A INFÂNCIA PARA O CAPITAL: O ACORDO PMF-BID

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A INFÂNCIA PARA O CAPITAL: O ACORDO PMF-BID BALBINOTTI, Hellen, UFSC, [email protected] MELGAREJO, Mariano Moura, UFSC, [email protected] SEKI, Allan Kenji, UFSC, [email protected] INTRODUÇÃO

Dinheiro público é para o serviço público! Essa é a insígnia do Sindicato dos Trabalhadores no Serviço Público Municipal de Florianópolis (SINTRASEM, 2015), cuja posição é contrária ao repasse de recursos públicos municipais para o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) previsto no acordo entre a Prefeitura Municipal de Florianópolis (PMF) e a instituição. Apoiado em pesquisa realizada pela Fundação Carlos Chagas (FCC), coordenada por Campos (2010), a pedido do Ministério da Educação (MEC) e do BID, o Acordo PMF-BID foi negociado desde 2012 e apresentado em nova versão em novembro de 2013 na qual declara: El objetivo general del programa es expandir la cobertura y mejorar la calidad de la educación de la EI y EF de la red municipal, asegurando el desarrollo de las múltiples dimensiones humanas de sus estudiantes, a través del acceso a servicios de jornada integral. (BID, s.d., p. 67). Trata-se aqui de examinar tal Acordo, discutir algumas de suas concepções e funestos desdobramentos para a Rede Municipal de Ensino (RME) caso não se organize alguma resistência coletiva.

METODOLOGIA Realizamos análise documental das duas fontes mais importantes do Acordo PMF-BID (BID, s.d.; 2013), associando-a a teorizações do campo marxista, particularmente referidas em 1 2

Acadêmica do Curso de Licenciatura em Pedagogia-UFSC. Bolsista PIBIC-CNPq-UFSC. Professor da RME. Mestrando em Educação-UFSC.

GT MARXISMO, EDUCAÇÃO E ESCOLA ANAIS do VII ENCONTRO BRASILEIRO DE EDUCAÇÃO E MARXISMO Belém, Universidade Federal do Pará, Maio de 2016. ISBN 978-85-7395-161-5

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Granemann (2012), Fontes (2010) e Mota Júnior (2016), bem como a outros documentos e autores não citados. Verificamos que o Acordo, orçado em U$ 118.430.000, prevê contrapartida de U$ 59.570.000 por parte da PMF, somados aos U$ 58.860.000 do BID, quantia a ser gasta em cinco anos e paga em até 25 anos com juros baseados na taxa LIBOR (BID, 2013). Esse valor, pela conversão simples ao dólar comercial, era de aproximadamente R$ 276.770,91 em meados de novembro de 2013 e R$ 473.720, na conversão simples, em 11 de janeiro de 2015. Ademais, o Acordo paga consultorias específicas a parceiros como a FCC, o Centro de Políticas Públicas e Avaliação da Educação (CAEd) da Universidade de Juiz de Fora-MG e a Universidade do Sul de Santa Catarina (UNISUL).

DISCUSSÃO O Acordo PMF-BID expressa a presença na rede municipal de um sujeito educador fundamental, o Capital, posto que considera fundamental una mejor calidad de la enseñanza en la formación de capital humano. (BID, s.d., p. 14). A formação de mão de obra, ou Capital Humano, segundo Mota Júnior (2016), é central para Organizações Multilaterais. Entretanto, o milagre prometido insiste em não acontecer: tal formação, associada ao desenvolvimento econômico, não vem reduzindo a pobreza no planeta. OM admitem que o crescimento econômico, por maior que possa vir a ser, não é suficiente para reduzir a pobreza e promover o desenvolvimento social. Daí que a diretriz proposta pelos organismos internacionais para as políticas sociais é a focalização na pobreza extrema, estimulando programas sociais compensatórios destinados ao cidadão-pobre, com renda abaixo da linha de pobreza. (MOTA JÚNIOR, 2016, p. 144). O documento do BID (s.d., p. 2) é cristalino: la Secretaría Municipal de Educación (SME) tiene responsabilidad en los niveles de Educación Infantil (EI) y Enseñanza Fundamental (EF), atendiendo a población de estratos socioeconómicos bajos. O seu intento é produzir profunda mudança na RME – beneficiando simultaneamente o setor de construção, entre outros parceiros –, em especial, no que diz respeito às avaliações de larga escala, atingindo os padrões internacionais da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), associados ao “serviço de jornada integral”; seleção adequada de gestores e professores; diretrizes curriculares condizentes e sistema competente de avaliação, especificamente para a Educação Infantil (EI) e primeiros anos do Ensino Fundamental. Professor Substituto no Centro de Ciências da Educação (CED), Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Mestre em Educação-UFSC. Doutorando em Educação-UFSC. Contribuiu ainda como orientadora e autora deste trabalho, a profa. Dra. Olinda Evangelista, [email protected] 3

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Tomando-se a EI, o projeto político PMF-BID desconsidera os conhecimentos produzidos pela própria rede, sua experiência e suas proposições. Se a expansão de vagas e os “serviços de jornada integral” ocorrerem tendo como objetivo os parâmetros internacionais, as produções e construções de professores da rede estarão em risco, bem como um projeto que considere as crianças e a socialização dos conhecimentos na perspectiva de suas emancipações como sujeitos históricos. Vincula-se frequência das crianças à EI, avaliação, sucesso escolar e futura empregabilidade, privilegiando a tomada do lugar da criança como objeto das políticas, ou seja, crianças-mercadorias, objetos secundarizados. Tal correlação, presente há décadas neste campo, secundariza a EI na socialização do conhecimento e no desenvolvimento integral de crianças que devem ser reconhecidas como sujeitos históricos e sociais da infância, O bordão da inclusão social, do benefício popular, do combate à pobreza faz desaparecer alunos e professores do Acordo, evidenciando um diálogo de mercado para mercado no qual bebês-alunos aparecem como trabalhadores do futuro numa cínica potencialização da mão de obra do porvir.

