A importância do consumo energético dos edifícios na Europa: soluções propostas para a sua redução

June 12, 2017 | Autor: João Castro-Gomes | Categoria: Energy and Environment, Environmental Sustainability
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A importância do consumo energético dos edifícios na Europa: soluções propostas para a sua redução Luís Pires*, Pedro D. Silva* e J. P. Castro Gomes** * Departamento de Engenharia Electromecânica Universidade da Beira Interior Calçada Fonte do Lameiro – Covilhã Telf: +351 275 329 925; fax: +351 275 329 972; e-mail: [email protected], [email protected] ** Departamento de Engenharia Civil Universidade da Beira Interior Calçada Fonte do Lameiro – Covilhã Telf: +351 275 329 976; fax: +351 275 329 969; e-mail: [email protected]

Resumo — O crescimento do consumo mundial de energia primária registado nos últimos anos, os valores significativos da dependência energética do nosso país e da União Europeia em relação a países terceiros e a dimensão da fatia relativa aos edifícios na procura final de energia exigem a adopção de medidas que promovam uma redução geral de consumos energéticos. Em particular, tem-se verificado nos anos mais recentes, um forte crescimento do consumo de energia para promover o arrefecimento dos edifícios. Torna-se portanto necessário desenvolver medidas especialmente dirigidas para a redução deste género de consumo energético. Neste trabalho discutem-se algumas das tecnologias tradicionalmente usadas para esse fim, propondo-se também uma nova solução tecnológica.

1. Introdução Em 2004 o consumo de energia primária a nível mundial atingiu o valor de 10224,4 mtep (milhões de toneladas equivalente de petróleo) o que representa um aumento de 4,3 % em relação ao consumo do ano anterior. Na União Europeia (EU25), e no mesmo ano, o consumo foi de 1718,8 mtep, 1,3 % acima do valor de 2003, e representando cerca de 17,0 % do consumo mundial [1]. A União Europeia é também fortemente importadora de energia, tendo importado em 2002 cerca de 48 % dos combustíveis que utilizou [2]. De resto, prevê-se que, se nada se fizer, dentro de 20 a 30 anos a União Europeia esteja a cobrir 70 % das suas necessidades energéticas com produtos importados [3], o que envolve sérios riscos em relação à segurança do seu aprovisionamento energético. Em Portugal o consumo de energia primária foi de 25,0 mtep em 2004, tendo-se verificado uma redução relativamente a 2003 de 0,9%. Se analisarmos o consumo por tipo de combustível observamos que a produção hidroeléctrica apresentou um decréscimo em relação a 2003 de 22,2 %. Este facto, provocado pela grave situação de seca que se verificou em 2004, pode explicar a redução conseguida no consumo global desse mesmo ano, já que ao nível dos outros combustíveis se verificaram aumentos

substanciais, 3,3 % no petróleo, 3,7 % no de gás natural e 2,6 % no carvão [1]. No que respeita à dependência energética do nosso país relativamente às importações, a situação é ainda mais preocupante que no caso da União Europeia, pois o seu valor em 2002 era da ordem de 84 % [2]. De acordo com o que se apresenta na figura 1, o sector dos edifícios (doméstico e serviços) representou, no ano de 2002, cerca de 40 % do consumo final de energia no conjunto dos 25 países que, actualmente, compõem a União Europeia. Neste sector, em particular, o consumo nos edifícios domésticos representou cerca de 63 % do valor total [2]. De acordo com dados avançados pela própria União, entre 1990 e 2000 o consumo de energia nos edifícios domésticos teve, na União Europeia, um crescimento médio de 0,7 % ao ano. O consumo para fins de aquecimento (aquecimento ambiente, águas quentes sanitárias, confecção de refeições) cresceu em média, apenas, 0,5 % ao ano. Contudo, o consumo associado ao arrefecimento teve um crescimento bastante acentuado, 14,6 % ao ano, como resultado do aumento da procura de conforto associada à elevação dos padrões da qualidade de vida e também da redução dos preços dos equipamentos de ar condicionado. Ainda sobre este tópico, prevê-se que a procura de energia para arrefecimento de edifícios cresça a uma taxa de 3,4 % ao ano no período entre 2000 e 2030 [4]. Edifícios de serviços 15%

Edifícios domésticos 25%

Indústria 28%

Transportes 32%

Fig.1. Consumo final de energia por sector na UE25 em 2002.

