A industrialização de Mato Grosso do Sul é influenciada pela condição de estado fronteiriço?

Share Embed


Descrição do Produto

A INDUSTRIALIZAÇÃO DE MATO GROSSO É INFLUENCIADA PELA CONDIÇÃO DE ESTADO FRONTEIRIÇO? Thayná Nogueira Gomes1 Lisandra Pereira Lamoso2 RESUMO Nos últimos anos o estado de Mato Grosso do Sul apresentou mudanças nas características de sua industrialização. O estado que não participou diretamente do processo de industrialização do país iniciado nos anos 1930, teve sua economia baseada na agropecuária, por isso desenvolve pouca experiência na atividade industrial. Contudo, com o passar dos anos, o estado começa a receber indústrias ainda pouco sofisticadas, mas que visam fomentar a economia estadual. No início do século XXI, novas indústrias começam a adentram o estado, tanto devido as políticas adotadas pelo governo federal, quanto pelas leis de renúncia fiscal do governo estadual, o que reconfigura o cenário industrial sul-mato-grossense. Objetivamos com essa pesquisa compreender se e em que grau a industrialização que ocorre no estado de Mato Grosso do Sul sob o recorte temporal de 2000 a 2014 – processo que denominamos de reestruturação espacial da indústria -, guarda relações com seu caráter fronteiriço, haja vista, que parte considerável de seu território, na porção oeste e sudoeste do estado, fazem fronteira com os países Bolívia e Paraguai. Palavras-chave: Industrialização. Mato Grosso do Sul. Fronteira. ABSTRACT In recent years the state of MatoGrosso do Sul presented changes in the characteristics of industrialization. The state did not participate directly in the country's industrialization process started in the 1930s, had its economy based on agriculture, so it develops little experience in industrial activity. However, over the years, the state begins to get even unsophisticated industries, but designed to promote the state economy. In the early twenty-first century, new industries begin to step into the state, both because of the policies adopted by the federal government, as the tax waiver laws of the state government, which reconfigures the South Mato Grosso industrial setting. We aim with this research to understand whether and to what extent industrialization occurring in the state of Mato Grosso do Sul in the time frame from 2000 to 2014 - a process that we call spatial restructuring of industry - keeps relations with its frontier character, given, that a considerable part of its territory in the west and southwest of the state portion, bordering Bolivia and Paraguay countries. 1

Doutoranda em Geografia pela Universidade Federal da Grande Dourados. Bolsista Capes. E.mail: [email protected] 2 Docente na Universidade Federal da Grande Dourados. E.mail: [email protected] VI Seminário Internacional AMÉRICA PLATINA (VI SIAP) e I Colóquio Unbral de Estudos Fronteiriços TEMA: “América Platina: alargando passagens e desvendando os labirintos da integração” Campo Grande, 16,17 e 18 de novembro de 2016 UEMS (Unidade Universitária de Campo Grande) ISBN: 978-85-99540-21-3

