalização E assim hoje podemos e devemos constatar o fato de que toda a nossa Emigração está inteiramente separada da Polônia, e ligada a ela apenas pelo sentimento, por um sentimento que a cada dia se torna mais fraco. E se olharmos diante de nós tranqüilamente, não embriagados por qualquer tipo de fanatismo, veremos diversas categorias de poloneses. Uns vêem para onde estamos caminhando (de um modo geral o número deles cresce dia a dia, não sendo neste momento ainda muito numeroso) e estes se dividem em dois grupos. Uma parte, apreciando sobretudo o polonismo, não querendo afundar num elemento que lhe é estranho, não quer trabalhar pela riqueza dos outros, vivência uma grande tragédia, perguntando o que fazer para que eles mesmos e a sua geração possam permanecer poloneses. [...] Outros, sentindo que estão afundado, que nada os salvará, desejam apressar esse processo, contanto que ao menos para os seus filhos ele transcorra da forma menos dolorosa possível, e estes até contribuem pessoalmente para que seus filhos se tornem brasileiros. E finalmente [...] aqueles que não filosofam nem navegam

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na onda, vivendo de um dia para outro e aos quais a vida levará para onde a encaminha a ligeira corrente da necessidade, mantém-se inteiramente passivos. (GŁUCHOWSKI, 2005, p. 320)

Neste fragmento do livro Os poloneses no Brasil, do ex-cônsul da Polônia em Curitiba, Kazimierz Gluchowski publicado originalmente em Polonês em 1927 (traduzido e republicado em 2005), a polonidade, é entendida nesta acepção, como sentimento nacional. Após o estabelecimento das primeiras colônias, no contexto de um fluxo menor de imigrantes, existe a constatação da existência de um processo triplo: os que ainda mantém a ligação com a Polônia, os que querem abandonar o mais rápido possível e os passivos. Ou seja, o autor, analisa as condições da identidade étnica polonesa local como um meio de informar das possibilidades para a Polônia com relação aos emigrados. Ao longo do tempo, a polonidade vai sendo formulada pelos “porta-vozes” do grupo polonês, tanto intelectuais imigrantes como os a serviço do governo, sendo baseada em marcadores definidos como sendo “tradições” polonesas, aquilo que chamaríamos de “cultura comum” (SEYFERTH, 2000) além da manutenção da força da religião e da língua. Araújo Filho (2003) empreende uma análise da construção da polonidade, tratando como uma construção social levada a cabo pelo segmento urbano dos imigrantes poloneses e que reportavam a práticas específicas do campesinato tradicional. Araújo Filho tenta demonstrar a heterogeneidade dos imigrantes poloneses, partindo do pressuposto de Wachowicz, de uma imigração urbana e de uma intelligentsia no Paraná, em especial, Curitiba, os quais teriam formulado a noção de polonidade baseados nos colonos rurais, fundamentado no discurso da manutenção da língua e da religiosidade. Nesse sentido, haveria um esforço do clero, comerciantes donos de jornais, políticos e diretores de sociedade para a formulação do discurso, fato demonstrado em oposição ao sentimento nacional trazido pelos funcionários governamentais poloneses. Na década de 1930, com o estado polonês mais organizado, se iniciam atividades mais pontuais, especialmente na tentativa de desenvolver uma política imperialista voltada à conquista de colônias polonesas para a busca de matérias-primas e a consecução de um mercado consumidor para os produtos poloneses. O governo polonês tentou usar assentamentos da diáspora existentes para cumprir os grandiosos planos nacionalistas e coloniais mais amplos. Consequentemente, imigrantes poloneses eram tratados como cidadãos importantes para a realização das metas políticas e ideológicas dos governos ou Rev. História Helikon, Curitiba, v.3, n.6, p.126-142, 2º semestre/2016.