A nível nacional, o sector dos edifícios apresentou em 2003 um consumo final de energia de 5,4 mtep representando cerca de 29 % do consumo total, figura 2. Tem particular interesse referir o contributo deste sector no consumo final de energia eléctrica, que foi no referido ano da ordem de 60 % [5]. Importa, adicionalmente, saber que Portugal apresentou em 2000 um nível de emissões de CO2 superior em 49,9 % ao valor de 1990 [4], quando o País se comprometeu perante o Conselho Europeu, e de acordo com o previsto no protocolo de Quioto, a limitar o crescimento das suas emissões, no período 2008-2012, a um valor de 27 % em relação ao valor do ano de referência, 1990 [6]. Consciente da importância do sector dos edifícios no plano energético, o Parlamento Europeu e o Conselho da União Europeia aprovaram em 2002 a directiva 2002/91/CE relativa ao desempenho energético dos edifícios. Foi estabelecida a data de 4 de Janeiro de 2006 como data limite para a transposição desta directiva para a ordem jurídica interna de cada um dos países membros da União. No caso de Portugal, aguarda-se para breve a sua adopção, integrada na implementação de um Sistema Nacional de Certificação Energética e da Qualidade do Ar Interior nos Edifícios. Aguarda-se, também, a votação dos decretos-lei que aprovam o novo Regulamento das Características de Comportamento Térmico dos Edifícios e o novo Regulamento dos Sistemas Energéticos de Climatização dos Edifícios, mais exigentes que os anteriores. Edifícios de serviços 12%

Edifícios domésticos 17%

Indústria 32%

Transportes 39%

Fig.2. Consumo final de energia por sector em Portugal em 2002.

Tem-se observado nos últimos anos, com especial incidência nos países mais desenvolvidos, à propagação do uso de aparelhos de ar condicionado. Nesta situação encontram-se os países do sul da Europa, e, mais recentemente, os países do centro e norte do mesmo continente [7]. De acordo com o estudo EERAC – Energy Efficiency of Room Air Conditioners apresentado em 1999 pela Comissão Europeia [8] a proliferação deste tipo de aparelhos tem crescido de forma acentuada nos últimos anos, sendo de esperar que no caso particular de países como Portugal, Espanha e Grécia esse crescimento se continue a verificar a uma taxa de 7 %, ao ano, durante os próximos anos. Este factor conduz à ocorrência de picos de procura de energia eléctrica durante os meses de Verão, quando as necessidades de arrefecimento são mais prementes. A existência desses picos de procura pode originar a ruptura do sistema de distribuição de electricidade, como tem acontecido nos dias mais quentes

dos últimos anos, por exemplo, na Grécia. Por outro lado, e atendendo a que tais picos ocorrem apenas durante algumas semanas do ano, é evidente que capacidade produtiva adicional necessária para lhes responder não pode ser obtida com recurso à construção de dispendiosas centrais de produção de energia eléctrica nem tão-pouco à importação de electricidade de países vizinhos [7]. A utilização crescente de aparelhos convencionais de ar condicionado sugere, também, preocupações de carácter ambiental que ultrapassam a questão associada ao consumo de energia. Por um lado, é conhecida a contribuição dos refrigerantes do tipo CFC (clorofluorcarbonetos) – de utilização proibida, embora ainda se encontrem em muitas aplicações de refrigeração e ar condicionado – na depleção da camada de ozono. Por outro lado, os refrigerantes desenvolvidos para os substituir, do tipo HFC (hidrofluorcarbonetos) e PFC (perfluorcarbonetos), apesar de não contribuírem para a destruição da camada de ozono, têm um elevado potencial de aquecimento global, pois tratarem-se de gases de efeito de estufa.