CONSIDERAÇÕES FINAIS As negociações entre o Brasil e instituições financeiras vêm de longa data, e essa relação intensificou-se substancialmente após a década de 1990, tendo sofrido uma mudança importante, pois podem ser operadas diretamente por governos estaduais e municipais. O compromisso do capital expresso no Acordo PMF-BID para a Educação municipal recrudesce justamente naquela década, quando um vasto projeto de reforma internacional foi articulado e disparado na famosa Conferência de Jomtien e seu slogan Educação para Todos, com repercussões para a América Latina e Caribe (ALC). O contrato em tela exprime, em nível local, um projeto de reforma que concretiza interesses político-econômicos capitalistas postos em andamento nos anos 90 do século XX, momento em que precisava responder a questões derivadas da crise dos anos de 1970 e que redundaram no neoliberalismo. O empréstimo integra um processo de longo alcance temporal de intervenção do capital. Ou seja, longe de cumprir um papel prestamista, o Acordo PMF-BID privilegia uma forma específica de realizar reformas educacionais em favor da acumulação de capital, expondo os fundos públicos à sanha financeira, com consequências importantes para as políticas sociais e para a vida da classe trabalhadora. O Capital está em busca constante de meios para contornar, ainda que sempre provisoriamente, os ciclos de crises próprios à acumulação capitalista. Isso implica necessariamente no alargamento da dinâmica de acumulação ao ponto de envolver na forma GT MARXISMO, EDUCAÇÃO E ESCOLA ANAIS do VII ENCONTRO BRASILEIRO DE EDUCAÇÃO E MARXISMO Belém, Universidade Federal do Pará, Maio de 2016. ISBN 978-85-7395-161-5

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mercantil o conjunto da vida social. Para uma economia capitalista-dependente como a nossa, diante da impossibilidade de lançar mão dos meios mais corriqueiros da violenta forma capitalimperialista, isso significará que as burguesias internas recorram, quase sempre, à apropriação, por um lado, do fundo público – tomado em abstrato – convertendo-o em fundo de acumulação do capital. Por outro lado, significa, quase que necessariamente, profundas alterações nas políticas sociais: nas reformas, ou melhor, contrarreformas, transferindo, assim, a riqueza social para o fundo de acumulação capitalista (GRANEMANN, 2012; FONTES, 2010).

PALAVRAS-CHAVE: Banco Interamericano de Desenvolvimento; Reforma educacional; Educação Infantil; Florianópolis.

NOTAS 1 - O trabalho contou com a orientação e a autoria da profa. Dra. Olinda Evangelista, professora voluntária no PPGE/UFSC. Bolsista CNPq.

REFERÊNCIAS BANCO INTERAMERICANO DE DESENVOLVIMENTO. Brasil. Proyecto de Expansión y Mejoramiento de la Educación Infantil y la Enseñanza Fundamental en Florianópolis (BRL1329).

Propuesta

de

Préstamo.

S.d.

Disponível

em:

<

http://idbdocs.iadb.org/wsdocs/getdocument.aspx?docnum=38240345>. Acesso em: 18 nov. 2015. BANCO INTERAMERICANO DE DESENVOLVIMENTO. Proyecto de Expansión y Mejoramiento de la Educación Infantil y la Enseñanza Fundamental en Florianópolis. 2013. Disponível em: < http://www.iadb.org/Document.cfm?id=38240345>. Acesso em: 18 nov. 2015. CAMPOS, Maria Malta (Coord.). Educação Infantil no Brasil: avaliação qualitativa e quantitativa.

2010.

Disponível

em:

http://idbdocs.iadb.org/wsdocs/getdocument.aspx?docnum=36817945. Acesso em: 18 nov. 2015. FONTES, Virgínia. O Brasil e o capital imperialismo: teoria e história. 2. ed. Rio de Janeiro: EPSJV/Editora UFRJ, 2010. GRANEMANN, Sara. Fundos de pensão e a metamorfose do “salário em capital”. In: SALVADOR, Evilásio; et al. Financeirização, fundo público e política social. São Paulo: Cortez, 2012. 317 p. GT MARXISMO, EDUCAÇÃO E ESCOLA ANAIS do VII ENCONTRO BRASILEIRO DE EDUCAÇÃO E MARXISMO Belém, Universidade Federal do Pará, Maio de 2016. ISBN 978-85-7395-161-5

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MOTA JÚNIOR, William Pessoa da. O Banco Mundial e a contrareforma da Educação Superior brasileira no Governo Lula da Silva (2003-2010). Universidade Federal do Pará. Instituto de Ciências da Educação. Programa de Pós-Graduação em Educação. Doutorado. Texto de Defesa. UFPA: Belém/PA, 2016. Mimeo. SINTRASEM. Sobre a pesquisa “Avaliação da qualidade e elaboração do sistema de monitoramento da Educação Infantil da rede Municipal de Florianópolis. 2015. Disponível em: http://sintrasem.org.br/content/sobre-pesquisa-%E2%80%9Cavalia%C3%A7%C3%A3o-daqualidade-e-elabora%C3%A7%C3%A3o-do-sistema-de-monitoramento-daeduca%C3%A7%C3%A3o. Acesso em: 6 fev. 2016.

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