A INFLUENCIA DA MÚSICA NO TEMPO E NA QUALIDADE DE PASSADAS DURANTE A MARCHA DA CRIANÇA COM PARALISIA CEREBRAL

August 25, 2017 | Autor: L. Poyares Musico... | Categoria: Physiotherapy, Music, Cerebral Palsy, Music Therapy, Movement disorders, March
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A influência da música no tempo e na quantidade de passadas durante a marcha da criança com paralisia cerebral The influence of music on timing and quantity of steps during gait in children with cerebral palsy Angela Maria Dias1 Marilena do Nascimento2 Carlos Bandeira de Mello Monteiro3 Silvia Regina Pinheiros Malheiros5

RESUMO

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Ludmila Christina Simões Poyares4

Este estudo objetivou verificar quantitativamente se a música influencia na locomoção de crianças com Paralisia Cerebral. Para tanto, foi utilizado o teste Time Up & Go, o qual mensura a mobilidade funcional do levantar, sentar e marcha. O teste foi aplicado a quatro crianças com diparesia espástica. A mensuração de tempo e número de passadas foi obtida, respectivamente, por meio de cronômetro e pedômetro, e verificou-se a ocorrência de diferença na execução da tarefa sem cantar e cantando uma música da preferência da criança. Os resultados demonstraram a existência de diferença média significativa entre a situação de cantar e não cantar, tanto em tempo quanto em passadas. Em ambas as variáveis, houve redução nos valores, quando se realizou a atividade cantando. A redução no tempo foi de 11,63s±2,65 para 9,38s±1,46, e em passadas foi de 15,75±3,91 para 11,08±5,26. Verificou-se que as crianças avaliadas realizaram com maior eficácia a tarefa quando utilizaram a música cantada como coadjuvante.

(1) Fisioterapeuta, Pós-graduanda em Tratamento de Reabilitação em Deficiência Física e Gestão Organizacional de um Centro de Reabilitação na Associação de Assistência à Criança Deficiente – AACD, São Paulo. (2) Musicoterapeuta, Chefe do Setor de Musicoterapia da AACD, São Paulo. (3) Fisioterapeuta, Doutor em Neurologia pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, Professor do Curso de Fisioterapia Aplicada à Pediatria das Faculdades Metropolitanas Unidas – FMU, São Paulo. (4) Musicoterapeuta, Professora do Curso de Musicoterapia das FMU, São Paulo. (5) Fisioterapeuta, Professora nas FMU, São Paulo.

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ABSTRACT

Descritores: Fisioterapia - Música - Paralisia cerebral - Transtornos motores - Marcha.

It was quantitatively verified if music influences the locomotion of children with Cerebral Palsy. For the accomplishment of this work, the test Time Up & Go was used, which measures the functional mobility to get up, sit down and gait. The test was applied to four children with spastic diplegia. The measurement of timing and number of steps was obtained, respectively, through chronometer and pedometer, and the occurrence of difference was verified in the execution of the task without singing and singing a song of the child’s preference. Results demonstrated the existence of mean significant difference between the situations of singing and not singing, as much in timing as in steps. Reduction in the values was observed when the singing activity took place. Reduction in timing ranged from 11.63s±2.65s to 9.38s±1.46s, and the number of steps ranged from 15.75±3.91 to 11.08±5.26). It was verified that the children accomplished with greater effectiveness the task when using music as adjuvant. Keywords: Physical therapy - Music - Cerebral palsy - Movement disorders - Gait.

Dias AM, Nascimento M, Monterio CBM, Poyares LCS, Malheiros SRP. A influência da música no tempo e na quantidade de passadas durante a marcha da criança com paralisia cerebral. Arquivos Brasileiros de Paralisia Cerebral 2009; 4(9):2-7.