Keywords: Industrialization. MatoGrosso do Sul. Frontier. INTRODUÇÃO O estado de Mato Grosso do Sul, tem limites com Mato Grosso, Goiás, Minas Gerais, São Paulo e Paraná, e com os países Bolívia e Paraguai nas porções oeste e sudoeste do estado. Essa localização trouxe aspectos singulares ao processo de industrialização que se desdobrou no estado. Ao mesmo tempo em que o processo de industrialização do Brasil concentrou-se no Sudeste do país deixando assim Mato Grosso do Sul a priori, externo ao desenvolvimento industrial em curso desde a década de 1930, sua localização limítrofe com o estado São Paulo tornou-se importante elemento de inserção do estado a economia industrial paulista, na medida em que Mato Grosso do Sul assumiu a função de extensão da economia paulista. Ou seja, o estado exerceu suporte a economia do Sudeste, atuando como produtor de matéria-prima e fronteira agrícola, visando atender a demanda da recente economia industrial. Contudo, o papel exercido por Mato Grosso do Sul já no início da industrialização brasileira, consolidou sua economia com base na agropecuária e no extrativismo, que ainda hoje influencia a economia estadual, mas de forma diferenciada. A luz da categoria proposta por Santos (1977), formação sócio-espacial, buscamos compreender se a industrialização que ocorre no estado de Mato Grosso do Sul sob o recorte temporal de 2000 a 2014 – processo que denominamos de reestruturação espacial da indústria -, guarda relações com seu caráter fronteiriço, haja vista, que parte considerável de seu território, na porção oeste e sudoeste do estado, fazem fronteira com os países Bolívia e Paraguai, sendo nove municípios fronteiriços lindeiros. Como constructo teórico metodológico nos pautamos em autores como Santos (1977; 2012) que analisa as características da sociedade brasileira, Lencioni (1994) e Sposito (2007) que contribuem com uma análise ampliada da industrialização no país; e Lamoso (2011), Souza (2005) e Ribeiro-Silva (2016) que discorrem acerca das especificidades da industrialização estadual. Utilizamos a Classificação das Atividades Econômicas (CNAE 2.0) publicada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) para elencar os setores industriais analisados. Para quantificar as unidades industriais presentes no território sul-mato-grossense utilizamos os dados da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Econômico (SEMADE, 2015), assim como os dados da Federação das Indústrias do Mato Grosso do Sul (FIEMS, 2014) para identificar as indústrias instaladas no estado. Utilizamos também os dados dos censos agropecuários de 1996 e 20063 publicados pelo IBGE para análise do uso e cobertura da terra e os dados da Secretaria do Comércio Exterior (SECEX/MDIC, 2016) para mensurar a pauta da balança comercial do Mato Grosso do Sul. Dessa forma, visamos compreender a relevância fronteiriça para o processo de reestruturação da indústria sul-mato-grossense. Ademais, devido a característica agroprimáriamineral de sua estrutura produtiva (LAMOSO, 2011), faz-se necessário compreendermos como se configura os diferentes usos e cobertura da terra na estado, vejamos no item abaixo.

3

Utilizaremos os dados dos censos agropecuários de 1996 e 2006, devido à proximidade com nosso recorte temporal, a saber: 2000 – 2014, sendo o censo de 2006 o último publicado até o momento pelo IBGE. Devido às mudanças metodológicas aplicadas ao censo agropecuário de 2006, ficamos impossibilitados de realizar uma comparação mais precisa entre as mesorregiões, mas se observarmos o total estadual de área de pastagem em 2006, chegamos à 21.055.122 hectares de terras (IBGE, 2015), sinalizando uma sensível diminuição da área de pastagem no estado em dez anos.

VI Seminário Internacional AMÉRICA PLATINA (VI SIAP) e I Colóquio Unbral de Estudos Fronteiriços TEMA: “América Platina: alargando passagens e desvendando os labirintos da integração” Campo Grande, 16,17 e 18 de novembro de 2016 UEMS (Unidade Universitária de Campo Grande) ISBN: 978-85-99540-21-3

Mato Grosso do Sul e recursos naturais4 Em Mato Grosso do Sul a pecuária extensiva foi elemento fundamental para o povoamento da região desde quando Mato Grosso do Sul era conhecido como Sul de Mato Grosso – no período anterior a divisão do estado -, sendo até os dias atuais importante para a conformação da economia estadual. Devido a necessidade de grandes extensões de pastagens para a pecuária extensiva, vejamos como se configurou a pastagem no território sul-mato-grossense. Os dados do Censo agropecuário de 1996revelam que 21.810.707 hectares de terras estavam ocupados por pastagens, sendo que a maior parte delas, localizadas na mesorregião Leste de Mato Grosso do Sul (Ver quadro 1), que possuía 6.264.574 hectares de pastagens em 1996, seguida da mesorregião dos Pantanais com 5.985.666 hectares (IBGE, 2015), embora essa atividade se dispersasse por todo o território estadual. Quadro 1 - Utilização das terras por mesorregião em Mato Grosso do Sul. Utilização das terras em 31/12/1995 (há) Lavouras em Mesorregião SulÁrea total Lavouras Pastagens Matas descanso e mato-grossense (há) permanentes e naturais e naturais e produtivas não temporárias artificiais plantadas utilizadas Totais 30 942 772 1 383 711 21 810 707 5 877 739 522 128 Centro-norte 6 248 149 296 423 4 405 477 1 204 582 87 635 Leste 8 572 185 310 288 6 264 574 1 667 300 109 268 Dos Pantanais 8 824 907 23 636 5 985 666 1 978 060 187 857 Sudoeste 7 297 531 753 364 5 154 990 1 027 797 137 368 Fonte: IBGE. Censo Agropecuário de 1996. Adaptado.

