A (IN) CONSTITUCIONALIDADE DO CADASTRO NACIONAL DO ADOTANTE

July 5, 2017 | Autor: Patricia Lima | Categoria: Direito Constitucional, Direito de família, Adoção
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UNIVERSIDADE COMUNITÁRIA DA REGIÃO DE CHAPECÓ - UNOCHAPECO
ÁREA DE CIÊNCIAS HUMANAS E JURÍDICAS
CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO





PATRÍCIA DE LIMA FELIX







A (IN) CONSTITUCIONALIDADE DO CADASTRO NACIONAL DO ADOTANTE













CHAPECÓ (SC),
2012

PATRÍCIA DE LIMA FELIX















A (IN) CONSTITUCIONALIDADE DO CADASTRO NACIONAL DO ADOTANTE




Monografia apresentada ao Curso de Direito da Universidade Comunitária da Região de Chapecó, UNOCHAPECÓ, como requisito parcial à obtenção do título de bacharel em Direito, sob a orientação da Profª. Me. Nilton Martins de Quadros.







Chapecó (SC), maio 2012.
UNIVERSIDADE COMUNITÁRIA DA REGIÃO DE CHAPECÓ - UNOCHAPECÓ
ÁREA DE CIÊNCIAS HUMANAS E JURÍDICAS
CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO



A (IN) CONSTITUCIONALIDADE DO CADASTRO NACIONAL DO ADOTANTE



PATRÍCIA DE LIMA FELIX




________________________________________
Profª. Me. Nilton Martins de Quadros
Professor Orientador



________________________________________
Profª. Me. Laura Cristina de Quadros
Coordenadora do Curso de Direito



________________________________________
Prof. Me. Robson Fernando Santos
Coordenador Adjunto do Curso de Direito




Chapecó (SC), maio 2012.
PATRÍCIA DE LIMA FELIX




A (IN) CONSTITUCIONALIDADE DO CADASTRO NACIONAL DO ADOTANTE



Monografia aprovada como requisito parcial para obtenção do grau de BACHAREL EM DIREITO no Curso de Graduação em Direito da Universidade Comunitária da Região de Chapecó - UNOCHAPECÓ, com a seguinte Banca Examinadora:



________________________________________
Me. Nilton Martins de Quadros – Presidente



________________________________________
Membro



________________________________________
Membro




Chapecó (SC), maio 2012.

AGRADECIMENTOS

Iniciais agradecimentos ao Senhor do Universo e aos amigos de luz, que me permitiram a graça deste feito, assim como a graça de cada amanhecer. Às minhas mães, Isabel (i.m.) e Cleonice – almas nobres –, pelos mais importantes conhecimentos que me repassaram, auxiliando na construção do que hoje sou.
De uma forma muito especial, meus agradecimentos ao meu amado Gabriel, que em muito contribuiu para a conclusão de mais esta etapa em minha vida, através de seu carinho e compreensão.
Aos avós, Bertholdo e Ilda pelo apoio, incentivo e amor incondicional. Aos meus irmãos, e de uma maneira especial ao Robson (irmão), que mesmo distante está sempre presente.
Aos mestres que compartilharam seu conhecimento e que através de seus ensinamentos fizeram com que eu pudesse me apaixonar ainda mais pela área jurídica, em maior atenção ao Mestre e orientador Nilton, à sua dedicação e paciência.
Aos amigos e a todas aquelas pessoas que passaram pelo meu caminho, contribuindo nesta jornada.

RESUMO


A (IN)CONSTITUCIONALIDADE DO CADASTRO NACIONAL DO ADOTANTE. Patrícia de Lima Felix.
Nilton Martins de Quadros (ORIENTADOR). (Universidade Comunitária da Região de Chapecó – UNOCHAPECÓ).

(INTRODUÇÃO) Diante das consequências que se observa com as opções que o Estado proporciona ao postulante a adoção no que tange na escolha do perfil da criança/adolescente, evidencia-se a necessidade de tratar do tema com maior zelo. Desta forma, aborda-se a (in)constitucionalidade do cadastro nacional do adotante, instituído pela resolução n.º 54 de 29 de abril de 2008, vinculado ao Conselho Nacional de Justiça, abrangendo todas as comarcas das unidades da federação, criando também o cadastro de crianças e adolescentes aptos à adoção. Logo, forma-se um banco de dados onde é possível o confronto de informações e adequação dos cadastros. (OBJETIVOS) Além de analisar a inconstitucionalidade do cadastro nacional do adotante, a presente pesquisa também visa estudar os direitos humanos e fundamentais, os princípios da dignidade da pessoa humana, do melhor interesse da criança, da proteção integral, da prioridade absoluta e da condição peculiar da pessoa em desenvolvimento. Busca-se com esta pesquisa lembrar que a criança/adolescente é um sujeito de direitos, que deve ser respeitado e tratado de forma especial, por ser um cidadão em desenvolvimento. (EIXO TEMÁTICO) A pesquisa vincula-se ao Eixo Temático do Curso de Direito da Unochapecó denominado Cidadania e Estado. (METODOLOGIA) Para o desenvolvimento teórico do estudo foi utilizado a pesquisa bibliográfica. (CONCLUSÃO) Observa-se que o Estado, com intuito de assegurar o que o constituinte previu a cerca da proteção integral, estabeleceu o cadastro nacional do adotante estruturado com perguntas fechadas, nas quais o postulante tem a liberdade de estabelecer e limitar o perfil da criança, de acordo com o sexo, faixa etária, cor, doenças físicas ou mentais etc. Trata-se de uma afronta grosseira a todos os princípios estudados, deixando de lado a efetivação do objetivo principal do Estado, quando da criação do cadastro nacional do adotante. (PALAVRAS-CHAVE) (In)constitucionalidade, Cadastro Nacional do Adotante, Melhor Interesse da Criança.

ABSTRACT

THE (IN)CONSTITUTIONALITY OF THE NATIONAL REGISTRATION OF THE ADOPTER. Patricia de Lima Felix.
Nilton Martins de Quadros (ADVISOR). (Community University of the Region of Chapecó-UNOCHAPECÓ).

(INTRODUCTION) In face of consequences that can be seen with the options that the State gives to the adoption postulant, regarding the choice of the child/teenager profile, highlights the need to treat the topic with greater zeal. In this way, deals with the unconstitutionality of national registration of the adopter, established by resolution no. 54 of April 29, 2008, linked to the National Judiciary Council, covering all regions and the units of the Federation, creating the registration of children and adolescents fit for adoption. Therefore, a database where it possible the confrontation of information and appropriateness of registers. (GOALS) In addition to analyzing the unconstitutionality of national registration of the adopter, this research also aims to study the human and fundamental rights, the principles of human dignity, of the best interests of the child, of integral protection of the absolute priority and the peculiar condition of the person in development. The intention with this search is remember that the child/teenager is a subject of rights which must be respected and treated specially, as a developing person. (THEMATIC AXIS) Search the links to the Thematic Axis of Law of Unochapecó course called Citizenship and State. (METHODOLOGY) Theoretical development of study was used the bibliographic search. (CONCLUSION) It is noted that the State, with the aim of guaranteeing that the constituent predicted integral protection, established the national register structured with closed questions, where the adopter can established and limited the child's profile, according to sex, age, color, physical or mental diseases etc. It is a gross affront to all principles studied, leaving aside the fulfillment of primary purpose of State, when the creation of the national registration of the sponsor. (KEYWORDS) Unconstitutionality of National Registration, Sponsor, Best interests of the child.




LISTA DE ABREVIATURAS

CNA – Cadastro Nacional do Adotante
ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente



LISTA DE APÊNDICES

APÊNDICE A - ATESTADO DE AUTENTICIDADE DA MONOGRAFIA 50
APÊNDICE B - TERMO DE SOLICITAÇÃO DE BANCA 51



LISTA DE ANEXOS

ANEXO I – CADASTRO NACIONAL (PRETENDENTE OU ADOTANTE) 56
ANEXO II – CADASTRO DA CRIANÇA/ADOLESCENTE 57



SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 13
CAPÍTULO I 15
1 O PAPEL DA INTERPRETAÇÃO NA AVALIAÇÃO DA (IN)CONSTITUCIONALIDADE 15
1.1 Constituição – material e formal 15
1.2 Constitucionalismo e movimentos históricos 19
1.3 Constitucionalidade e Inconstitucionalidade 21
1.3.1 Inconstitucionalidade formal 22
1.3.2 Inconstitucionalidade material 22
1.3.3 Inconstitucionalidade por ação e omissão 23
1.3.4 Inconstitucionalidade de normas constitucionais 24
2 Interpretação das normas constitucionais 25
2.1 A velha hermenêutica 26
2.2 A nova hermenêutica 27
2.3 O papel dos princípios e sua força normativa 29
2.4 O papel dos direitos fundamentais e sua força interpretativa 30
CAPÍTULO II 31
2 DIREITOS HUMANOS FUNDAMENTAIS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE 31
2.1 A historicidade dos direitos humanos e direitos fundamentais 33
2.2 Dignidade da pessoa humana e os direitos fundamentais 36
2.3 Direitos fundamentais da criança e do adolescente 39
2.4 Princípio da Prioridade Absoluta 42
2.5 Princípio da Proteção Integral e o direito à convivência familiar 44
2.6 Princípio do Melhor Interesse da Criança frente ao instituto da adoção 45
CAPÍTULO III 48
3 ADOÇÃO E O CADASTRO NACIONAL DO ADOTANTE 48
3.1 Evolução do instituto da Adoção 48
3.2 A adoção na ótica constitucional 51
3.3 O instituto da Adoção na Lei 12.010/2009 52
3.4 O Cadastro Nacional do Adotante 53
3.5 O direito à convivência familiar e comunitária previsto no art. 227 da Constituição da República 54
CONCLUSÃO 57
REFERÊNCIAS 62
APÊNDICES 63
ANEXOS 68


INTRODUÇÃO

A presente pesquisa versa sobre o Cadastro Nacional do Adotante, e sua (in)constitucionalidade, diante dos princípios constitucionais. Mais especificamente acerca da existência do questionário do perfil do adotando, que na maioria das vezes resta limitado pelos postulantes à adoção.
Diante da problemática a ser abordada, observa-se a gravidade das conseqüências causadas às crianças e adolescentes que se encontram em situação desigual, carecendo de uma convivência familiar, e outros direitos e garantias fundamentais para assegurar sua cidadania, não obstante se tratar de direito fundamental constitucionalmente garantido.
Neste sentido, evidencia-se o dificultoso acesso dos adotandos ao desenvolvimento, e principalmente à convivência familiar e comunitária, direitos estes, assegurados pela Constituição Federal da República, em seu art. 227, caput, que dispõe o seguinte:
É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
Considerando o eixo temático acerca da presente pesquisa acadêmica, observa-se a necessidade de tratar das razões da existência do questionário inserido no Cadastro Nacional do Adotante/Pretendente, no qual se estabelece e limita o perfil do adotando.
O presente estudo é de suma importância, pois trata-se de um grave problema social, haja vista o abandono e o descaso do Estado, das famílias e da sociedade em proporcionar as crianças/adolescentes, concretas condições de convívio social, acesso ao lazer, à saúde, entre outras garantias constitucionais.
É de se verificar a falta de abordagem acerca do tema, pois conforme se passara a expor mais adiante, a adoção não é um ato de caridade, e não se tratando de um ato de caridade, há necessidade de dispor sobre a criança os verdadeiros instintos paternais, como se filho biológico fosse. Sendo assim, totalmente desnecessário estabelecer um perfil fechado, das crianças e adolescentes à serem adotados.
O método de abordagem foi o método dedutivo, pois até o presente momento, não se tem conhecimento de pesquisas que tratem acerca da temática em questão. Além disso, a pesquisa se deu de forma bibliográfica, buscando interpretações, de acordo com entendimentos doutrinários dos princípios constitucionais abordados.
O primeiro Capítulo trata acerca dos conceitos de Constituição, dos movimentos constitucionalistas e da inconstitucionalidade, propriamente dita.
Já o segundo capítulo aborda os princípios da dignidade da pessoa humana, este antes da constituição formal, do século XII – as primeiras cartas constitucionais –, e seu atual conceito e demais princípios constitucionais.
Por derradeiro, o mesmo capítulo ainda trata dos princípios da dignidade da pessoa da criança, o princípio do melhor interesse da criança e do princípio da igualdade, e por fim a interpretação do art. 227 da Constituição Federal da República do Brasil.
Por conseguinte, o terceiro capítulo trata da Adoção e do Cadastro Nacional do Adotante, explicando sua criação e sua função social, salientando as falhas significativas do processo adotivo, que impedem a melhor utilização desta ferramenta social.