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paralisia cerebral (PC), também denominada encefalopatia crônica não progressiva da infância, é consequência de uma lesão não progressiva que, tendo ocorrido no início do desenvolvimento do indivíduo, afeta o encéfalo em fase de maturação estrutural e funcional. É definida por Bower e Ashburn1 como uma desordem da postura e do movimento, persistente e não imutável causada por lesão no encéfalo em desenvolvimento, nos primeiros meses de infância ou, antes ou durante o nascimento. Tem como característica causar dificuldades variáveis na coordenação da ação muscular, com resultante incapacidade da criança em manter posturas e realizar movimentos normais2-5. Suas manifestações clínicas são bastante variáveis, porém o aspecto comum entre elas é a ocorrência de distúrbios no tônus muscular, postura e qualidade de movimentos. Déficits como comprometimento da cognição, dificuldades visuais e auditivas, bem como modificações adaptativas do comprimento muscular e até deformidades ósseas podem ou não se associar ao quadro sensório-motor6-8. Frequentemente, as crianças com PC deixam de desempenhar habilidades e funções comuns a indivíduos de mesma faixa etária que a sua9, pois a ocorrência dos sinais e sintomas característicos pelo aumento do tônus leva a alto risco para comprometimento do desenvolvimento neuropsicomotor2,10. Sendo assim, a independência funcional, ou pelo menos a avaliação do potencial de desenvolvimento que cada indivíduo tem para mobilidade, seja transferência ou locomoção, é parte importante dos objetivos de tratamento de uma equipe interdisciplinar para reabilitação da criança com PC. Considerando-se a funcionalidade, deve-se enfatizar que a marcha é um dos componentes básicos do funcionamento independente do ser humano, e por isso mesmo é objeto de estudo e foco de intervenção clínica em muitos trabalhos na área da fisioterapia11,12. Para tanto, é fundamental estabelecer definições adequadas das terminologias utilizadas na marcha. Norkin13 enfatiza a importância de padronizarmos a terminologia usada na descrição da marcha em diferentes estudos, e propõe que a maior unidade empregada em sua descrição seja denominada “ciclo da marcha”. Este ciclo inicia quando o calcanhar do membro de referência contata a superfície de apoio, e termina quando o calcanhar do mesmo membro contata novamente o solo. Enfatiza, ainda, que dois passos, um direito e um esquerdo, igualam uma passada, e uma passada é igual a um ciclo de marcha. A análise da marcha e, consequentemente, o tipo de intervenção clínica que o fisioterapeuta tradicionalmente oferece aos seus pacientes são centrados em aspectos biomecânicos. Para tanto, são descritos os padrões de movimentos utilizados e analisadas as forças envolvidas em sua produção. Sem dúvida, tais características são

importantes para o entendimento e para a intervenção sobre o fenômeno, mas não parecem ser suficientes para uma abordagem funcional da questão. A participação da criança em atividades terapêuticas para o desenvolvimento da marcha está diretamente relacionada ao seu interesse e motivação para com a proposta da atividade, ou seja, a criança não participará de uma determinada atividade sem que tenha interesse pessoal. Como forma alternativa às questões expostas, um dos recursos que o fisioterapeuta pode utilizar no seu atendimento é a música, a qual poderá propiciar um ambiente mais agradável e possibilitará melhor participação do paciente nas atividades propostas. No entanto, há que se considerar que a música pode exercer outras influências além de facilitar o contato entre paciente e terapeuta. Segundo Thaut14, a música é organizada no tempo, possuindo batidas rítmicas que ocorrem em intervalos previsíveis e consistentes. Essa qualidade da música permite que seja usada como um marcador de tempo para atividades físicas. Os estímulos rítmicos controlam o sincronismo associado com a ativação neural de movimentos motores, e esses movimentos podem ser potencializados, uma vez que o ritmo fornece sugestões para a previsibilidade de movimentos motores. No andar, o ritmo básico corresponde a sons iguais em sucessão, nos quais se pode variar a velocidade de execução. As crianças que apresentam dificuldades motoras podem se beneficiar do ritmo organizado de uma música para propiciar movimentos mais específicos e sincronizados durante a troca dos passos e na realização da marcha15. Seguindo essa linha de considerações, a utilização da música pode trazer elementos favorecedores ao desempenho da deambulação para crianças com PC. No entanto, é preciso que novas pesquisas sejam realizadas, integrando possíveis efeitos da música no desempenho deambulatório e a avaliação de aspectos da bio-metria da marcha. Desta forma, o objetivo do presente trabalho foi investigar possíveis influências da música no desempenho da marcha na criança com PC.