As lavouras, que também fizeram parte desse processo, ocupavam em 1996, 1.383.711 hectares de terras no estado, passando a ocupar 2.051.256 de hectares em 2006, aumentando em aproximadamente 660.000 hectares em dez anos. Quando observamos os dados publicados pelo IBGE (2015) das lavouras temporária e permanente em 2013, a diferença nos valores se acentua ainda mais. Em 2013, as lavouras ocupavam 4.323.406 hectares de terras, sendo 4.318.120 hectares destinados à lavoura temporária, com destaque para o cultivo de soja, cana-de-açúcar, milho e algodão, produtos que figuram nas exportações do estado. Como o IBGE (2015) não disponibilizou os dados referentes à pastagem no estado em 2013, não pudemos estabelecer uma comparação ou uma relação causa/efeito com o aumento da lavoura, principalmente temporária. Nesse sentido, nos surgem indagações a respeito da área que está sendo apropriada pela lavoura, seriam essas áreas anteriormente de pastagem? Com o intuito de investigar o tema, trazemos para a análise os dados da pecuária de 1996 a 2014, que contém informações dos rebanhos. Em 1996, o estado continha um rebanho total de 31.971.345 cabeças, sendo que o rebanho de bovinos, bubalinos, equinos, asininos, muares, caprinos e ovinos continha 20.491.532, com 19.754.356 cabeças somente de bovinos. Nos anos de 2006 e 2010, o rebanho do estado continuou a crescer, chegando a 2010 com um total de50.066.732 cabeças, entretanto, já no ano de 2006 os rebanhos de suínos e aves ultrapassam em quantidade o rebanho de bovinos no estado. Em 2006 o rebanho de bovinos, bubalinos, equinos, asininos, muares, caprinos e ovinos representam 21.327.003 cabeças, que em 2010 aumenta para 23.244.295 cabeças, apresentando um tímido crescimento, mas em 2014 esse número diminui para 21.894.237 cabeças estado. Quando observamos os rebanhos de suínos e aves, o crescimento torna-se muito mais elevado; o rebanho de 4

Esse subitem foi editado para compor este artigo, porém, foi publicado anteriormente como o item 2.2 intitulado “Reestruturação dos setores industrias no Mato Grosso do Sul” como parte da dissertação. Ver: Gomes, 2016. VI Seminário Internacional AMÉRICA PLATINA (VI SIAP) e I Colóquio Unbral de Estudos Fronteiriços TEMA: “América Platina: alargando passagens e desvendando os labirintos da integração” Campo Grande, 16,17 e 18 de novembro de 2016 UEMS (Unidade Universitária de Campo Grande) ISBN: 978-85-99540-21-3