CAPÍTULO I
1 O PAPEL DA INTERPRETAÇÃO NA AVALIAÇÃO DA (IN)CONSTITUCIONALIDADE
Acredita-se que o termo inconstitucionalidade vai muito além do conceito de se tratar simplesmente de toda norma ou ato do poder público que, com uma carga de desvalor, vai de encontro à Constituição. Antes de adentrar neste tema é essencial que haja uma compreensão do que é constituição. Para tanto se explanará a seguir alguns breves conceitos.
1.1 Constituição – material e formal
Em um primeiro momento, o termo constituição traz a ideia de norma superior escrita, porém nem sempre foi assim, Fernandes (2011, p. 3-5) ensina que constituição sempre existiu, desde a formação das primeiras sociedades, demonstra ser exatamente este o primeiro conceito de constituição, ou seja, formação; instituição; existência da sociedade, traduzindo a maneira de ser desta. O autor destaca que "Aristóteles em A Política, afirma ser a Constituição (politéia) o modo de ser da polis".
Canotilho (1997, p. 88) ressalta que este primeiro conceito de constituição ainda não se refere ao Estado, mas à sociedade, neste sentido: "A sociedade 'tem' uma constituição; a constituição é a constituição da sociedade [...]". Com isso, o autor quer dizer que a constituição tem cunho de traduzir a forma da sociedade, esquematizar sua estrutura e organização, contribui-se assim, para um conceito primário de constituição, trata-se de uma definição lógica inicial e superficial do que é constituição.
Contudo, ressalte-se que se trata aqui de uma constituição material, isto é, a constituição real, qual ainda não se molda na forma escrita, mas possui três requisitos basilares que, segundo Fernandes (2011, p. 5), são: identidade, organização e valores, traduzidos em regras de acordo com a moral e os costumes de determinada sociedade, em um dado momento de sua história, que acompanham sua evolução, e que se modificam de forma a se adaptar às mudanças e necessidades desta sociedade.
Neste sentido:
Se sempre existiu constituição no mundo, sempre existiu constituição material (real), ou seja, matérias que constituíram comunidades, sociedades e Estados que se diferenciaram (com seus respectivos 'modos de ser') fazendo com que cada um, sociologicamente, tivesse uma determinada constituição. Portanto, a conclusão é que todos os países (Estados ou mesmo comunidades) possuíram em todos os momentos de sua história, constituições reais e efetivas à luz, sobretudo, de uma perspectiva eminentemente sociológica. (FERNANDES, 2011, p. 6).
Relevante também a clássica palestra proferida por Ferdinand Lassalle na sociedade operária da Prússia, quando busca tratar sobre a "essência da Constituição" e desenvolve o conceito que até hoje adota-se de Constituição Real:
Mas que relação existe com o que vulgarmente chamamos Constituição? Com a Constituição jurídica? Não é difícil compreender a relação que ambos os conceitos guardam entre si. Juntam-se esses fatores reais do poder, os escrevemos em uma folha de papel e eles adquirem expressão escrita. A partir desse momento, incorporados a um papel, não são simples fatores reais do poder, mas sim verdadeiro direito instituições jurídicas. Quem atentar contra eles, atenta contra a lei, e por conseguinte é punido.
Não se pode deixar de lado a forte influência das grandes revoluções havidas entre os séculos XVII e XVIII, quais contribuíram para o surgimento da constituição formal, situações que serão tratadas em momento oportuno.
Hans Kelsen, em sua obra Teoria Pura do Direito (2009, p. 55), explica que:
As ordens coercitivas revolucionariamente instituídas provaram ser duradouramente eficazes, passaram a ser reconhecidas como ordens jurídicas, os governos das comunidades por elas constituídas passaram a ser havidos como governos de um Estado e os seus atos como atos estaduais e, consequentemente, como atos jurídicos.
Com isso, Kelsen trata da evolução da sociedade, de sua forma de governo e organização, se refere ao progresso de sociedade para Estado, do transporte das normas do campo material para o campo formal, quando a partir de então foram reconhecidos os atos da sociedade – Estado/governo – como atos jurídicos.
A constituição material tratava basicamente da organização da sociedade, o "dever-ser" – do qual se referiu anteriormente – limitava o poder do Estado, com a finalidade de assegurar as garantias e direitos fundamentais do indivíduo. Dentre estas garantias e direitos fundamentais já preconizados desde a formação das sociedades, desde já se observa um esboço do princípio da dignidade da pessoa humana, este que já era tratado pela sociedade com extrema relevância. Entretanto, o conceito deste princípio passou por diversas mudanças, ao passo que a sociedade evoluiu, conforme será se estudará mais adiante.
No que tange a formação das primeiras constituições, Nucci assevera que:
Os hebreus foram o primeiro povo que praticou o constitucionalismo, através do regime teocrático, pois o governante não possuía um poder absoluto, já que limitado pelas leis do senhor. Era uma forma de constituição material. Os gregos também vivenciaram pelo menos dois séculos de regime político absolutamente constitucional. Em Roma, durante a república, houve o exemplo clássico de uma sociedade estatal fundamentalmente constitucional. (Karl Loewenstein apud NUCCI, 2011, p. 55-56).
Evidencia-se a necessidade da sociedade em ter uma constituição, sempre com a finalidade de organizar seu sistema estrutural e principalmente limitar o poder dos governantes, onde busca evitar o caos de uma sociedade sem constituição. Logo, verifica-se que a constituição é vista como base da sociedade.
Neste mesmo sentido, Paulo Bonavides acrescenta que:
Do ponto de vista material, a Constituição é o conjunto de normas pertinentes à organização do poder, à distribuição da competência, ao exercício da autoridade, à forma de governo, aos direitos da pessoa humana, tanto individuais como sociais. Tudo quanto for, enfim, conteúdo básico referente à composição e ao funcionamento da ordem política exprime o aspecto material da Constituição. (BONAVIDES, 2006, p. 80).
Bonavides ainda ressalta que não há qualquer sociedade – Estado – que, com um mínimo de organização não possua sua própria Constituição, por mais rudimentar que venha a ser sua estrutura e forma de ser (2006, p. 80-81).
Uma interpretação mais profunda que se pode trazer ao presente, é o conceito formulado por Lassale, no qual o autor expõe que: "O que portanto é realmente peculiar à época moderna não são as Constituições materiais – importantíssimo ter isto sempre em mente – mas as constituições escritas, as folhas de papel". (LASSALE apud BONAVIDES, 2006, p. 81 – grifou-se).
Quanto à constituição formal, Bonavides expõe que esta não trata apenas de assuntos inerentes a estrutura da sociedade, limitação do poder e garantia dos direitos fundamentais do indivíduo, mas traz consigo diversas outras normas ordinárias e atribui à elas uma carga de valor constitucional, que para o autor se vê desnecessário. Bonavides ainda faz referência ao conceito de Kelsen: "Fala-se de constituição em sentido formal quando se faz a distinção entre as leis ordinárias e aquelas outras que exigem certos requisitos especiais para sua criação e reforma". (KELSEN apud BONAVIDES, 2006, p. 82).
O autor quer dizer que as normas não materiais, quando trazidas para a constituição por si só não surtem seus efeitos, estando ali apenas de maneira formal. O que o autor entende por normas de cunho material, são aquelas pertinentes à organização estrutural da sociedade, limitação do poder do governo, e principalmente que busquem assegurar as garantias e direitos fundamentais das pessoas. Destarte, à estas normas sim deve-se atribuir força constitucional, e a carga de valor necessários.
Neste sentido, tem-se os princípios constitucionais, que possuem grande força normativa e devem, sobretudo, ser respeitados, ainda que implícitos na constituição.
Ademais, Bonavides expõe que "[...] a palavra Constituição não basta, hoje, no campo do Direito Constitucional, para exprimir toda a realidade pertinente à organização e funcionamento das estruturas básicas da sociedade política.", o autor utiliza a nomenclatura sistema, com a finalidade de expor o sistema político e o sistema constitucional, ambos com profunda ligação, contudo salienta a distinção existente entre o sistema constitucional e a Constituição propriamente dita, onde a constituição se refere ao conjunto de normas, enquanto que o sistema constitucional se preocupa com a estrutura e organização da sociedade (BONAVIDES, 2006, p. 93/94).
Com a efetivação da Constituição formal, através dos movimentos constitucionalistas, evidenciou-se a necessidade de que as leis elaboradas a partir daquela época seguissem as exigências formais da Constituição, insurgiu-se no "[...] divórcio entre a Sociedade e o Estado [...]. Era a Constituição do Estado liberal, a Constituição folha de papel [...]". (BONAVIDES, 2006, p. 94/95).
Para Bonavides, o amadurecimento da sociedade/estado, implicou em um comando a ser exercido da constituição sobre a sociedade, que anteriormente era o inverso, comando desta sobre aquela, ou seja, a sociedade perdeu o controle sobre sua própria constituição, eis que a Constituição passou a tratar do controle da sociedade – passou-se ao Estado Moderno.
Nessa esteira, Bonavides destaca:
Daqui surge o claro imperativo de colocar a Constituição escrita num sistema: o sistema constitucional, quer dizer, aquele que abrange todas as forças excluídas pelo constitucionalismo clássico ou por este ignoradas, em virtude de visualizar nas Constituições apenas o seu aspecto formal, o seu lado meramente normativo, a juridicidade pura.
"O espírito do poder existe quando a sociedade só reconhece e pratica a Constituição real", por Constituição real, entenda-se constituição material – de fato, desenvolvida com base nos costumes da sociedade, onde traduz o "dever ser" desta –, de maneira a efetivar seus direitos e garantias fundamentais. (BONAVIDES, 2006, p. 98).
Por outro lado, o fato de um Estado ter sua Constituição formal é muito mais que a consolidação de disposições legais, trata-se de um verdadeiro caminho – norte – delimitados pelos princípios emanados pelo Estado Jurídico de Direito, por onde os fluxos normativos devem seguir "o primado do direito". (CANOTILHO, 1997, p. 245).
Por conseguinte, é possível concluir que por constituição material, tem-se todos os princípios e regras que visam a organização da sociedade, com o principal objetivo de limitar o poder do Estado, a fim de garantir a liberdade e os direitos fundamentais dos indivíduos.
Contudo, para efetivar estes direitos, houve a necessidade de uma constituição que regulasse a sociedade em si. Foi neste sentido que os movimentos constitucionalistas ganharam força, onde buscaram impulsionar a formalização destes direitos, em um documento – a constituição formal. A constituição formal, por sua vez, é o documento que contém todas estas regras sociais e princípios fundamentais, de uma forma solene.
1.2 Constitucionalismo e movimentos históricos
A constituição material exprime o modo de ser das antigas sociedades, e conforme ensina Gilmar Ferreira Mendes, a constituição formal, considerado atributo do Estado Moderno, refere-se a um documento escrito, que tem por escopo, reunir e estabelecer de maneira formal uma gama de direitos e garantias fundamentais, além de inseri-los em um documento, a partir de então considerado a base do Estado Moderno. O surgimento de um documento escrito se deu a partir da segunda metade do século XVIII, devido a Revolução Francesa e a independência dos Estados Unidos (MENDES, 2011, p. 1053).
No que tange ao constitucionalismo, vejamos:
O constitucionalismo clássico, reduzindo a Constituição simplesmente a um instrumento jurídico, dava competência aos três órgãos fundamentais da ordem estatal – o Executivo, o Legislativo e o Judiciário – ao mesmo passo que declarava os direitos e as garantias individuais. A Constituição se continha toda no texto, como se fora o livro sagrado da liberdade, a bíblia de uma nova fé democrática, o alcorão dos princípios liberais, tendo por finalidade precípua limitar ou enfrear o exercício do poder. (BONAVIDES, 2006, p. 94).
A sociedade pressionava o Estado, na busca da efetivação de seus direitos e garantias individuais, na luta pela dignidade, ou nos termos da Revolução Francesa: pela liberdade, igualdade e fraternidade. Ocorre que o Estado atendeu a pertinente exigência, mas ao mesmo tempo atribuiu a si mesmo competência para legislar, regulamentar e fiscalizar, através de seus três principais órgãos: Executivo, Legislativo e Judiciário.
Evidencia-se direta ligação existente entre as Revoluções havidas naquela época e a origem da constituição formal. Neste sentido, Fernandes ressalta que
Se a Constituição real é o modo de ser de uma comunidade, na medida em que carrega as matérias constitutivas de um modo de ser de Estado e de Sociedade, a partir dos séculos XVII e XVIII ganha contornos tipicamente jurídico-normativos. Sem dúvida a ideia de organização constitucional formal (formalizada) dos Estados se estabelece (se funda), de forma solene, no século XVIII com o denominado "movimento do constitucionalismo" que guarda íntima relação com as revoluções americana e francesa. (FERNANDES, 2011, p. 7).
O Constitucionalismo vem a ser o resultado da reunião destes vários momentos históricos e revolucionários que marcaram o início da "era das Constituições formalizadas (formais) em um documento escrito". Assim, demonstra-se que a constituição que, anteriormente se tratou como o "dever ser" da sociedade, deixa de lado o conceito de Kelsen, e passa a ser considerado como um ato constitutivo, ato que cria e institui a nova sociedade – o Estado Moderno. Assim, Fernandes destaca que
Inicia-se a noção de constituição como algo que funda uma nova sociedade, como um documento escrito que se projeta para o futuro a partir da sua criação (produção) e que todos devem respeito, independentemente de sua posição social (status), ou até mesmo de sua colocação na estrutura organizacional do Estado (ideia do governo das leis e não dos homens). (FERNANDES, 2011, p. 10).
Pouco mais tarde, observa-se a ocorrência de certa dificuldade com o surgimento iminente destas constituições. Para Bonavides, a referida época "exprimia a dor de um grande parto: o das constituições de inspiração socialista ou socializante, cuja versão ocidental, após a Segunda Grande Guerra Mundial se traduz [...] pelo constitucionalismo do Estado Social." (BONAVIDES, 2006, p. 101).
No conceito de Fernandes, a constituição formal é o contorno da constituição material, que trazida para o âmbito formal, ao final do século XVIII, passou a "ordenar em termos jurídicos [...] por meio de um documento (pacto) escrito; declarar nessa carta escrita um conjunto de direitos fundamentais e o respectivo modo de garantia; organizar o poder político segundo esquemas tendentes a tornar um poder limitado e moderado". (FERNANDES, 2011, p. 10).
Nota-se que o movimento do constitucionalismo, que impulsionou a formalização das constituições, tinha por objetivo regular – de maneira solene e formal – os direitos e garantias fundamentais e a organização do Estado, além de assegurar a limitação do poder exercido pelo Estado, a fim de proteger os direitos coletivos e individuais.
1.3 Constitucionalidade e Inconstitucionalidade
Tanto a constitucionalidade, quanto a inconstitucionalidade estão diretamente ligadas à Constituição, às suas concepções e a uma conduta praticada pelo Estado, seja através de um ato ou de uma norma. Caso seja a conduta desrespeitosa aos valores, costumes e às normas, estar-se-á diante de um ato que vai de encontro à Constituição e aos valores e princípios nela inseridos – assim considerada inconstitucional. Entretanto, se o ato praticado seguir as normas previstas na constituição, concebido de acordo com os valores e princípios constitucionais, este será aceito e considerado constitucional.
Todavia, Mendes assevera que:
Dessarte, os conceitos de constitucionalidade e inconstitucionalidade não traduzem, tão somente, a ideia de conformidade ou inconformidade com a Constituição. Assim, [...] dir-se-á que constitucional será o ato que não incorrer em sanção, por ter sido criado por autoridade constitucionalmente competente e sob a forma que a Constituição prescreve para a sua perfeita integração; inconstitucional será o ato que incorrer em sanção – de nulidade ou de anulabilidade – Por desconformidade com o ordenamento constitucional. (MENDES, 2011, p. 1058).
O autor destaca que estes conceitos não englobam toda conformidade ou desconformidade com a Constituição, e ainda faz menção aos atos especialmente praticados pelo poder público, este que é o primeiro a tomar conhecimento das normas. Para esta pesquisa, o conceito de inconstitucionalidade a ser adotado é o conceito jurídico, sem descuidar de que o jurídico envolve sua carga ideológica, valorativa e fática.
1.3.1 Inconstitucionalidade formal
Mendes ensina que o vício formal carrega um defeito na criação do ato normativo, trata-se de uma questão procedimental, na qual o legislador equivoca-se ao criar uma lei. (MENDES, 2011, p. 1070).
Nesta esteira, Fernandes exprime o conceito de inconstitucionalidade formal nos seguintes termos: "A inconstitucionalidade formal é aquela que envolve um vício no processo de produção das normas jurídicas, na medida em que as leis ou atos normativos são editados em desconformidade com as normas previstas constitucionalmente." Ademais, o autor ressalta a obrigatoriedade de respeito aos requisitos formais, pertinentes à forma de elaboração da lei ou ato normativo. (FERNANDES, 2011, p. 897).
A inconstitucionalidade formal se dá pela desobediência aos preceitos legais do processo normativo. Para outros autores, como Luis Roberto Barroso, ainda há de se falar em inconstitucionalidade formal orgânica, que vem a ser a inobservância da regra de competência para a realização do ato. (BARROSO, 2007, p. 26).
1.3.2 Inconstitucionalidade material
Os vícios materiais dizem respeito ao mérito das normas ou atos, com origem em um conflito diretamente ligado com dispositivos constitucionais – normas constitucionais, e seus princípios. Nos basta neste momento conceituar os tipos de contrariedade constitucional e este tipo de inconstitucionalidade que, segundo Mendes, pode se dar através de excesso de poder legislativo. (MENDES, 2011, p. 1073).
O referido autor destaca que a inconstitucionalidade pode também ocorrer por excesso de poder quando insere questão pertinente aos limites funcionais da jurisdição constitucional, vejamos:
A utilização do princípio da proporcionalidade ou da proibição do excesso no Direito constitucional envolve [...] a apreciação da necessidade e adequação da providência legislativa. Quanto à proibição de proteção insuficiente, a doutrina vem apontando para uma espécie de garantismo positivo, ao contrário do garantismo negativo (que se consubstancia na proteção contra os excessos do Estado), já consagrado pelo princípio da proporcionalidade. A proibição de proteção insuficiente adquire importância na aplicação dos direitos fundamentais de proteção, ou seja, naqueles casos em que o Estado não pode deixar de proteger de forma adequada estes direitos.
Outrossim, além da interpretação extraída dos princípios da proporcionalidade e proibição de excesso, há outra face deste princípio, que engloba várias circunstâncias, das quais cumpre enfatizar a proibição de proteção insuficiente de qualquer garantia fundamental, assegurada pela própria constituição.
Por conseguinte tem-se a constituição formal que, conforme se expôs anteriormente, surgiu através de uma longa batalha em busca da efetivação dos direitos e garantias fundamentais – normas de cunho material que atualmente possuem uma grande carga de valor – que não devem sofrer violação através de uma nova norma ou ato do Estado, eivado de desvalor. Assim, não é possível conceber a ideia da existência de um retrocesso na legislação, no caso de nova norma ou ato que viole tais normas. Conclui-se aqui que o Estado não deve criar ato ou norma que vá de encontro aos direitos e garantias fundamentais, ou melhor, às normas de cunho material inseridas na constituição – as cláusulas pétreas –, estar-se-ia diante de uma inconstitucionalidade material. Este entendimento se extrai do princípio da proibição do retrocesso, que será visto mais adiante.
1.3.3 Inconstitucionalidade por ação e omissão
Evidencia-se que a inconstitucionalidade se verifica através de um ato do poder público ou norma por ele instituída. Neste sentido cumpre destacar o tipo de inconstitucionalidade para o ato positivo e o ato negativo, trata-se de uma conduta – violadora da constituição – positiva ou negativa, será respectivamente considerada inconstitucional: por ação ou omissão.
Fernandes salienta que, a inconstitucionalidade por ação corresponde a uma conduta positiva, ou seja, um ato efetivamente realizado pelo poder público, em desacordo com a normatividade constitucional.
Ademais, o autor trata da inconstitucionalidade por omissão, como uma conduta negativa do poder público. Caso em que o poder público permanece inerte, não atua, pois deixa de proceder com uma conduta que vise efetivar os direitos previstos na Constituição, deixa de viabilizar estes direitos aos interessados. (FERNANDES, 2011, p. 897-898).
Mendes (2011, p. 1086), ainda se refere a existência de omissão total ou parcial: "Tem-se omissão absoluta ou total quando o legislador não empreende a providência legislativa reclamada. Já a omissão parcial ocorre quando um ato normativo atende apenas parcialmente ou de modo insuficiente a vontade constitucional". Quando o Autor faz menção à vontade da constituição, se refere a uma norma de eficácia limitada, que necessita de um ato ou de uma nova norma que seja criada pelo Estado para atender a esta necessidade constitucional. Contudo, a nova norma ou ato criado pelo Estado nem sempre atende de forma total a vontade da constituição.
Desta forma, é claro o entendimento de que inclusive a inércia do legislador ou do poder público acaba por ofender gravemente a constituição, eis que se é esta a conduta que se identifica – omissão –, deixa de assegurar as garantias fundamentais constitucionalmente previstas.
1.3.4 Inconstitucionalidade de normas constitucionais
Primeiramente, merece destaque o termo normas constitucionais, que se referem às cláusulas pétreas, normas pertinentes aos direitos fundamentais e estrutura política estatal. As cláusulas pétreas manifestam a necessidade de assegurar a integralidade da Constituição, questões materiais que são as bases de sua existência formal. São as chamadas cláusulas de garantia que, segundo Mendes (2001, p. 96-98):
Tais cláusulas de garantia traduzem, em verdade, um esforço do constituinte para assegurar a integridade da Constituição, obstando a que eventuais reformas provoquem a destruição, o enfraquecimento ou impliquem profunda mudança de identidade. É que, como ensina Hesse, a Constituição contribui para a continuidade da ordem jurídica fundamental, na medida em que impede a efetivação de um suicídio do Estado de Direito Democrático sob a forma da legalidade. Neste sentido pronunciou-se o Tribunal Constitucional alemão, asseverando que o constituinte não dispõe de poderes para suspender ou suprimir a Constituição.
Desta forma, fala-se em inconstitucionalidade de normas constitucionais, seja um ato que fere diretamente os pilares da Constituição.
Contudo, é complexo o entendimento de que uma norma, instituída pelo próprio poder constituinte venha a ser inconstitucional para o conjunto de normas que ela será inserida – a constituição. Quanto às normas constitucionais originárias, não tem razão de prosperar a tese da existência de incompatibilidade inconstitucional entre as normas promulgadas na Constituição Brasileira em cinco de outubro de um mil novecentos e oitenta e oito, pois esta é dotada de forma e princípios que levam o intérprete à conclusão de que há uma unidade normativa.
Entretanto, há de se recordar que anteriormente se tratou das questões basilares da constituição, normas de caráter material, sem as quais a constituição não se sustentaria – as cláusulas pétreas. Nesta linha, tem-se que uma norma secundária, como por exemplo, decorrente de Emenda, pode sim vir a ofender a constituição, seja pela não observância dos princípios proporcionalidade ou da proibição do excesso no Direito constitucional – vício material –, seja por erro na própria formulação desta lei ou do ato – vício formal.
2 Interpretação das normas constitucionais
Conforme ensina Fernandes, a hermenêutica vem a ser um "ponto de partida suficiente ou pelo menos um referencial para uma compreensão" (FERNANDES, 2011, p.135-136). Dessa forma, tem-se que a palavra hermenêutica pode ser usada como correspondente da palavra interpretação.
O pensamento de Nader vai adiante, dizendo que "enquanto que a hermenêutica é teórica e visa estabelecer princípios, critérios, métodos, orientação geral, a interpretação é de cunho prático, aplicando os ensinamentos da hermenêutica" (NADER, apud GOMES, 2001, p. 28).
Kelsen afirma que "a interpretação é, portanto, uma operação mental que acompanha o processo de aplicação do direito" (KELSEN, 2009, p. 392). Logo, não se pode falar da hermenêutica sem realizar qualquer referência a interpretação, visto que a primeira provê os meios adequados para a realização da segunda (GOMES, 2001, p. 29).
A importância da hermenêutica é possível ser visualizada na história. As leis sempre foram utilizadas como instrumento das paixões da minoria, fruto do acaso e do momento, sem que a análise do seu cabimento fosse de fato realizada (BECCARIA, 2006, p. 15-16).
Desta forma, fundamental como a disposição formal da lei, é a sua hermenêutica. A interpretação de como a lei será utilizada e deve ser entendida é essencial para seu objetivo final, especialmente pertinente uma constituição de estado.
Conforme a evolução da sociedade, dos costumes, ocorreu a necessidade de mudanças e progressos também nas normas jurídicas, surgiu assim a necessidade de evolução da forma de interpretação destas normas – a nova hermenêutica. Para demonstrar a evolução da hermenêutica, Bonavides trata da juridicidade dos princípios, de acordo com três fases: jusnaturalismo, positivismo e pós-positivismo (BONAVIDES, 2006, p. 258-259).
Bonavides classifica o jusnaturalismo da seguinte maneira:
"A primeiro – a mais antiga e tradicional – é a fase jusnaturalista; aqui, os princípios habitam ainda esfera por inteiro abstrata e sua normatividade, basicamente nula e duvidosa, contrasta com o reconhecimento de sua dimensão ético-valorativa de idéia que inspira os postulados de justiça". (BONAVIDES, 2006, p. 259).
Refere-se Bonavides que esta fase dominou a dogmática dos princípios por um longo período, até o advento da Escola Histórico do Direito. O Autor afirma que a fase seguinte apresentou um positivismo tão forte e arcaico, que por muitos anos "envergonhava" os juristas formados sob a égide do jusnaturalismo (BONAVIDES, 2006, p. 260).
A fase positivista é explicada pelo Bonavides a partir da ideia dos princípios, adentra-se nos códigos como fonte normativa e subsidiária. Bonavides enfatiza que [...] o juspositivismo, ao fazer dos princípios na ordem constitucional meras pautas programáticas supralegais, tem assinalado, via de regra, a sua carência de normatividade, estabelece, portanto, a sua irrelevância jurídica." (BONAVIDES, 2006, p. 263). Ressalte-se que a essencial distinção entre a velha hermenêutica e a nova hermenêutica se encontra na teoria destes princípios constitucionais.
2.1 A velha hermenêutica
A velha hermenêutica se apresenta escassa de normatividade de princípios, estes que se tornam irrelevantes quando da aplicabilidade das normas, posto que, no que tange a velha hermenêutica, o juiz era um mero aplicador das normas, seguia rigorosamente o que a lei dispunha. Na velha hermenêutica as normas, e apenas estas, eram de extrema relevância. (BARROSO, 2003, p. 332).
Esta época é conhecida por refletir o forte positivismo jurídico, sem levar em consideração outras fontes do direito, como por exemplo, os costumes e princípios.
A velha hermenêutica limitava-se ao que estava disposto na lei, e esta era considerada soberana, o que impossibilitava a busca de interpretação em princípios baseados nas mudanças dos costumes sociais. Contudo, atualmente torna-se inviável até mesmo imaginar a aplicabilidade apenas da norma "seca", pois se vislumbra tamanha mudança de costumes e evolução social e a importância dos princípios que estão implícitos na constituição, mas que possuem grande força normativa.
2.2 A nova hermenêutica
De maneira mais complexa, a nova hermenêutica traz novas formas de interpretação das normas, faz uso de princípios e regras e visa resolver os litígios de forma proporcional e equilibrada, através do qual busca efetividade das normas e das garantias e direitos fundamentais (BARROSO, 2003, p. 337).
Evidencia-se a necessidade da análise de cada caso, eis que a realidade fática acima de tudo deve ser levada em consideração, o que atualmente verificamos – ao menos em nossos Tribunais. Neste sentido, consta da jurisprudência extraída do Supremo Tribunal Federal, pelo Relator Ministro Celso de Mello, que:
O Supremo Tribunal Federal - apoiando-se em valiosa hermenêutica construtiva e invocando princípios essenciais (como os da dignidade da pessoa humana, da liberdade, da autodeterminação, da igualdade, do pluralismo, da intimidade, da não discriminação e da busca da felicidade) - reconhece assistir, a qualquer pessoa, o direito fundamental [...].
Observa-se que a nova forma de interpretação de normas abre os olhos para a mudança dos costumes da sociedade – estes que possuem direta ligação com a interpretação dos princípios –, como se pode verificar no referido julgado.
Verifica-se que o Relator buscou embasamento para a aplicação dos direitos fundamentais através da aplicação da nova hermenêutica, destacou "o afeto como valor jurídico impregnado de natureza constitucional: um novo paradigma que informa e inspira a formulação do próprio conceito de família". Neste caso, o Supremo Tribunal Federal entendeu as novas necessidades da sociedade, a mudança social que clama por uma transformação na própria legislação. Com a evolução da sociedade modificam-se os costumes e consequentemente os conceitos, neste sentido a interpretação das normas deve acompanhar esta evolução, de modo a proteger os direitos e garantias fundamentais dos indivíduos.
Imperioso destacar a fundamentação do agravante no pertinente julgado, onde esclarece que "quanto ao poder judiciário não se fechar às transformações sociais, e aceitá-las mesmo que inexista lei que vá [sic] ao encontro delas, caberia, salvo melhor juízo, ao Congresso Nacional interpretar essas mudanças e colocá-las na lei positiva".
Impende destacar ainda o manifesto do Supremo Tribunal Federal acerca da aplicabilidade dos direitos fundamentais através desta nova forma de interpretação:
Esta Suprema Corte, ao proferir referido julgamento, viabilizou a plena realização dos valores da liberdade, da igualdade e da não discriminação, que representam fundamentos essenciais à configuração de uma sociedade verdadeiramente democrática, tornando efetivo, assim, o princípio da igualdade, assegurando respeito à liberdade pessoal e à autonomia individual, conferindo primazia à dignidade da pessoa humana, rompendo paradigmas históricos, culturais e sociais e removendo obstáculos que, até então, inviabilizavam a busca da felicidade [...].
Os julgados mais recentes do Supremo Tribunal Federal acerca da aplicabilidade dos direitos fundamentais utilizam a instrumentalidade do direito constitucional alemão, ou seja, a ponderação de bens e interesses, através da aplicabilidade do princípio da proporcionalidade.
Entretanto, muito além da aplicação deste princípio, observa-se que os juristas constroem o ordenamento jurídico com a principal base em princípios que possuem força normativa e não apenas em regras positivadas:
Vários juristas vão por em relevo a construção de um ordenamento jurídico com base não só em regras, mas também em princípios jurídicos. Essa perspectiva vai ter como objetivo central superar a concepção positivista atrelada a um sistema jurídico fechado preso a um modelo de regras (FERNANDES, 2011, p. 180-182).
O autor ainda esclarece a identidade entre as normas jurídicas e os princípios, uma vez que estes ganharam força de norma, afirma ainda que inexistem critérios teóricos capazes de separar estas duas espécies.
2.3 O papel dos princípios e sua força normativa
A atual forma de interpretação constitucional permite a utilização dos princípios como se regras fossem. Entretanto Robert Alexy diferencia regras e princípios, onde as conceitua da seguinte forma:
[...] princípios são normas que ordenam que algo se realize na maior medida possível, em relação às possibilidades jurídicas e fáticas. Os princípios são, por conseguinte, mandamentos de otimização que se caracterizam porque podem ser cumpridos em diferentes graus e porque a medida de seu cumprimento não só depende das possibilidades fáticas, mas também das possibilidades jurídicas. [...] Por outro lado, as regras são normas que exigem um cumprimento pleno e, nessa medida, podem sempre ser somente cumpridas ou não. Se uma regra é válida, então é obrigatório fazer precisamente o que se ordena, nem mais nem menos (ALEXY apud FERNANDES, 2011, p. 185).
Fernandes (2011, p. 185) questiona que, se um princípio é considerado uma norma, "como uma norma pode ter sua aplicação em diferentes graus?", se refere aqui ao mecanismo de proporcionalidade. E, em seguida, o autor traz o ensinamento de Alexy, do qual extrai o entendimento de que, caso sejam considerados os princípios de forma análoga aos valores, se poderia fazer uma análise de forma a ordená-los de acordo com sua relevância.
Imperioso destacar que na velha hermenêutica, os princípios não tinham qualquer força normativa, onde utilizava-se apenas a lei, sem maiores interpretações dela e sem o uso dos princípios para auxiliar na interpretação e aplicação da norma.
Contudo, a nova hermenêutica atribui força normativa aos princípios, que conforme Alexy, nesta nova fase são considerados mandamentos de otimização. Com isso, o autor se refere a função dos princípios na interpretação das normas, expõe assim que, quando há uma colisão entre regras, uma será considerada nula, para aplicabilidade de outra. Entretanto, quando a colisão ocorre com os princípios, um deles não poderá ser considerado nulo, mas deverá retroceder para que se aplique o outro.
2.4 O papel dos direitos fundamentais e sua força interpretativa
Conforme já se expôs, o constitucionalismo surgiu com a finalidade de impor uma limitação ao poder do Estado, visando assegurar as garantias e direitos fundamentais e a organização da estrutura da sociedade. Assim, cumpre ressaltar que através do avanço do constitucionalismo, houve um ganho de força dos direitos fundamentais, que passaram a ser considerados com maior relevância, formando a base do ordenamento jurídico.
Nestes termos, os direitos fundamentais seriam, ao mesmo tempo, ora vistos como direitos de defesa (ligados a um dever de omissão, um não fazer ou não interferir no universo privado dos cidadãos), principalmente contra o Estado; mas ainda, como garantias positivas para o exercício das liberdades (e aqui, entendidos como obrigações de fazer ou de realizar) por parte do mesmo Estado (FERNANDES, 2011, p. 225).
Neste diapasão, tem-se que os direitos fundamentais passaram a se estabelecer como verdadeiros pilares, essenciais para a interpretação e aplicação das normas constitucionais. Desta forma, conforme entendimento de Sarlet, os direitos fundamentais são ainda a base do ordenamento jurídico do Estado e da sociedade e, dotados de eficácia radiante (SARLET apud FERNANDES, 2011, p. 224-225).