MÉTODO Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Projetos e Pesquisas da AACD - Associação de Assistência a Criança Deficiente, e foi desenvolvido após assinatura de termo de consentimento livre e esclarecido pelo(a) responsável legal dos pacientes. Foram avaliados quatro pacientes (duas meninas e dois meninos) com PC do tipo diparesia espástica, residentes na região metropolitana de São Paulo, com idade variando entre 6 e 12 anos. Optou-se por avaliar

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somente pacientes com características motoras de diparesia espástica por apresentarem predomínio de comprometimentos em membros inferiores e distúrbios da marcha observáveis na prática clínica. Os critérios de inclusão para a participação do estudo foram: diagnóstico médico de PC realizado por um médico neurologista infantil especializado na área e diagnóstico fisioterápico de diparesia espástica; tratamento na Clínica de Fisioterapia das Faculdades Metropolitanas Unidas em 2008. Participaram desta pesquisa apenas pacientes com nível II segundo o Gross Motor Function Classification System (GMFCS) traduzido para o português por Hiratuka16, que classifica crianças com PC em cinco níveis de acordo com a função motora. Isso significa que todos os pacientes avaliados tinham condições de andar sem dispositivos auxiliadores da mobilidade. Para a caracterização dos indivíduos e viabilização de um grupo bastante homogêneo utilizou-se, também, a Classificação Internacional de Funcionalidade Incapacidade e Saúde (CIF, 2003)17. Gunnar e Stucki18 citam que a CIF é um instrumento que pode ser utilizado para caracterização de grupos em pesquisas científicas. Segundo a Organização Mundial da Saúde, é um sistema de classificação útil para a organização de grupos homogêneos em pesquisas científicas, servindo como uma linguagem padronizada para a classificação da funcionalidade e capacidade. Os indivíduos selecionados para este trabalho apresentavam a mesma característica funcional no domínio de “funções do corpo” (funções neuro-músculo-esqueléticas e relacionadas ao movimento, assim como funções da voz e da fala) e no domínio de “atividades e participação”, considerandose a mobilidade e a comunicação. Optou-se por esses domínios, pois são os mais importantes para viabilizar a execução da tarefa proposta de andar e cantar uma música ao mesmo tempo. Desta forma, considerando-se as funções do corpo, os indivíduos avaliados apresentavam funções músculo-esqueléticas com padrão da marcha classificado como deficiência moderada (b770.2); tônus dos músculos da metade inferior do corpo também classificado como moderado (b7353.2); e funções da fala de fluência e ritmo classificadas como deficiência leve (respectivamente, b3300.1 e b3301.1). Considerando-se as atividades e participação na mobilidade, os indivíduos conseguiam sentar-se sem dificuldades (d4102.0), mas apresentavam dificuldade leve para levantar-se (d4104.1) e dificuldade moderada para andar distâncias curtas (d4500.2). Na comunicação não apresentavam dificuldade em recepção de mensagens orais (d310.0), mas apresentavam dificuldade leve na produção da fala (d330.1). Importante enfatizar que um indivíduo não apresentava dificuldade na fala (d330.0).

