A inconstitucionalidade do Artigo 785 do NCPC (sentença judicial)

June 2, 2017 | Autor: Ruitemberg Pereira | Categoria: Direito Processual Civil, Direito Civil
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I.

RELATÓRIO

1. Trata-se de ação de cobrança de encargos condominiais envolvendo as partes apontadas em epígrafe, ajuizada em data anterior ao início da vigência do Novo Código de Processo Civil de 2015 (18/3/2016). 2. Conforme decisão interlocutória anterior e tendo em vista o disposto no artigo 784, inciso X, do CPC/2015, foi determinado à parte autora que promovesse, mediante emenda à petição de ingresso, a conversão da ação de cobrança em ação de execução de título executivo extrajudicial, submetida originariamente ao rito sumário, na forma dos artigos 275 e seguintes do CPC/1973, sob pena de extinção sem resolução de mérito. 3. A despeito desta determinação judicial, esta não restou cumprida pela parte autora, que, conforme cada um dos casos analisados, ora deixou de responder ao ato, ora insistiu na continuidade do feito como ação de conhecimento, à luz das regras do CPC revogado, sob o fundamento da regra estabelecida no art. 1.046, §1º, do CPC/2015, ora manifestou a opção prevista no artigo 785 do CPC/2015. 4.

É o relatório.

II.

ANÁLISE DAS QUESTÕES DE FATO E DE DIREITO

5. O feito comporta julgamento imediato, conforme o estado do processo, haja vista a constatação da falta de interesse processual, nos termos do disposto no artigo 485, inciso VI, do CPC/2015. DA INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 785 DO CPC/2015 6. Por oportuno, cumpre examinar, neste contexto, a regra do artigo 785 do CPC/2015, segundo o qual “a existência de título executivo extrajudicial não impede a parte de optar pelo processo de conhecimento, a fim de obter título executivo judicial”. 7. Segundo a doutrina, este dispositivo estaria em consonância com alguns posicionamentos adotados pelo colendo Superior Tribunal de Justiça, manifestados antes da entrada em vigor do Novo Código de Processo Civil. 8. Entretanto, como demonstraremos a seguir, esta compreensão da doutrina sobre a jurisprudência do STJ acerca do tema, afirmativa de um “entendimento firme” deste Tribunal sobre a possibilidade de o detentor de título executivo extrajudicial fazer opção pela ação de conhecimento,

não é de todo precisa, porquanto não faz jus nem ao contexto em que essas decisões foram proferidas nem leva em conta a profunda divergência da jurisprudência do egrégio STJ acerca do tema. 9. Isso porque, contrariamente ao que sugere a doutrina, a jurisprudência do STJ não consagra um direito potestativo de opção pela ação de conhecimento por parte do detentor de título extrajudicial líquido, certo e exigível. 10. Para desenvolvermos este ponto, devemos levar em consideração que os precedentes do STJ sobre a opção do credor, que veio a ser consagrada no art. 785 do CPC/2015, estão assentados nas seguintes premissas: (1) A opção pela ação de conhecimento não poderia ser anulada, uma vez que, não tendo implicado prejuízos para a defesa, a anulação de todos os atos processuais significaria violação ao princípio da razoável duração do processo (REsp 1180033/RS, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 17/06/2010, DJe 29/06/2010); (2) A opção pela ação monitória constitui “livre faculdade do credor”, pois, sendo a monitória um mecanismo assemelhado à execução, não traz maiores prejuízos ao réu (AgRg nos EDcl no AREsp 118.562/RS, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 02/06/2015, DJe 09/06/2015; AgRg no REsp 1209717/SC, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 11/09/2012, DJe 17/09/2012); (3) A opção pela ação de conhecimento franquearia ao executado mecanismos mais amplos de defesa (AgRg no REsp 1189134/MT, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 20/08/2015, DJe 28/08/2015; REsp 981.440/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 12/04/2012, DJe 02/05/2012; REsp 210.030/RJ, Rel. Ministro NILSON NAVES, TERCEIRA TURMA, julgado em 09/12/1999, DJ 04/09/2000, p. 149); (4) A opção pela ação de conhecimento seria menos gravosa para o executado, uma vez que obsta a realização da penhora (REsp 532.377/RJ, Rel. Ministro CESAR ASFOR ROCHA, QUARTA TURMA, julgado em 21/08/2003, DJ 13/10/2003, p. 373; REsp 207.173/SP, Rel. Ministro ARI

PARGENDLER, TERCEIRA TURMA, julgado em 09/04/2002, DJ 05/08/2002, p. 325); (5) A opção pela ação de conhecimento ou monitória é possível desde que haja dúvida razoável sobre a força executiva ou executoriedade do título extrajudicial (REsp 717.276/PR, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 21/06/2007, DJ 29/06/2007, p. 581; REsp 504.503/RS, Rel. Ministro CASTRO FILHO, TERCEIRA TURMA, julgado em 29/10/2003, DJ 17/11/2003, p. 323; REsp 394.695/RS, Rel. Ministro BARROS MONTEIRO, QUARTA TURMA, julgado em 22/02/2005, DJ 04/04/2005, p. 314); (6) A opção pela ação de conhecimento é admissível desde que não haja prejuízos para a defesa (AgRg no REsp 1508197/SP, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 15/10/2015, DJe 26/10/2015; AgRg no AREsp 148.484/SP, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 15/05/2012, DJe 28/05/2012). 11. Abrindo um breve parêntese, antes de avançarmos na análise desses julgados, é importante chamar a atenção para a forma inadequada como os juristas, juízes e tribunais brasileiros, de modo geral, lidam com a jurisprudência nacional. 12. A jurisprudência exerce um papel fundamental na argumentação jurídica. Contudo, a compreensão de enunciados jurídicos que emanam dos precedentes não pode ser desenvolvida de forma subjetiva, aleatória ou desconectada da realidade ou dos contextos fáticos que ensejaram a edição dos julgados, nem pode se transformar num verdadeiro bric-à-brac de excertos e de ementas citados de forma totalmente desordenada, desconexa e sem uma apreciação crítico-racional tanto desses contextos quanto dos posicionamentos contrários existentes no seio da própria jurisprudência, sob pena de uma sensível perda da racionalidade das generalizações que constitui a própria razão de ser da jurisprudência. 13. Neste cenário, não é raro identificar afirmações gratuitas e puramente subjetivas, fundadas em meros argumentos de autoridade, sustentando a suposta existência de “entendimento firme do Tribunal” ou de alegada “jurisprudência dominante” num contexto em que, em verdade, não há nada mais do que divergências, contradições e posicionamentos mal compreendidos acerca da própria jurisprudência. 14. Este aspecto — que parece ser uma peculiaridade do Direito no Brasil — foi muito bem explorado por José Rodrigo RODRIGUEZ, em trabalho jurídico vencedor do 56º Prêmio Jabuti (2014), in verbis:

“... podemos dizer que a fundamentação das decisões judiciais no Brasil é um aspecto menor do funcionamento de nossa jurisdição e, por via de consequência, do padrão de argumentação prevalente neste país. Temos a formação de padrões decisórios, especialmente por meio de ementas e súmulas que não incorporam a fundamentação da decisão dos problemas jurídicos de que tratam. Os acórdãos escritos dos tribunais são o mero registro dos debates, sem preocupação com a coerência da argumentação e sem a redação de uma decisão oficial do tribunal. A decisão é tomada por agregação da opinião dos juízes dos órgãos colegiados e não dá qualquer destaque às razões para decidir. Esta variável institucional resulta em um padrão de argumentação que tende a ser baseado em argumentos de autoridade. Há pouca incidência de argumentação sistemática, que procure reconstituir racionalmente o sistema para decidir o caso concreto à luz dessa reconstrução. Tal fato fica evidente com o exame do uso que os juízes fazem da doutrina e dos casos semelhantes julgados anteriormente. Não há no Brasil um sistema de precedentes organizado. A citação de casos, quando ocorre, não busca reconstituir um padrão de argumentação relevante para o caso a ser decidido. Os casos são citados em forma de acúmulo para reforçar a autoridade de quem está proferindo a sentença. É muito difícil encontrar casos que sirvam de referência para todos os juízes no que diga respeito a um mesmo problema jurídico. (...) Diante desta descrição, fica claro porque este texto sustenta que a jurisdição brasileira é opinativa e julga em função da agregação de opiniões e não com base na fundamentação sistemática e racional. Também fica claro porque é razoável dizer que nossa jurisdição é personalista: ela admite e estimula os juízes a emitirem opiniões e não decisões bem fundamentadas.” (RODRIGUEZ, José Rodrigo, Como decidem as cortes? Para uma crítica do direito (brasileiro), São Paulo, FGV, 2013, p. 107-108) 15. Fechando este parêntese e prosseguindo na análise da jurisprudência citada, é possível chegar, sem maiores dificuldades, à conclusão de que, a despeito de um ou outro julgado do STJ que insinue a existência de um direito potestativo do detentor de título executivo extrajudicial à opção pela ação de conhecimento ou à ação monitória, tal

direito de opção efetivamente não é consagrado na jurisprudência do STJ, como demonstraremos nos seguintes tópicos: 1) Legalidade processual e nulidades 16. Um primeiro aspecto a ser considerado, neste tópico, tem a ver com o fator “tempo do julgamento” e o consequencialismo social cujo respeito se espera de qualquer decisão judicial. No tocante ao tema de fundo, a matéria em questão somente chega ao conhecimento do egrégio STJ apreciada a matéria em primeiro e segundo graus, estando o feito já em sua fase final, momento em que, não raramente, o próprio título executivo e o crédito dele decorrente, caso existentes, já poderiam até mesmo estarem prescritos, inviabilizando assim a própria retomada da via alternativa (ação de execução), o que guarda pertinência com uma acepção adequada das regras da preclusão consumativa (electa uma via regressus ad alteram non datur). 17. Desse modo, não restaria outra alternativa ao colendo Tribunal Superior a não ser consolidar os atos processuais já praticados na ação de conhecimento ou na ação monitória proposta, admitindo a via da ação de conhecimento, em respeito à razoável duração do processo (REsp 1180033/RS, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 17/06/2010, DJe 29/06/2010) e ao tradicional princípio que veda a declaração de nulidades processuais sem prejuízo (pas de nullité sans grief), consagrado no art. 277 do CPC/2015, segundo o qual, “quando a lei prescrever determinada forma, o juiz considerará válido o ato se, realizado de outro modo, lhe alcançar a finalidade”, como fez o STJ em alguns dos precedentes citados (AgRg no REsp 1508197/SP, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 15/10/2015, DJe 26/10/2015; AgRg no AREsp 148.484/SP, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 15/05/2012, DJe 28/05/2012). 18. Entretanto, nem tanto céu, nem tanto mar. Considerar válido um ato processual já praticado que desobedece à forma prescrita em lei não equivale a reconhecer nem estimular a possibilidade de que as partes desobedeçam tal forma, em todo e qualquer caso. Não se admite um direito potestativo de violar a forma processual, que constitui, em última instância, uma concretização do princípio constitucional da segurança jurídica (art. 5º, caput, CF/88). 19. Ora, admitir e convalidar vícios no processo não significa estimular processos viciados. Aliás, o reconhecimento da nulidade processual (mesmo relativa) deve operar exatamente no sentido contrário, de

desestimular a prática de ilegalidades, evitando todas as nulidades. Entendimento em sentido diverso, outrossim, implicaria transformar o que deve ser exceção (nulidades processuais) em verdadeira regra, estimulando a prática de ilegalidades e consectárias nulidades processuais. 20. Outrossim, seria intolerável conceber-se, a priori, um princípio de validade da anulabilidade dos atos processuais (essencialmente inválidos), descurando-se da regra básica de que a anulabilidade se assenta, essencialmente, em juízo pragmático acerca da eficácia do ato processual e não em juízo de validade, como ensina Elio FAZZALARI: “A relação entre anulabilidade e eficácia do ato processual se põe, portanto, e se resolve no sentido de que o ato inválido pode, obviamente, ser removido, mas, enquanto isso não ocorre, permanece em condições de desenvolver os seus efeitos. E mais. Quanto ao ato preparatório, a lei (art. 156 CPC) põe o princípio da anistia ao alcance do escopo pelo qual, quando se constate que um ato desenvolveu os seus efeitos – no sentido que tenham sido cumpridas as atividades que a lei a ele coliga como consequências -, a invalidade não pode mais ser sancionada: fala-se de ‘sanar’ o ato processual anulável (de fato, o código de rito fala de ‘nulidade’; mas que, ao invés, que se trate de anulabilidade é confirmado exatamente pela previsão da ‘sanatória’, inconcebível em relação a um ato nulo); mas se converte mais na convalidação do efeito desenvolvido em concreto, malgrado a invalidade. Tal convalidação bem se compreende, onde se considere que cada ato do processo é usado com o fim prático de provocar e tornar possível as condutas sucessivas: se tal escopo é atingido, não há sentido em ‘anular’ o ato.” (FAZZALARI, Elio, Instituições de direito processual, São Paulo, Bookseller, 2006, p. 520-521) 21. Por conseguinte, tal postura afrontaria o princípio da legalidade processual que orienta o exercício do direito público de ação, mormente através da disciplina das condições da ação, nomeadamente o interesse processual. Ora, determina o artigo 330, inciso III, do CPC/2015 (art. 267, inciso VI, do CPC/1973) que será (imperativo) indeferida a petição inicial quando o autor carecer de interesse processual, o que, indubitavelmente, se configura quando, existente o título executivo líquido, certo e exigível, e não havendo dúvidas razoáveis sobre a executoriedade deste, o autor decide propor ação de conhecimento. Ademais, o artigo 485, inciso VI, desautoriza o juiz a examinar o mérito da ação quando “verificar ausência de legitimidade ou de interesse processual”.