CAPÍTULO II
2 DIREITOS HUMANOS FUNDAMENTAIS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE
Na Constituição Federal de 1988, é possível observar que o constituinte se preocupou em declarar os direitos e garantias fundamentais, em seu Título II, subdividindo-os em cinco capítulos: direitos individuais e coletivos; direitos sociais; nacionalidade; direitos políticos e partidos políticos.
Ressalte-se que tais garantias fundamentais, não devem ser consideradas meras diretrizes, mas sim normas jurídicas, que conforme Fernandes são "dotadas de vinculação aos órgãos encarregados pela atividade de aplicação e criação do direito" (2011, p. 201 – grifou-se).
Entretanto, a noção de direitos fundamentais é muito anterior a ideia de constitucionalismo, que, conforme tratou-se no capítulo anterior, o constitucionalismo se fundou com a necessidade de assegurar os direitos humanos de primeira geração, abordados mais adiante, trazendo-os para dentro da constituição formal, com a finalidade de torná-los positivados.
A Origem formal do constitucionalismo está ligada às Constituições escritas e rígidas dos Estados Unidos da América, em 1791, a partir da Revolução Francesa, apresentando dois traços marcantes: organização do Estado e limitação do poder estatal, por meio da previsão de direitos e garantias fundamentais. (MORAES, 2011, p. 1).
O que se extrai do ensinamento acima é que o surgimento das cartas constitucionais tem profunda ligação com a edição de declarações de direitos do homem, com o objetivo principal de limitar o poder político, incorporando os direitos subjetivos do homem em normas formais.
Antes do movimento constitucionalista, que tem sua base política no iluminismo francês, o que influenciava na ideia de Direito e Estado era a concepção hobbesiana, que segundo Manoel Gonçalves Ferreira filho:
O pacto social, para estabelecer a vida em sociedade de seres humanos naturalmente livres e dotados de direitos, há de definir os limites que os pactuantes consentem em aceitar para esses direitos. A vida em sociedade exige o sacrifício que é a limitação do exercício dos direitos naturais. Não podem todos ao mesmo tempo exercer todos os seus direitos naturais sem que daí advenha a balbúrdia, o conflito (FERREIRA FILHO, 2011, p. 22).
Imperioso destacar que, o termo direitos naturais, para Ferreira Filho, se refere aos direitos humanos. Entretanto, quanto a declaração de direitos, o autor melhora a apresentação anterior, dando ênfase à construção da independência norte americana.
Não é por mera coincidência que cada uma das antigas colônias inglesas da América do Norte, ao romper seus laços com a metrópole, tem o cuidado de formular desde logo sua declaração de Direitos. Não é por capricho, que essas colônias adoram declarações (a primeira de Virgínia, em 1776), antes de estabelecer as próprias Constituições, e muito antes de se unirem pelas instituições confederativas (em 1781) e federativas (em 1787), com a Constituição dos Estados Unidos da América. O mesmo ocorre em relação a esses Estados quando se unem. Primeiro vem a declaração de direitos, no caso embasando a própria declaração de independência (1776), bem antes, portanto, da vigência dos Artigos de Confederação (1781) e promulgação da Constituição da Filadélfia (1787). E o mesmo ocorreu na França. A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão é de 1789; a primeira Constituição, de 1791. Só mais tarde, por economia de tempo e trabalho, é que se passou a estabelecer num mesmo documento a declaração de Direitos (o pacto social) e a Constituição (o pacto político). (FERREIRA FILHO, 2011, p. 24).
Assim surgiu a ideia da inserção dos direitos fundamentais nas cartas constitucionais. Importante lembrar, como já trabalhamos no primeiro capítulo, que as primeiras constituições não nasceram se declarando supremas, nem mesmo havia segurança em afirmar à época que as mesmas tivessem alguma força normativa, como bem podemos notar pela célebre frase atribuída ao Rei Frederico Guilherme VI, da Prússia, por Lassalle em sua não menos famosa obra A Essência da Constituição: "Julgo-me obrigado a fazer agora, solenemente, a declaração de que nem no presente nem para o futuro permitirei que entre Deus do céu e o meu país se interponha uma folha de papel escrita como se fosse uma segunda Providência"...
A questão da normatividade e superioridade da Constituição tem como marco jurídico, a decisão da suprema corte norte americana no início do século XIX e vai, aos poucos influenciando o constitucionalismo de todo o mundo.
Assim, os direitos que chamamos na atualidade de fundamentais, estando no centro das Constituições em decorrência deste movimento Constitucionalista, passam a ser dotados de normatividade e supremacia.
Para Fernandes "a afirmação de superioridade da Constituição, como norma superior e matriz das demais normas só faz sentido, se direcionada a assegurar a maior proteção possível de iguais direitos fundamentais a todos os membros de uma dada sociedade." (FERNANDES, 2011, p. 223).
Na atualidade defende-se a noção das dimensões subjetivas e objetivas dos direitos fundamentais, sendo consideradas como dimensões subjetivas a limitação do poder estatal, tendo por finalidade assegurar tais direitos e garantias fundamentais. Por sua vez a dimensão objetiva vai além deste conceito, traçando um verdadeiro norte de eficácia, que baseia todo o ordenamento jurídico (FERNANDES, 2011, p. 225).
Não obstante os direitos fundamentais terem força normativa, e serem considerados os pilares do ordenamento jurídico, o autor deixa clara a inexistência qualquer tipo de hierarquia entre eles, como meios de defesa e como garantias positivas para o exercício das liberdades, mas salienta seu caráter instrumental, que permite que o indivíduo que teve o direito lesado busque socorro no judiciário, visando a proteção destes direitos.
2.1 A historicidade dos direitos humanos e direitos fundamentais
Primeiramente, é necessário esclarecer se as expressões direitos humanos e direitos fundamentais são sinônimas. Contudo, tradicionalmente se sustenta que não é possível tratar ambos os termos como sinônimos, eis que, a expressão direitos humanos tem caráter universal, se referem aos direitos do homem de maneira a atingir todos os indivíduos, numa perspectiva extra-estatal, ou melhor, universal. De outro lado, os direitos fundamentais são aqueles que estão positivados, são os direitos humanos incorporados na carta constitucional de determinado Estado.
Este termo "direitos fundamentais" surge na França (conforme tratamos no capítulo anterior), no final do século XVIII, através do movimento político e cultural que deu origem à Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão. Entretanto, é comum encontrar autores que tratam de direitos humanos e fundamentais como sinônimos.
Sabrina Morais esclarece a distinção destes termos, dispondo que os direitos humanos podem ser representados por um sistema que contenha os direitos fundamentais. Por conseguinte, os direitos fundamentais são os direitos humanos incorporados no ordenamento jurídico, ou seja, são juridicizados. Seguindo esta linha de pensamento, a autora traz o posicionamento de Sarlet:
A expressão direitos humanos guarda uma relação maior com os documentos de Direito Internacional, pleiteando o reconhecimento de direitos ao ser humano, pela simples condição de sê-lo, independente de qualquer ordem jurídica amparadora aspirando a uma validade universal, para todos os povos e tempos, revelando um equívoco caráter supranacional não vigente nos direitos fundamentais.Portanto, reforça que a melhor terminologia a ser adotada deve englobar tanto a vertente internacional quanto a interna, compreendida na expressão Direitos Humanos Fundamentais.(SARLET apud MORAIS, 2007, p. 36).
Canotilho destaca que para a compreensão de direitos humanos é necessária a divisão deste em dois grupos: direitos do homem e direitos do cidadão. Sendo que, enquanto aos direitos do homem se referem aos direitos do indivíduo em si, os direitos do cidadão se referem aos direitos do indivíduo que convive em sociedade (CANOTILHO, 2003, p. 233).
Em se tratando dos direitos fundamentais, surge o termo gerações de direitos, da qual BONAVIDES (2010, p. 562-564) faz uma análise sistêmica, de acordo com a evolução histórica. A primeira geração destes direitos traz a ideia de liberdade, a segunda geração, traz os direitos de igualdade, e por fim, a terceira geração, os direitos de fraternidade, complementando o lema da Revolução Francesa: liberdade, igualdade e fraternidade.
Neste mesmo sentido, Fernandes busca classificar as gerações dos direitos, sendo os direitos de primeira geração pertinentes aos direitos civis e políticos, que foram o marco dos movimentos constitucionalistas no ocidente, no final do século XVIII e início do século XIX. Tendo surgido os direitos de segunda geração apenas no século XX, quais sejam: direitos sociais, culturais e econômicos, que também são chamados de sociais. Este grupo de direitos teve seu desenvolvimento no Estado Social, através de movimentos e ideias antiliberais. E quanto aos direitos de terceira geração, ensina o autor que:
[...] No final do século XX, um resgate de teor humanístico oriundo da tomada de consciência de um mundo partido entre nações desenvolvidas e subdesenvovidas teria sido um elemento importante para o pensar de uma nova geração de direitos fundamentais, uma terceira geração de direitos (dimensão) [...] enxerga como destinatário todo o gênero humano (presente e futuro), como um todo conectado, de modo que se fundamentaria no princípio da fraternidade. Estaríamos falando, então, de direito ao desenvolvimento, direito à paz, direito ao meio ambiente, direito de comunicação [...] (FERNANDES, 2011, p. 231).
Não obstante o entendimento de Fernandes e de outros autores, alguns defendem a existência da quarta e quinta gerações, onde a quarta geração se refere ao direito à democracia, à informação e ao pluralismo, da mesma forma, a "moda" atual é o uso da expressão "dimensões" no lugar de "gerações", sob a acusação de que o uso da expressão "gerações" levaria a ideia de superação de uma por outra. Enquanto que a quinta geração compreenderia a paz, sendo este o entendimento do conceituado Bonavides, que afirma que "O novo Estado de Direito das cinco gerações de direitos fundamentais vem coroar, por conseguinte, aquele espírito de humanismo que, no perímetro da juridicidade, habita as regiões sociais e perpassa o Direito em todas as suas dimensões." (BONAVIDES, 2008, p. 583).
Neste contexto, pode-se afirmar que as gerações de direitos fundamentais se baseiam em uma ordem histórica e cronológica em que passaram a ser reconhecidos e inclusos na carta constitucional.
Todavia, os direitos fundamentais insurgem não só para assegurar direitos e garantias diretamente ligados aos indivíduos, mas também "a um complexo organizado de normas, que por sua vez, configuram um instituto jurídico [...]." (MENDES apud FERNANDES, 2011, p. 238).
Conforme já destacamos anteriormente, a Constituição Federal de 1988 elenca um rol de direitos fundamentais, mas não impõe nenhum limite para criação de novos direitos fundamentais.
Cumpre frisar que cada parte do ordenamento jurídico, que venha tratar de direitos fundamentais possui direta relação com a dignidade da pessoa humana. Ademais, não só os direitos que estão declarados no ordenamento interno, mas também os direitos humanos, no âmbito universal.
2.2 Dignidade da pessoa humana e os direitos fundamentais
Evidencia-se que este é o objetivo primordial dos direitos humanos e fundamentais, garantir a dignidade da pessoa humana. Neste sentido Ingo Sartet afirma que:
Sendo correta a premissa de que os direitos fundamentais constituem – ainda que com intensidade variável – explicitações da dignidade da pessoa, por via de conseqüência e, ao menos em princípio [...], em cada direito fundamental se faz presente um conteúdo ou, pelo menos, alguma projeção da dignidade humana.
Ademais, Sarlet faz menção ao ensinamento de Rousseau ao se referir que "os direitos fundamentais adquirem vida e inteligência por meio da dignidade da pessoa, ao passo que esta não se realiza e torna efetiva se não pelos direitos fundamentais." (ROUSSEAU apud SARLET, 2011, p. 101).
Esclareça-se que não há hierarquia entre os direitos fundamentais, porém, o que se vislumbra é que a dignidade humana está inserida em todos os direitos fundamentais elencados na Constituição de 1988, de forma a estar assegurado através de qualquer um dos direitos fundamentais que venham a ser garantidos. Neste sentido, Fernandes trata a dignidade da pessoa humana como um super princípio ao afirmar que:
Originalmente construído a partir de uma leitura kantista, dotado de uma normatividade metajurídica, isto é moralizante, já que oriunda da fórmula do imperativo categórico, refere-se à proteção da pessoa – como sujeito de direitos – como fim em si mesma, e nunca como meio para realização de objetivos de terceiros."(FERNANDES, 2011, p. 267).
Conforme já exposto anteriormente, a importância deste tema se dá ao fato de que a dignidade da pessoa humana é considerada uma referência normativa à proteção da autonomia individual. Antes de conceituar o tema, imperioso destacar as palavras de Sarlet:
Assim, sem que se reconheçam à pessoa humana os direitos fundamentais que lhe são inerentes, em verdade estar-se-á negando-lhe a própria dignidade, o que nos remete à controvérsia em torno da afirmação de que ter dignidade equivale apenas a ter direitos (e/ou ser sujeito de direitos), pois mesmo em se admitindo que onde houver direitos fundamentais há dignidade, a relação primária entre dignidade e direitos, pelo menos de acordo com o que sustenta parte da doutrina, consiste no fato de que as pessoas são titulares de direitos humanos em função de sua inerente dignidade (SARLET, 2011, p. 102).
Entretanto o conceito de dignidade tem gerado dificuldades conceituais. Para Rizzato Nunes, "dignidade nasce com a pessoa [...], o ser humano é digno por que o é." De uma maneira mais clara, Nunes afirma que o ser humano já nasce com sua dignidade, que deve ser respeitada acima de tudo. Após, o indivíduo cresce e convive no meio social, por conseguinte desenvolve seu pensamento, que deve ser respeitado, isto é, sua liberdade, sua imagem, suas crenças, etc., todas estas condições compõe a dignidade humana. (NUNES, 2002, p. 49).
A dignidade da pessoa humana pressupõe tamanha supremacia, com conceito firmado no princípio da igualdade e da liberdade, estes que são o fundamento do novo Estado Democrático de Direito. A dignidade da pessoa humana resgatou o ser humano como sujeito de direitos, garantindo-lhe plena cidadania.
A dignidade humana confere ao ordenamento jurídico unidade de sentido e legitimidade, que, conforme Sarlet,
[...] a despeito de seu caráter compromissário, confere uma unidade de sentido, de valor e de concordância prática ao sistema de direitos fundamentais, que, por sua vez, repousa na dignidade da pessoa humana, isto é, na concepção que faz da pessoa fundamento e fim da sociedade e do Estado, razão pela qual se chegou a afirmar que o princípio da dignidade humana atua como o "alfa e ômega" do sistema das liberdades constitucionais e, portanto, dos direitos fundamentais. (SARLET, 2011, p. 91).
Sarlet ainda se refere à Constituição de 1988, como "constituição da pessoa humana", pois trata da dignidade da pessoa humana como condição de fundamento de nosso Estado democrático de Direito.
Ao contrário dos autores anteriormente citados, que entendem inexistir hierarquia entre direitos fundamentais previstos na Constituição de 1988 , Sarlet coloca a dignidade da pessoa humana no maior nível hierárquico das normas previstas na Carta Magna.
[...] a dignidade da pessoa humana [...] tem sido considerada – também na esfera jurisprudencial – como dotada de plena normatividade, notadamente como referencial no âmbito do processo hermenêutico, embora não se vá adentrar o mérito das decisões individualmente consideradas, especialmente no que diz com o uso adequado [...] da dignidade da pessoa humana (SARLET, 2011, p. 99).
Com isso, Sarlet quer dizer que apesar do fato de nem todos os direitos fundamentais se fundarem na dignidade da pessoa humana, este continua na condição de princípio fundamental e estruturante do ordenamento jurídico, servindo de parâmetro para aplicação e interpretação não só dos direitos fundamentais, mas também sobre todo o ordenamento jurídico.
Com tudo o que vimos até então, podemos afirmar que não seria aceitável, ou melhor, não seria constitucional qualquer ato ou norma criada pelo estado – ainda que infraconstitucional –, que vá de encontro à dignidade da pessoa humana.
Assim, temos que o legislador constituinte atribuiu aos princípios fundamentais força normativa e informativa de todo o ordenamento jurídico constitucional e "inclusive das normas definidoras de direitos e garantias fundamentais, que igualmente integram aquilo que se pode denominar de núcleo essencial da nossa Constituição formal e material" (SARLET, 2011, p. 75).
Ressalte-se que a dignidade da pessoa humana está expressamente prevista em outros dispositivos da Constituição de 1988, que não o título que trata dos direitos fundamentais, quando, na esfera da ordem social, fundou o planejamento familiar nos princípios da dignidade da pessoa humana, assegurando à criança e ao adolescente o direito à dignidade (art. 227, caput):
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
Neste contexto, "a dignidade da pessoa e a própria pessoa humana mereceram a devida atenção por parte da nossa ordem jurídica positiva" (SARLET, 2011, p. 76).
Quanto ao referido princípio, Bonavides destaca que "sua densidade jurídica no sistema constitucional há de ser, portanto máxima e se houver reconhecidamente um princípio supremo no trono da hierarquia das normas, esse princípio não deve ser outro senão aquele em que todos os ângulos éticos da personalidade se acham consubstanciados" (BONAVIDES, 2008, p. 233).
2.3 Direitos fundamentais da criança e do adolescente
De acordo com o entendimento de Nunes, anteriormente citado, de que a pessoa já nasce com dignidade, evidencia-se que estes direitos são garantidos em face da consideração de seus titulares como pessoas humanas, ainda que em processo de desenvolvimento, eis se tratar de detentores de direitos civis, humanos e sociais.
O princípio da dignidade da pessoa humana tem o condão de assegurar os direitos e garantias fundamentais, com prioridade à criança e ao adolescente. Neste diapasão, caso ocorra descumprimento destes direitos, ou mesmo havendo omissão em sua implementação, resulta no descumprimento dos direitos fundamentais, logo, qualquer norma ou ato neste sentido, pode ser considerada inconstitucional.
De acordo com o ECA, em seu art. 18, o direito à dignidade pressupõe a proibição a qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor à criança e/ou ao adolescente. Este é o entendimento que também se extrai do art. 227, supramencionado.
Ademais, o Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu art. 17, assegura que o direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, das ideias e crenças, dos espaços e objetos pessoais.
Evidencia-se a carga valorativa atribuída destas normas através da dignidade da pessoa humana, considerando a criança e adolescente, pessoa em desenvolvimento, sendo sujeito de direitos humanos, civis e sociais.
Fazendo um paralelo com a Constituição Federal de 1988 e a Convenção dos Direitos da Criança, Veronese esclarece que a Carta Magna tem "uma nova base doutrinária, a qual implica que, fundamentalmente, as crianças e adolescentes brasileiros passam a ser sujeitos de direitos. Essa categoria encontra sua expressão mais significativa na própria concepção de Direitos Humanos de Lefort: 'o direito de ter direitos'[...]"(VERONESE, 1999, p. 100).
Tal atribuição às crianças e adolescentes, como sujeitos de direitos a serem protegidos pelo Estado, pela família e pela sociedade, conforme o art. 227, da CF/88, observou os direitos fundamentais e os direitos humanos e, além de priorizar sua garantia de forma absoluta.
Próximo da Constituição de 1988, cumpre-nos salientar a ratificação do Brasil à Convenção dos Direitos da Criança, de 1989, esta que inclusive afirmou os direitos da criança e do adolescente, sendo consolidada pela ONU em Assembléia realizada em 20 de novembro de 1989.
Neste sentido, para Josiane Rose Petry Veronese, a Convenção sobre os direitos da criança:
[...] ratifica o que as Nações Unidas proclamaram e acordaram na Declaração Universal dos Direitos Humanos e nos Pactos Internacionais de Direitos Humanos, determina que toda pessoa, sem qualquer tipo de distinção, seja de raça, cor, sexo, idioma, crença, opinião política ou de outra índole, origem nacional ou social, posição econômica, nascimento ou qualquer outra condição, possui os direitos enunciados nesses documentos (VERONESE, 1999, p. 96).
Destaque-se que a referida Convenção, faz menção à Declaração Universal dos Direitos Humanos, que trouxe como princípio fundamental que:
Todas as crianças, absolutamente sem qualquer exceção, serão credoras destes direitos, sem distinção ou discriminação por motivo de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião positiva ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento ou qualquer outra condição, quer sua ou de sua família.
Não obstante estarem todos estes direitos devidamente assegurados no ordenamento jurídico, resta-nos questionar acerca da efetividade desses direitos no processo de adoção, quanto ao Cadastro Nacional do Adotante, eis que o referido cadastro é estruturado com perguntas fechadas, nas quais o postulante à adoção tem a liberdade de estabelecer o perfil da criança, de acordo com o sexo, a faixa etária, a cor, se aceita gêmeos (sexo feminino ou masculino), se aceita irmãos, se aceita criança com problemas físicos ou mentais.
Ressalte-se a importância de tratar dos direitos fundamentais inerentes às crianças e adolescentes de forma especial e separadamente, por se tratar de seres em desenvolvimento, neste sentido, Veronese destaca que "o fato de que as crianças, tendo em vista sua vulnerabilidade, necessitam de cuidados e proteção especiais; e enfatiza a importância da família, para que a criança desenvolva sua personalidade, num ambiente de felicidade, amor e compreensão"(VERONESE, 1999, p. 97).
É interessante destacar que, tais garantias expressamente contidas na Constituição Federal têm absoluta prioridade, não havendo razão de existir quaisquer tipos de atos discriminatórios, tratando crianças e adolescentes de forma geral, englobando tanto aquelas que se encontram em situação de abandono, quanto aquelas que estão inseridas no seio familiar. "No tocante à proteção à família – como instituição basilar da sociedade brasileira -, a Constituição expressamente veda qualquer distinção entre filhos havidos ou não da relação matrimonial, ou por adoção." (FERNANDES, 2011, p. 479).
Por conseguinte, Veronese enfatiza a relevância do respeito aos "valores culturais da comunidade da criança e o papel vital da cooperação internacional para o cumprimento dos Direitos da Criança."
Ainda em se tratando dos direitos e garantias fundamentais da criança e do adolescente, destacamos trechos do julgado da Relatora: Desembargadora Maria Elza, nos autos de uma apelação cível:
A dignidade da pessoa humana, notadamente a da criança e do adolescente, é tutelada pela Constituição Federal e pela Lei n. 8.069/90. Assim, é dever inafastável dos Municípios de Carangola, de São Francisco Glória, de Faria Lemos e de Fervedouro empreenderem todos os esforços que efetivem o princípio fundamental de proteção integral à criança e ao adolescente, assegurando abrigo, apoio sócio-educativo, sócio-familiar e assistência material, moral, médica e psicológica, nos termos do art. 227, da CF, e 4º, 6º, 7º, 15, 70, 86, 87, 88, 90 da Lei n. 8.069/90.
Com a finalidade de fazer uma ligação entre os direitos humanos e os direitos fundamentais da criança e do adolescente, merece destaque o entendimento de Sérgio Resende de Barros, onde afirma:
Quando se pensa em direitos humanos fundamentais o que primeiro vem a mente é o direito à vida. Mas não se pode pensar na vida humana sem pensar na família. Uma implica a outra, necessariamente. Daí que – também necessariamente – o direito à vida implica o direito à família, fundando-o primordialmente, como o primeiro na ordem jurídica da família, o mais fundamental dos direitos de família. Também não é possível pensar outros direitos humanos fundamentais sem pensar na família, O direito à liberdade e a igualdade, à fraternidade e à solidariedade humanas, à segurança social e à felicidade pessoal, bem como outros direitos humanos fundamentais, todos eles dão fundamento ao direito à família e remetem ao recinto familiar – o lar –, onde eles se realizam mais efetivamente, desde que envolvidos e amparados pelo afeto (BARROS apud PEREIRA, 2004, p. 612-613 – grifou-se).
Afortunada a correlação feita pelo autor, pois se chegou a um ponto em que todos estes princípios se correlacionam em perfeita sintonia, formando um harmonioso conjunto de direitos e garantias – que são os direitos fundamentais. Ademais, o autor insere a família como um desses direitos, um meio através do qual os indivíduos exercem estes direitos, fazem parte da sociedade.
Neste mesmo sentido, segue o autor, inserindo a família como uma das bases do Estado, uma vez que se trata de uma sociedade que auxilia o Estado na efetivação dos direitos assegurados constitucionalmente:
Ademais – mas não depois dos demais – a criança e o adolescente. Embora não sejam a única, eles constituem uma das razões maiores – uma das causas principais ou, dizendo o mesmo, um dos princípios causais – da família. O que faz deles o objeto de um especial afeto – o afeto paternal e maternal – que se alia ao afeto de toda a família e, além da família, o afeto de toda a sociedade, que se empenha em protegê-los da melhor maneira possível, como se deve proteger – dignamente – o ser humano na sua origem e na sua primeira evolução. Daí, por que o Estado em que a sociedade brasileira se constitui fez por assegurar constitucionalmente os direitos humanos fundamentais da criança e do adolescente, assim como seus principais direitos operacionais (BARROS apud PEREIRA, 2004, p. 617).
Daí se diz que "é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida [...]", é o que se extrai do artigo 227 da Constituição Federal de 1988, que tem o objetivo primordial de assegurar aqueles direitos elencados no texto constitucional, com absoluta prioridade.
Desta forma, os atos relacionados às crianças e adolescentes devem sempre respeitar o melhor interesse dos mesmos, cabendo ao Estado efetivar a proteção adequada, inclusive quando é necessário suprir os devidos cuidados nas situações em que os pais não o fizeram.
2.4 Princípio da Prioridade Absoluta
O princípio da prioridade absoluta está inserido no caput do art. 227, da Constituição Federal de 1988, onde dispõe o seguinte:
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão (grifou-se).
O termo prioridade absoluta, busca atribuir uma atenção maior aos direitos e garantias fundamentais das crianças e adolescentes, afirmando que merecem atenção especial por se tratarem de pessoas em desenvolvimento. Neste sentido, Veronese (1999, p. 110), destaca que:
A criança tem o direito à vida, sendo dever do Estado assegurar a sua sobrevivência e o seu desenvolvimento. Aí se constata a importância dos arts. 5º e 6º da Constituição Federal, o primeiro que trata dos direitos individuais e coletivos e o segundo dos sociais, como o direito à educação, à moradia, ao trabalho, à saúde pública, à previdência social, ao lazer, à proteção materno-infantil, à assistência aos desamparados. Portanto, o cumprimento desses preceitos implica em garantia de qualidade de vida, em garantia de cidadania.
Entretanto, o autor trata apenas do dever do Estado em assegurar estes direitos, mas o texto constitucional declara, de maneira sutil, uma ordem das entidades que tem o dever de assegurar estes direitos às crianças e adolescentes, atribuindo em primeiro lugar tal dever à família, em seguida à sociedade e por conseguinte ao próprio Estado, neste sentido:
Uma das técnicas originárias de proteção social que até hoje se mantém é a família. Aproveita-se a lei da solidariedade no âmbito das relações familiares. Ao gerar deveres recíprocos entre os integrantes do grupo familiar, safa-se o Estado do encargo de prover toda a gama de direitos que são assegurados constitucionalmente ao cidadão. Basta atentar que, em se tratando de crianças e adolescentes, é atribuído primeiro à família, depois à sociedade e finalmente ao Estado (CF 227) o dever de garantir com absoluta prioridade os direitos inerentes aos cidadãos em formação (DIAS, 2009, p. 66).
Não obstante a perspicaz ordem atribuída pelo legislador constituinte, evidencia-se que os principais meios para o alcance da efetividade destes direitos são: a primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias; precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública; preferência na formulação e na execução de políticas sociais públicas; destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude, como bem está previsto no parágrafo único do artigo 4º do Estatuto da Criança e do Adolescente, atribuindo com prioridade ao Estado o dever de efetivar a proteção, eis que Este é o responsável para promover políticas sociais públicas para este fim. Para Dias (2009, p. 67) a disposição contida no artigo 4º do ECA se refere a um "microssistema que traz normas de conteúdo material e processual, de natureza civil e penal, e obriga toda a legislação que reconhece os menores como sujeitos de direitos."
Tem-se aqui, o artigo 227 da Constituição Federal, como uma norma de eficácia limitada, que impõe à família, à sociedade e ao Estado o dever de assegurar os direitos das crianças e adolescentes, mas não dispõe as formas de efetivação de tais direitos. Assim, o ECA apresenta em seu artigo 4º, § único tais institutos, complementando a norma prevista constitucionalmente, conforme melhor complementa Veronese (1999, p. 108):
Não há que se negar, no que tange à implementação legislativa, que o Estado brasileiro deu o primeiro passo no processo de priorização da infância e da juventude, quando prolatou a Lei nº. 8.069/90, regulamentando o art. 227 da Constituição Federal, consolidou na ordem jurídica interna princípios da Doutrina da Proteção Integral. [...] Há que se consider, também, que o atual momento histórico está a exigir que as Casas Legislativas, no processo de elaboração do orçamento e previsão de recursos a serem destinados às políticas públicas, tanto na esfera federal quanto estadual, fiquem atentas ao princípio da prioridade absoluta que se deva dar às crianças e adolescentes.
Por derradeiro, por absoluta prioridade deve-se entender que as crianças e adolescentes devem ser considerados antes de tudo, ou seja, acima de tudo, tendo seus direitos assegurados de forma plena e ilimitada. Cumpre destacar que o princípio da prioridade absoluta está diretamente ligado ao princípio da proteção integral, este que também se encontra inserido no artigo 227 da Constituição Federal. O princípio da proteção integral se refere à todos os direitos sociais descritos no caput do artigo 227, da Constituição Federal.
2.5 Princípio da Proteção Integral e o direito à convivência familiar
Além da previsão constitucional, pode-se encontrar o princípio da proteção integral inserido no ECA, onde visa garantir às crianças e adolescentes o pleno gozo de seus direitos fundamentais constitucionalmente estabelecidos.
O objetivo do princípio da proteção integral é assegurar às crianças e aos adolescentes seus direitos, de forma plena, irrestrita, incondicional e ilimitada, mantendo-os a salvo de qualquer tipo de agressão, pois são consideradas pessoas em desenvolvimento, sujeitos de direitos.
A proteção integral incumbe à família, à sociedade e ao Estado. Atribui-se aqui, força à família, reconhecendo-a constitucionalmente como a base da sociedade. Neste sentido é possível concluir que as crianças e os adolescentes tem o direito de estarem inseridos no seio familiar, participando também da vida em sociedade. Para tanto, sobrevém a necessidade da efetiva proteção integral por parte da família e do Estado, através de políticas sociais que visem a proteção das crianças e adolescentes (DIAS, 2009, p. 67-69).
No que tange a promoção e proteção dos direitos fundamentais da criança e do adolescente, enquanto pessoas em desenvolvimento, Veronese (1999, p. 117):
A liberdade de expressão está proclamada no art.5º, IX, da CF/88, no qual se declara que "é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença". A criança e o adolescente devem sempre ser estimulados no sentido de que a expressão de seus valores e a garantia de fazê-lo sadiamente, se constitui num dado a ser acrescentado à formação da personalidade da pessoa humana.
A autora destaca os direitos sociais da criança/adolescente e a importância de sua efetivação, eis que o exercício de tais direitos ou a privação deles interfere totalmente na formação da personalidade da pessoa em seu desenvolvimento.
2.6 Princípio do Melhor Interesse da Criança frente ao instituto da adoção
O melhor interesse da criança é o princípio basilar e norteador de todo o sistema protecionista do menor, através do qual se busca observar sempre os direitos fundamentais já elencados anteriormente. Este princípio se sobrepõe quando há conflito de um direito da criança/adolescente frente ao direito de outra pessoa. Neste sentido, temos que a criança, além de ser tratada com absoluta prioridade, terá assegurado seu melhor interesse frente aos interesses ou direitos de outra pessoa.
Assim, via de regra, nos países em que a adoção é reconhecida e/ou permitida, esta só se realizará quando de fato representar um bem, consoante os interesses da criança, e ainda, deverá ser revestida de todas as garantias e permitida pelas autoridades competentes.
Pretende tal preceito evitar que se processem adoções revestidas de ilicitudes, lembrando-se que a mesma consistem numa medida excepcional, devendo considerar o interesse maior da criança. Busca-se com isso evitar o tráfico de crianças, pois se é correto afirmar que a adoção se constitui numa forma de resolver os problemas de crianças que vivem em condições [sic] subhumanas, sobretudo nos países marcados pela miséria econômico-social ou pela guerra, também é certo que não seria adequado que a adoção fosse realizada sem nenhuma formalidade legal, sem nenhum compromisso, tendo em conta que se devam impedir os abusos que já ocorreram e ainda ocorrem, em face da falta de escrúpulos de pessoas ou mesmo de entidades que se servem desse mecanismo para auferir vantagens econômicas (VERONESE, 1999, p. 132).
A Lei 8.069/90 em seu art. 5º adverte que nenhuma criança ou adolescente poderá ser negligenciada, discriminada, explorada, violentada, oprimida, vítima de atos cruéis e no art. 6º, há a complementação desse entendimento, advertindo que na aplicação do Estatuto, dever-se-á sempre considerar a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento (VERONESE, 1999, p. 134).
Observando-se que um dos pontos a serem esclarecidos na presente pesquisa é a conseqüência dos critérios seletivos ao perfil da criança/adolescente, estabelecidos pelos pretendentes à adoção, no Cadastro Nacional do Adotante, temos que o processo de adoção acaba por se tornar "burocrático" e vagaroso e ocasiona demora para adoção de crianças e adolescentes, não obstante seus direitos fundamentais estarem constitucionalmente assegurados.
Nota-se a existência de uma ligação entre estes três princípios:
[...] na medida em que se garante o respeito à prioridade absoluta, é possível se preservar o melhor interesse. Para que se efetive a proteção integral, além da prioridade absoluta e da condição peculiar de pessoa em desenvolvimento há uma trilogia de direitos cujo fim é assegurar a sua eficácia. Trata-se da trilogia da proteção integral composta pelos direitos: à liberdade, ao respeito à dignidade todos definidos no ECA em seus artigos 16, 17 e 18, respectivamente (2012, p. 17).
Logo, assim como o princípio da proteção integral e da prioridade absoluta, o melhor interesse da criança está atrelado aos demais, de forma que através deste se busca efetividade da aplicação dos direitos e garantias das crianças.