suínos em 1996 que era de 508.813 cabeças, em 2006 passa a ser 864.317 cabeças e em 2014 fecha com 1.217.651 cabeças. O rebanho que considera o número de aves no estado representava 10.971.000 em 1996, cresceu para 26.529.316 cabeças em 2014, sendo que em 2010 esse rebanho chegou ao número de 25.760.402 cabeças em todo o estado, caracterizando-se como o rebanho que mais apresentou crescimento em Mato Grosso do Sul, em um período de dezoito anos (IBGE, 2015). Como o crescimento do rebanho de bovinos, suínos e aves, explicaria a diminuição de pastagem no estado? Esse crescimento não deveria refletir em um crescimento também da área de pastagem? A resposta dessas indagações perpassa pelas mudanças no processo produtivo e das relações de produção, haja vista, que com a inserção do novo pacote tecnológico no campo, pode-se modernizar a produção, passando a pecuária a ser uma atividade intensiva, ou seja, utilizando a tecnologia foi possível produzir mais em menor espaço e em menor tempo, com o rebanho em confinamento. Ademais, a integração entre pequenos produtores e empresas do setor de carnes, possibilitou principalmente no que diz respeito ao rebanho de aves, aumentar sensivelmente o contingente do rebanho. A necessidade de se compreender a configuração do uso e cobertura da terra no estado está relacionada com a importância desses usos e/ou recursos naturais para a reestruturação da indústria no Mato Grosso do Sul. A balança comercial do estado, de certa forma refletindo a tendência nacional, pauta-se na exportação de commodities como soja e milho e em processamento de recursos naturais, como açúcares da cana e pasta química da madeira, o que de certa forma justificaria o crescimento da área de lavouras e silvicultura, nos casos da soja, cana e eucalipto. Assim como o setor de carnes, que representou em 2014 aproximadamente 18% de participação nas exportações e o setor de mineração com menos de 10% das exportações do estado (SECEX/MDIC, 2016). Parte da produção agrícola e os produtos da silvicultura não são exportados de forma bruta, haja vista, as políticas federais e principalmente estaduais que buscam a agregar valor ao produto do estado, para auferir maior lucro com as exportações. É nesse contexto que emerge as chamadas agroindústrias em Mato Grosso do Sul, aquecendo a produção de sua matéria-prima, recursos naturais e produtos semielaborados. O processo de reestruturação industrial de Mato Grosso do Sul, além de estar altamente vinculado a formação sócio-espacial do estado, tendo os recursos naturais como destaque, mantem forte relação com a retomada das políticas industriais (RIBEIRO-SILVA, 2016) e com a concessão de incentivos fiscais. Em escala federal, a intitulada Lei Kandir (nº 87/1996), desonera a indústria exportadora do pagamento de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), diminuindo os custos principalmente com o transporte de carga dentro do território nacional, visa melhorar a competitividade do produto brasileiro. Em escala regional, no período de nosso recorte temporal, de 2000 a 2014, temos a implantação da Lei nº 93/2001 – MS EMPREENDEDOR, ainda no Governo Zeca (1999 – 2003 e 2003 - 2007), que fora continuada pelo governo de André Puccinelli de 2007 até 2015, em seus dois mandatos. Os governadores de Mato Grosso do Sul, desde meados dos anos 2000 têm se emprenhado em atrair indústrias e agregar valor ao produto estadual, o fazendo por meio da concessão de incentivos fiscais, juntamente com o auxílio dos governos municipais, com a doação de terrenos, e outros benefícios que são concedidos à indústria pelo fato de se instalarem no território, sob a justificativa da geração de empregos. Estamos chamando de reestruturação industrial de Mato Grosso do Sul as mudanças ocorridas na espacialização da indústria no território, como também as alterações produtivas e tecnológicas trazidas pelas indústrias que adentraram o estado a partir dos anos 2000, sob o fomento de políticas de renúncia fiscal em todas as escalas governamentais. Essa nova face da industrialização do Mato Grosso do Sul modificou inclusive os usos e cobertura da terra em

VI Seminário Internacional AMÉRICA PLATINA (VI SIAP) e I Colóquio Unbral de Estudos Fronteiriços TEMA: “América Platina: alargando passagens e desvendando os labirintos da integração” Campo Grande, 16,17 e 18 de novembro de 2016 UEMS (Unidade Universitária de Campo Grande) ISBN: 978-85-99540-21-3