22. Não é por outra razão que, por força do princípio da legalidade processual, a doutrina qualifica como “casos típicos de nulidade de fundo” (ou nulidades absolutas) os vícios ligados às condições da ação, aos pressupostos processuais positivos de existência e de validade, e aos pressupostos processuais negativos).” (WAMBIER, Teresa Arruda Alvim, Nulidades do processo e da sentença, 4ª. ed., São Paulo, RT, 1998, p.. 159;179). 23. Mais grave ainda se mostraria admitir a propositura de ação monitória, sendo o autor detentor de título líquido, certo e exigível, o que afronta a própria letra do artigo 700 do CPC/2015, segundo o qual “a ação monitória pode ser proposta por aquele que afirmar, com base em prova escrita sem eficácia de título executivo...”. 24. Tal dispositivo, a toda evidência, ao estabelecer como pressuposto processual da ação monitória a existência de prova escrita desprovida de eficácia de título executivo, afastou, a contrario sensu, qualquer possibilidade de ajuizamento desta ação quando o credor já detém título extrajudicial líquido, certo e exigível. 2) O Artigo 785 CPC/2015 e as obrigações de pagar quantia certa 25. Segundo vem sustentando a doutrina, a norma processual do art. 785 CPC/2015 foi adotada em virtude da diversidade dos processos de execução do título judicial e de execução do título extrajudicial no que concerne às medidas judiciais constritivas possíveis (medidas típicas em relação ao título extrajudicial; medidas atípicas quanto ao título judicial), que determinariam uma maior amplitude de meios no cumprimento da sentença vis-à-vis da execução do título extrajudicial. 26. Adotando este ponto de vista, destaco o entendimento de Marinoni, Arenhart e Mitidiero: “... aqueles que viam a possibilidade do ajuizamento desta demanda de conhecimento, alegavam as vantagens da execução de títulos judiciais. De fato, o sistema processual civil oferece — e já oferecia na vigência do Código de Processo Civil de 1973 — vários privilégios à efetivação de sentenças, em relação ao regime da execução prevista para títulos extrajudiciais. Há, por exemplo, em relação às prestações de pagar, fazer, não fazer e entregar coisa, fixadas por sentença, um amplo e flexível sistema de medidas indutivas e sub-rogatórias (v.g., arts. 139, IV e 536 do CPC), que não é repetido para a execução de títulos extrajudiciais. Em relação a créditos, a efetivação de sentença se impõe sob

a ameaça de multa (art. 523, §1º, do CPC), que também não existe para a execução de títulos extrajudiciais.” (MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel, Novo curso de processo civil, vol. 3, São Paulo, RT, 2015, p. 76) 27. Embora esses autores não tenham sido mais enfáticos acerca do tema, é de se compreender que a defendida vantagem comparativa das sentenças judiciais em relação aos títulos executivos extrajudiciais somente se torna possível no caso das ações judiciais que possibilitem a tutela específica (art. 497, CPC/2015), ou seja, quando o título extrajudicial ou a ação de conhecimento envolvam pedidos de condenação em obrigações de fazer ou de não fazer ou de entregar coisa. 28. Já em relação às ações versando sobre o pagamento de quantia certa não se trata de tutela específica, mas sim de tutela substitutiva, por sub-rogação ou expropriatória (art. 824 do CPC/2015). 29. Assim se deduz pelo fato de que somente no caso do cumprimento das sentenças que fixaram obrigações que tais (fazer, não fazer e entregar coisa) admite-se a possibilidade de aplicação de multa processual (astreinte), inclusive na fase de conhecimento, visando a compelir o devedor ao seu cumprimento, segundo a dicção dos arts. 536, §1º, e 538, §3º, do CPC/2015, que assim determinam: “Art. 536. No cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de fazer ou de não fazer, o juiz poderá, de ofício ou a requerimento, para a efetivação da tutela específica ou a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente, determinar as medidas necessárias à satisfação do exequente. § 1º Para atender ao disposto no caput, o juiz poderá determinar, entre outras medidas, a imposição de multa, a busca e apreensão, a remoção de pessoas e coisas, o desfazimento de obras e o impedimento de atividade nociva, podendo, caso necessário, requisitar o auxílio de força policial. (...) Art. 538. Não cumprida a obrigação de entregar coisa no prazo estabelecido na sentença, será expedido mandado de busca e apreensão ou de imissão na posse em favor do credor, conforme se tratar de coisa móvel ou imóvel. (...)

§ 3o Aplicam-se ao procedimento previsto neste artigo, no que couber, as disposições sobre o cumprimento de obrigação de fazer ou de não fazer.” 30. Daí concluir-se que, no caso das obrigações de pagar quantia certa (execuções e ações de conhecimento) não se identifica qualquer diferença ontológica importante entre a execução do título judicial, resultante da ação de conhecimento, e a execução do título extrajudicial, a ponto de justificar a faculdade de opção do credor pela ação de conhecimento ou pela ação monitória. 31. Desse modo, a despeito do entendimento jurisprudencial acima delineado, o credor não poderia adotar a opção prevista no art. 785 CPC/2015 relativamente aos títulos executivos extrajudiciais versando sobre obrigações de pagar quantia certa. 3) O Artigo 785 CPC/2015 e o direito de defesa 32. Cumpre analisar também o argumento de que o artigo 785 CPC/2015 operaria uma ampliação do direito de defesa do executado. 33. A bem da verdade, esta premissa não fazia sentido jurídico nem mesmo no âmbito do regime processual do CPC/1973, cujo artigo 745, em sua redação originária, já determinava que “quando a execução se fundar em título extrajudicial, o devedor poderá alegar, em embargos, além das matérias previstas no art. 741, qualquer outra que lhe seria lícito deduzir como defesa no processo de conhecimento.” (THEODORO JÚNIOR, Humberto. Código de processo civil anotado, 2ª ed., 1996, Rio de Janeiro, Forense, p. 321). 34. Esta concretização do princípio constitucional da ampla defesa pelo executado não se alterou com a edição da Lei n. 11.382/2006, que deu nova redação ao artigo 745 do CPC/1973, assegurando ao embargante a possibilidade de alegar, nos embargos, qualquer defesa possível em processo de conhecimento, in verbis: “Art. 745. Nos embargos, poderá o executado alegar: I - nulidade da execução, por não ser executivo o título apresentado; II - penhora incorreta ou avaliação errônea; III - excesso de execução ou cumulação indevida de execuções; IV - retenção por benfeitorias necessárias ou úteis, nos casos de título para entrega de coisa certa (art. 621); V - qualquer matéria que lhe seria lícito deduzir como defesa em processo de conhecimento.”

35. Da mesma forma, também o artigo 917, inciso VI, do CPC/2015 consagrou a ampla defesa do devedor, ao dispor que, nos embargos à execução, é permitido ao executado alegar “qualquer matéria que lhe seria lícito deduzir como defesa em processo de conhecimento”. 36. Sendo assim, admitir-se a possibilidade de a parte autora optar, ao seu puro arbítrio e alvedrio, pela ação de conhecimento, embora seja detentor de título extrajudicial líquido, certo e exigível quanto à obrigação de pagar quantia certa constituiria uma violação a diversos princípios, regras e valores constitucionais que orientam o novo processo civil, a saber: (1) Violação ao princípio da isonomia (art. 24 da Convenção Americana de Direitos Humanos, art. 5º, caput, CF/88, e art. 139, inciso I, do CPC/2015; (2) Violação ao princípio da razoável duração do processo (art. 5º, inciso LXXVIII, CF/88, c/c art. 8.1 da Convenção Americana de Direitos Humanos e art. 139, inciso II, do CPC/2015); (3) Violação ao princípio do juiz natural (art. 5º, inciso LIII, CF/88 c/c art. 8.1 da Convenção Americana de Direitos Humanos). 4) Da violação ao princípio da isonomia processual 37. O art. 24 da Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH) estabelece que “todas as pessoas são iguais perante a lei. Por conseguinte, têm direito, sem discriminação, a igual proteção da lei”. 38. O artigo 5º da Constituição Nacional brasileira dispõe que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade...”. 39. Por sua vez, o artigo 139, inciso I, do CPC/2015 (Lei Federal n. 13.105/2015) determina que “o juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe: I - assegurar às partes igualdade de tratamento”. 40. O princípio que consagra o direito à igualdade apresenta duas dimensões: (a) a primeira veda a discriminação negativa, “exigindo-se que as normas jurídicas sejam aplicadas a todos indistintamente, evitado discriminações odiosas. A discriminação odiosa consiste em qualquer

distinção, exclusão, restrição ou preferência baseada na raça, cor, sexo ou orientação sexual, religião, convicção política, nacionalidade, pertença a grupo social o outro traço social que objetiva ou gera o efeito de impedir o prejudicar a plena fruição, em igualdade de condições, dos direitos humanos.” (RAMOS, André de Carvalho, Curso de direitos humanos, 2ª ed. rev. atual. e amp. São Paulo, Saraiva, 2015, p. 462); (b) a segunda, autoriza a discriminação positiva, que deixamos de analisar in concreto, uma vez que não ostenta relevância para a análise do caso sub examen. 41. À luz desta distinção, uma aplicação generalizada e descomedida da regra do novel art. 785 do CPC/2015 implicaria grave violação ao princípio da igualdade em sua dimensão negativa, implicando severa discriminação negativa em desfavor do devedor (possível réu na ação de conhecimento), se se entender que a opção legal é deferida como direito potestativo do credor (autor na ação de conhecimento), e não, de igual modo, ao devedor/réu, que ficaria assim obrigado a submeter-se à escolha unilateral da técnica processual feita pelo credor. 42. Além da discriminação negativa em detrimento de um dos polos da relação processual, a aplicação generalizada e descomedida do art. 785 do CPC/2015 para reconhecer a opção prevista como mero direito potestativo do credor implicaria também significativos prejuízos materiais para o devedor, considerando o incremento dos encargos processuais no caso de eventual condenação na ação de conhecimento (custas processuais, honorários advocatícios sucumbenciais, multa processual e novos honorários advocatícios no caso de início da fase de cumprimento de sentença, na forma do artigo do artigo 85, §§1º e 2º, do CPC/2015). 43. Assim sendo, é correto concluir que a opção do credor pelo processo de conhecimento é muito mais onerosa para o devedor. 44. Desse modo, ao favorecer apenas uma das partes da relação processual, quer assegurando-lhe uma opção potestativa não admitida para a parte ex adversa, quer conferindo-lhe benefícios materiais suplementares (honorários advocatícios) e impondo à parte contrária, ao final, diversos outros encargos financeiros, o art. 785 implica verdadeira discriminação negativa, contrária à primeira dimensão do princípio constitucional da igualdade. 5) Da Violação ao princípio da razoável duração do processo 45. Em relação ao princípio da razoável duração do processo ou ao direito a um processo judicial sem dilações indevidas (derecho a un processo sin dilaciones indebidas), o artigo 8.1 da Convenção Americana