CAPÍTULO III
3 ADOÇÃO E O CADASTRO NACIONAL DO ADOTANTE
3.1 Evolução do instituto da Adoção
Nas sociedades clássicas a adoção foi a maneira encontrada para perpetuar a família, mas era vista como último recurso quando, entre outros fatores, os casais não conseguiam ter filhos, ou quando o cônjuge falecia ainda jovem. Esta perpetuação da família era fundamental devido a religiosidade dos antigos, pois somente com ela é que dariam continuidade ao culto familiar, crença onde adoravam seus antepassados. Na atual sociedade, a adoção surge com uma maior relevância social, pois muito além de consolidar a continuidade da família, este objetivo se transforma em importante instrumento de inclusão social, buscando extinguir os preconceitos e diferenças sociais. (COULANGES, 2006, p. 58-59).
A história da humanidade empresta relevante importância ao Código de Hamurabi, considerado a primeira codificação jurídica de que se tem notícia. Hamurabi, rei da Babilônia, (1750-1685 a.C.) no código a que se dá seu nome, traz uma visão da sociedade da época: as classes sociais, as profissões, a situação da mulher e os crimes que eram cometidos. Apresentava duzentos e oitenta e dois dispositivos, nove deles referentes a adoção (arts. 185 a 193) (GRANATO, 2006, p. 33).
Neste sentido, "aquele a quem a natureza não deu filhos pode adotar um, para que não cessem as cerimônias fúnebres" (Leis de Manu, apud COULANGES, 2006, p. 58).
Ainda conforme o autor, é possível compreender que o instituto da adoção era utilizado já nas sociedades clássicas, eis que se encontram registros de leis acerca do tema, um exemplo clássico é o Código de Hamurábi e nas Leis de Manu. Contudo, foram nas civilizações Grega e Romana que a adoção começou a ser amplamente praticada, regulada pela religião, visando a perpetuação da família e principalmente do culto familiar. Contudo a adoção caiu em desuso durante a Idade Média, onde a dogmática da Igreja Católica ganhou força e passou a ser imposta as pessoas, inclusive no que tange aos sacramentos (COULANGES, 2006, p. 60-61).
Havia também a crença de que os mortos dependiam dos ritos fúnebres que seus descendentes deveriam praticar, para terem tranqüilidade na vida após a morte. O vivo não podia passar sem o morto, nem este sem aquele. Por este motivo, poderoso laço se estabelecia, unindo todas as gerações de uma mesma família. A religião só podia propagar-se pela geração. O pai transmitia vida ao filho e, ao mesmo tempo, a sua crença, o seu culto, o direito de manter o lar, de oferecer repasto fúnebre, de pronunciar as fórmulas da oração (GRANATO, 2006, p. 31).
De acordo com uma análise histórica do instituto da adoção, tem-se a existência de registros desde a sociedade babilônica, no já mencionado Código de Hamurábi. Entretanto, textos mais expressivos são encontrados junto as civilizações grega e romana, nas quais a adoção possuía profunda importância devido à índole religiosa destes povos.
No Direito Romano podemos encontrar o seguinte conceito: "adoptio est actus solemnis quo in loco filii vel nepotis adscicitur qui natura talis non est, ou seja, a adocao é o ato solene pelo qual se admite em lugar de filho quem pela natureza não é" (RODRIGUES apud GRANATO, 2006, p. 23).
Antes mesmo do surgimento da religião grega e romana, as civilizações baseavam-se no culto do lar, onde as famílias adoravam seus antepassados. Os adotantes tinham o objetivo de que os filhos adotivos os cultuassem após a morte e, além disso, dessem seguimento a seu "nome". Para tanto era imprescindível que o adotado se desligasse totalmente da família biológica, pois não poderia adorar dois lares ao mesmo tempo. E, conforme o autor, foi graças ao culto do lar que surgiu a propriedade privada, a sucessão e mais tarde as cidades. (COULANGES, 2006, p. 61-62).
Havia um desligamento completo da família em que nascera, a linha do parentesco pelo nascimento se rompia; o novo vínculo do culto substituía o do parentesco. Não podia o filho adotado tornar a entrar na família de seus pais biológicos, contudo, a lei lhe facultava que, tendo um filho, e o deixando em seu lugar na família adotante, poderia retornar ao seu lar de origem, rompendo, porém, quaisquer laços entre ele e o próprio filho (GRANATO, 2006, p. 32).
Extrai-se o entendimento de que havia uma visão de propriedade sobre os filhos, esta que não possui lugar na sociedade moderna, na qual sobreleva o ser humano e seus direitos fundamentais a uma vida digna e sã, com prioridade absoluta ao ser em desenvolvimento.
Salienta-se que
Na Idade Média a adoção caiu em desuso, quer por contrariar os interesses dos senhores feudais, quer por influência do Direito Canônico. Com efeito os ensinamentos do cristianismo afastaram o enorme temor que antes existia no homem, de morrer sem descendência masculina que praticasse os ritos fúnebres, condenando-o ao sofrimento eterno (GRANATO, 2006, p. 38).
Contudo, na Idade Moderna, no ano de 1683, foi na Dinamarca que houve o marco do instituto da adoção, no código promulgado por Christian V. A adoção surgiu ainda, na Alemanha, no plano do Código Prussiano, ou chamado Código de Frederico, e no Codex Maximilianus da Bavaria, no ano de 1756 (GRANATO, 2006, p. 40).
Imperioso destacar o termo prioridade absoluta, conforme tratou-se no capítulo anterior, quer dizer que as crianças e adolescentes merecem atenção especial quanto a efetividade e garantia de seus direitos fundamentais por se tratarem de pessoas em desenvolvimento. Neste sentido, Veronese (1999, p. 110), enfatiza que
A criança tem o direito à vida, sendo dever do Estado assegurar a sua sobrevivência e o seu desenvolvimento. Aí se constata a importância dos arts. 5º e 6º da Constituição Federal, o primeiro que trata dos direitos individuais e coletivos e o segundo dos sociais, como o direito à educação, à moradia, ao trabalho, à saúde pública, à previdência social, ao lazer, à proteção materno-infantil, à assistência aos desamparados. Portanto, o cumprimento desses preceitos implica em garantia de qualidade de vida, em garantia de cidadania.
No que tange ao Direito à Convivência Familiar e Comunitária, e mais especificamente ao tratar da Família Substituta, o Estatuto afirma, em seu art. 28, que a colocação em família substituta poderá ser feita mediante guarda, tutela ou adoção, independentemente da situação jurídica da criança ou adolescente, e o § 1º admoesta: "Sempre que possível, a criança ou o adolescente deverá ser previamente ouvido e a sua opinião devidamente considerada". (VERONESE, 1999, p. 116).
É possível observar que na antiguidade o instituto visava a exclusiva satisfação psicológica dos adotantes, tendo ganhado, modernamente, uma profunda modificação e redefinição de seu conceito. Atualmente, o instituto almeja a proteção do menor, devendo buscar a proteção do melhor interesse do adotando e restringindo os obstáculos para a adoção.
Contemporaneamente a adoção está assentada na ideia de se oportunizar a uma pessoa humana a inserção em núcleo familiar, com a sua integração efetiva e plena, de modo a assegurar a sua dignidade, atendendo às suas necessidades de desenvolvimento da personalidade, inclusive pelo prisma psíquico, educacional e afetivo (FARIAS; ROSENVALD, 2010, p. 913).
Nesta esteira, observa-se que através da evolução social, e da progressão do instituto, buscou-se afastar a ideia da adoção como um meio destinado a dar um filho a quem não consegue procriar, devido à problemas biológicos, mas ao contrário deste entendimento, o objetivo atual deve ser de dar uma família a criança/adolescente que aguarda pela adoção, visando sempre, e com absoluta prioridade, o melhor interesse deste.
3.2 A adoção na ótica constitucional
A Constituição de 1988, buscando assegurar a proteção isonômica aos filhos adotivos, estabeleceu o seguinte em seu artigo 227:
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (Redação dada Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010)
Desta forma, os atos relacionados às crianças e adolescentes devem sempre respeitar o melhor interesse dos mesmos, cabendo ao Estado, à família e à sociedade efetivar a proteção adequada, inclusive quando é necessário suprir os devidos cuidados nas situações em que os pais não o fizeram – inclusive conforme já se tratou no capítulo anterior.
(VERONESE, 1999, p. 108) Não há que se negar, no que tange à implementação legislativa, que o Estado brasileiro deu o primeiro passo no processo de priorização da infância e da juventude, quando prolatou a Lei nº. 8.069/90, regulamentando o art. 227 da Constituição Federal, consolidou na ordem jurídica interna princípios da Doutrina da Proteção Integral. [...] Há que se consider, também, que o atual momento histórico está a exigir que as Casas Legislativas, no processo de elaboração do orçamento e previsão de recursos a serem destinados às políticas públicas, tanto na esfera federal quanto estadual, fiquem atentas ao princípio da prioridade absoluta que se deva dar às crianças e adolescentes.
A partir dessa perspectiva, a adoção ganhou novos contornos, obtendo significativo progresso da matéria. Com a força normativa de todos os princípios constitucionais que visam a proteção da pessoa humana, é que a filiação ganhou instrumentalização, servindo para os núcleos familiares.
(FARIAS; ROSENVALD, 2010, p. 912) O filho adotivo não é um filho de segunda categoria e não pode sofrer discriminação em relação aos demais filhos. Com o Texto Magno, o adotado passou a ser sujeito de direitos, de todos os direitos reconhecidos ao filho biológico. A relação jurídica filiatória determinada pela adoção tem as mesmas qualificações e direitos reconhecidos aos filhos decorrentes do elo biológico.
Conforme já se expôs anteriormente, a adoção cria, além de laços afetivos, laços jurídicos que geram direitos ao adotando, impedindo que esses laços sejam rompidos por qualquer motivo. Assim como não se pode devolver o filho biológico, também ocorre com a adoção. Neste sentido, o que se pretende demonstrar é a irrevogabilidade e a irretratabilidade da adoção, não se admitindo a extinção do vínculo estabelecido.
A atual interpretação do instituto da adoção se funda no princípio da proteção integral e na real vantagem para a criança/adolescente (FARIAS; ROSENVALD, 2010, p. 913). A proteção integral exige o atendimento do maior valor constitucional, ou seja, a garantia da preservação da dignidade do adotante enquanto ser humano em construção e as normas infraconstitucionais sobre a adoção deverão, obrigatoriamente, se conformarem com valores sob pena de inconstitucionalidade.
3.3 O instituto da Adoção na Lei 12.010/2009
A Lei 12.010/2009 buscou efetivar a norma contida no art. 227 da Constituição Federal de 1988, que incumbiu o Estado à promover a proteção das crianças e adolescentes, visando a garantia do direito à convivência familiar, tanto é que assim dispõe os primeiros artigos da referida Lei, como se pode observar:
Art. 1º. Esta Lei dispõe sobre o aperfeiçoamento da sistemática prevista para garantia do direito à convivência familiar a todas as crianças e adolescentes, na forma prevista pela Lei nº. 8.069, de 13 de julho de 1990, Estatuto da Criança e do Adolescente.
§ 1º. A intervenção estatal, em observância ao disposto no caput do art. 226 da Constituição Federal, será prioritariamente voltada à orientação, apoio e promoção social da família natural, junto à qual a criança e o adolescente devem permanecer, ressalvada absoluta impossibilidade, demonstrada por decisão judicial fundamentada.
§ 2º. Na impossibilidade de permanência na família natural, a criança e o adolescente serão colocados sob adoção, tutela ou guarda, observadas as regras e princípios contidos na Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, e na Constituição Federal.
O objetivo da referida Lei é de reduzir o número de crianças nos abrigos e possibilitar a eles a inserção na sociedade, através de família substituta até que venha a ser adotado.
Entretanto, a falha do Estado persiste, pois o meio encontrado para solucionar a referida questão foi a criação do Cadastro do Adotante, que atualmente permite a escolha do perfil da criança, a ser criteriosamente selecionado pelos postulantes à adoção.
3.4 O Cadastro Nacional do Adotante
O Cadastro Nacional do Adotante surgiu como importante ferramenta para auxiliar os juízes a conduzirem os processos de adoção. E além disso, o objetivo primordial do Cadastro é de agilizar o processo de adoção, por meio do cruzamento de dados entre interesses dos postulantes à adoção e os dados de características físicas das crianças/adolescentes aptos para a adoção.
O postulante a adoção deve proceder com sua habilitação na vara da infância e da juventude de sua comarca ou vara especializada para o competente processo de adoção. Por conseguinte, após a prolação da sentença de habilitação, o juiz que habilitou o pretendente à adoção, realizará o cadastro deste no Sistema, com a finalidade de que todos os demais juízes competentes para adoção tenham acesso aos dados deste cadastro. Assim também ocorre com a criança/adolescente após o processo de destituição do pátrio poder, atual poder familiar, esta que terá seus dados lançados no Sistema – pelo juiz prolator da sentença que destituiu o poder familiar e declarou a criança/adolescente apto para a adoção –, com a finalidade de que os demais juízes tenham acesso aos dados destas crianças e possam realizar o cruzamento dos dados, para dar início ao procedimento da adoção (RIEZO, 2011, p. 55-56).
Quanto ao critério utilizado no cadastro nacional de adoção para a fixação da posição na "fila" da adoção, o Estatuto da Criança e do Adolescente não estabelece critérios de prioridade para a convocação de pretendentes. Em alguns Estados e Comarcas, os habilitados são indicados exclusivamente de acordo com a ordem cronológica de habilitação. Em outros há apreciação de dados acerca dos pretendentes,como, p. ex. se são estéreis, se possuem outros filhos, etc. Diante da missão constitucional do Conselho Nacional de Justiça, não cabe ao CNJ estabelecer tais critérios. Apenas por uma questão de melhor apresentação das listas de pretendentes, buscados pelo perfil da criança/adolescente, os resultados apresentados pelo CNA [...] (RIEZO, 2011, p. 56).
Esclarece-se que o CNA surgiu exclusivamente para facilitar a adoção, mas se busca entender os pertinentes motivos que tornam o processo de adoção, na prática, um tanto burocráticos. Há que se tratar do melhor interesse na criança, conforme se expôs em capítulo anterior, todavia o que se verifica é a observação de um melhor interesse dos pretendentes à adoção, quando o Estado utiliza desta ferramenta para proporcionar aos postulantes à adoção, a discricionariedade de estabelecer o perfil da criança da maneira que lhes seja mais favorável, apesar de evidenciar-se que o objetivo da Lei 12.010/2009 não é exatamente este.
3.5 O direito à convivência familiar e comunitária previsto no art. 227 da Constituição da República
Para suprir a necessidade presente na referida norma de eficácia limitada – previsão do art.227, CF/88 –, no Capítulo III do ECA, o legislador estabeleceu que toda criança ou adolescente tem direito a ser criado e educado no seio da sua família e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária, em ambiente livre de toda presença de pessoas dependentes de substancias entorpecentes.
A criança ou adolescente que estiver inserido em programa de acolhimento familiar ou institucional terá sua situação reavaliada, no máximo, a cada 6 (seis) meses, devendo a autoridade judiciária competente, com base em relatório elaborado por equipe interprofissional ou multidisciplinar, decidir de forma fundamentada pela possibilidade de reintegração familiar ou colocação em família substituta, em quaisquer das modalidades previstas no art. 28 do Estatuto da Criança e do Adolescente, que estabelece [...] (RIEZO, 2011, p. 66).
É possível fazer a interpretação de que a adoção é um direito das crianças que aguardam por um lar. Por conseguinte, importante destacar que o cadastro de pretendentes à adoção é a relação de postulantes à adoção inscritos nas Varas da Infância e da Juventude do país, que foram avaliados pelas equipes técnicas, compostas de assistente social e psicólogo, que cumpriram as exigências legais e que, por sentença judicial, foram considerados aptos para adotar (RIEZO, 2011, p. 72).
Na prática, o cruzamento de dados entre os adotandos e adotantes obedece a uma ordem cronológica de inscrição do postulante no Cadastro Nacional do Adotante. Ocorre que quando surge uma criança apta para a adoção, é feito contato com o primeiro pretendente à adoção, observada a "fila" de espera. Caso o perfil da criança não corresponda com o perfil que o referido pretendente estabeleceu, passa-se para o seguinte pretendente e assim sucessivamente (RIEZO, 2011, p. 73-76).
Além da discriminação havida entre filhos legítimos e filhos adotivos, verifica-se a discriminação existente na própria sociedade com relação as crianças/adolescentes que estão aptos à adoção – antes mesmo de os interessados optarem pela adoção. Assim, é necessário que se proceda com uma análise da atual ferramenta utilizada para a aplicabilidade deste instituto – devendo-se observar se esta ferramenta contribui para a inserção das crianças e adolescentes no seio familiar ou acaba por retardar o processo de adoção. Vejamos como o CNA, de fato, possibilita a limitação do perfil da criança, com perguntas fechadas, in verbis:

Entretanto, verificando-se tamanha importância deste instituto, a adoção deve ser tratada além de um ato jurídico, nas palavras de Farias:
A adoção é gesto de amor, do mais puro afeto. Afasta-se, com isso, uma falsa compreensão do instituto como mera possibilidade de dar um filho a quem não teve pelo mecanismo biológico, como se fosse um substitutivo para a frustração da procriação pelo método sexual. Por certo a adoção é muito mais do que suprir uma lacuna deixada pela biologia (FARIAS; ROSENVALD, 2010, p. 914).
Adentrando na questão do preconceito concernente a adoção, Eunice Granato destaca que: "Ninguém, ligado ao assunto, ignora que há, sempre, casais que, não tendo filhos, procuram, ansiosamente, uma criança para adotar: geralmente recém-nascido, branco e com boa saúde" (GRANATO, 2006, p. 134). Entretanto, observa-se que o Estado é que permite tal atitude, deixando de lado inclusive as garantias das quais se tratou nos capítulos anteriores da presente pesquisa.
Quanto ao objetivo da adoção, a autora esclarece:
[...] oferecer um ambiente familiar favorável ao desenvolvimento de uma criança, que, por algum motivo, ficou privada da sua família biológica. A adoção, como hoje é entendida, não consiste em "ter pena" de uma criança, ou resolver situação de casais em conflito, ou remédio para esterilidade, ou, ainda, conforto para a solidão. O que se pretende com a adoção é atender as reais necessidades da criança, dando-lhe uma família, onde ela se sinta acolhida, protegida, segura e amada (GRANATO, 2006, p. 26).
A autora ainda trata acerca da necessária evolução dos procedimentos da adoção, destacando o dever do poder público em priorizar as reais vantagens para o adotando. Observa-se aqui a incompatibilidade do uso categórico desta ferramenta, e o fim para o qual ela foi criada.