determinadas porções do território sul-mato-grossense e criaram-se estruturas produtivas capazes de atender essa nova demanda industrial inserida no estado. Vejamos então como a indústria está se reestruturando espacialmente, em meio a esse cenário de incentivos à industrialização em Mato Grosso do Sul. A nova face da indústria sul-mato-grossense O setor industrial em Mato Grosso do Sul passou por um período de crescimento entre os anos de 2000 a 2014. Em 2000 tínhamos 2.882 plantas industriais enquanto que em 2014 esse número se elevou para 7.419, crescendo 38,8% em quatorze anos. O crescimento das plantas industriais seu deu a princípio de 2001 a 2003, período em que temos os primeiros reflexos da implantação da Lei nº 93/2001 – MS EMPREENDEDOR, após 2003 passamos por um período de decréscimo das unidades industriais, voltando a crescer somente em 2007, primeiro ano do Governo Puccinelli no estado. No que diz respeito à espacialização dessas indústrias, analisando o Mapa 1, vemos que em 2000 localizavam-se em maior número nos quatro municípios principais do estado, escolhidos como “pólos de desenvolvimento” na década de 1970, na medida em que já possuíam uma economia mais organizada que os outros municípios e recebiam maiores investimentos públicos naquele período. Em 2014 percebemos que a indústria, apesar de manter-se em maior quantidade nos quatros municípios já mencionados, adensa também em municípios com pouca experiência industrial, fora dos chamados “pólos de desenvolvimento”, na busca por novos espaços atrativos à indústria. O mapa 1 assevera o crescimento acelerado da indústria no estado em pouco mais de dez anos, antes polarizada agora dispersa por todo o território, mesmo que ainda de maneira desigual. Em estudo anteriormente5 realizado foram analisados 20 segmentos do setor industrial em Mato Grosso do Sul, de acordo com a CNAE 2.0, foram eles: o setor de alimentos, o setor têxtil, vestuário, couros, metalurgia, minerais não metálicos, minerais metálicos, o setor de construção, impressão, bebidas, o setor de móveis, produtos de madeira, produção florestal, o setor de celulose e papel, borracha e materiais plásticos, máquinas e equipamentos elétricos, o setor de fármacos, químicos, veículos e reboques e o setor de biocombustível.

Mapa 1 - Espacialização das Indústrias no Mato Grosso do Sul em 2000 e 2014.

5

Ver: GOMES, 2016. VI Seminário Internacional AMÉRICA PLATINA (VI SIAP) e I Colóquio Unbral de Estudos Fronteiriços TEMA: “América Platina: alargando passagens e desvendando os labirintos da integração” Campo Grande, 16,17 e 18 de novembro de 2016 UEMS (Unidade Universitária de Campo Grande) ISBN: 978-85-99540-21-3

Dentre os 20 segmentos industriais analisados, oito estabelecem relações com a formação sócio-espacial do estado, principalmente pelo vínculo existente entre a atividade agropecuária preponderante na economia anteriormente estabelecida - e a indústria baseada no processamento de recursos naturais. Ou seja, essas indústrias ao utilizarem os recursos naturais presentes no território como matéria-prima, unem o agro à produção industrial, são as chamadas agroindústrias, que utilizam as rugosidades (SANTOS, 2012) presentes no território para viabilizar seu processo produtivo, criando assim estruturas favoráveis a sua reprodução. Nesse grupo se enquadram os setores de alimentos e couros, minerais metálicos, produção florestal, móveis, produtos de madeira, celulose e papel e biocombustível. De acordo com os dados da SEMADE (2015) esse grupo de segmentos industriais possuía o total de 32,04% das unidades industriais presentes no Mato Grosso do Sul em 2014. Por outro lado, há segmentos que se instalaram no estado visando usufruir dos benefícios fiscais garantidos pela Lei 93/2001 – MS Empreendedor, em que o governo concede um desconto de ICMS em até 67%. Essa iniciativa busca fomentar a indústria de transformação e assim agregar valor ao produto do estado, ademais, nas especificações dessa lei consta a preocupação em incentivar a instalação de indústrias em municípios que não possuem, ou que possuem poucas unidades industriais, além do intuito de gerar novos postos de trabalho. Fazem parte desse grupo os setores: têxtil, vestuário, metalúrgico, borracha e materiais plásticos, máquinas e equipamentos elétricos, minerais não metálicos e o setor de construção, sendo este o grupo que possuía maior quantidade de unidades industriais presentes em Mato Grosso do Sul em 2014, com 51,58% de seu total (SEMADE, 2015). Existem ainda alguns segmentos que consideram a atratividade e a especificidade do mercado consumidor como elemento preponderante para escolha do local de instalação da planta industrial, como: o setor de fármacos, químicos, veículos e reboques, impressão e bebidas, haja vista, que essas indústrias possuem alcance regional e/ou local. Dentro desse grupo de indústrias, há àquelas que são priorizadas pela lei de incentivos fiscais estadual e outras que não são, entretanto, compõe um grupo diferente dos elencados anteriormente, devido a opção metodológica de diferenciar as relações da indústria com o território de acordo com o elemento mister para a instalação dessas indústrias em Mato Grosso do Sul, nesse caso, o mercado consumidor. Espacialmente, as indústrias que mantêm relações com a formação sócio-espacial do estado, estão adensadas nos principais municípios sul-mato-grossenses: Campo Grande, Dourados, Três Lagos e Corumbá, além de em menores quantidades distribuídas pelos municípios do entorno desses polos. Isso ocorre porque essas indústrias, em geral grandes corporações agroindustriais de capital intensivo aglutinam em seu entorno elementos como: logística para escoamento, proximidade com a matéria-prima, ambiente político favorável, disponibilidade de mão de obra; que diminuem a mobilidade espacial dessas indústrias, mas possibilitam sua reprodução de capital e sua territorialização em determinadas porções do território, a exemplo do setor de carnes na mesorregião Sudoeste do estado e o setor de celulose e papel na mesorregião Leste do Mato Grosso do Sul. As indústrias que são atraídas pelos incentivos fiscais, possuem maior mobilidade espacial devido buscarem locais mais atrativos economicamente e que possibilitem a produção de uma produto mais competitivo no mercado, dessa forma, essas indústrias se espacializaram para além dos municípios polos, em municípios com pouca experiência industrial, o que permitiu a participação de outros municípios na industrialização estadual. Levantamos também destaque aos municípios que fazem limites com os estados de São Paulo e Paraná, sinalizando a instalação de indústrias do Sudeste em Mato Grosso do Sul principalmente como forma de diminuição dos custos produtivos, como o caso dos municípios de Mundo Novo e Eldorado no setor de vestuário e o município de Três Lagoas no setor têxtil.