de Direitos Humanos dispõe que “toda pessoa tem direito a ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou para que se determinem seus direitos ou obrigações de natureza civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer outra natureza”. 46. No mesmo sentido, o art. 5º, inciso LXXVIII, da Constituição da República estabelece que “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”. 47. Como ensina José Vicente Gimeno Sendra, a razoável duração do processo constitui um direito público-subjetivo de natureza constitucional e autônomo: “En una primera aproximación el derecho a un proceso sin dilaciones indebidas puede concebirse como un derecho subjetivo constitucional, de carácter autónomo, aunque instrumental del derecho a la tutela, que asiste a todos los sujetos del Derecho Privado, que hayan sido parte en un procedimiento judicial que se dirige frente a los órganos del Poder Judicial, aun cuando en su ejercicio han de estar comprometidos todos los demás poderes del Estado, creando en él la obligación de satisfacer dentro de un plazo razonable las pretensiones y resistencias de las partes o de realizar sin demora la ejecución de las sentencias.” (SENDRA, José Vicente Gimeno. El derecho a un proceso sin dilaciones indebidas. Poder Judicial. n. Especial 1. p. 47. Madrid: Consejo General del Poder Judicial, 1988) 48. Conforme André Nicolitt, a razoável duração do processo constitui um corolário lógico do princípio do devido processo legal ou do processo justo: “...percebe-se que o direito a um processo em tempo razoável é um direito correlato ao direito ao devido processo ou ao processo justo e equitativo. Em outras palavras, o processo com duração razoável nada mais é do que uma consequência lógica do devido processo, ou mesmo um aspecto deste.” (NICOLITT, André, A Duração razoável do processo, São Paulo, RT, 2014) 49. Sobre o tema, dialogando com a jurisprudência da Corte Europeia de Direitos Humanos, assim decidiu a Corte Interamericana de Direitos Humanos, no julgamento do caso Genie Lacayo Vs. Nicarágua, que:

"77 Artigo 8.1 da Convenção, também se refere a um período de tempo razoável. Este não é um conceito fácil de definir. Eles podem ser invocados para precisar os itens citados pelo Tribunal Europeu dos Direitos Humanos em várias decisões em que este conceito foi analisado, já que este artigo da Convenção é substancialmente equivalente ao 6 da Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos humanos e liberdades fundamentais. De acordo com o Tribunal de Justiça Europeu deve-se levar em conta três fatores para determinar a razoabilidade do tempo em que o processo ocorre: a) a complexidade do caso; b) a conduta do requerente; c) a conduta das autoridades judiciais (ver, entre outros, TEDH, acórdão de 19 de fevereiro Motta 1991, série A, n 195-A, parágrafo 30, ... TEDH, Ruiz Mateos v Espanha acórdão de 23 de junho de 1993, Série A 262 não., 30 par.) " (Corte Interamericana de Direitos. Nicarágua Lacayo Caso Genie Vs Humano (Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 29 de janeiro de 1997, Série C, n º 30). 50. Além desses critérios, a Corte Interamericana tem destacado que a proteção da razoável duração do processo tem em vista minorar o tempo durante o qual os direitos do indivíduo (liberdade, propriedade etc) são diretamente afetados pela tramitação processual. Desse modo, o processo deve ser tão mais célere quanto maior for o grau de interferência na situação jurídica dos indivíduos. 51. Este aspecto foi ressaltado pela Corte Interamericana no julgamento do caso Comunidad Indígena Xákmok Kásek. Vs. Paraguay, no qual assevera que: “136. En cuanto al cuarto elemento, para determinar la razonabilidad del plazo se debe tomar en cuenta la afectación generada por la duración del procedimiento en la situación jurídica de la persona involucrada en el mismo, considerando, entre otros elementos, la materia objeto de controversia. El Tribunal ha establecido que si el paso del tiempo incide de manera relevante en la situación jurídica del individuo, resultará necesario que el procedimiento avance con mayor diligencia a fin de que el caso se resuelva en un tiempo breve[158]. En el presente caso la demora en la obtención de una solución definitiva al problema de la tierra de los miembros de la Comunidad ha incidido directamente en su estado de vida. Esta situación es analizada en profundidad en el Capítulo VII infra.” (Corte IDH. Caso Comunidad Indígena Xákmok

Kásek. Vs. Paraguay. Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia de 24 de agosto de 2010 Serie C No. 214) 52. Entrementes, numa perspectiva mais ampla do que aquela tratada pela Corte Interamericana de Direitos Humanos cumpre analisar também a conduta do Legislador como possível causa de violação ao princípio da razoável duração do processo, tendo em vista que a este ditame também está sujeita a atividade legislativa infraconstitucional, por força do princípio da supremacia da Constituição e dos imperativos da interpretação conforme à Constituição e às normas internacionais de direitos humanos (controle de convencionalidade). 53. Nesse sentido e tendo em vista a disposição do artigo 785 do NCPC, cumpre reconhecer que a nova possibilidade de opção procedimental deferida exclusivamente ao credor, não consagrada nos regramentos normativos processuais revogados, opera verdadeira violação ao direito fundamental à razoável duração do processo em sua dimensão objetiva, na medida em que faculta a uma das partes da relação processual escolher uma técnica processual mais demorada e mais onerosa para a parte contrária, ainda que o próprio sistema jurídico instaurado preveja medida processual igualmente efetiva e mais célere (execução de título extrajudicial). 54. Neste contexto, cumpre destacar a dupla dimensão objetiva e subjetiva dos direitos fundamentais, sobre a qual lecionou José Carlos Vieira de Andrade: “Com efeito, a generalidade dos Autores alude à existência de uma ‘dupla dimensão’, de uma ‘dupla natureza’, de um ‘duplo carácter’ ou de uma ‘dupla função’ (em qualquer dos casos, subjetiva e objectiva) dos direitos fundamentais. (...) Quando se declara que os direitos fundamentais não constituem hoje apenas ‘direitos’ subjetivos mas também direito objetivo, não se quer certamente com isto significar apenas que as posições jurídicas subjectivas pressupõem um preceito de direito objetivo que as preveja: isso seria afirmar uma banalidade e afirmá-la até de maneira menos correcta, porque poderia dar a entender que o direito objetivo viria depois, quando a prioridade no plano da existência, é, pela natureza das coisas, a inversa. Pretende-se, sim, fazer ver que os direitos fundamentais não podem ser pensados apenas do ponto de vista dos indivíduos, enquanto faculdades o poderes de que estes são titulares, antes valem juridicamente também do ponto de vista da

comunidade, como valores ou fins que esta se propõe prosseguir. Em cada um dos direitos fundamentais, entre eles ou à volta deles, a Constituição delimita espaços normativos, preenchidos por valores ou interesses afirmados, que constituem bases de ordenação da vida social.” (ANDRADE, José Carlos Vieira de, Os Direitos fundamentais na constituição portuguesa de 1976, Coimbra, Almedina, 1998, p. 144-145) 55. A propósito, como bem destaca CANOTILHO, falar em direitos fundamentais como princípios já significa por em destaque a sua dimensão objetiva. Nas palavras do autor, “os direitos são direitos, só sendo razoável falar em direitos como princípios quando se trata de acentuar as dimensões objectivas de valor a eles inerentes (dignidade da pessoa, privacidade, identidade, liberdade).” (CANOTILHO, J. J. Gomes, Estudos sobre direitos fundamentais, Coimbra, Coimbra, 2004, p. 159) 56. Conseguintemente, a dimensão objetiva do direito fundamental à razoável duração do processo determina a compreensão de que esse direito não deve ser concretizado apenas como um direito subjetivo das partes, mas sim também como um direito que traduz um interesse social de que os processos tenham uma duração razoável, tendo em vista a própria dignidade da Justiça (preservada pela legislação em inúmeros regramentos) e os próprios custos econômicos, financeiros e sociais que uma relação processual demorada pode ocasionar para a sociedade em geral. 57. Portanto, na medida em que o legislador passa a admitir a opção potestativa do credor por uma técnica processual menos favorável à razoável duração do processo, a despeito de o sistema jurídico prever outro rito processual igualmente eficaz à prestação jurisdicional e mais favorável à duração razoável, é a dimensão objetiva do direito fundamental à razoável duração do processo, ante o interesse social subjacente, que determina a inconstitucionalidade da novel medida legislativa. 58. Como lecionam Dimitri Dimoulis e Leonardo Martins (DIMOULIS, Dimitri; MARTINS, Leonardo, Teoria geral dos direitos fundamentais, São Paulo, RT, 2007, p. 119-120), a dimensão objetiva dos direitos fundamentais confere a esses três características: 1) são normas de competência negativa: os direitos fundamentais significam que “aquilo que está outorgado ao indivíduo em termos de liberdade para ação e em termos de livre-arbítrio, em sua esfera, está sendo objetivamente retirado do Estado, ou seja, independentemente da questão se o particular exigir

em juízo o respeito de seu direito”; 2) são critérios de interpretação e configuração do direito infraconstitucional: estabelecem uma obrigação de interpretação conforme os direitos fundamentais, de sorte que as autoridades estatais devem interpretar e aplicar todo o direito infraconstitucional de modo consoante aos direitos fundamentais; 3) são deveres estatais de tutela em relação aos próprios direitos fundamentais. 59. Importantes e adequadas lições sobre a dimensão objetiva dos direitos fundamentais no âmbito do processo civil são sustentadas por Luiz Guilherme MARINONI: “As normas consagradoras de direitos fundamentais afirmam valores, os quais incidem sobre a totalidade do ordenamento jurídico e servem para iluminar as tarefas dos órgãos judiciários, legislativos e executivos. Nesse sentido, é possível dizer que tais normas implicam em uma valoração de ordem objetiva. A norma de direito fundamental, independentemente da possibilidade de sua subjetivação, sempre contém valoração. O valor nela contido, revelado de modo objetivo, espraia-se necessariamente sobre a compreensão e a atuação do ordenamento jurídico. Atribui-se aos direitos fundamentais, assim, uma eficácia irradiante. Afirmar a dupla dimensão — objetiva e subjetiva — dos direitos fundamentais não significa dizer que o direito subjetivo decorre do direito objetivo. O que importa esclarecer, aqui, é que as normas que estabelecem direitos fundamentais, se podem ser subjetivadas, não pertinem somente ao sujeito, mas a todos aqueles que fazem parte da sociedade. Como explica Vieira de Andrade, os direitos fundamentais não podem ser pensados apenas do ponto de vista dos indivíduos, enquanto faculdades ou poderes de que estes são titulares, contudo valem juridicamente também do ponto de vista da comunidade, como valores ou fins.” (MARINONI, Luiz Guilherme, Técnica processual e tutela dos direitos, 2ª ed, São Paulo, RT, 2008, p. 132) 60. À luz desses diferentes elementos da dimensão objetiva do direito fundamental à razoável duração do processo, não se faz necessário que, para se reconhecer a inconstitucionalidade do art. 785 do CPC/2015, haja direitos subjetivos ou interesses do devedor a serem protegidos in concreto, porquanto a norma do art. 5º, inciso LXXVIII, da CF/88 estatui para o legislador uma competência negativa e um mandamento de interpretação do direito à luz daquele dispositivo constitucional em

desfavor do legislador, cuja inobservância pode e deve ser declarada ex officio pelo juiz, sem qualquer intervenção da parte interessada, como forma de tutela objetiva do interesse social inerente à duração razoável do processo. 61. Outro aspecto que não pode ser desconsiderado é o de que o art. 785 do CPC/2015 milita contra a natureza de “mandamento de otimização” presente em quaisquer princípios constitucionais, especialmente no princípio da razoável duração do processo, na medida em que permite a escolha de uma técnica processual mais demorada e dispendiosa (a ação de conhecimento) tanto para o Estado quanto a parte contrária em detrimento de uma técnica mais célere e eficiente (ação de execução do título extrajudicial). 62. Nesse sentido, destaco a doutrina de Robert ALEXY, “princípios são normas que ordenam que algo seja realizado na maior medida possível dentro das possibilidades jurídicas e fáticas existentes. Princípios são (...) mandamentos de otimização, que são caracterizados por poderem ser satisfeitos em graus variados e pelo fato de que a medida devida de sua satisfação não depende somente das possibilidades fáticas, mas também das possibilidades jurídicas.” (ALEXY, Robert, Teoria dos direitos fundamentais, Trad. de Virgílio Afonso da Silva, São Paulo, Malheiros, 2008, p. 90) 6) Da violação ao princípio do juiz natural 63. O princípio do juiz natural está consagrado no referido art. 8.1 da Convenção Americana de Direitos Humanos, segundo o qual “toda pessoa tem direito a ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou para que se determinem seus direitos ou obrigações de natureza civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer outra natureza.” 64. Com bem destaca a doutrina (BUENO, Cássio Scarpinella, Curso de direito processual civil. Teoria geral do processo civil, 2ª ed., São Paulo, Saraiva, p. 115), o princípio do juiz natural, que constituiria o “único pressuposto de existência do processo (...) único requisito que deve necessariamente encontrar-se presente para que se possa conceber, juridicamente, a atuação do Estado-juiz”, encontra assento na Constituição Federal tanto na norma do art. 5º, inciso XXXVII, segundo o qual “não haverá juízo ou tribunal de exceção”, como no art. 5º, inciso LIII, que prevê que “ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente;”.