CONCLUSÃO
Com todo o embasamento da presente pesquisa, o primeiro ponto a ser destacado é o termo constituição, este que em um primeiro momento nos traz a ideia de norma superior escrita, mas conforme exposto, Fernandes ensina que constituição sempre existiu, desde a formação das primeiras sociedades. O autor ainda destaca que este termo significa a formação, instituição, o surgimento de uma sociedade, que traduz a maneira de ser desta.
Este primeiro conceito de constituição se refere apenas à sociedade, ainda não se refere ao Estado. Trata-se da constituição material, que tem o objetivo de identificar a sociedade, organizar seus valores traduzindo-os em regras de acordo com a moral e os costumes, adaptando-se as suas necessidades e mudanças, de acordo com um dado momento de sua história.
Neste sentido, temos que a sociedade tinha suas regras, mas chegou um momento em que os indivíduos destas sociedades precisavam que seus direitos estivessem assegurados de uma forma solene, para garantir a limitação do poder do Estado sobre os indivíduos. E foi aí que vieram as grandes revoluções, havidas entre os séculos XVII e XVIII, que contribuíram para o surgimento da constituição formal. A sociedade passou a ser considerada Estado, suas normas se transportaram do campo material para o campo formal, quando então estas normas foram considerados como atos jurídicos.
Entre outras situações, com a efetivação da constituição formal através dos movimentos constitucionalistas, houve a necessidade de que as normas (agora consideradas leis) elaboradas a partir daquela época seguissem as exigências formais da constituição.