Os critérios de exclusão foram: presença de deformidades osteoarticulares estruturadas em quadril, joelhos ou tornozelos; realização de cirurgia ou bloqueio químico neuromuscular há menos de seis meses; pacientes com níveis I, III, IV e V do GMFCS; outras doenças associadas; e alterações nas funções cognitivas que impedissem a colaboração e compreensão de ordens simples nas atividades propostas. A avaliação utilizada para mensurar a marcha dos pacientes foi o teste Time Up & Go (TUG), o qual mensura a mobilidade funcional que envolve equilíbrio, força dos músculos de membros inferiores e velocidade da marcha. Para tanto, solicita-se ao paciente que levante de uma cadeira com descanso para os braços e deambule três metros, pare, retorne e sente novamente, enquanto o tempo em segundos para realizar esta tarefa é cronometrado19. Esse teste foi idealizado por Mathias et al. e modificado por Podsiadlo e Richardson20, para avaliar a mobilidade funcional em idosos frágeis. É considerado um teste simples sem utilização de equipamentos específicos. Dessa forma, o tempo gasto para a realização do teste está diretamente associado ao nível da mobilidade funcional. Tempos reduzidos na realização do teste indicam indivíduos independentes quanto à mobilidade. Já indivíduos que o realizam em tempo superior a 20 segundos tendem a ser mais dependentes nas suas tarefas diárias21. Para possibilitar a aplicação do teste na paralisia cerebral, realizou-se modificação somente no local de partida. Como as crianças têm dificuldade em descer de cadeira para adultos, optou-se em realizar a posição inicial e final em banco sem apoio dos braços, considerando-se altura ideal aquela em que a criança consegue se manter sentada com flexão das pernas e coxas de 90°. Para este trabalho utilizou-se também cronômetro para mensurar o tempo de deslocamento e pedômetro para realizar a contagem das passadas. O cronômetro registra tempos em centésimos de segundo (1\100 segundos) e pode ser parado e retomado do ponto de parada. O pedômetro eletrônico é um aparelho simples, definido como um contador mecânico que grava o tempo e os movimentos de passos em resposta à aceleração vertical do corpo, e foi desenvolvido para avaliar o comportamento do indivíduo durante a marcha, efetuando o registro do número de passos dados e da distância percorrida. Tem a potencialidade de providenciar, a custos reduzidos, medições objetivas e precisas da atividade física diária relativa ao deslocamento a pé22,23, e tem como proposta estimar o número de passos dados por meio do registro das oscilações verticais do corpo24. Para a execução deste trabalho foi realizada a classificação motora grossa em todos os pacientes por meio

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da aplicação do GMFCS e da CIF. Após as classificações, o TUG três vezes em cada paciente, com a utilização do pedômetro que foi fixado na região da crista ilíaca ântero-superior esquerda do paciente, cronometrandose o tempo realizado na tarefa de levantar do banco, andar 3 metros, retornar e sentar no banco. Finalizou-se a cronometragem quando a criança adquiriu a posição de partida, ou seja, sentada com coxas perpendiculares ao banco e flexão de pernas e coxas de 90º. Após as três tentativas repetiu-se o teste, novamente três vezes, mas dessa vez a criança teria que andar e cantar uma música de sua escolha e preferência durante toda a realização do teste. A escolha da música foi feita por meio de uma Anamnese Musical com a criança e o responsável para verificar a música de sua escolha e seu prévio conhecimento. Foi utilizado o teste t de Student pareado para comparar os resultados das avaliações do TUG sem cantar e cantando, e o teste de correlação de Pearson para medir o grau de relação entre tempo e passadas, que foram aplicados a partir do programa SPSS (Statistical Package for Social Sciences), versão 11.0.

RESULTADOS Na Tabela 1 estão caracterizados os quatro pacientes que participaram do estudo, e na Tabela 2 se encontram os resultados médios de tempo e passadas nas duas situações estudadas: “Cantando” versus “Sem Cantar”. Na primeira tabela se observa homogeneidade da amostra em relação ao sexo e ao nível motor dos pacientes, apesar da diferença cronológica. A aplicação da CIF permitiu um grupo bastante homogêneo também no que tange a funções do corpo e atividades e participação.