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regimes. Baseado na utilização dos colonos instalados, por exemplo, foi criado em 1934 em Varsóvia, um grupo chamado de Aliança Mundial dos poloneses do exterior (Światowy Związek Polakow z Zagranicy - Światpol). O slogan de Światpol era: "A Polônia é para os poloneses, mas os poloneses são para Polônia, a Polônia existe onde quer que haja poloneses”. Sobre o imperialismo é importante frisar que entre 1875 e 1914, surge um novo tipo de Império, o colonial, isto é, período que predomina a colonização imperialista da Europa sobre países asiáticos, africanos e latino-americanos. As potências europeias deveriam expandir o ambiente econômico para o desenvolvimento de sua força produtiva, ou seja, dilatar o espaço do desenvolvimento do capitalismo, a fim de obter matériasprimas, mercados para produtos manufaturados e inversões de capitais acumulados. O Brasil, diante desta perspectiva, em razão da sua independência e impossibilidade de ser colonizado diretamente, isto é, militar, político e economicamente pelas potências europeias, torna-se área de influência daquelas nações, as quais iniciam uma política externa para a consecução de seus objetivos. Os imigrantes, para aqueles países que os tinham em terras brasileiras, poderiam ser “porta de entrada” para produtos industriais das nações imperialistas, assim como elementos políticos facilitadores das relações com o governo brasileiro (MAGALHÃES, 1993, BERTONHA, 1997), ou seja, um expediente para a política externa dos países europeus. Os orquestradores da influência polonesa foram os oficiais do exército polonês, principalmente Stefan Strzemiański, que eram enviados ao Brasil a fim de fundar novas colônias no país, ainda que sem uma ligação formal com o estado polonês, mas apenas um apoio discreto por parte da política externa polonesa (HUNCZAK, 1967). Strzemiański estava a serviço da Liga Morska i Koloniala (Liga Marítima e Colonial-LMiK), um dos exemplos mais claros das políticas polonesas. A Liga Marítima e Colonial era uma instituição independente e uma das mais importantes organizações que procurava áreas de colonização para os emigrantes poloneses. A partir destas considerações, as ações desta LMiK desde 1930, empregaria um caráter “imperialista” e “colonialista” às ações polonesas com o objetivo de fundar colônias e possivelmente dominar regiões. A liga chegou a ter mais de 800 mil filiados (HUNCZAK, 1967) na Polônia e fazia protestos reivindicando terras para o país, pressionava o governo para Rev. História Helikon, Curitiba, v.3, n.6, p.126-142, 2º semestre/2016.

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estabelecer políticas coloniais, bem como efetuava a compra de fazendas e alguns milhares de hectares no Brasil para criar colônias polonesas. Em 1933-1934 o Ministério dos Negócios Estrangeiros criou planos para formar assentamentos poloneses em uma região entre o Brasil, Argentina e Paraguai. Território nas margens do rio Paraná foi descrito como o melhor para o projeto; devido aos assentamentos poloneses já existentes em Misiones (Argentina) e o caráter periférico da região, proporcionaria (acreditava-se) uma chance muito boa para o sucesso de uma colônia polonesa. Na década de 1930 a LMiK, começou a promover compra de terras através de negócios com o governo paranaense. Ocorreu a colonização da colônia Morska Wola, no vale do Rio Ivaí, no Oeste do estado do Paraná e planejada a criação da colônia OrliczDreszer. Nessa mesma década, quando começou a ser colonizado o Norte do Paraná, chegaram a ser fundadas colônias polonesas nessa região: Warta, nos arredores de Londrina (1934), que recebeu poloneses transmigrados principalmente de Santa Catarina, e Gleba Orle, no atual município de Arapongas (1937), formada por um grupo de poloneses vindos diretamente da Polônia e outros que vieram do Sul do Paraná ou de Santa Catarina. Apesar das negociações bem sucedidas com o Governo do Paraná, que renderam tentativas de colonização, como as ações do general Strzemianski. Ao todo, a Liga comprou cerca de apenas 30 mil hectares no estado do Paraná com o objetivo de instalar colonos. A partir deste momento, podemos observar que depois de uma fase inicial de estabelecimento da Polônia Independente a partir de 1918 e com um segundo momento de reforço da ação polonesa nos anos 1930, os planos poloneses eram ambiciosos. Contudo, no final da década de 1930, no Brasil, começa a surgir uma resposta aos interesses europeus com relação aos colonos emigrados, especialmente embasada na noção de “perigo alemão”, com o crescimento dos regimes totalitários europeus e uma possível “ameaça” à soberania nacional. As atividades polonesas não passaram despercebidas. Em meio às políticas nacionalistas do governo Vargas e de um crescimento de um medo de parte da intelectualidade brasileira com relação à afluência de estrangeiros, há o início de certo receio com relação aos poloneses, em especial nas regiões em que eram numericamente importantes. Em Curitiba, o jornal "Correio do Paraná" deu o alarme de que a Polônia estava Rev. História Helikon, Curitiba, v.3, n.6, p.126-142, 2º semestre/2016.

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se preparando para conquistar vários estados do Brasil, a fim de dominá-los e estabelecer colônias polonesas. Tal fato rendeu manifestações antipolonesas e ameaças de contramanifestações por parte das sociedades polônicas, o que quase gerou um confronto nas ruas. Em agosto de 1938, o Interventor do Paraná, Ribas, afirmou que “as frotas unidas alemã, polonesa e italiana invadirão as nossas costas”7 (KULA, 1976) tal era o clima durante o Estado Novo. Segundo Kula (1976) existia um Plano de Colonização de 10 anos, que nasceu no Ministério dos Negócios Estrangeiros em 1936, em que elementos como manutenção da polonidade e evitar o abrasileiramento eram tarefas primordiais: “O maior cuidado do Estado em relação a emigração deveria ser a tendência a manter íntegra a consciência nacional do elemento emigrante. O fortalecimento do sentimento nacional dos emigrantes se realiza,antes de tudo, através da criação de aglomerações de emigrantes, que mantém estreito contato com o país natal, amparando a emigração [...] Desfazendo-se da parte ativa da sua nação, o Estado Polonês deveria de maneira consciente e planificada dirigir o movimento emigracional para os países, que apresentam para a Polônia especial interesse político e econômico. Desta maneira compreendida, a emigração pode se tornar um sério instrumento igualmente da política estrangeira, assim como da política econômica do Estado Polonês”.8