65. Um aspecto importante que decorre do princípio do juiz natural, a par da clássica enunciação do princípio que veda os tribunais e juízes de exceção, é o de que os litigantes em processos judiciais não gozam da faculdade de escolher o seu juiz, senão quando tal escolha for prevista ou permitida pela ordem constitucional, devendo o juiz constitucionalmente competente ser o previamente estabelecido pela Constituição e pelas leis que a regulamentam, de forma objetiva e uniforme, não se admitindo ademais que a própria lei processual crie novas exceções à moldura de competência estabelecida ou permitida pela Constituição. 66.

Assim já lecionava há muito Vicente Greco Filho: “Ligado à proibição dos tribunais de exceção está o princípio do juiz natural (art. 5º, LIII): ‘Ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente’.” Tal regra significa que as regras de determinação de competência devem ser instituídas previamente aos fatos e de maneira geral e abstrata de modo a impedir a interferência autoritária externa. Não se admite a escolha do magistrado para determinado caso, nem a exclusão ou afastamento do magistrado competente. Quando ocorre determinado fato as regras de competência já apontam o juízo adequado, utilizando-se, até, o sistema aleatório do sorteio (distribuição) para que não haja interferência na escolha.” (GRECO FILHO, Vicente, Direito processual civil brasileiro, vol. 1, 12ª. ed., São Paulo, Saraiva, 1996, p. 46) (destaquei)

67. É válido acentuar que “o princípio do juiz natural diz respeito à identificação do juiz constitucionalmente competente”. Isso significa dizer que, como acentua a doutrina, a identificação do juiz constitucionalmente competente passa pela análise de qual seja o juiz previsto na Constituição da República ou por ela permitido. 68. Sobre o tema, destaco novamente as lições de Cássio Scarpinella BUENO: “... o princípio do juiz natural diz respeito à identificação do ‘juiz’ constitucionalmente competente. É fundamental, destarte, compreender em que condições a Constituição Federal cria e aceita determinados órgãos jurisdicionais para julgar determinados assuntos, determinadas pessoas e assim por diante. Será ‘juiz natural’ aquele que a Constituição indicar como competente ou, quando menos, quando ela, Constituição Federal, permitir que o seja.

(...) O ‘princípio do juiz natural’, em suma, depende, sempre e em qualquer caso, da identificação do órgão jurisdicional que, de acordo com o ‘modelo constitucional do processo civil’, detém ou não jurisdição e, mais especificamente, competência (fixada em abstrato, antes do fato conflituoso) para realizar o julgamento. O que a lei processual civil, de seu turno, faz, concretizando o ‘modelo constitucional do processo civil’, é criar condições, em cada caso, de distribuir adequada e racionalmente a carga dos trabalhos judiciários entre os diversos órgãos que compõem a estrutura judiciária, regulando a competência de cada órgão jurisdicional...” (op. cit., p. 116) 69. Esta distinção entre “juiz previsto” e “juiz permitido” pela Constituição ostenta especial relevância para a análise daqueles casos em que se poderia cogitar de uma verdadeira faculdade de escolha por parte do jurisdicionado, tanto da técnica processual adequada, como, por conseguinte, do juiz competente para o seu processamento e julgamento, a exemplo do que ocorreria, verbi gratia, no caso de a parte optar pela propositura de um mandado de segurança contra ato administrativo do Presidente da República (da competência do Supremo Tribunal Federal, nos termos do artigo 102, inciso I, “d”, da CF/88) ou, contra o mesmo ato, por uma ação de conhecimento contra a União Federal (da competência da Justiça Federal de primeiro grau, nos termos do artigo 109, inciso I, da CF/88). 70. Esta hipótese, dentre várias outras, longe de infirmar, confirma a inteligência de que o princípio do juiz natural veda a possibilidade de “escolha do juiz”, porquanto se cuida de faculdade prevista ou permitida pela própria Constituição. Diferentemente acontece no caso em que a faculdade de escolha da técnica processual e do juiz competente decorre apenas da norma infraconstitucional, do que emerge cristalina a sua inconstitucionalidade. 71. Mais uma vez entra em cena a dimensão objetiva dos direitos fundamentais, que determina o interesse público e social à proteção do princípio do juiz natural, independentemente de qual seja a pretensão, as vontades ou os interesses das partes litigantes. 72. Este aspecto da argumentação goza de especial relevância naqueles juízos em que há distinção ratione materiae para a fixação da competência jurisdicional para processar e julgar as ações de execução de título extrajudicial seja diferente daquela aplicável ao processamento e julgamento das ações submetidas ao procedimento comum, como

sucede nesta Região Administrativa de Taguatinga – DF. Nesta, as ações executivas são da competência absoluta da única Vara de Execução de Títulos Extrajudiciais - VETE, criada e instalada nos termos da Resolução TJDFT n. 16, de 4/11/2014 do TJDFT e Portaria Conjunta TJDFT n. 47, de 21/5/2015, ao passo que as ações do procedimento comum são da competência de uma das 5 (cinco) Varas Cíveis existentes. 73. Desse modo, ao admitir-se a escolha antecipada, ab initio litis, da técnica processual a ser aplicada, conforme o art. 785 do CPC/2015, estar-se-ia autorizando uma das partes da relação processual — e apenas a uma das partes, em detrimento do princípio da igualdade — escolher também, por via de consequência, o juiz competente para processar e julgar o feito, o que importa manifesta violação ao princípio do juiz natural. 74. Considerando alguns aspectos de ordem pragmática, cumpre admitir que o exercício deste direito de escolha poder-se-ia dar não apenas com base em aspectos relativos à técnica processual preferida (rito comum ou rito executivo), mas também por aspectos ligados à própria atuação dos magistrados de um ou outro juízo em outros casos assemelhados (forma como julgam esta ou aquela pretensão, tempo de demora dos processos no juízo etc). 75. Portanto, insista-se, admitir que as partes possam realizar este tipo de avaliação e assim escolher o juiz e o juízo, constitui uma prática claramente incompatível com o princípio do juiz natural. POSICIONAMENTOS DOUTRINÁRIOS 76. Embora a temática da inconstitucionalidade do artigo 785 do CPC/2015 ainda não tenha sido suscitada no âmbito doutrinário, alguns doutrinadores já manifestaram seu posicionamento contrário à novel regra, sustentando que o processo não pode ser analisado apenas com base nas escolhas e interesses subjetivos das partes litigantes, mas sim à luz da dimensão objetiva do interesse público que lhe é subjacente. 77. No sentido das convicções acima desenvolvidas, o eminente Prof. Daniel Amorim Assumpção Neves, em seus comentários ao novo Código de Processo Civil reconhece que, notadamente em virtude da dimensão objetiva dos princípios, direitos e valores que orientam o processo civil, e o interesse público que deles emanam, nenhum dos fundamentos hauridos a partir da jurisprudência do STJ sobre o dispositivo em comento se mostra convincente. 78.

Assim se manifesta o aclamado processualista:

“Da análise dos julgamentos do Superior Tribunal de Justiça sobre o tema notam-se dois fundamentos principais a admitirem o processo de conhecimento mesmo quando já existe título executivo extrajudicial: a inexistência de prejuízo ao réu e a possibilidade de este fazer uma defesa mais ampla e plena de seus direitos. Nenhum dos dois fundamentos convence. A possibilidade de defesa mais ampla e plena é uma falácia, considerando-se que nos embargos à execução o executado pode alegar todas as matérias como defesa em processo de conhecimento. A defesa, portanto, tem a mesma dimensão e abrangência na contestação e nos embargos à execução. Quanto a inexistir prejuízo ao réu, sendo até mesmo vantajosa a ele a escolha do processo de conhecimento, o argumento parte de premissa correta, porque, mesmo sendo admissíveis os embargos à execução sem a garantia do juízo, com uma execução em trâmite a penhora pode ser realizada a qualquer momento. A desvantagem do executado perante o exequente não existe na relação autor e réu, e essa premissa não pode ser ignorada. Ocorre, entretanto, que analisar a questão sob a ótica dos interesses das partes não é o mais correto a fazer, pouco importando se o autor abre mão de uma situação de vantagem em favor do réu. A circunstância deve ser analisada sob a ótica das condições da ação, mais precisamente do interesse de agir (na realidade de sua ausência). Tendo as condições da ação natureza de matéria de ordem pública, é evidente que não podem ceder diante do interesse privado de autor e/ou réu. A criação de um título executivo judicial por meio do processo de conhecimento quando já existe título executivo extrajudicial em favor do autor demanda um trabalho jurisdicional inútil, ocupando o Poder Judiciário de um processo que não precisaria existir para tutelar o interesse da parte. A questão, portanto, não diz respeito à vontade do autor e à ausência de prejuízo ao réu, mas à perda de tempo, dinheiro e energia exigida do Poder Judiciário para criar um título executivo judicial reconhecendo uma obrigação já consagrada em título executivo extrajudicial. Trata-se de um verdadeiro atentado ao princípio da economia processual sob seu aspecto macroscópico, permitindo-se um processo inútil por vontade das partes em detrimento do interesse público de se obterem mais resultados com menor atividade jurisdicional.” (NEVES, Daniel Amorim Assumpção, Novo Código de Processo Civil

comentado, artigo por artigo, Salvador, Juspodium, 2016, p. 1238) (grifos nossos) 79. No mesmo sentido, destaca-se a doutrina de Antônio César Bochenek e outros, para os quais o dispositivo legal padece de falta de lógica: “O artigo 785 não tem correspondente no Código de 1973 e causou surpresa por destoar de toda a construção do novo código, que objetiva fornecer um processo de tutela efetiva, adequada e mais célere. Parece uma disposição contrária à lógica e aos fundamentos da cultura processual, que se funda na adequação do meio para a melhor solução da lide, que caracteriza a condição da ação denominada de interesse de agir. Um dos postulados do direito processual é que o titular só pode agir se houver necessidade da intervenção judicial e pelo meio processual adequado, que se revele apto e útil para dar a melhor tutela e a melhor solução para o caso. A parte, o interessado, não pode dispor do processo ao seu talante. O processo é formal e rígido para garantia dos próprios participantes. Por outro lado, a escolha da via inadequada leva à extinção do processo, nos termos do artigo 485, VI, do novo CPC. Nesta situação, considerando que o titular do direito possui título executivo e está autorizado a promover a execução, que é o meio mais adequado e útil para a solução do seu direito, a permissão de escolha de outra via –– em regra mais longa, com risco de um resultado contraditório de improcedência ––, não se encontra fundamento para a aplicação do dispositivo...” (CUNHA, José Sebastião Fagundes; CAMBI, Eduardo; BOCHENEK, Antonio César (coord.), Código de Processo Civil comentado, 1ª Edição, São Paulo, RT, 2016) (grifos nossos) 80. Sustentando uma crítica mais incisiva, Marcelo Abelha Rodrigues, sugerindo até mesmo, não sem razão, que a novel regra do artigo 785 do CPC/2015 teria sido motivada por interesses obscuros, não explicitados pelo legislador [como o incremento de honorários advocatícios em favor do credor, por exemplo?], em detrimento da lógica e dos diversos princípios que norteiam a prestação jurisdicional, in verbis: “O artigo 785 do CPC tem a seguinte redação “A existência de título executivo extrajudicial não impede a parte de optar pelo processo de conhecimento, a fim de obter título executivo