VI Seminário Internacional AMÉRICA PLATINA (VI SIAP) e I Colóquio Unbral de Estudos Fronteiriços TEMA: “América Platina: alargando passagens e desvendando os labirintos da integração” Campo Grande, 16,17 e 18 de novembro de 2016 UEMS (Unidade Universitária de Campo Grande) ISBN: 978-85-99540-21-3

Como vimos, o grupo de segmentos industriais que se utilizaram de incentivos fiscais estadual, representavam a maior quantidade de unidades industriais presentes no estado em 2014. Entretanto, quando observamos a pauta da balança comercial sul-mato-grossense, o primeiro grupo – que considera as especificidades da formação sócio-espacial – se sobressai, figurando entre os cinco principais produtos exportados no estado em 2014: soja, mesmo que triturada (23,43%); pasta química da madeira (20,30%); carnes desossadas (11,13%); minérios de ferro não aglomerados (8,94%); outros açúcares da cana (6,68%), que somados representaram 70,48% das exportações do estado em 2014 (SECEX/MDIC, 2016). As indústrias desses segmentos usufruem principalmente da lei Kandir (87/1996), que ao desonerar o transporte de cargas dentro do território nacional, diminui os custos de escoamento da produção e incentiva a exportação. Os principais destinos dessa exportação são os países: China, no setor de celulose e papel e em menores proporções no setor de carnes e açúcar e álcool (28,23%); Argentina, no setor de minerais metálicos ou extrativo mineral (10,04%); Rússia, no setor de carnes (7,22%), Países Baixos – Holanda, no setor de celulose e papel, óleos vegetais e produtos de sua extração, como a soja, e também no setor de carnes (6,04%); e Itália no setor de celulose e papel, e couros (5,64%).Quanto as importações, o gás natural se destaca com 67,66% do total importado pelo estado, tendo a Bolívia como país de origem (SECEX/MDIC, 2016). Notem que os países fronteiriços não estão entre os destinos das exportações sul-matogrossenses e só aparecem em destaque nas importações, com a Bolívia, devido a importância do gasoduto Bolívia-Brasil, que adentra o território brasileiro através do município lindeiro de Corumbá, somando-se a outras fontes de energia para suprir a demanda energética do país, sobretudo a demanda da indústria. Ademais, o único país que pertence a América do Sul e figura entre os cinco principais destinos das exportações do estado é a Argentina, que não faz fronteira com Mato Grosso do Sul, mas usufrui da relação fronteiriça Brasil-Paraguai. Retomando a análise dos setores industriais, o único setor que estabelece, de fato, relação com o país fronteiriço é o setor de minerais metálicos com a produção de minério de ferro e manganês nos municípios de Corumbá e Ladário. Esse setor compreende a indústria extrativa conforme estabelece a CNAE 2.0: extração de minério de ferro e extração de minerais metálicos não ferrosos. Em geral as indústrias do setor se espacializam próximas às jazidas a serem exploradas, nesse caso, o Morro do Urucum (GOMES, 2016), como podemos observar no Mapa 2. Sendo que em Mato Grosso do Sul o “setor está basicamente formado pelos grupos Vale S/A, Vetorial Mineração S/A e Vetria Mineração S/A, que controlam as empresa Corumbá Mineração LTDA, Mineração Corumbaense Reunida S/A e MMX Corumbá Mineração LTDA [...]” (GOMES, 2016, p. 120).

