A indústria do Home Care e o abuso jurídico na relativização do contrato

June 7, 2017 | Autor: Denizom Oliveira | Categoria: Home Care, Processo Civil, Direito Civil, Direito à Saúde
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A indústria do Home Care e o abuso jurídico na relativização do contrato Segundo levantamento recente realizado pelo Núcleo Nacional das Empresas de Serviços de Atenção Domiciliar (NEAD), mais de um milhão de pessoas recebem atenção domiciliar no Brasil, seja de cuidados ambulatoriais residenciais ou internação em casa. De acordo com o NEAD, este mercado movimenta atualmente R$3 bilhões ao ano e permanece em constante crescimento, atingindo cerca de 230 mil empregos. Não há dúvidas de que o crescimento do setor está diretamente ligado ao aumento da expectativa de vida do brasileiro, bem como devido aos diversos benefícios gerados, tanto ao paciente, como a sua família, a partir da recuperação médica fora do ambiente hospitalar. Dentre tais números, destaca-se a origem de cada paciente antes de iniciado o atendimento domiciliar. Cerca de 4% dos pacientes são oriundos do serviço público, outros 26% são particulares, porém se destaca que 70% dos assistidos em domicílio são beneficiários de operadoras de planos de saúde, segundo o jornal O Estado de S. Paulo. Entretanto, surge um questionamento acerca deste elevado percentual a partir do fato de que esta espécie de atendimento não faz parte da lista de procedimentos obrigatórios oferecidos pelas operadoras de plano de saúde, exceto quando expressamente contido no contrato firmado entre a empresa ou cooperativa e o beneficiário: Qual seria o motivo de tamanho número de atendimentos domiciliares pelos planos de saúde? A resposta vem dos tribunais, especialmente do Superior Tribunal de Justiça. Ao analisar determinado caso concreto, o STJ entendeu que o contrato de plano de saúde pode estabelecer as doenças que terão cobertura securitária, mas não pode restringir a modalidade de tratamento a ser ministrado ao paciente, sendo o serviço de home care um desdobramento do atendimento hospitalar contratualmente previsto. Complementando este entendimento, posiciona-se o STJ no sentido de que mesmo que ausente a previsão contratual do atendimento domiciliar, este deverá ser prestado ao beneficiário, eis que deve preponderar a interpretação mais favorável ao segurado como aderente de um contrato de adesão. O caso teve a seguinte ementa junto ao Tribunal:

RECURSO ESPECIAL. PLANO DE SAÚDE. SERVIÇO DE HOME CARE. COBERTURA PELO PLANO DE SAÚDE. DANO MORAL. 1 - Polêmica em torna da cobertura por plano de saúde do serviço de "home care" para paciente portador de doença pulmonar obstrutiva crônica. 2 - O serviço de "home care" (tratamento domiciliar) constitui desdobramento do tratamento hospitalar contratualmente previsto que não pode ser limitado pela operadora do plano de saúde. 3- Na dúvida, a interpretação das cláusulas dos contratos de adesão deve ser feita da forma mais favorável ao consumidor. Inteligência do enunciado normativo do art. 47 do CDC. Doutrina e jurisprudência do STJ acerca do tema. 4- Ressalva no sentido de que, nos contratos de plano de saúde sem contratação específica, o serviço de internação domiciliar (home care) pode ser utilizado em substituição à internação hospitalar, desde que observados certos requisitos como a indicação do médico assistente, a concordância do paciente e a não afetação do equilíbrio contratual nas hipóteses em que o custo do atendimento domiciliar por dia supera o custo diário em hospital. 5 - Dano moral reconhecido pelas instâncias de origem. Súmula 07/STJ. 6 - RECURSO ESPECIAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. Não há que se questionar os benefícios do atendimento domiciliar na recuperação dos pacientes, como anteriormente mencionado. No entanto, o que se busca é compreender como estender a interpretação do contrato assinado pelo beneficiário para incluir um serviço pelo qual este optou por não contratar no momento de sua adesão. Quando um consumidor contrata determinado plano de saúde, opta pelo serviço que melhor lhe atende ou pelo que pode pagar. Por óbvio, quanto maior e melhor a rede credenciada, o gabarito dos profissionais, a quantidade e evolução tecnológica dos procedimentos, maior será o valor da contraprestação. Daí advém a necessidade de se ter um contrato específico para cada classe de serviço, contrato cujo teor inevitavelmente contém cláusulas limitativas ou restritivas, já que não se pode perder de vista a liberdade de contratar. Tais cláusulas, por sua vez, não visam suprimir qualquer direito ou ludibriar o consumidor, mas apenas explicitar os limites do que efetivamente será oferecido no plano escolhido/contratado.

O próprio STJ tem ratificado o posicionamento de que não se configuram como abusivas as cláusulas limitativas, desde que tenham sido estipuladas de forma clara, ainda que em contrato de adesão. Há que se ressaltar, inclusive, que o mesmo Tribunal já se posicionou sobre questão igualmente delicada, quando se posicionou contrário à cobertura de transplante de órgãos pelas operadoras de plano de saúde, vejamos: PLANO DE SAÚDE. TRANSPLANTE DE ÓRGÃOS. LIMITAÇÃO DA COBERTURA. POSSIBILIDADE. I - Em sendo clara e de entendimento imediato, não é abusiva a cláusula que exclui da cobertura contratual o transplante de órgãos. II - A clareza dos termos contratuais não está necessariamente vinculada ao modo como foram grafados. (STJ, Relator: Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, Data de Julgamento: 21/02/2006, T3 - TERCEIRA TURMA) Neste caso, ao contrário do anteriormente apresentado, o entendimento predominante foi o de que a cláusula de restrição não podia ser considerada como abusiva, já que redigida de forma a ser facilmente compreendida pelo homem médio, não se podendo impor ao plano o custeio de procedimento não coberto e que inclusive não consta na lista da ANS de procedimentos obrigatórios que devem ser oferecidos pelas operadoras de planos de saúde. Diante de tais fatos, pode se concluir que em ambos os casos apresentados, o objeto tratado não é um bem jurídico comum, mas um dos maiores e mais bem amparados pelo Direito: a vida. Ocorre que esta ponderação de princípios e interesses, que se faz necessária caso a caso, geralmente tende a favorecer a parte aparentemente hipossuficiente, o consumidor, mesmo imputando-se ao prestador do serviço um ônus expressamente não contratado pelo consumidor e que, na maioria das vezes, se mostra extremamente oneroso às operadoras de plano de saúde. Denizom Moreira de Oliveira Advogado – Andrade GC Advogados

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