Em outro documento do ministério, a emigração polonesa é vista como necessária, devido aos excedentes populacionais, e, de outro lado, pela orientação da expansão política e econômica para além das fronteiras do país. Afirmando que para “a posição de potência da Polônia, imprescindível é a obtenção do fator de influências políticas fora da Polônia” 9. O Ministério chegou a afirmar que o Brasil estava ciente das atividades relacionadas à emigração, de maneira que deveriam tomar as ações com cuidado (KULA, 1976). Não importa o quão irrealista esses planos fossem, em geral, foi a política interna da Argentina e do Brasil, o que impediu a realização de quaisquer intenções coloniais polonesas, e ao mesmo tempo abateu profundamente a cultura da diáspora polonesa na América do Sul. No entanto, a Polônia continuou a busca de territórios potenciais para os migrantes poloneses. 777

B. Lepecki, Vice-Consul da Polônia em Curitiba, para o Representante da Polônia no Rio de Janeiro 29 VIII 1938, AAN-MSZ n° 10386, p. 83. 8 AAN-MSZ n° 9585, p. 11. 9 AAN-MSZ n° 9578, p. 151.

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De fato, a reação brasileira é complementada pelas políticas subsequentes do estado. Inicia uma restrição à imigração e uma “campanha de nacionalização” do Estado Novo (a partir de 1937) coordenado por Getúlio Vargas, cujos objetivos fundamentados num “nacionalismo brasileiro”, atingem os poloneses, em especial suas instituições de ensino. Estes fatos conduzem as autoridades polonesas e a LMiK a se concentrarem-se, a partir de então, na África (Libéria, Madagascar e Angola).

Comentários Finais Os planos poloneses após 1930 eram ambiciosos. Os emigrantes eram vistos como recursos importantes politicamente e economicamente. Houve um esforço por parte do estado polonês e de instituições independentes para utilizar aquela população. Este fato permitiu a vinda de intelectuais e a criação de pequenas colônias, contudo, o enfraquecido estado polonês não era capaz de sustentar uma política colonial que fosse além da manutenção da identidade cultural dos imigrantes e depois da Campanha de Nacionalização, mesmo tal perspectiva se tornou insustentável. A II República Polonesa conviveu com um período de dificuldades econômicas e pobreza, somados a uma geopolítica flagelante. Ao longo dos anos, ocorreram vários conflitos fronteiriços. Cienciala (2011) deixa claro que os objetivos da política externa polonesa estavam concentrados em manter um equilibrium com a Alemanha Nazista e a URSS, vizinhos que por séculos tiveram objetivos predatórios sobre as terras polonesas. Em resumo, impedir a invasão estrangeira e manter a independência para o recém estabelecido estado polonês era a prioridade, mais que a conquista de colônias. Apesar das dificuldades, durante a II República (1918-1939), existiram vários vínculos entre a Polônia e seus emigrantes no Brasil. Fator gerador de conflitos entre entidades católicas e laicas, bem como entre as lideranças estabelecidas e as da “emigração dirigida”. O estado polonês instalou estabelecimentos diplomáticos, patrocinou a ida de intelectuais para as colônias fruto da diáspora das décadas anteriores, bem como enviou investimentos para o estabelecimento de projetos com os colonos, os quais permitiram a emergência de instituições culturais e de ensino, as quais tinham entre outros objetivos, promover e manter uma polonidade constituída enquanto identidade cultural. Segundo Walaszek (2003), a influência da República polonesa em muitos

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lugares, de fato, abrandou os processos de assimilação e aculturação entre os jovens, permitiu a elevação do nível de ensino e apoio para o catolicismo. Legados que foram arrefecendo com a nacionalização varguista. Os diversos fatores políticos dos anos 1930 legaram dificuldades para a Polônia, as quais culminariam na Segunda Guerra Mundial e numa nova perda da independência polonesa com a invasão alemã em setembro de 1939 e o fim da II República. Alguns poloneses, no entanto, mantém o vínculo com a pátria-mãe, deslocando-se do Brasil, para combater na Europa pela Polônia ocupada.

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Data de recebimento e aprovação Recebido: 10/03/2016 Received: 10/03/2016 Aprovado: 17/12/2016 Approved: 17/12/2016

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