2. Arrefecimento passivo de edifícios Nos últimos anos, e na sequência das questões discutidas no ponto anterior tem sido intensa a procura de soluções técnicas que conduzam à melhoria do comportamento térmico de edifícios, como acontece nos trabalhos de, por exemplo, Pires et al. [9], Chwieduk [10], Ding et al. [11] e Hawlader et al. [12]. Nesta perspectiva, e no âmbito do conceito de arquitectura sustentável, ou bioclimática, segundo o qual, entre outros aspectos, se devem ter em linha de conta as condições climáticas do local onde os edifícios são implementados [13], apresenta-se, neste trabalho, uma caracterização de técnicas utilizadas tradicionalmente para promover o arrefecimento de edifícios, como são a ventilação nocturna, a acumulação de frio e o arrefecimento evaporativo. Adicionalmente propõe-se uma nova tecnologia de baixo consumo energético baseada na utilização combinada destas três técnicas de reconhecido valor. A. Ventilação nocturna A ventilação nocturna prevê a passagem do ar da noite pelo interior do edifício de modo a arrefecer a sua massa térmica. O frio aí acumulado é depois empregue durante o dia para contrariar os ganhos de calor do edifício, mantendo a sua temperatura interior dentro de limites aceitáveis [14]. Segundo Cardinale et al. [15], a ventilação natural é, na região mediterrânica, a forma mais efectiva de arrefecer edifícios de modo passivo. Ao projectar um edifício ventilado naturalmente deve começar-se pelo estudo das condições climáticas e da orografia do local da construção, garantindo-se, assim, a permeabilidade do edifício aos fluxos exteriores de ar. Consegue-se, deste modo, retirar o

calor do interior do edifício reduzindo a sua temperatura e melhorando o conforto térmico associado. Com esta estratégia consegue-se reduzir o consumo de energia associada ao condicionamento do ar no Verão. De salientar que a exposição aos fluxos de ar exterior deve ser evitada no Inverno, o que não representa uma grande dificuldade pois os ventos predominantes têm, em geral, diferentes direcções nas duas estações do ano. Segundo os autores, a correcta exposição dos edifícios e da morfologia urbana aos ventos prevalecentes permite a redução das necessidades de arrefecimento mesmo em edifícios não bioclimáticos, sem qualquer custo. Através da simulação do comportamento de um edifício não bioclimático, ou seja, um edifício com características comuns ao nível dos materiais e das tecnologias que integra, apontam as capacidades de arrefecimento e as possibilidades de poupança energética oferecidas por uma correcta ventilação natural. Uma variante da ventilação natural é a que se efectua durante a noite, tirando partido do arrefecimento natural que ocorre nesse período. A ventilação nocturna, que pode ser natural ou mecânica, é uma estratégia de arrefecimento que tem sido utilizada ao longo de séculos, em especial em regiões climáticas com verões quentes. Existe, actualmente, um interesse renovado na ventilação nocturna, simultaneamente em climas quentes e em climas moderados [16]. De modo a avaliar a aplicabilidade da ventilação nocturna devem conhecer-se as condições climáticas de cada região em particular. Numa avaliação inicial das estratégias mais adequadas para uma região específica, podem usar-se os diagramas bioclimáticos. Tratam-se de diagramas psicrométricos onde estão marcadas determinadas áreas que facilitam a coincidência entre as estratégias do projecto e as condições climáticas do local. Num trabalho com as vertentes numérica e experimental, Kolokotroni et al. [16], realizaram simulações térmicas de um típico edifício de serviços para uma grande variedade de condições internas e contemplando diversos dados climáticos correspondentes ao Verão em Inglaterra. Os resultados mostram que a ventilação nocturna é um método viável para tratar o problema do sobreaquecimento dos edifícios de serviços naquele país. Simultaneamente, foram realizados ensaios experimentais num edifício de serviços recentemente reabilitado que confirmam que, nos espaços ventilados durante a noite, as temperaturas apresentavam valores inferiores ao habitual durante o dia seguinte, em especial nas primeiras horas de trabalho. Ainda sobre este assunto, num trabalho exclusivamente experimental, que decorreu durante o período de Verão no sul da Califórnia [17], foi realizada a monitorização de edifícios com diferentes massas térmicas e expostos a diferentes condições de ventilação e sombreamento. Foi avaliado o efeito da ventilação nocturna no comportamento térmico desses edifícios. Concluiu-se que a ventilação nocturna teve, apenas, um pequeno efeito na temperatura máxima interior do edifício com reduzida massa térmica. Contudo, foi muito efectiva na redução das temperaturas