judicial”. Tal dispositivo não encontra correspondente no direito processual anterior nem em diploma alienígena. A proposição do artigo 785 é daquelas que, num primeiro momento ao analisar um Código novo, nos provoca um ar de desimportância, por vê-lo como uma falha – normal dentro de textos legislativos tão grandes – que não merecesse qualquer reflexão crítica, senão uma ácida crítica, quase em tom de galhofa sobre o seu texto. Mas, num segundo momento, quando se ouve, aqui e alhures, comentários que enxergam no dispositivo uma novidade atraente, aí o desprezo para a dar lugar à preocupação, não tanto pelo dispositivo em si, mas no sentido que nele se pode emprestar. É regra comezinha de direito processual, fruto de um princípio informativo lógico, de que ninguém vai em juízo buscar a tutela de seu direito se este tal direito não tiver sido nem lesado ou ameaçado. Socorre-se ao Poder Judiciário e ao processo porque, pelo menos em tese, alguém pretende tutelar uma pretensão resistida ou insatisfeita. Não por acaso o artigo 17 diz que “para postular em juízo é necessário ter interesse e legitimidade”, bem como o artigo 786 determina que “a execução pode ser instaurada caso o devedor não satisfaça a obrigação certa, líquida e exigível consubstanciada em título executivo”. Assim, aquele que se aventura a buscar uma tutela jurisdicional sem ter interesse, ou seja, sem que exista a necessidade dessa intervenção do poder judiciário ou que use a via processual absolutamente inadequada terá como resultado uma manifestação do Poder Judiciário dizendo exatamente que será extinto o processo pela falta do referido interesse (art.485, VI). O que se vê no artigo 785 do CPC é um tiro desferido contra a lógica, a não ser que, escondido sob essa simplória obviedade, exista um “oculto interesse” que no dispositivo nem sequer foi sugerido pelo legislador.” (RODRIGUES, Marcelo Abelha, Por que o 785 do CPC?, disponível em http://www.cjar.com.br/wp-content/uploads/2015/05/o-artigo785-do-NCPC1.pdf, acesso em 24/6/2016).

O ARTIGO 784, X, CPC/2015 E O ART. 323, CPC/2015 81. Alguns condomínios têm sustentado, equivocadamente, o ponto de vista de que as ações de cobrança (ações de conhecimento) seriam mais

favoráveis que as ações executivas de título extrajudicial, pelo fato de essas, diferentemente daquelas, não permitirem a aplicação da regra do artigo 323 do CPC/2015 (antiga regra do artigo 290 do CPC/1973), norma que permite a inclusão de encargos condominiais vincendos na cobrança realizada. 82. O referido dispositivo (art. 323 do CPC/2015) dispõe que “na ação que tiver por objeto cumprimento de obrigação em prestações sucessivas, essas serão consideradas incluídas no pedido, independentemente de declaração expressa do autor, e serão incluídas na condenação, enquanto durar a obrigação, se o devedor, no curso do processo, deixar de pagá-las ou de consigná-las”. 83. Entretanto, tal entendimento se mostra totalmente equivocado, pois não há qualquer justificativa plausível para excluir da regra do artigo 323 do CPC/2015 as execuções fundadas em títulos extrajudiciais, restringindo-a apenas às execuções de títulos judiciais. 84. Assim se dá por força do disposto no artigo 771 do CPC/2015, que determinou a aplicação subsidiária das regras do processo de conhecimento e do cumprimento de sentença (Livro I da Parte Especial do novo Código de Processo Civil): “Art. 771. Este Livro regula o procedimento da execução fundada em título extrajudicial, e suas disposições aplicam-se, também, no que couber, aos procedimentos especiais de execução, aos atos executivos realizados no procedimento de cumprimento de sentença, bem como aos efeitos de atos ou fatos processuais a que a lei atribuir força executiva. Parágrafo único. Aplicam-se subsidiariamente à execução as disposições do Livro I da Parte Especial. 85. Destaque-se que o artigo 323 situa-se precisamente no Livro I da Parte Especial do NCPC (seção II – Do pedido), sendo norma plenamente aplicável às execuções de títulos extrajudiciais. 86. Nem poderia ser outra a interpretação adequada da regra do artigo 771, parágrafo único, do CPC/2015, porquanto a norma do artigo 323 do CPC/2015 constitui salutar medida de economia e eficiência processual, a evitar que, tanto nas ações de conhecimento em geral, quanto nas execuções, o processo alcance a sua máxima efetividade com o menor custo possível para ambas as partes, na medida em que se evita que o credor seja obrigado a promover diferentes ações para a obtenção do mesmo bem jurídico, no caso, as parcelas dos encargos condominiais que se forem vencendo no curso da relação processual, “enquanto durar a obrigação”.

87. A propósito, cumpre assinalar que a jurisprudência do próprio Superior Tribunal de Justiça já reconhecia a incidência da regra idêntica do artigo 290 do CPC/1973 (atual 323 do CPC/2015) aos processos de execução de títulos extrajudiciais, a exemplo da execução de contratos locatícios e da execução hipotecária, como demonstram os seguintes julgados: “PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. CONTRATO DE LOCAÇÃO. INCLUSÃO DOS ALUGUÉIS VENCIDOS INADIMPLIDOS NO CURSO DA DEMANDA. ART. 290 DO CPC. INCIDÊNCIA. AUSÊNCIA DE DÚVIDAS QUANTO AOS VALORES INADIMPLIDOS DEVIDOS. 1. Incluem-se na execução os débitos locatícios vencidos e inadimplidos no decorrer da demanda, nos termos do art. 290 do CPC. 2. Entendimento a que se chega ante a aplicação do art. 598 do CPC e a consagração dos princípios da celeridade e economia processual. 3. Recurso especial provido.” (REsp 1390324/DF, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, TERCEIRA TURMA, julgado em 02/09/2014, DJe 09/09/2014) 88. Neste importante julgado, assim se manifestou o eminente Min. Relator: “A controvérsia a ser dirimida nos presentes autos cinge-se a definir se incide na execução de título extrajudicial, in casu, de contrato de locação de bem imóvel, o disposto no art. 290 do Código de Processo Civil, que assim dispõe: "Art. 290. Quando a obrigação consistir em prestações periódicas, considerar-se-ão elas incluídas no pedido, independentemente de declaração expressa do autor; se o devedor, no curso do processo, deixar de pagá-las ou de consigná-las, a sentença as incluirá na condenação, enquanto durar a obrigação." A respeito do tema, confiram-se as lições de Cândido Rangel Dinamarco (in "Instituições de Direito Processual Civil", 2009, vol. III, p. 239/240): "Direitos ainda inexistentes mas suscetíveis de serem reconhecidos em condenações para o futuro são aqueles que, decorrendo de uma só e única relação jurídica substancial, vão se constituindo ao longo do tempo. Trata-se das obrigações de trato sucessivo, caracterizadas por relações jurídicas das quais emana a obrigação de realizar prestações múltiplas, ordinariamente periódicas (CPC, art. 290). Ordinariamente faleceria ao sujeito o legítimo interesse

processual ao processo e ao julgamento de pretensões relativas a prestações futuras e portanto ainda inexigíveis (ausência de necessidade da jurisdição; supra. n. 544). Mas, estando elas ligadas a outras prestações já vencidas e portanto exigíveis, do inadimplemento destas o legislador extrai a razoável previsão de que também as futuras não serão honradas e, por esse motivo, confere ao sedizente credor a possibilidade de postular a condenação no alegado devedor por todas - vencidas e vincendas. " Na hipótese dos autos, foi proposta a execução de título extrajudicial representado por contrato de locação de imóvel em virtude do inadimplemento de aluguéis e de demais encargos referentes ao bem locado. O executado não apresentou embargos, efetuou o depósito judicial do valor referido na inicial devidamente atualizado e postulou a extinção do processo em virtude da quitação do débito. Intimado a manifestar-se, o exequente recusou-se a dar a dívida por quitada ao argumento de que haveriam obrigações pendentes que venceram após o ajuizamento da demanda até a data do despejo do locatário e que não foram abrangidas na inicial. O juízo monocrático, após ouvir o executado, que pugnou pela não incidência do art. 290 do CPC, determinou que a Contadoria Judicial elaborasse novos cálculos incluindo os débitos posteriores à propositura da execução até a data em que o locador foi imitido na posse do bem conforme informado pelo exequente. Primeiramente, é certo que o contrato de locação alberga prestações de trato sucessivo referentes aos aluguéis devidos pelo locatário. Por sua vez, prevê o art. 598 do mesmo diploma legal a aplicação subsidiária as disposições que regem o processo de conhecimento às execuções. Ainda, é certo ser indispensável a certeza, a liquidez e a exigibilidade do título para o ajuizamento da ação executiva. Esses três elementos referem-se, respectivamente, à ausência de dúvidas quanto à existência do título que consubstancia a obrigação, à quantidade de bens que é objeto da obrigação e ao momento previsto para o adimplemento dessa obrigação. Assim é que, não há qualquer óbice para fazer incidir à execução de título extrajudicial o disposto no art. 290 do CPC, para que as prestações periódicas sejam consideradas

incluídas no pedido enquanto durar a obrigação, independentemente de declaração expressa do autor, desde que referida inclusão não macule a certeza, a liquidez, ou a exigibilidade do título.” 89. Conseguintemente, por força da regra do artigo 771, parágrafo único, do CPC/2015, não há falar em qualquer distinção entre as ações de execução de título judicial (cumprimento de sentença) e aqueloutras fundadas em título extrajudicial no que diz respeito à aplicação da regra do artigo 323 do mesmo Diploma legal. 90. Desse modo, não se vislumbra, neste particular, qualquer vantagem comparativa na opção das entidades condominiais pela via da ação de conhecimento em detrimento da execução do título extrajudicial autorizada pelo artigo 784, inciso X, do CPC/2015. Assim sendo, não pode ser este o argumento a justificar a permanência da regra do art. 785 do CPC/2015 no interior do sistema jurídico nacional, nos limites das competências deste Juízo. QUESTÕES ESPECÍFICAS – COBRANÇAS CONDOMINIAIS Do escopo do art. 784, X, do CPC/2015 – A questão dos “condomínios irregulares” 91. De início, cumpre analisar o âmbito normativo (escopo normativo) do art. 784, inciso X, do CPC/2015, que conferiu aos encargos condominiais a natureza de título executivo extrajudicial, assim dispondo: “Art. 784. São títulos executivos extrajudiciais: (...) X - o crédito referente às contribuições ordinárias ou extraordinárias de condomínio edilício, previstas na respectiva convenção ou aprovadas em assembleia geral, desde que documentalmente comprovadas;”. 92. Neste particular, o objetivo é analisar a amplitude do termo “condomínio edilício” constante deste dispositivo, haja vista que muitas entidades condominiais têm argumentado, neste Juízo, que a regra em comento somente se aplicaria aos condomínios em edifícios de apartamentos, não se aplicando aos denominados condomínios horizontais, especialmente, aquela espécie de condomínio muito presente na atípica realidade fundiária do Distrito Federal, constituída pelos denominados “condomínios irregulares” instalados normalmente em imóveis públicos (embora também possíveis em imóveis particulares). 93. O argumento que desenvolveremos neste tópico é o de que a norma em comento se aplica tanto aos condomínios em prédios de