VI Seminário Internacional AMÉRICA PLATINA (VI SIAP) e I Colóquio Unbral de Estudos Fronteiriços TEMA: “América Platina: alargando passagens e desvendando os labirintos da integração” Campo Grande, 16,17 e 18 de novembro de 2016 UEMS (Unidade Universitária de Campo Grande) ISBN: 978-85-99540-21-3

Mapa 2 - Espacialização do setor de minerais metálicos em Mato Grosso do Sul em 2007 e 2014.

Podemos ver que o setor de minerais metálicos não logrou grandes alterações entre os anos de 2007 e 2014, quando passou de dois municípios para três municípios atuantes no setor. Corumbá contemplando a maior parte das indústrias extrativas e Ribas do Rio Pardo e Campo Grande atuando na “exploração também de minério, em menores proporções, e para tratamento de resíduos industriais do setor. Contudo, a produção desses municípios é reduzida e partem de indústrias menores” (GOMES, 2016, p. 120). A concentração do setor nas mãos de alguns grupos de cadeia produtiva verticalizada e capital-intensivos, também são elementos que reduzem a mobilidade espacial do setor pelo estado, adensando-o em determinadas porções do território. A relação fronteiriça estabelecida no setor de minerais metálicos ocorre no escoamento da produção realizado através do rio Paraguai, que transporta a produção de minério de ferro e manganês que é exportado de Corumbá para a Argentina, no porto de San Nicolas, onde a produção de Corumbá, principalmente da subsidiária da empresa Vale, a Mineração Corumbaense Reunida, é escoada (VALE, 2016). Nesse trajeto, a estrutura logística de exportação interliga por meio da hidrovia Paraná-Paraguai, os países: Brasil, Paraguai e Argentina. Contudo, lembramos que o escoamento da produção mineral de Mato Grosso do Sul também ocorre por meio do modal ferroviário, que transporta a produção do setor ao mercado nacional e ao porto de Santos, onde ocorre a exportação. CONCLUSÃO A industrialização sul-mato-grossense de 2000 a 2014 é caracterizada por três grandes grupos em que os 20 setores industriais analisados se encaixam. O grupo que possuía maioria quantitativa de unidades industriais em 2014 foi aquele que considerou as políticas de renúncia fiscal como elemento sine qua non para a instalação das indústrias no território, estando espacialmente disperso pelos municípios de todo o estado e que apresentaram maior mobilidade espacial nesse período. Entretanto, o grupo que abrange as indústrias que se utilizam da formação sócio-espacial do estado para desenvolverem suas atividades produtivas, mesmo em menor quantidade, obteve maior representatividade nas exportações sul-mato-grossense em 2014, o que corrobora com a importância das recursos naturais para a economia de Mato Grosso do Sul, salientada no início do texto. Há ainda o terceiro grupo que considera principalmente o mercado consumidor para definir o local de sua instalação, esse grupo atua no mercado regional e local. Constatamos que os dois primeiros grupos se destacam na economia do estado, porém apresentando