máximas interiores, no edifício com elevada massa térmica. Também Pfafferott et al. [18], defendem que, em climas moderados, o arrefecimento passivo por ventilação nocturna é uma abordagem promissora para reduzir a procura de energia, em condicionamento de ar, nos edifícios de serviços, sem reduzir o conforto térmico associado. Segundo os autores, pesquisas anteriores mostraram claramente que a procura de energia nos novos edifícios de serviços é dominada pela procura de electricidade para iluminação, ventilação e ar condicionado. Defendem que, um estudo recente sobre edifícios de serviços na Suécia, indica claramente que, naquele país, os edifícios de serviços têm experimentado uma contínua redução na procura de aquecimento, como resultado do melhor isolamento dos edifícios impostos pelos códigos actuais mais exigentes. Esta melhoria do desempenho térmico da envolvente foi acompanhada, por outro lado, pelo crescimento da carga térmica interior associada aos novos equipamentos de escritório. No estudo realizado pelos autores [18] foi efectuada a monitorização de um edifício de serviços por um período de tempo de dois anos. O edifício foi projectado e construído de modo a permitir o acompanhamento de um conjunto de grandezas, por exemplo, a temperatura do ar interior e o caudal de ar insuflado em cada uma de doze salas, o que permitiu avaliar o efeito da ventilação nocturna nas condições de conforto do edifício. Adicionalmente, os dados recolhidos serão empregues, no futuro, na validação de ferramentas de simulação empregues no projecto de edifícios com arrefecimento por ventilação nocturna. Em regiões onde a amplitude diurna da temperatura do ar seja significativa, temperaturas entre 30 ºC e 36 ºC durante o dia e abaixo de 20 ºC durante a noite, tem sentido promover o arrefecimento dos edifícios recorrendo à ventilação nocturna [19]. Mesmo em regiões onde a amplitude diurna não seja tão acentuada, climas moderados, a utilização desta estratégia pode reduzir o consumo de energia associado aos aparelhos convencionais de ar condicionado [15]-[18]. B. Acumulação de energia por calor latente O desenvolvimento de melhores meios de acumulação térmica é um aspecto importante na conservação de energia em edifícios. Resulta da necessidade de promover a conservação de energia e reduzir a dependência dos combustíveis fósseis, tornando-se necessário procurar meios efectivos de reduzir os picos no consumo de energia e de deslocar parte da carga dos períodos de máxima procura. É possível mostrar que, para além de uma redução directa no consumo de energia, a sua acumulação nos edifícios reduz os picos de procura criando uma curva de carga mais uniforme no tempo. A acumulação de energia térmica é geralmente feita sob a forma de calor sensível ou sob a forma de calor latente. O primeiro processo de acumulação requer a utilização de substâncias que possuam uma elevada capacidade térmica,

