A Independência da Catalunha

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A Independência da Catalunha Victor Targino de Araujo1

Aos 09.11.2015, o Parlamento da Catalunha declarou, unilateralmente, sua independência. Em outras palavras, a Região Autônoma, integrante do Reino da Espanha, externa seu desejo de se desvincular, totalmente, do governo central, em Madrid, assumindo contornos de um país livre, soberano e afixado em Barcelona, sua Capital. Por razões óbvias, a Espanha não concordou com a declaração. A Catalunha é sua província mais rica e Barcelona é uma das cidades mais importantes do Reino. O Primeiro-Ministro Espanhol, Mariano Rajoy, afirma que, pela Constituição, o Parlamento da Catalunha não tem legitimidade para editar uma declaração de independência. Não sem que antes seja realizada uma consulta popular a todos os súditos do Reino, catalãos ou não. Com o perdão aos cientistas políticos que concordam com Rajoy, o Parlamento da Catalunha tem total legitimidade para declarar sua independência.

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Atualmente, advogado no Sport Club Corinthians Paulista e pós-graduando em Direito Desportivo pela PUC-SP. Autor da dissertação científica: “Considerações para a Regulamentação dos Cassinos no Brasil”, apresentada à Universidade Presbiteriana Mackenzie em 2012, posteriormente publicada na Revista Brasileira de Direito Tributário e Finanças Públicas, jan/fev 2013 e do artigo “O Direito à Cultura, ao Lazer e ao Entretenimento e sua Relação com os Jogos de Azar Proibidos no Brasil”, publicado no livro Direitos Humanos: perspectivas e reflexões para o Século XXI, Ed. Ltr, 2014.

A Carta das Nações Unidas, de 1945, em seu artigo 1º, item 2, traz o Princípio de Autodeterminação dos Povos. O povo catalão remonta suas origens ao início do Século IX, nas guerras travadas pelos Francos contra os Muçulmanos no norte da Península Ibérica. Com o estabelecimento de diferentes condados cristãos na Região, fixados na costa nordeste da Península Ibérica, pouco a pouco o Condado de Barcelona e os condados próximos foram se assimilando, criando identidade cultural (língua e costumes), econômica e política, culminando na formação do Principado da Catalunha, no início do Século XII. Em 1162, o Príncipe Catalão herdou o Reino de Aragão, vizinho, estabelecendo a união entre ambos, porém respeitando a autonomia do Principado, dado que seu povo possuía identidade cultural distinta dos Aragoneses, a começar pela língua. Ao longo dos séculos, entretanto, a autonomia desse povo foi sendo minguada. O Rei Fernando de Aragão, em 1469, se casou com Isabel de Castela, unificando seus Reinos e formando os traços da Espanha atual. A influência e dominação que se sucedeu, por parte do Reino de Castela

na

política

e

nos rumos do

novo

Reino

Espanhol, disseminou um sentimento de revolta e independência do povo catalão em relação ao Governo Central, cuja identidade cultural, política e social era muito diferente.

Em 1641, os Catalães declararam-se uma República independente, sem sucesso, já que o Governo de Madrid (Rei Filipe IV, castelhano) interviu militarmente. Na Guerra de Sucessão Espanhola, travada entre 1701 e 1714, os Catalães apoiaram a ascensão de Carlos III, formalmente à época, sucessor do título de Rei de Aragão, região historicamente mais alinhada com a Catalunha, ao Governo Central, contra o herdeiro de Castela, o Rei Filipe V. Com a vitória deste último, toda e qualquer expressão cultural Catalã foi proibida pelo Governo de Madrid, em todo o território que formaria o Império Espanhol, cuja linha de sucessão seria sempre de Castela e a língua predominante a castelhana (conhecida no Brasil como "Espanhol"). Tentaram, sem sucesso, por três vezes, declarar independência (1873, 1931

e

1934),

sempre

sofrendo

duras

intervenções

militares

coordenadas pelo Governo Central. Com a democratização da Espanha, em 1977, sob a batuta do Rei Juan Carlos I, permitiu-se, na Constituição de 1978 (artigo 143), que algumas regiões de seu Reino gozassem de relativa autonomia ao Governo de Madrid, podendo fixar seu Parlamento e Governo. Assim, a partir do Estatuto da Catalunha, de 1979, o Governo Central permitiu aos Catalães o reestabelecimento de suas identidades culturais e políticas, além de reacender o sentimento nacionalista desse povo tão distinto daqueles que governaram a Espanha por séculos. E nem se argumente, como deseja Mariano Rajoy, que a Constituição não permite aos Catalães declarar sua independência, impondo a

realização de uma consulta popular prévia em todo o Reino sobre o tema. Primeiro. É óbvio que a Constituição não permitiria uma secessão, diretamente. O Governo Central não gostaria de perder força. O Rei não gostaria de perder suas terras. Aliás, surpreende a posição da Coroa Espanhola (Rei Filipe VI, castelhano) que, até o momento, não se manifestou sobre a independência. Segundo, é lógico que uma consulta popular, por todo o Reino, não permitiria a independência do povo Catalão. Ora, a Catalunha corresponde a 1/5 do território espanhol. Os catalães teriam que convencer, no mínimo, mais 2/5 do Reino a votar a seu favor. Um Reino, diga-se de passagem, de maioria castelhana. Sem contar que outros povos estariam decidindo sobre uma região que não lhes compete. Se os Catalães, no exercício da democracia que a Constituição da Espanha lhes confere, optaram por eleger deputados separatistas, esta é a vontade da maioria. E, os deputados, representando o povo que os elegeu, propuseram e aprovaram a Declaração de Independência da Catalunha em sessão do Parlamento. Se os seus representantes parlamentares, não tiverem legitimidade agir e decidir em seu nome, então quem terá? Os Castelhanos? Seria o mesmo que impor os rumos do Brasil à vontade dos Argentinos.

O povo Catalão tem o direito de autodeterminar-se, garantido pela Carta das Nações Unidas. Do contrário, praticamente nenhuma declaração de independência na história seria válida, devendo grande parte dos países hoje soberanos, retornarem

ao status

quo, época

de

vassalagem

às suas

ricas

Metrópoles. Ou alguém pensa que o Governo Português considerou legítima a Independência do Brasil? obs: a título de curiosidade, a 1ª Constituição de Portugal, datada de 23.09.1822, previa que a Nação Portuguesa seria formada pela União dos Reinos de Portugal e do Brasil. O Brasil havia se declarado independente 16 (dezesseis) dias antes.

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