VI Seminário Internacional AMÉRICA PLATINA (VI SIAP) e I Colóquio Unbral de Estudos Fronteiriços TEMA: “América Platina: alargando passagens e desvendando os labirintos da integração” Campo Grande, 16,17 e 18 de novembro de 2016 UEMS (Unidade Universitária de Campo Grande) ISBN: 978-85-99540-21-3

dinâmicas mais intrínsecas com os estados limítrofes, principalmente os estados do Sudeste e quando se trata de exportações com os países do hemisfério norte. As políticas de renúncia fiscal, com ênfase a lei 93/2011 – MS Empreendedor, atrai para o território sul-mato-grossense indústrias que guardam relações mais intensas com a economia do Sudeste e que se instalam no estado a fim de usufruir dos benefícios político-econômicos concedidos pelo estado, ganhando competitividade no mercado. A reestruturação da indústria sulmato-grossense enfatiza por outro lado o papel econômico das indústrias exportadoras processadoras de recursos naturais, que estabelecem incipientes relações com a condição de estado fronteiriço - exceto no que tange ao setor de minerais metálicos -, ganhando conotação de destaque quando se trata das importações, na medida em que o gás natural, como principal produto importado prepondera a Bolívia em sua condição fronteiriça. O setor de minerais metálicos, dentre os 20 analisados, mesmo com as mudanças ocorridas devido ao processo de reestruturação industrial de Mato Grosso do Sul, continua sendo o único a manter relações com os países fronteiriços, por meio da logística de escoamento da produção mineral. Sendo assim, a condição fronteiriça sul-mato-grossense, guardada as devidas proporções, não é elemento mister para a industrialização do estado. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS FIEMS. Cadastro Industrial: banco de dados. CD-ROM, Campo Grande, 2014. GOMES, T. N. A dimensão espacial do processo de reestruturação da indústria no Mato Grosso do Sul de 2000 a 2014. Dissertação (Mestrado em Geografia). Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Três Lagoas, 2016. 268p. LAMOSO, L. P. Dinâmicas Produtivas da Economia de Exportação no Mato Grosso do Sul – Brasil. Revista Mercator, Fortaleza, v. 10, n. 21, p.33-47, jan./abr. 2011. LENCIONI, S. Reestruturação urbano-industrial no Estado de São Paulo: a região da metrópole desconcentrada. Espaços & Debates, São Paulo, 1994, nº 38. RIBEIRO-SILVA, C. H. Política industrial brasileira e a industrialização de Mato Grosso do Sul no século XXI. 2016. 278f. Tese (Doutorado em Geografia). Faculdade de Ciências Humanas, Universidade Federal da Grande Dourados, Dourados, 2016. SANTOS, M. Sociedade e espaço: a formação social como teoria e como método, Boletim Paulista de geografia, São Paulo, nº 54, 1977. ______. A natureza do espaço: técnica e tempo, razão e emoção. 4 ed. 7 reimp. São Paulo: EDUSP, 2012. SOUZA, A. O. A polarização como estratégia de desenvolvimento regional: o caso de Mato Grosso do Sul. Home page do Centro de Estudos Humboldt, Buenos Aires, v. 1, p. 1-20, 2005. SPOSITO, E. S. Reestruturação produtiva e reestruturação urbana no estado de São Paulo. Scripta Nova, Barcelona, v. 11, n. 245 (69), 2007. Sites consultados

VI Seminário Internacional AMÉRICA PLATINA (VI SIAP) e I Colóquio Unbral de Estudos Fronteiriços TEMA: “América Platina: alargando passagens e desvendando os labirintos da integração” Campo Grande, 16,17 e 18 de novembro de 2016 UEMS (Unidade Universitária de Campo Grande) ISBN: 978-85-99540-21-3

CNAE 2.0 (2015). Disponível em: . Acesso em 20 ago. de 2015. VALE, 2016. Vale no mundo. Disponível em: . Acesso em: 04out. 2016. IBGE, 2015.Censo Agropecuário 1996 – Mato Grosso do Sul. Utilização das terras em 31.12.1995. Disponível em: . Acesso em: 23 ago. de 2015. SECEX/MDIC (2016). Banco de dados. Balança comercial dos estados: 2014 - Mato Grosso do Sul. Acesso em: 03 de out. de 2016. SEMADE, 2015. Banco do dados da Web: BDWEB. Disponível em: . Acesso em 26 ago. 2015.

VI Seminário Internacional AMÉRICA PLATINA (VI SIAP) e I Colóquio Unbral de Estudos Fronteiriços TEMA: “América Platina: alargando passagens e desvendando os labirintos da integração” Campo Grande, 16,17 e 18 de novembro de 2016 UEMS (Unidade Universitária de Campo Grande) ISBN: 978-85-99540-21-3

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.