como sejam, água, pedras ou tijolos cerâmicos. O segundo processo de acumulação recorre a substâncias que, na gama de temperaturas utilizada, transitam de fase. Apresenta as vantagens de a temperatura de acumulação ser praticamente constante e de a capacidade de acumulação por unidade de volume exibir valores mais elevados, conduzindo a sistemas de acumulação mais compactos e de menor volumetria [21]. Com respeito aos critérios de conforto térmico, a natureza quase isotérmica da transição de fase é uma das mais atractivas características da acumulação por calor latente em componentes de edifícios [20]. As substâncias empregues na acumulação de energia por calor latente podem ser de origem orgânica ou inorgânica. Os primeiros esforços para desenvolver substâncias deste tipo incidiram sobre substâncias inorgânicas, do género, sais hidratados. Estas substâncias apresentam como propriedades mais atractivas, elevados valores de calor latente, o facto de não serem inflamáveis e o seu elevado conteúdo de água, que significa que são pouco dispendiosas e disponíveis em grande escala. Possuem, no entanto, certas características desapropriadas, o que levou à investigação e desenvolvimento de substâncias orgânicas para este fim. Essas características incluem, o seu forte poder corrosivo, a instabilidade química que possuem e a dificuldade que apresentam em suportar ciclos térmicos de carga e descarga. Uma vez que a sua aplicação exige encapsulamento, foram consideradas desapropriadas para impregnação em materiais porosos de construção civil. As substâncias orgânicas possuem, por outro lado, um conjunto de características que as tornam adequadas para a acumulação de energia por calor latente em elementos de edifícios. São quimicamente mais estáveis que as inorgânicas, e não apresentam problemas relativamente aos ciclos térmicos de carga e descarga. Adicionalmente, demonstraram ser compatíveis e apropriadas para absorção por parte dos materiais de construção mais comuns. As características indesejáveis mais importantes prendem-se com a sua inflamabilidade e a possibilidade de gerarem fumos tóxicos em caso de combustão. Outros problemas, de menor importância, são a sua propensão para a oxidação térmica com a idade, o seu odor e a apreciável variação de volume que apresentam. As investigações mais recentes mostram, no entanto, que a selecção e modificação apropriadas destas substâncias eliminam a maior parte dessas características indesejáveis, apontando algumas substâncias orgânicas como fortemente adequadas para a incorporação em elementos de construção, sendo mais frequente tirar partido da transição sólido – líquido [20]. Athienitis et al. [22] realizaram no mesmo trabalho um estudo experimental e uma simulação numérica sobre a aplicação de substâncias acumuladoras, com transição de fase, em elementos da envolvente de edifícios solares passivos. Segundo os autores, os edifícios com grandes áreas envidraçadas, em particular aqueles com orientação predominante próxima de sul, podem apresentar grandes níveis de desconforto, por sobreaquecimento, durante as estações da Primavera e do Outono. Nestes períodos, os ganhos solares são, ainda, muito significativos, e,

normalmente, os sistemas de aquecimento do edifício encontram-se, já, em funcionamento. A utilização deste tipo de substâncias acumuladoras torna possível a acumulação de grandes quantidades de energia térmica na envolvente dos edifícios sem as desconfortáveis oscilações de temperatura associadas à acumulação de energia por calor sensível. Adicionalmente, torna desnecessária a utilização de estruturas com elevada massa. Os resultados deste trabalho mostram que a utilização de placas de gesso impregnadas com estas substâncias pode reduzir a temperatura máxima interior em, aproximadamente 4º C, reduzindo, também, de forma significativa a necessidade de aquecimento durante a noite. Um trabalho de cariz unicamente experimental [23] apresenta o desenvolvimento de uma parede composta, onde foi encapsulada uma substância acumuladora do tipo orgânico, com vista à sua implementação na envolvente de edifícios, melhorando, assim, o seu comportamento térmico. Os ensaios realizados em habitações de teste revelam que, com a presença destas paredes, as necessidades de arrefecimento se reduziram em cerca de 10 %. Khudhair et al. [24] realizaram um trabalho onde desenvolveram placas de gesso impregnadas com uma substância acumuladora com transição de fase. O objectivo foi o de conseguir um material composto para acumulação de energia por calor latente destinado a aplicações solares passivas. A substância por eles empregue foi do tipo parafina. Pretendiam com o desenvolvimento e a utilização das referidas placas melhorar o índice de conforto térmico no interior dos edifícios, por meio da redução das oscilações da temperatura do ar interior. Os testes experimentais realizados com as placas mostraram que a impregnação pode ser conseguida simplesmente mergulhando as placas de gesso em parafina na fase líquida por um período de próximo de dez minutos. As propriedades construtivas das placas de gesso mantiveramse após a impregnação. Os ciclos térmicos a que as placas gesso-parafina foram submetidas não mostram tendência para a migração da parafina no interior das placas nem para a ocorrência da degradação da capacidade de acumulação da mesma. Também Kedl [25] obteve resultados idênticos num trabalho experimental realizado com placas de gesso impregnadas com uma outra parafina. Usou um processo de impregnação semelhante ao descrito anteriormente, tendo conseguido concentrações volumétricas de parafina com valores próximo de 35 %. Os ensaios realizados mostram, mais uma vez, que as propriedades construtivas das placas não se alteram podendo, por exemplo, ser pintadas de modo idêntico às placas tradicionais. Novamente, os ciclos térmicos realizados mostraram não haver tendência para a migração da parafina nem de existir degradação da capacidade de acumulação da placa. A utilização de substâncias acumuladoras incorporadas na massa dos edifícios permitirá aumentar a sua capacidade de acumulação de frio. Deste modo poder-se-á adequar o processo de arrefecimento nocturno com as necessidades

