A Indústria Cultural: o domínio leva à minoridade

July 6, 2017 | Autor: Pablo Martins | Categoria: Immanuel Kant, Cultural Industry
Share Embed


Descrição do Produto

1

A Indústria Cultural: o domínio leva à minoridade‫٭‬

Pablo de Oliveira Martins¹ `` Tenha coragem de te servir do teu próprio entendimento´´. (Immanuel Kant)

Resumo: O presente artigo tem por objetivo expor a relação entre a indústria cultural advinda do capitalismo e o controle exercido sobre os consumidores, na perspectiva crítica estabelecida pelos autores Theodor Adorno e Max Horkheimer² no livro Dialética do Esclarecimento, fazendo analogias com o conceito de minoridade contido no artigo, Resposta à pergunta: O que é o esclarecimento? escrito pelo filósofo Immanuel Kant em 1783. Procura-se indicar os meios, mais especificamente os meios culturais, utilizados pelo sistema capitalista para impor sua ideologia do consumo e produção, e exercer o pleno domínio sobre os consumidores, alienando da capacidade de pensar, ou seja, deixando-os em um estado de minoridade. Palavras-chave:

Indústria

Cultural.

Capitalismo.

Consumidores.

Domínio.

Minoridade.

Introdução:

A economia capitalista vem exercendo durante décadas o seu domínio, tendo como finalidade a obtenção de lucro se vale de meios para introduzir nos indivíduos o espírito consumista. Dentre esses meios está a indústria cultural que controla os veículos de comunicação e a formação intelectual e social das pessoas. Diante do monopólio cultural, os consumidores perdem sua autonomia e capacidade crítica, entrando no estado de minoridade. O desenvolvimento do artigo relaciona o domínio cultural com a formação de um homem ``menor´´, um ser não pensante, ou com o pensamento manipulado. Para tanto se baseia em textos críticos, que têm como objeto de estudo o esclarecimento

* Artigo apresentado como trabalho avaliativo de conclusão de período na disciplina de Filosofia/Ética do 1º período do curso de direito da Universidade Federal de Rondônia. ¹ Cursando do 1º período de direito da UNIR. ² Faziam parte do Instituto de Pesquisa Social fundado em 1923 na Universidade de Frankfurt. Conhecida também como Escola de Frankfurt, produziam estudos críticos com bases marxistas.

2

humano, são esses: o capítulo, A Indústria Cultural: o Esclarecimento como mistificação das massas, do livro Dialética do Esclarecimento; e o artigo Resposta à pergunta: O que é o esclarecimento? do filósofo iluminista Immanuel Kant.

1 A Indústria cultural e a minoridade dos consumidores. O homem moderno é um objeto de manipulação, dominado pelos interesses econômicos que enaltecem a relação consumo/produção. O poder do capital direciona-se, com todos os seus mecanismos e técnicas opressivas, para o lucro e elimina impiedosamente os obstáculos que impeçam o aumento da produtividade. Dessa maneira, as relações sociais e culturais, que moldam a sociedade e caracterizam o homem, revelam-se um negócio muito bem planejado a serviço da indústria. Essa, com o intuito de maximizar seu domínio e impedir desvios no sistema, produz e reproduz os meios culturais, expondo constantemente o homem à Ideologia que a legitima. ``O mundo todo é forçado a passar pelo filtro da indústria cultural´´. (ADORNO; HORKHEIMER. 1985, p. 118) A indústria cultural, como instrumento capitalista, reveste-se do espírito liberal que está alicerçado na lei da oferta e da procura, a lógica do mercado concebe um homem de duas faces: no espaço público laboral é a mão-de-obra produtora; na vida privada é o consumidor. O trabalhador é constantemente induzido a seguir ritmo da produção, inclusive nos momentos destinados ao lazer, onde a cultura se apropria da arte para perpetuar a ideologia do consumismo. Todos os meios de comunicação são racionalmente manipulados para não dar possibilidade de resistência aos consumidores, introduzindo nesses a ideia de que somente através da indústria cultural suas necessidades podem ser satisfeitas, consequentemente, o não integrado ao sistema não sobrevive. Segundo Adorno & Horkheimer (1985, p.125), os consumidores são mantidos tão bem presos em corpo e alma que sucumbem ao que lhes é oferecido pela produção capitalista. A estrutura industrial do trabalho-consumo, formada pela extrema especialização técnica, aliada ao controle dos meios sócioculturais, aliena o homem, não apenas no sentido de retirar o seu conhecimento sobre o próprio ofício, mas também em privá-lo de capacidades fundamentais à sua existência como animal racional. Pensar, observar e refletir são atividades proibidas, pois estas logo evidenciam a insustentabilidade do regime explorador. Assim, tutelar o ser consumista é imprescindível para a manutenção da economia de mercado. O estado de