Nas palavras de Bonavides, pode-se dizer que houve um divórcio entre a Sociedade e o Estado. O que surgiu foi a constituição do Estado Liberal ou, no conceito de Lassale: a "Constituição folhas de papel".
Evidencia-se que a sociedade pressionava o Estado em busca da efetivação de seus direitos e garantias individuais, na luta pela dignidade, e ainda, nos termos da Revolução Francesa: pela liberdade, igualdade e fraternidade. E o Estado atendeu à esta exigência, mas ao mesmo tempo atribuiu a si mesmo a competência para legislar, regulamentar e fiscalizar, através da criação do Executivo, Legislativo e Judiciário.
Assim, demonstra-se que a constituição, que anteriormente tratava do "dever-ser" da sociedade, deixa de lado este conceito de Kelsen e passa a ser considerado um ato constitutivo, um ato que cria a institui uma nova sociedade, ou seja, O Estado Moderno.
A partir daí é possível observar que os termos constitucionalidade e inconstitucionalidade estão diretamente ligados a uma conduta que é praticada pelo Estado, através de um ato ou uma norma. Caso esta conduta seja criada dentro dos ditames da constituição e seja e de acordo com os valores, os costumes e àquelas normas já previstas, será este ato ou norma considerado constitucional. Contudo, se o ato praticado ou a lei criada não seguir as normas previstas na constituição ou seja realizado fora das exigências formais contidas na constituição, então será considerado inconstitucional.
Quanto à interpretação das normas constitucionais, cumpre salientar que Kelsen afirma ser a interpretação uma operação mental que acompanha o processo de aplicação do direito. Refere-se aqui à hermenêutica jurídica.
Gize-se a importancia da hermenêutica, como um instituto fundamental para a interpretação da lei. É uma ferramenta que auxilia na interpretação, para se saber como determinada lei deve ser utilizada, como deve ser entendida e aplicada. Assim, a hermenêutica é essencial para o objetivo final de toda e qualquer lei, em especial em função da constituição de um Estado.
Cumpre ressaltar que a velha hermenêutica prescindia de interpretação, limitava-se ao que estava disposto na lei, enquanto que a nova hermenêutica é a forma de aplicação da norma, é uma maneira de interpretar a norma.
Contudo, atualmente é difícil imaginar a aplicabilidade apenas da norma "seca", sem considerar os princípios contidos na constituição. A partir daí podemos observar que os juristas estão construindo o ordenamento jurídico com base em princípios que possuem força normativa e não apenas em regras positivadas. Logo, temos que, no direito atual, os princípios são dotados de força normativa.
Por conseguinte, a presente pesquisa buscou abordar alguns princípios constitucionais de maior relevância, para confrontar com a temática proposta. Assim, merece destaque o entendimento do Nobre Autor Ingo Sarlet, no que tange aos direitos humanos, pois o autor ensina que os direitos fundamentais só adquirem vida e inteligência por meio do princípio da dignidade da pessoa humana, ao passo que a dignidade da pessoa humana não se realiza e não se torna efetivo senão pelos direitos e garantias fundamentais. Sarlet é um dos poucos autores que se refere à hierarquia de direitos humanos e ele ainda coloca o princípio da dignidade da pessoa humana no topo desta hierarquia.
Pertinente à dignidade da pessoa da criança e do adolescente, este princípio encontra-se expressamente previsto no art. 227, da Constituição Federal de 1988. Verifica-se que neste mesmo dispositivo é possível identificar vários outros princípios que permitem uma ampla avaliação. Dentre estes, os mais relevantes para a presente pesquisa são: a prioridade absoluta, o princípio da proteção integral, do melhor interesse da criança e do direito à convivência familiar e comunitária.
Concluiu-se por fim que, o melhor interesse da criança está atrelado aos princípios constitucionais da proteção integral e da prioridade absoluta, de forma que o melhor interesse busca a efetividade dos direitos e garantias das crianças e adolescentes.
Estes princípios se sobrepõe quando há um conflito de interesses entre o direito de uma criança ou adolescente frente ao direito de outra pessoa. As crianças e adolescentes devem ser tratadas de forma especial, por se tratarem de sujeitos de direitos, em desenvolvimento. Neste sentido é que a adoção só deve se realizar quando, de fato, representar um bem para a criança ou adolescente.
Entretanto, conforme tratou-se no Capítulo III, o instituto da adoção nas sociedades clássicas era de perpetuar a família, com a finalidade exclusiva de dar seguimento aos cultos religiosos e as oferendas. Imagine-se que, nesta crença, a pessoa que morria e que não tinha família, ficava sem as oferendas religiosas, acreditava-se que ela ficaria abandonada e sofreria por toda a eternidade. Portanto, os casais que não conseguiam ter filhos, adotavam com a finalidade de perpetuar a família. Então havia essa crença de que os mortos dependiam dos ritos fúnebres que seus descendentes deveriam realizar, para que pudessem ter tranqüilidade na vida após a morte.
Observe-se que nas sociedades clássicas, o objetivo era encontrar uma criança para a família e que hoje o objetivo é outro, encontrar uma família para criança, sempre visando o seu melhor interesse e não o melhor interesse do adotante.
O CNA surgiu exclusivamente para facilitar o processo da adoção, por meio do cruzamento de dados entre os interesses dos postulantes à adoção e os dados de características físicas das crianças e adolescentes, porém não está cumprindo sua finalidade.
Então, o postulante à adoção se habilita, passa por um processo de acompanhamento do serviço social, e preenche o cadastro informando o perfil da criança desejada. A partir daí ocorre o cruzamento de dados, o qual segue rigorosamente uma ordem cronológica, de acordo com a inscrição, ou seja, de acordo com a fila. Verifica-se o perfil estabelecido pelo primeiro pretendente, e caso o perfil da criança não corresponda com o perfil que o referido pretendente estabeleceu, passa-se para o seguinte e assim sucessivamente.
Desta forma, é necessária uma análise desta atual ferramenta utilizada para o instituto da adoção, verificando se ela contribui ou não para inserir as crianças e adolescentes no seio familiar ou se essa ferramenta acaba por retardar o processo de adoção.
Até poder-se-ia tratar a questão do preconceito dos próprios postulantes à adoção, quando limitam o perfil da criança, pois nas palavras de Eunice Granato, sempre existem aqueles casais que não tendo filhos, esperam ansiosamente uma criança para adotar, geralmente branca, recém-nascida e de boa saúde.
Porém, o que deve-se destacar é que o próprio Estado que permite esta atitude, isto é, o Estado que proporciona esta escolha, deixando de lado inclusive as garantias, princípios e direitos fundamentais que se tratou na presente pesquisa.
Desta forma o Estado que criou esta ferramenta, com o intuito de resolver a situação de abandono das crianças que se encontram em abrigos, porém, acabou por gerar um problema ainda maior ao permitir que os postulantes à adoção escolham o perfil da criança desejada, assim descartando quaisquer possibilidades de que adotantes e adotandos venham ao menos a se conhecer. Considera-se mais importante e acima de tudo a fila, o Cadastro e o cruzamento de dados.
Evidencia-se aqui, a incompatibilidade do uso categórico desta ferramenta, eis que não está de acordo com o fim para o qual ela foi criada.
Por fim, temos que o Cadastro Nacional do Adotante vai de encontro com os princípios constitucionais atribuídos aos indivíduos em desenvolvimento. O CNA fere princípios de cunho material, pode-se referir aqui à um vício de inconstitucionalidade material, pois o problema não está na forma como o cadastro foi instituído, mas sim em seu conteúdo, exclusivamente no que tange as perguntas fechadas que nele constam, discriminando principalmente em função do sexo, idade e cor da criança ou adolescente a ser adotado.