de arrefecimento no interior dos edifícios. O recurso a estas substâncias permite, ainda, atenuar as flutuações da temperatura interior dos edifícios. A escolha da temperatura de transição de fase da substância de acumulação deve ter em conta as condições de conforto térmico pretendidas [24]. C. Arrefecimento evaporativo O ar exterior pode ser arrefecido por evaporação de água antes de ser introduzido no interior de um edifício. Neste caso, o escoamento de ar pode ser induzido mecanicamente ou de forma passiva. Podem usar-se para esse efeito, por exemplo, torres de arrefecimento, que, para lá do arrefecimento que impõem, também humidificam o ar ambiente. Este processo é conhecido como arrefecimento evaporativo directo. O arrefecimento evaporativo pode ser, contudo, indirecto. Um exemplo desta situação é o de um telhado que é arrefecido por uma massa de água aí existente, transformando o tecto do edifício num elemento que arrefece o espaço interior sem elevar o nível de humidade. Em regiões muito secas, do ponto de vista do conforto, o arrefecimento evaporativo directo pode ser um meio pouco dispendioso e desejável também em termos fisiológicos. Em regiões mais húmidas o desempenho destes sistemas é menor e a elevada humidade resultante pode ser indesejável no aspecto do conforto. Nestes casos, o arrefecimento evaporativo indirecto pode representar uma boa solução. Em vez de utilizar a evaporação para arrefecer e humidificar o ar ambiente que é introduzido no edifício, é possível usar a evaporação para arrefecer um elemento da envolvente do edifício por meio da existência de uma massa de água. O edifício é então arrefecido por condução através desse elemento. Trata-se de arrefecimento evaporativo indirecto, que reduz a temperatura do ar interior do edifício sem elevar o seu conteúdo de vapor [19]. Manzan e Saro [26] investigaram o comportamento térmico de um telhado destinado ao arrefecimento passivo de edifícios. Esse telhado possuía no seu interior um canal ventilado, por ar exterior, e cuja superfície inferior era mantida continuamente molhada. De modo a avaliar o desempenho térmico do sistema, os autores realizaram simulações numéricas relativas à distribuição da temperatura, campo de velocidades e concentração de vapor de água do ar no interior do canal. Concluíram que esta técnica pode ser útil, em especial, no arrefecimento passivo de edifícios industriais e de serviços onde existem grandes superfícies de telhado e onde os problemas associados ao arrefecimento são de difícil resolução. Num trabalho de carácter experimental [27] foi investigada a aplicabilidade de evaporadores cerâmicos porosos destinados ao arrefecimento de edifícios. Os ensaios foram conduzidos numa câmara térmica, no interior da qual existia um canal onde foram colocados os protótipos dos evaporadores, classificados como de baixa, média ou elevada porosidade. O desempenho dos diferentes evaporadores foi avaliado para diferentes condições de temperatura de ar seco, humidade relativa, pressão de