3

minoridade, descrito por Kant, revela-se, então, como uma técnica de manipulação capitalista. Do mesmo modo, quanto mais arraigado estiver o consumismo, mais eficiente é a empresa na obtenção do lucro. A indústria busca introduzir naturalmente os bens de consumo na vida das pessoas, o cotidiano pré-fabricado se confunde com a natureza. Ou seja, o capitalismo, por meio de meios coercivos, como a publicidade, cria necessidades artificiais. Através da alienação cultural e do controle social sob os quais vivem os homens, a indústria cultural retira a autonomia e independência dos indivíduos, transformando-os em um seres ``acríticos´´, e incapazes de julgar o que é realmente necessário e o que é supérfluo. A razão humana fica paralisada em meio ao fluxo, cada vez maior, de informações, de forma que os estereótipos publicitários têm dispensado os indivíduos, de acordo com Adorno & Horkheimer (1985, p.146), do esforço de individualização em prol do esforço de imitação. No consumismo generalizado, a imitação do produto imposto pela indústria destrói os sensos de criatividade e reflexão da massa popular. O individualismo, tão associado ao pensamento liberal capitalista, na verdade, é ilusório, trata-se de mais um modelo fruto da indústria cultural. A pseudoindividualidade mascara o universalismo e a generalização que domina as relações de consumo. Todos os bens produzidos tendem a se uniformizar, as mínimas diferenças entre os produtos servem para manter a ilusão da concorrência e da possibilidade de escolha. De fato, os consumidores não são livres, a escolha é direcionada pela ideologia do mercado, e essa influência se dá, principalmente, através dos meios de comunicação que refletem a cultura manipulada. O homem, então, pensa e age da maneira como a indústria determina, torna-se um ser menor na visão de Kant. No artigo, ``Resposta à pergunta: O que é o esclarecimento?´´, Kant afirma que ``a minoridade é a incapacidade de se servir de seu próprio entendimento sem a tutela de um outro´´. O homem moderno, pois, encontra-se tutelado pelo sistema capitalista, e este, tendo o controle cultural e educacional, não permite que os seus subordinados ascendam ao esclarecimento. Nesse ponto, para Kant, o não-esclarecimento ou permanência no estado de minoridade é de responsabilidade das próprias pessoas que se acovardam diante da liberdade. Essa concepção estaria correta se as pessoas detivessem certa autonomia e controle sobre os meios culturais (espaço onde a razão

4

se expressa). As poucas que tem não conseguem sozinhas lutar contra o sistema e são logo sufocadas. Afinal, a indústria cultural exerce tamanho domínio na vida das pessoas que não abre espaço para que essas se revoltem ou resistam. Kant também afirma que ``é difícil para todo homem tomado individualmente se livrar dessa minoridade, pois já tornou uma espécie de segunda natureza´´. É o que a própria indústria cultural faz ao controlar o consumidor no trabalho e no lazer. Além do mais, os tutores ``emburrecem seus animais domésticos´´ para impedir que ``arrisquem o menor passo sem o andador que as sustenta´´ (KANT. 1783, p.2), o que seria, conforme o livro Dialética do Esclarecimento , ``o progresso da estultificação´´, algo como o domínio pela ignorância do outro. O poder econômico capitalista utiliza a indústria cultural como instrumento de persuasão e domínio sobre os consumidores, alienando-os da capacidade de pensar fora do sistema. ``O inimigo que se combate é o inimigo que já está derrotado, o sujeito pensante´´. (ADORNO; HORKHEIMER. 1985, p. 140). Salienta-se, porém, nas palavras do filósofo iluminista, que a minoridade não resulta da falta de entendimento, esse existe, o problema é que tem seu fim deturpado pela grande indústria. A racionalidade e o cientificismo, surgidos nos períodos áureos do esclarecimento humano (Renascimento, séc. XV-XVI; Iluminismo, séc. XVII-XVIII), destinam-se, hoje, à manutenção do poder capitalista. Os poucos indivíduos que conseguiram se livrar das ``amarras culturais´´ vivem em constante incerteza. Como na Alegoria da Caverna de Platão, quem sai da caverna se ofusca com a luz do sol. Pergunta-se, então: como é possível alcançar e esclarecimento e deixar a minoridade imposta pela indústria cultural? Segundo Kant, a liberdade leva o público a acender lentamente ao esclarecimento, mas revoluções, não modificam a maneira de pensar, apenas trocam as antigas ideologias por novos preconceitos. E vale a pena se excluir desse sistema tão bem organizado? Renunciar ao esclarecimento, e ser subjugado, ``significa lesar os direitos sagrados da humanidade´. (KANT, 1783, p.6).

Conclusões: Entender a lógica da dominação cultural é identificar os vícios do sistema capitalista,

onde

a

sociedade

é

estruturada

para

legitimar

o

ideal

do

consumo/produção. Os homens são manipulados pela indústria cultural com a finalidade de gerar mais lucro. E a razão humana é tutelada pela ideologia dominante. Contudo, a possibilidade da saída dessa tutela, ou estado de minoridade, existe para

5

os poucos que tiverem a coragem de enfrentar o sistema em busca do esclarecimento. Enquanto, a grande massa sucumbe diante da coercibilidade cultural que não lhe dá liberdade. Sabe-se que, ao longo da história, inúmeras culturas dominaram e foram derrubadas, e só o futuro irá dizer por quanto tempo a indústria cultural capitalista ainda exercerá seu domínio. O certo é que o atual regime econômico capitalista não sobrevive sem a indústria cultural que o sustenta.

The Culture Industry: the domain leads to minority

Abstract: This article aims to explain the relationship between the culture industry that comes from capitalism and the control exerted on consumers in the critical perspective established by the authors Theodor Adorno and Max Horkheimer ² in the book Dialectic of Enlightenment, making analogies with the concept of minority contained in the article, answer the question: what is enlightenment?, written by the philosopher Immanuel Kant in 1783. It is argued the means, more specifically the cultural means used by the capitalist system to impose their ideology of consumption and production, and to exercise full control over consumers, alienating the ability to think, or leaving them in a state of minority. Keywords: Culture Industry. Capitalism. Consumers. Domain. Minority.

Referências Bibliográficas:

ADORNO, T. W; HORKHEIMER, M. Dialética do Esclarecimento. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1985.

KANT, Immanuel. Resposta à pergunta: O que é o Esclarecimento?. 1783. Disponível em: < http://ensinarfilosofia.com.br/__pdfs/e_livors/47.pdf>. Acesso em: 01/07/2011.

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.