REFERÊNCIAS

BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. 427 p.
BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 25 ed. atual. São Paulo: Malheiros, 2010. 835 p.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: DF, Senado, 1988.
DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 5 ed. rev. atual. amp. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.
FERNANDES, Bernardo Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 3 ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011.
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Direitos humanos fundamentais. 13 ed. São Paulo: Saraiva, 2011.
KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. 6 ed. São Paulo: Martins Fontes, 2009. 427p.
MORAES, Alexandre. Direitos humanos fundamentais. São Paulo: Atlas, 2011.
MORAES, Alexandre. Direito constitucional. 28 ed. rev. atual. São Paulo: Atlas, 2012.
MORAIS, Sabrina. O direito humano fundamental ao desenvolvimento social: uma abordagem interdisciplinar e pluralista ao direito constitucional comparado entre Brasil e Espanha. Florianópolis: OAB/SC, 2007.
NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 7 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011.
PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Afeto, ética, família e o novo Código Civil. Belo Horizonte: Del Rey, 2004.
SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 9 ed. rev. atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2011.
VERONESE, Josiane Rose Petry. Os direitos da criança e do adolescente. São Paulo: LTr, 1999.
http://www2.dbd.puc-rio.br/pergamum/tesesabertas/0510661_07_cap_02.pdf (acesso em 12 de abril de 2012).


















APÊNDICES


















APÊNDICE A

Atestado de Autenticidade da Monografia


UNIVERSIDADE COMUNITÁRIA DA REGIÃO DE CHAPECÓ - UNOCHAPECÓ
ÁREA DE CIÊNCIAS HUMANAS E JURÍDICAS
CURSO DE DIREITO



ATESTADO DE AUTENTICIDADE DA MONOGRAFIA




Eu, Patrícia de Lima Felix, estudante do Curso de Direito, código de matricula n. 70025548, declaro ter pleno conhecimento do Regulamento da Monografia, bem como das regras referentes ao seu desenvolvimento.
Atesto que a presente Monografia é de minha autoria, ciente de que poderei sofrer sanções na esferas administrativa, civil e penal, caso seja comprovado cópia e/ou aquisição de trabalhos de terceiros, além do prejuízo de medidas de caráter educacional, como a reprovação no componente curricular Monografia II, o que impedirá a obtenção do Diploma de Conclusão do Curso de Graduação.

Chapecó (SC), 15 de maio de 2012.



_________________________________________
Patrícia de Lima Felix

















APÊNDICE B


Termo de Solicitação de Banca



UNIVERSIDADE COMUNITÁRIA DA REGIÃO DE CHAPECÓ - UNOCHAPECÓ
ÁREA DE CIÊNCIAS HUMANAS E JURÍDICAS
CURSO DE DIREITO


TERMO DE SOLICITAÇÃO DE BANCA



Encaminho a Coordenação do Núcleo de Monografia o trabalho monográfico de conclusão de curso da estudante Patrícia de Lima Felix, cujo título é ______________, realizado sob minha orientação.
Em relação ao trabalho, considero-o apto a ser submetido à Banca Examinadora, vez que preenche os requisitos metodológicos e científicos exigidos em trabalhos da espécie.
Para tanto, solicito as providências cabíveis para a realização da defesa regulamentar.
Indica-se como membro convidado da banca examinadora: ___________________ _______________________________, telefone para contato ___________________.

Chapecó (SC), _____ de ______________________ de 2012.



________________________________
Assinatura do(a) Orientador(a)
















ANEXOS

















ANEXO I

CADASTRO NACIONAL (PRETENDENTE/ADOTANTE)


















ANEXO II

DADOS DA CRIANÇA/ADOLESCENTE


UNIÃO CIVIL ENTRE PESSOAS DO MESMO SEXO - ALTA RELEVÂNCIA SOCIAL E JURÍDICO-CONSTITUCIONAL DA QUESTÃO PERTINENTE ÀS UNIÕES HOMOAFETIVAS - LEGITIMIDADE CONSTITUCIONAL DO RECONHECIMENTO E QUALIFICAÇÃO DA UNIÃO ESTÁVEL HOMOAFETIVA COMO ENTIDADE FAMILIAR: POSIÇÃO CONSAGRADA NA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (ADPF 132/RJ E ADI 4.277/DF) - O AFETO COMO VALOR JURÍDICO IMPREGNADO DE NATUREZA CONSTITUCIONAL: A VALORIZAÇÃO DESSE NOVO PARADIGMA COMO NÚCLEO CONFORMADOR DO CONCEITO DE FAMÍLIA - O DIREITO À BUSCA DA FELICIDADE, VERDADEIRO POSTULADO CONSTITUCIONAL IMPLÍCITO E EXPRESSÃO DE UMA IDÉIA-FORÇA QUE DERIVA DO PRINCÍPIO DA ESSENCIAL DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA - ALGUNS PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL E DA SUPREMA CORTE AMERICANA SOBRE O DIREITO FUNDAMENTAL À BUSCA DA FELICIDADE - PRINCÍPIOS DE YOGYAKARTA (2006): DIREITO DE QUALQUER PESSOA DE CONSTITUIR FAMÍLIA, INDEPENDENTEMENTE DE SUA ORIENTAÇÃO SEXUAL OU IDENTIDADE DE GÊNERO - DIREITO DO COMPANHEIRO, NA UNIÃO ESTÁVEL HOMOAFETIVA, À PERCEPÇÃO DO BENEFÍCIO DA PENSÃO POR MORTE DE SEU PARCEIRO, DESDE QUE OBSERVADOS OS REQUISITOS DO ART. 1.723 DO CÓDIGO CIVIL - O ART. 226, § 3º, DA LEI FUNDAMENTAL CONSTITUI TÍPICA NORMA DE INCLUSÃO - A FUNÇÃO CONTRAMAJORITÁRIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO - A PROTEÇÃO DAS MINORIAS ANALISADA NA PERSPECTIVA DE UMA CONCEPÇÃO MATERIAL DE DEMOCRACIA CONSTITUCIONAL - O DEVER CONSTITUCIONAL DO ESTADO DE IMPEDIR (E, ATÉ MESMO, DE PUNIR) "QUALQUER DISCRIMINAÇÃO ATENTATÓRIA DOS DIREITOS E LIBERDADES FUNDAMENTAIS" (CF, ART. 5º, XLI) - A FORÇA NORMATIVA DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS E O FORTALECIMENTO DA JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL: ELEMENTOS QUE COMPÕEM O MARCO DOUTRINÁRIO QUE CONFERE SUPORTE TEÓRICO AO NEOCONSTITUCIONALISMO - RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO. NINGUÉM PODE SER PRIVADO DE SEUS DIREITOS EM RAZÃO DE SUA ORIENTAÇÃO SEXUAL (Ag. Reg. no Recurso Extraordinário 477.554 – Minas Gerais – segunda turma – 16/08/2011).
Extraído do artigo de Nilton Martins de Quadros e Sebastião Rodrigo Souza de Araújo – Anexo III.
Por positivados entenda-se aqui apenas no sentido de terem sido os direitos fundamentais dispostos na constituição formal, de maneira solene.
(http://afilosofia.no.sapo.pt/cidadania1a.html)
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS - APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0133.05.027113-8/001
Art. 4º. É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do Poder Público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.
Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende:
a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias;
b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública;
c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas;
d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude.
Art. 16. O direito à liberdade compreende os seguintes aspectos:
I – Ir, vir e estar nos logradouros públicos e espaços comunitários, ressalvadas as restrições legais;
II – opinião e expressão;
III – crença e culto religioso;
IV – brincar, praticar esportes e divertir-se;
V – participar da vida familiar e comunitária, sem discriminação; [...]
Art. 17. O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, ideias e crenças, dos espaços e objetos pessoais.
Art. 18. É dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano[...].
Referencia constante na página 15 da pesquisa.

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