alimentação da água e disposição dos evaporadores no interior do canal. Obtiveram-se reduções entre 6 ºC a 8 ºC na temperatura de bolbo seco do ar à saída do canal, com aumento correspondente na humidade relativa da ordem de 30 %. Ghosal et al. [28] efectuaram a modelação matemática e numérica do escoamento de água sobre um tecido aplicado no telhado e na parede virada a sul de uma estufa. É comum, na Índia, a utilização de tecidos nas faces das estufas de modo a promover o seu sombreamento. O objectivo do trabalho foi avaliar o potencial de arrefecimento de estufas, simultaneamente, por evaporação da água. Foram, também, realizados ensaios experimentais durante o período de Verão, na região de Delhi, recolhendo-se dados relativos a três situações distintas, com sombreamento e com escoamento de água, com sombreamento e sem escoamento de água, e sem sombreamento. Os estudos paramétricos realizados envolveram os efeitos do caudal de água, do comprimento do telhado, da humidade relativa do ar ambiente e da absorvidade do tecido na redução da temperatura do ar interior da estufa. Os resultados revelaram uma redução de 6 ºC na temperatura interior da estufa na situação de sombreamento com escoamento de água, e 2 ºC na situação de sombreamento sem escoamento de água. D. Tecnologia proposta A tecnologia que se sugere neste trabalho contempla a utilização combinada das três técnicas abordadas, a ventilação nocturna, a acumulação de frio e o arrefecimento evaporativo. Propõe-se o desenvolvimento de um elemento construtivo, como parte integrante da envolvente dos edifícios, que permita efectuar o seu arrefecimento com reduzidos custos energéticos. Este novo elemento, ao fazer parte da envolvente do edifício, separa o ambiente interior das condições exteriores. É constituído por uma parede ladeada por dois canais. No canal situado do lado externo do elemento circula ar nocturno que provém do exterior permitindo o arrefecimento natural da parede. Para incrementar a taxa de transferência de calor entre o ar exterior e a superfície da parede, esta é mantida continuamente húmida. O processo de transferência de calor e massa resultante permite aumentar a taxa de arrefecimento desta superfície. Permite, ainda, arrefecer essa superfície até à temperatura de bolbo húmido do ar exterior, que é inferior à temperatura de bolbo seco desse mesmo ar, e que na ausência do arrefecimento evaporativo seria a temperatura limite de arrefecimento. Tratando-se de arrefecimento evaporativo indirecto não existe a desvantagem de elevar exageradamente a humidade do ar no interior dos edifícios. O outro canal é alimentado pelo ar do interior do edifício. Por forma a adequar os processos de arrefecimento no canal exterior, quer como resultado da amplitude térmica exterior, quer como resultado do processo evaporativo aí produzido, com a necessidade de arrefecimento no interior do edifício, recorre-se a uma parede com características térmicas particulares. Esta parede é constituída por

materiais tradicionais de construção civil aos quais será incorporado uma substância acumuladora com transição de fase.

3. Conclusão O consumo de energia primária tem crescido substancialmente nos últimos anos. Para esse aumento tem contribuído de forma importante o uso crescente dos sistemas de ar condicionado em edifícios. Acresce, ainda, o problema da procura sazonal excessiva de energia eléctrica para fins de condicionamento de ar, que, em muitos países, tem superado a sua capacidade de abastecimento. Existem, portanto, fortes motivos para procurar técnicas de arrefecimento que conduzam à poupança substancial dos recursos energéticos, promovendo, simultaneamente, a conservação do meio ambiente. Neste contexto, foram abordadas neste trabalho as técnicas convencionais envolvidas: ventilação nocturna, acumulação térmica por calor latente e arrefecimento evaporativo; e foi proposta uma nova solução com o intuito de reduzir o consumo energético destinado ao arrefecimento de edifícios.

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