apartamentos quanto nos condomínios de casas, inclusive os denominados “condomínios irregulares”. 94. Nesse sentido, vale destacar as lições de um especialista na matéria, autor do Projeto que culminou na edição da Lei 4.591/1964, o notável civilista brasileiro Caio Mário da Silva Pereira, que chamava a atenção para o fato de que o direito anterior ao Código Civil de 1916 não admitia a divisão de edifício por planos horizontais, tratando a matéria sob o rótulo jurídico do “direito de vizinhança”, o mesmo se reconhecendo em Códigos civis estrangeiros, tais como os Códigos da Alemanha, da França, da Itália e de Portugal. 95. Em verdade, o Código Civil de 1916 somente cuidava do denominado “condomínio comum”, em seus artigos 623 e seguintes, cujas normas também se aplicavam ao denominado “condomínio em paredes, cercas, muros e valas” (arts. 642 e seguintes) com o adminículo das regras do direito de vizinhança (arts. 554 a 588). Não havia, portanto, regramentos acerca dos condomínios edilícios. 96. Em que pese ao fato de que a “divisão horizontal” já passara a ser admitida em códigos civis do Século XIX em diversas cidades francesas, como Orleans, Rennes, Paris, Nantes e Auxerre, como destaca Caio Mário da Silva Pereira, foi somente com a edição do Decreto n. 5.481, de 25/6/1928 (modificado pelo Decreto-Lei n. 5.234/1943 e pela Lei 285/1948), que se obteve, no Brasil, uma “regulamentação dos edifícios coletivos, divididos em unidades autônomas, destinadas a finalidades residenciais, profissionais ou comerciais” (PEREIRA, Caio Mário da Silva, Instituições de direito civil, vol. IV, 14ª ed., Rio de Janeiro, Forense, 2000, p. 126). 97. Com efeito, dispunha o artigo 1º do Decreto Federal n. 5481/1928 que “os edificios de mais de cinco andares, construidos de cimento armado ou materia similar incombustivel, sob a fórma de apartamentos isolados, entre si, contendo cada um, pelo menos, tres peças, e destinados a escriptorios ou residencia particular, poderão ser alienados no todo ou em parte objectivamente considerada, constituindo cada apartamento uma propriedade autonoma, sujeita ás limitações estabelecidas nesta lei.” Entretanto, o mesmo diploma legal ainda sujeitava os denominados condomínios de parede-meia às regras do direito de vizinhança e demais dispositivos do Código Civil de 1916 (art. 4º do Decreto 5481/1928), embora este mesmo dispositivo, à semelhança do artigo 623 do CCB/1916, também qualificasse o condomínio de parede-meia como autêntico “condomínio”, ao dispor que “o condomínio por meiação de paredes, soalhos e tectos dos apartamentos, regular-sehá pelo disposto no Código Civil, no que lhe fôr applicavel”.

98. À guisa de precisão da linguagem, é importante reconhecer que tanto os condomínios em áreas de terreno ocupadas por casas quanto condomínios em prédios de apartamentos constituem ambas formas de “propriedade horizontal”, que deriva simplesmente da divisão ideal dos imóveis envolvidos em planos horizontais, como bem destaca Caio Mário da Silva Pereira, in verbis: “No regime do condomínio especial dos edifícios coletivos (também chamado da propriedade horizontal por se ter originado da divisão dos prédios por planos horizontais) a idéia central reside na associação da compropriedade à propriedade exclusiva: o condomínio incide no solo, fundações, paredes-mestras, saguão de entrada, corredores, portas e coisas de uso comum e teto. A propriedade exclusiva tem por objeto a unidade, seja esta o apartamento residencial, seja o conjunto ou a sala de utilização profissional, seja a loja ou o grupo de finalidade comercial, e pode ter acesso à via pública, diretamente como as lojas ou indiretamente como os apartamentos. O condomínio é coativo ou forçado. Ao contrário do condomínio tradicional, é lícito ao proprietário da unidade autônoma ceder com esta o uso das partes e coisas comuns a estranho, e imiti-lo na sua posse. As unidades autônomas são tratadas objetivamente como tais, identificadas por indicação numérica ou alfabética, e respondem individualmente pelos tributos.” (op. cit. p. 127) 99. Sílvio de Salvo Venosa também chama atenção para o fato de que a expressão “condomínio edilício” designa a “propriedade horizontal”, a “propriedade em planos horizontais” ou a “propriedade em edifícios” (VENOSA, Sílvio de Salvo, Direitos reais, 4ª ed., 2004, São Paulo, Atlas, p. 313). 100. Também Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald destacam que “a expressão condomínio edilício é um neologismo, como condomínio que resulta da edificação, matéria que não poderia ter sido versado pelo Código Civil de 1916, eis que no início do século XX não se cogitava, no Brasil, de prédios de apartamento ou comerciais. Na doutrina podemos perceber a preferência pela utilização da expressão propriedade horizontal, pois há uma propriedade horizontalmente fracionada.” (FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson, Curso de direito civil, vol. 5, 11ª ed., 2015, p. 601). 101. Dessa circunstância extrai-se, com facilidade, a conclusão de que a expressão “condomínio edilício”, que é sinônima de “propriedade horizontal”, abrange tanto aos “condomínios em prédios de apartamentos”

quanto aos chamados condomínios fechados em lotes de terrenos nos quais se identificam propriedade comum (da coletividade condominial) e propriedades exclusivas (dos proprietários ou possuidores ou ocupantes dos imóveis loteados). 102. Nesse sentido, mais uma vez, destaco as lições de Sílvio de Salvo Venosa: “São freqüentes os chamados loteamentos fechados: bairros urbanizados, em periferia de grandes centros, para fins residenciais, ou em regiões mais afastadas para finalidades de lazer. Se as edificações ocorrem em dezenas de lotes, como nos casos concretos, com vias particulares, não temos dúvidas de que existem partes comuns, coletivas e unidades autônomas, empregando-se, no que não conflitar, a lei condominial. É opinião também de J. Nascimento Franco e Nisske Gondo (1988:10). Não há razão para que se entenda aplicável apenas a lei do parcelamento do solo. No entanto, a questão acende vivas controvérsias. Se, no entanto, a urbanização é feita pelo Município, não há propriedade coletiva, não há parte ideais no condomínio. Se existe acesso controlado, vias particulares entre os imóveis, áreas de lazer e de uso comum, estará estabelecido o condomínio sob o regime de propriedade horizontal. Denomina-se condomínio fechado, porque as ruas, praças e áreas de lazer pertencem ao domínio privado, auto-regulamentado por convenção e assembléias do condomínio. Segundo parte da doutrina, a que aderimos, ainda que sejam prestados serviços públicos no interior do condomínio, tal não transforma sua natureza jurídica. É claro que há necessidade de adaptação de normas condominiais na convenção, sem prejuízo das regras gerais de vizinhança. A Lei nº 4.591/64 albergou expressamente essa modalidade de condomínio em seu art. 8º (...). O presente Código [Civil de 2002] não se refere expressamente a essa modalidade, o que sugere que, de futuro, tenhamos um regramento próprio. Aplicam-se, contudo, no que couber, as regras condominiais.” (op. cit., p. 355)[inserção nossa] 103. Esta sinonímia (condomínio horizontal = condomínio edilício) é destacada também na doutrina de Arnaldo Rizzardo: “Daí denominar-se horizontal o condomínio quando se apresenta como uma propriedade exclusiva e autônoma das unidades que o compõem, conjugada com um ‘condomínio edilício’, expressão adotada pelo Código Civil de 2002, por corresponder à forma de construção própria da cidade, cujas leis emanam

dos edis, ou daqueles que legislam sobre a cidade.” (RIZZARDO, Arnaldo, Direito das coisas, Rio de Janeiro, Forense, 2004, p. 616). 104. Merece destaque este ponto ressaltado pela doutrina, de que a própria Lei 4.591/64, que “dispõe sobre o condomínio em edificações e as incorporações imobiliárias, consagrou também os “condomínios fechados”, assim como os “condomínios em prédios de apartamentos” (somente neste ponto sido derrogada pelo CCB/2002). 105. Conseguintemente, referida lei não estabeleceu qualquer distinção ontológica entre as duas espécies e definindo ambas as espécies como formas de condomínio edilício ou de propriedade horizontal para efeito da aplicação das regras definidas nesta lei, segundo a definição constante de seu artigo 1º, caput: “As edificações ou conjuntos de edificações, de um ou mais pavimentos, construídos sob a forma de unidades isoladas entre si, destinadas a fins residenciais ou nãoresidenciais, poderão ser alienados, no todo ou em parte, objetivamente considerados, e constituirá, cada unidade, propriedade autônoma sujeita às limitações desta Lei.” 106. Ademais, especificamente quanto aos condomínios fechados, o artigo 8º deste Diploma legal assim dispôs: “Art. 8º Quando, em terreno onde não houver edificação, o proprietário, o promitente comprador, o cessionário dêste ou o promitente cessionário sôbre êle desejar erigir mais de uma edificação, observar-se-á também o seguinte: a) em relação às unidades autônomas que se constituírem em casas térreas ou assobradadas, será discriminada a parte do terreno ocupada pela edificação e também aquela eventualmente reservada como de utilização exclusiva dessas casas, como jardim e quintal, bem assim a fração ideal do todo do terreno e de partes comuns, que corresponderá às unidades; b) em relação às unidades autônomas que constituírem edifícios de dois ou mais pavimentos, será discriminada a parte do terreno ocupada pela edificação, aquela que eventualmente fôr reservada como de utilização exclusiva, correspondente às unidades do edifício, e ainda a fração ideal do todo do terreno e de partes comuns, que corresponderá a cada uma das unidades; c) serão discriminadas as partes do total do terreno que poderão ser utilizadas em comum pelos titulares de direito sôbre os vários tipos de unidades autônomas;

d) serão discriminadas as áreas que se constituírem em passagem comum para as vias públicas ou para as unidades entre si. ” 107. Por esses motivos, a Primeira Jornada de Direito Civil, promovida pelo Centro de Estudos Judiciários (CEJ), órgão ligado ao Conselho da Justiça Federal (CJF), formulou o seu enunciado n. 89, nos seguintes termos: “O disposto nos arts. 1.331 a 1.358 do novo Código Civil aplica-se, no que couber, aos condomínios assemelhados, tais como loteamentos fechados, multipropriedade imobiliária e clubes de campo.” 108. Neste descortino, não se poderia, portanto, interpretar a regra do artigo 784, inciso X, do CPC/2015 tendo em vista apenas a hipótese de “condomínio edilício” regulamentado nos artigos 1.331 et seq. do CCB/2002, mas também as regras da Lei 4.591/64, única a cuidar especificamente dos condomínios fechados. 109. Ademais, o próprio Código Civil de 2002, além de não cuidar dos condomínios fechados, trata dos condomínios edilícios em contraposição, não aos condomínios fechados, mas sim ao condomínio comum, ordinário ou transitório, assim definido como aquele que, “resultante ou não da convenção, vigora por tempo certo ou enquanto não se lhe ponha termo, mas que pode cessar sempre” (PEREIRA, Caio Mário da Silva, Instituições de direito civil, vol. IV, 14ª ed., Rio de Janeiro, Forense, 2000, p. 121). 110. Na mesma direção, destaco novamente a doutrina de Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald: “Há diferenças marcantes entre o condomínio comum e o condomínio edilício. No condomínio geral instaura-se unicamente o regime de propriedade comum, restando ausente a propriedade individual. No condomínio edilício, ao reverso, os condôminos consideram-se, ao mesmo tempo, titulares exclusivos das unidades autônomas (proprietários individuais sobre partes exclusivas) e cotitulares das partes comuns. O condomínio edilício, assim, absorve dois regimes: o regime do condomínio, em que as normas do condomínio geral têm caráter supletivo, e o regime da propriedade exclusiva.” (op. cit., p. 601) 111. Em outras palavras, o Código Civil de 2002 não esgota a regulamentação da propriedade horizontal, que, no tocante aos condomínios fechados, continua sendo feita pela Lei 4.591/64.

112. Nesse sentido, também os encargos condominiais definidos pelos condomínios fechados constituem título executivo, haja vista que o artigo 12, §2º, da Lei 4.591/64 expressamente dispõe que “cabe ao síndico arrecadar as contribuições competindo-lhe promover, por via executiva, a cobrança judicial das quotas atrasadas.” 113. Assim sendo, não há qualquer fundamento jurídico a sustentar a conclusão de que o artigo 784, inciso X, do CPC/2015 teria a sua aplicação restrita aos condomínios em prédios de apartamentos, de sorte que a novel regra apenas reafirma a regra do artigo 12, §2º, da Lei 4.591/64, para permitir a cobrança pela via executiva em todos os casos de propriedade horizontal (compropriedade de áreas comuns + propriedade exclusiva), ou seja, em todos os casos de “condomínio edilício”, quer se refira aos prédios de apartamentos, quer se refira aos condomínios fechados. 114. Por fim, ao menos à luz da jurisprudência desta Corte de Justiça, não resta a menor dúvida quanto à natureza condominial dos denominados condomínios irregulares, sendo irrelevante para tanto o fato de os encargos condominiais serem cobrados por meio de associação de moradores. 115. Nesse sentido, destaco os seguintes julgados deste Tribunal: “APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO CIVIL. AÇÃO DE COBRANÇA. TAXAS DE MANUTENÇÃO COLETIVA. PREJUDICIAL DE MÉRITO. PRESCRIÇÃO SUSCITADA DE OFÍCIO. PRAZO QUINQUENAL (CPC, ART. 206, §5º, I). CONDOMÍNIO IRREGULAR. COBRANÇA REALIZADA POR ASSOCIAÇÃO DE MORADORES. IRRELEVÂNCIA. NATUREZA DA ATIVIDADE CONDOMINIAL. OBRIGAÇÃO PROPTER REM. GRATUIDADE DE JUSTIÇA. CONCESSÃO COM EFEITOS EX TUNC. (...) 3. O fato de o condomínio encontrar-se em situação irregular, sendo administrado por associação de moradores, não impede a cobrança de encargos fixados em assembleias da associação administradora, pois, segundo precedentes desta Corte, para se aferir a condição de condomínio, basta que se demonstre a natureza da atividade exercida pelo ente condominial, independentemente da denominação....” (Acórdão n.925686, 20140710327829APC, Relator: SIMONE LUCINDO, 1ª Turma Cível, Data de Julgamento: 02/03/2016, Publicado no DJE: 31/03/2016. Pág.: 227) “APELAÇÃO. DIREITO CIVIL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE COBRANÇA. TAXAS CONDOMINIAIS.

INADIMPLEMENTO. ASSOCIAÇÃO DE MORADORES. IRRELEVÂNCIA. DEVER DOS CONDÔMINOS DE CONTRIBUIR COM A DESPESA COMUM. OBRIGAÇÃO PROPTER REM. COBRANÇA DIRECIONADA AO POSSUIDOR DA UNIDADE. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. SENTENÇA REFORMADA. 1. O fato de o condomínio ser administrado por uma associação de moradores não impede a cobrança de encargos fixados em assembléia, pois, para se aferir a condição de condomínio, basta que se demonstre a natureza da atividade exercida pelo ente condominial de fato, mostrando-se irrelevante a denominação conferida. 2. Conquanto a autora/apelante tenha sido constituída originalmente sob a denominação de associação, ela atua como um condomínio, pois foi criada para disciplinar as relações internas dos condôminos/associados, zelando pelos interesses dos moradores do local, bem assim para a manutenção e melhoramento das áreas comuns. 3. Cabe ao condômino o pagamento da respectiva quota parte, pois não se afigura justo e razoável que o morador/proprietário se beneficie dos serviços prestados, bem como das benfeitorias realizadas pela associação sem a devida contraprestação. 4. A cobrança de taxa condominial deve ser direcionada ao possuidor da unidade integrante do condomínio, a teor do art. 1.345 do Código Civil, que estabelece que a responsabilidade pelo pagamento das quotas de despesas de condomínio, em virtude de se consubstanciarem em obrigações propter rem, recai tanto sobre o proprietário do imóvel - titular do domínio - quanto sobre o ocupante da unidade a qualquer título (compromissário comprador, locatário ou comodatário, etc.), podendo a ação de cobrança ser ajuizada contra um ou outro, individualmente, ou contra ambos em litisconsórcio passivo facultativo. 5. Não existindo controvérsia quanto à posse do apelado, necessária a condenação ao pagamento das cotas condominiais em aberta. 6. Recurso conhecido e provido. Sentença reformada.” (Acórdão n.939085, 20110710304849APC, Relator: ALFEU MACHADO, Relator Designado: ROMULO DE ARAUJO MENDES, 1ª Turma Cível, Data de Julgamento: 13/04/2016, Publicado no DJE: 19/05/2016. Pág.: 215) “CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA. TAXAS DE CONDOMÍNIO IRREGULAR.

ASSOCIAÇÃO. NÃO FILIAÇÃO. IRRELEVÂNCIA. OBRIGAÇÃO PROPTER REM. ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA. VEDAÇÃO. RECURSO IMPROVIDO. 1. À luz do artigo 12 da Lei nº 4.591/64, em qualquer condomínio os condôminos são responsáveis pelas despesas comuns realizadas. 1.1. O fato de o condomínio encontrar-se em situação irregular, sendo administrado por uma associação de moradores, não impede a cobrança de encargos fixados em assembléias. 1.2. Cuida-se, portanto, de obrigação propter rem, vinculando a coisa ao seu dono, impondo-se ao adquirente de imóvel ou ao seu possuidor a obrigação de pagar pelos encargos fixados em assembléia, uma vez que obtém proveitos do condomínio. 2. "Comprovadas as despesas, o condômino deve responder por elas, pois é seu dever moral arcar com as despesas rateadas entre os condôminos, sob pena de desrespeito a um dos princípios norteadores do nosso direito, que é o da proibição do enriquecimento ilícito". (in Código Civil Comentado, Nelson Nery Junior e outros, RT, 7ª edição, p. 1009). 3. Precedente da Casa. 3.1. "A origem e destinação da entidade criada sobrepujam a denominação que lhe fora conferida como parâmetro para delimitação da sua natureza jurídica, resultando que, conquanto lhe tenha sido conferida a denominação de associação ao ser criado, se efetivamente está destinado à administração das áreas comuns compreendidas no loteamento e fomento de serviços aos detentores das unidades que o integram de forma indistinta, essas inferências determinam que lhe seja conferida a natureza de condomínio irregular, que, desprovido de regular constituição, merece ser tratado como sociedade despersonalizada. 3. Assimilando que efetivamente é detentor de unidade autônoma situada no perímetro do loteamento, dela fruindo, o fato implica a imputação ao possuidor da qualificação de condômino independentemente de qualquer manifestação de vontade dele derivada, pois decorre a qualidade da simples detenção da fração que ocupa, tornando-o obrigado a concorrer para o custeio das despesas geradas pela entidade condominial na administração das áreas comuns e fomento dos serviços destinados a todos os condôminos de forma indiscriminada, inclusive porque, em se tratando de serviços fomentados a todos os condôminos de forma indistinta, todos devem concorrer para seu fomento na forma resolvida em assembléia".(TJDFT, 1ª Turma Cível, APC

nº 2013.01.1.005785-8, rel. Des. Teófilo Caetano, Dje de 3/2/2015, p. 159). 4. Recurso conhecido e improvido.” (Acórdão n.911868, 20130110057809APC, Relator: JOÃO EGMONT, 2ª Turma Cível, Data de Julgamento: 02/12/2015, Publicado no DJE: 16/12/2015. Pág.: 204) 116. Por conseguinte, admitir-se que essas entidades condominiais (condomínio irregulares) fossem alijadas da possibilidade de promover ações de execução dos encargos condominiais que lhes são devidas constituiria uma gravíssima ofensa ao princípio da isonomia (artigo 5º, caput, CF/88), porque, neste particular, esses entes despersonalizados, verdadeiros condomínios de fato, não ostentam qualquer distinção ontológica em comparação com os condomínios edilícios regularmente Registrados nos Cartórios de Imóveis competentes, substituindo, pois, em ambos os casos, o dever dos condomínios de coparticipação no pagamento das despesas coletivas. Da inaplicabilidade do Art. 1046, §1º, CPC/2015 ao caso concreto 117. Com efeito, dispõe o art. 1.046, §1º, do CPC/2015 regra de direito intertemporal nos seguintes moldes: “§1º As disposições da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973, relativas ao procedimento sumário e aos procedimentos especiais que forem revogadas aplicar-se-ão às ações propostas e não sentenciadas até o início da vigência deste Código.” 118. Constitui princípio elementar do Direito o de que a literalidade de um texto normativo implica, não um ponto de chegada, mas sim um imprescindível ponto de partida da interpretação jurídica. 119. Assim, o sentido literal de uma disposição jusnormativa não esgota a tarefa de interpretação e concretização jurídica, antes constitui uma “primeira orientação” que serve para delimitar e ordenar os passos seguintes do intérprete no sentido de extrair do texto normativo o seu sentido mais adequado e compatível com os demais princípios, regras e valores que orientam o sistema jurídico. 120. Por isso já recomendava o insuperável Carlos MAXIMILIANO sobre o tema, criticando o que denominava de “apego servil à letra dos dispositivos”: “Nada de exclusivo apego aos vocábulos. O dever do juiz não é aplicar os parágrafos isolados, e, sim, os princípios jurídicos em boa hora cristalizados em normas positivas.” (MAXIMILIANO, Carlos, Hermenêutica e aplicação do direito, 20ª ed., Rio de Janeiro, Forense, 2011, p. 97)

121. É assente na doutrina que nenhum critério da hermenêutica jurídica pode ser aplicado de forma isolada ou absoluta, mas sim de forma interrelacionada e sistêmica, no sentido da identificação da “intenção reguladora do legislador e ao escopo da norma em causa”. 122. Nesse sentido, invoco as sempre atuais lições de Karl LARENZ: “O sentido literal, a extrair do uso linguístico geral, constitui o ponto de partida e, ao mesmo tempo, determina o limite da interpretação, pois que aquilo que está para além do sentido possível e que já não é com ele compatível, mesmo na mais ampla das interpretações, não pode valor como conteúdo da lei. O sentido literal não é, em regra, inequívoco, deixando antes margem para numerosas variantes de interpretação. A afirmação, que se ouve com frequência, de que os termos inequívocos não carecem de interpretação induz tanto mais em erro, quanto, feita a abstracção de números e nomes próprios, a maior parte dos termos da linguagem corrente, e também da linguagem legislativa, não são inequívocos. Já a constatação de que do sentido literal resulta ‘inequivocamente’ este ou aquele significado é, em regra, o resultado de uma interpretação. O uso linguístico geral é precedido por um uso linguístico especial da lei, a não ser que resulte de outros critérios que a lei se afastou aqui do seu uso linguístico próprio. O significado intencionado em cada caso pode resultar, com suficiente certeza, do uso linguístico especial da lei; neste caso a interpretação é levada a seu termo com a averiguação do uso linguístico da lei e com a constatação de que a lei se não afastou aqui dele. Interessa então apenas e ainda um desenvolvimento do Direito, caso existam os pressupostos para tal. Mas, em regra, também um uso linguístico estabilizado por parte da lei deixa ainda aberta a possibilidade de diferentes variantes de significado; então são decisivos os outros critérios.” (LARENZ, Karl. Metodologia da ciência do direito, 3ª ed. Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 1997, P. 485) 123. Dessarte, para além da mera expressão literal da regra do artigo 1.046, §1º, do NCPC, a interpretação jurídica constitucionalmente adequada exige que o intérprete leve em conta diversos outros fatores que podem não apenas reforçar o texto da norma como também corrigilo, dentro de seus limites e possibilidades, tais como a teleologia da norma, a sua relação sistemática com outros valores, princípios e normas etc. Em outras palavras, a interpretação que pretenda conferir à

literalidade da norma jurídica um sentido absoluto, além de manifestamente insuficiente, pode produzir resultados compreensivos incompatíveis com a ordem jurídico-constitucional e a integridade do sistema de normas. 124. Mutatis mutandis, assim lecionava Celso Bastos, em seu clássico texto sobre a hermenêutica constitucional: “O método literal, em seu caráter absoluto, é que se torna totalmente não operativo. (...) Ressalte-se ainda que o tradicional critério gramatical costuma ser confundido com o brocardo (...) in claris cessat interpretatio. Na verdade, a interpretação meramente gramatical não garante a solução da problemática surgida.” (BASTOS, Celso, Hermenêutica e interpretação constitucional, São Paulo, CB, 1997, p. 111) 125. Também Friedrich Müller destacava que o teor literal da norma constitui apenas um dos elementos da interpretação jurídica, ao qual não se pode atribuir preponderância absoluta sobre os demais métodos de trabalho do intérprete jurídico, sob pena de cairmos no vale obscuro de um exegetismo legalista ultrapassado: “Enquanto forem indicadas como ‘métodos’ da práxis e da ciência jurídicas somente regras da interpretação, a estrutura da realização prática do direito terá sido compreendida de forma equivocada. A interpretação do teor literal da norma é um dos elementos mais importantes no processo de concretização, mas somente um elemento. Uma metódica destinada a ir além do positivismo legalista deve indicar regras para a tarefa da concretização da norma no sentido abrangente da práxis efetiva. Não pode aferrar-se nem ao dogma da evidência nem ao dogma voluntarista. Não pode conceber o processo bem como a tarefa da realização do direito normativamente vinculada como uma mera reelaboração de algo já efetuado. Ela deve elaborar os problemas da ‘pré-compreensão’ da ciência jurídica e do fato da concretização estar referida ao caso. Ela deve partir in totum de uma teoria da norma que deixa para trás o positivismo legalista.” (MÜLLER, Friedrich, Métodos de trabalho do direito constitucional, 2ª ed., São Paulo, Max Limonad, 2000, p. 61) 126. Uma interpretação jusconstitucionalmente adequada dos termos legais deve considerar, portanto, como ensina Juarez de FREITAS, a totalidade do Direito:

“... todas as frações do sistema guardam conexão entre si, daí resultando que qualquer exegese comete, direta ou indiretamente, uma aplicação de princípios, de regras e de valores componentes da totalidade do Direito. Retido este aspecto, registre-se que cada preceito deve ser visto como parte viva do todo, eis que apenas no exame de conjunto tende a ser melhor equacionado qualquer caso, quando se almeja uma bem-fundamentada hierarquização tópica dos princípios tidos como proeminentes. Com efeito, ao hierarquizar prudencialmente princípios, regras e valores, a interpretação tópico-sistemática opera escalonando-os, renovando os seus significados, e, quando configurada qualquer antinomia lesiva ou para evitá-la, os princípios devem ocupar o lugar de diretrizes harmonizadoras ou solucionadoras, situando-se na base e no ápice do sistema, vale dizer, atuando como fundamento e cúpula do mesmo. Inegável que, dado não haver hierarquia a priori que interdite ou dispense interpretação superveniente, o sistema requer constante e contínua reelaboração, donde segue a hierarquização não pode ser confundida com mero elemento ou método interpretativo. A exegese sistemática necessita abarcar todos os métodos, realizando o mister de harmonizálos na prática, de sorte a resguardar e a manter a unidade, em meio à multiplicidade axiológica, na construção e na reconstrução do Direito.” (FREITAS, Juarez, A Interpretação sistemática do direito, 3ª ed. rev. e amp., São Paulo, Malheiros, 2002, p. 71/72) 127. No âmbito de uma bem-fundamentada interpretação sistemática insere-se, com destaque, o método teleológico (ratio juris). 128. Como pontificava Carlos MAXIMILIANO, “toda prescrição legal tem provavelmente um escopo, e presume-se que a este pretenderam corresponder os autores da mesma, isto é, quiseram tornar eficiente, converter em realidade o objetivo ideado. A regra positiva deve ser entendida de modo que satisfaça aquele propósito; quando assim se não procedia, construíam a obra do hermeneuta sobre a areia movediça do processo gramatical. Considera-se o Direito como uma ciência primariamente normativa ou finalística; por isso mesmo a sua interpretação há de ser, na essência, teleológica.” (op. cit., p. 124) 129. Também Luís Roberto Barroso leciona que “as normas devem ser aplicadas atendendo, fundamentalmente, ao seu espírito e à sua

finalidade. Chama-se teleológico o método interpretativo que procura revelar o fim da norma, o valor ou bem jurídico visado pelo ordenamento com a edição de dado preceito.” (BARROSO, Luís Roberto, Interpretação e aplicação da Constituição, Saraiva, São Paulo, 1996, p. 129-130) 130. Nesse sentido, entendemos que a razão de ser do dispositivo legal em comento (art. 1.046, §1º, do CPC/2015), cuja interpretação não se deve estancar em seus elementos literais, reside na clara intenção do legislador de evitar qualquer prejuízo aos litigantes, especialmente em termos de celeridade e razoável duração do processo, o que fatalmente ocorreria se todas as ações sumárias anteriormente ajuizadas e não sentenciadas fosse imediatamente submetidas ao novo, abrangente e mais demorado procedimento comum estabelecido pelo NCPC, na forma determinada pelo art. 318 deste. 131. Para ilustrar este argumento teleológico, suponha-se, por exemplo, uma ação de ressarcimento de danos decorrentes de acidente de trânsito (art. 275, inciso II, alínea “d”, do CPC/1973) que, proposta à luz do regime processual revogado, esteja, na vigência do NCPC, em fase de realização da audiência de conciliação. 132. Nos termos do disposto no art. 278 do CPC/1973, não obtida a conciliação, caberia à parte ex adversa a oferta da contestação na própria audiência e, não havendo a necessidade de outras provas, poderia o juiz proferir sentença de imediato, na própria audiência de conciliação ou no prazo de 10 (dez) dias (art. 281 do CPC/1973). 133. Sem a regra de direito intertemporal do art. 1.046, §1º, do CPC/2015, esta mesma ação sofreria sensíveis atrasos, com sérios prejuízos para a razoável duração do processo (art. 5º, inciso LXXVIII, CF/88), na medida em que, vencida a fase de conciliação, a sentença de mérito não poderia ser proferida de imediato, ante a necessidade de observância das regras do procedimento comum, ou seja, apresentação da contestação no prazo de 15 (quinze) dias úteis subsequentes à audiência de conciliação (art. 335, inciso I, c/c art. 219 do CPC/2015) e provável apresentação de réplica também no prazo de mais de 15 (quinze) dias úteis (art. 351 do CPC/2015). 134. Desse modo, a sentença que, no regime processual anterior, poderia ser obtida imediatamente pelas partes, ou seja, na própria audiência de conciliação, somente poderia vir a lume, no novo regime, no prazo mínimo de 30 (trinta) dias úteis, sem contar, neste ínterim, o prazo para as providências cartorárias pertinentes.

135. Neste caso, não restam dúvidas quanto ao grave prejuízo causado pelo novel regime processual à razoável duração do processo anteriormente iniciado. 136. Para evitar este prejuízo, o legislador, sabiamente, estabeleceu a regra do art. 1.046, §1º, do CPC/2015, a fim de assegurar que as ações de rito sumário —que passariam imediatamente (art. 1.046, caput, CPC/2015) a serem regidas pelo procedimento comum — continuem sendo processadas segundo as regras do antigo rito sumário estabelecidas na legislação processual precedente (CPC/1973), idêntico raciocínio se aplicando aos procedimentos especiais cujas normas foram revogadas pelo NCPC. 137. Desses argumentos extrai-se, com facilidade, a ratio juris do dispositivo: a regra do art. 1.046, §1º, do CPC/2015 somente se aplica às ações de rito sumário e aos procedimentos especiais que, na ausência desta norma, seriam “desde logo” submetidas ao procedimento comum estabelecido pelo NCPC para todos os processos de conhecimentos em geral. Nesse sentido, o que veda a aludida norma é a passagem do “rito sumário” ou do “procedimento especial” antigo para o “processo de conhecimento” novo. 138. Por conseguinte e a contrario sensu, tal norma não se aplica àquelas ações de rito sumário que, embora ajuizadas anteriormente ao NCPC, não seriam submetidas a processo de conhecimento (procedimento comum), mas sim a procedimento executivo (execução de título extrajudicial) previsto no próprio NCPC, como sucede precisamente com as ações de cobrança de encargos condominiais, que foram convertidos em título executivo extrajudicial, conforme a norma expressa do art. 784, inciso X, do CPC/2015, que assim dispõe: “Art. 784. São títulos executivos extrajudiciais: (...) X - O crédito referente às contribuições ordinárias ou extraordinárias de condomínio edilício, previstas na respectiva convenção ou aprovadas em assembleia geral, desde que documentalmente comprovadas;” 139. Ora, a passagem do anterior “rito sumário” para o atual e vigente “rito executivo” não implica qualquer prejuízo à parte autora. Ao contrário, importa sensível e recomendado fator de celeridade processual, na medida em que antecipa o título executivo almejado na ação de conhecimento anteriormente proposta e possibilita, de forma mais célere, a adoção das medidas judiciais constritivas típicas do processo executivo

contra a parte ex adversa, ensejando assim uma rapidez na proteção jurisdicional do bem jurídico pretendida pelo autor. 140. Desse modo, é forçoso reconhecer que não gozam de ultraatividade as regras do rito sumário previstas no CPC/1973 relativas às ações de cobrança de encargos condominiais nem o artigo 1.046, §1º, do CPC/2015 constitui fundamento para afastar a aplicação imediata da regra do art. 784, inciso X, do CPC/2015 àquelas ações, que devem ser imediatamente convertidas em processos de execução de título extrajudicial, consoante a interpretação teleológica desenvolvida, a bem da concretização da razoável duração do processo. 141. Ademais, não inviabiliza esta interpretação o fato de, eventualmente, já se encontrar designada a audiência de conciliação (art. 277, caput, CPC/2015) para data próxima, porquanto nada impede a realização de audiências de conciliação mesmo no âmbito dos processos executivos, mesmo após a conversão do feito em execução de título extrajudicial. 142. Nesse sentido, o artigo 772, inciso I, do CPC/2015, que estabelece princípio geral aplicável às “execuções em geral”, determina que “Art. 772. O juiz pode, em qualquer momento do processo: I - ordenar o comparecimento das partes;”. Tal dispositivo, a propósito, decorre da regra geral estabelecida no artigo 2º, §3º, do CPC/2015 — aplicável às execuções por força do disposto no art. 771, parágrafo, do CPC/2015 —, nos termos do qual “§3º A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial.” 143. Portanto, a conversão da ação de cobrança sumária em execução de título extrajudicial não erige, em rigor, qualquer óbice à realização de audiências de conciliação designadas pelo juiz competente, nem impede que as partes, decidindo resolver a lide por acordo, solicitem ao juiz a sua pronta e imediata homologação, o que, a propósito, não constituiria nenhuma novidade, uma vez que se cuida de prática rotineira, quer nas execuções de títulos extrajudiciais, quer nas execuções submetidas ao rito de cumprimento de sentença. III.

PONTOS RESOLUTIVOS

144. \PautaPor esses fundamentos, DECLARO a inaplicabilidade do artigo 1.046, §1º, do CPC/2015 ao presente caso; DECLARO a inconstitucionalidade e a inconvencionalidade do artigo 785 do CPC/2015, por ofensa aos princípios da razoável duração do processo (art. 5º, inciso LXXVIII, CF/88 c/c art. 8.1 da Convenção Americana de

Direitos Humanos), da isonomia (art. 5º, caput, CF/88 c/c art. 24 da Convenção Americana de Direitos Humanos e art. 139, inciso I, do CPC/2015) e do juiz natural (art. 5º, inciso LIII, CF/88 c/c art. 8.1 da Convenção Americana de Direitos Humanos); e, por fim, DECLARO a parte autora carecedora de ação, por falta de interesse processual; e, por conseguinte, JULGO EXTINTO o processo sem resolução do mérito, nos termos do artigo 485, inciso VI, do CPC/2015. 145. Em virtude do princípio da causalidade, uma vez que a parte ré foi citada e tendo esta dado causa ao ajuizamento da ação, ao deixar de promover o pagamento dos encargos condominiais ora reclamados, CONDENO a parte ré ao pagamento das custas processuais e de honorários advocatícios aos advogados da parte autora, os quais, tendo em vista o caráter irrisório do valor da causa e do proveito econômico pretendido, arbitro em R$700,00 (setecentos reais), nos termos do artigo 85, §8º, do CPC/2015. 146. Sentença registrada eletronicamente, nesta data. 147. Publique-se. Intimem-se.

Ruitemberg Nunes Pereira Juiz de Direito Titular da Segunda Vara Cível de Taguatinga/DF

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