Na Tabela 2, por sua vez, observamos valores médios de tempo e quantidade de passadas significativamente diferentes nas situações de cantar e não cantar. Em ambas as variáveis, houve redução significativa nos valores médios obtidos.

COMENTÁRIOS É importante esclarecer que, nas atividades de vida diária, é comum o envolvimento do indivíduo em duas tarefas ao mesmo tempo. Teixeira e Alouche25, ao interpretarem o trabalho de Sylwan et al.26, citam que a capacidade de realizar dupla tarefa (realização de duas tarefas simultaneamente) é altamente vantajosa e um pré-requisito para uma vida normal. Uma caminhada, por exemplo, permite a comunicação entre pessoas, assim como o transporte de objetos de um local para outro necessita do monitoramento concomitante do ambiente para evitar acidentes. Realizar dupla tarefa é fundamental para propiciar funcionalidade no diaa-dia, e a investigação da influência de dupla tarefa na paralisia cerebral é importante para a organização do tratamento fisioterápico. Nas circunstâncias de realização de dupla tarefa, é comum o envolvimento de atividades motoras e cognitivas. Quando isso ocorre, a tarefa motora pode ser desempenhada automaticamente, ou seja, sem o envolvimento direto da atenção e/ou da consciência sobre a sua execução. Esse estágio autônomo do desempenho de uma habilidade motora é alcançado a partir de um processo de aprendizagem motora27. Segundo Schmidt e Wrisberg28, a aprendizagem motora é o conjunto de processos associados à prática, treinamento e experiência que promovem mudanças relativamente permanentes no comportamento motor. A

Tabela 1. Idade e sexo dos pacientes, nível ao GMFCS e à CIF. Paciente

Idade

Sexo

GMFCS

1

11 anos

Masculino

II

2

12 anos

Feminino

II

3

6 anos*

Feminino

II

4

8 anos

Masculino

II

CIF Funções do corpo

b770.2; b7353.2;

Atividades e Participação

d4102.0; d4104.1; 4500.2;

b3300.1 e b3301.1 d310.0; d330.1 e d330.0

* Único indivíduo sem dificuldade na fala (d330.0).

Tabela 2. Comparação Sem Cantar vs Cantando.

Sem cantar Cantando

Tempo Média (Desvio-padrão) 11,63 (2,65) 9,38 (1,46)

Passadas* Média (Desvio-padrão) 15,75 (3,91) 11,08 (5,26)

Valor calculado de “p” 0,002 0,023

*Considerou-se número de passadas o número de vezes que o calcanhar esquerdo do paciente tocou no chão.

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aprendizagem motora investiga os fatores que influenciam a aquisição de habilidades motoras e mecanismos e processos subjacentes a essa aquisição29,30. Quando o aprendizado ocorre, ambas as tarefas podem ser executadas de modo simultâneo, sem o prejuízo de uma ou da outra. Caso haja prejuízo do desempenho de uma das atividades, isso implica que não ocorreu a automatização, e nesse caso ocorrerá prejuízo na ação de uma das tarefas propostas. Essa piora no desempenho funcional é uma das consequências da atividade dupla, principalmente se a atividade for nova para o executante31. Uma modificação no aprendizado motor, durante uma dupla tarefa, principalmente quando se junta tarefa motora e cognitiva, pode ser um importante indicador do estado funcional em que se encontra um indivíduo durante um estado de saúde ou durante um período de reabilitação. Na literatura, essa alteração é normalmente referenciada como interferência motora-cognitiva27. Após uma lesão cerebral, pode surgir a interferência motora-cognitiva, e atividades facilmente automatizadas passam a requerer um processo controlado, com aumento da demanda atencional e maior interferência no desempenho motor, o que implica um prejuízo durante a realização de dupla tarefa32. Para este trabalho, optou-se em verificar as diferenças entre a execução da tarefa de somente andar comparando com a influência de dupla tarefa (motora e cognitiva), na qual pacientes com paralisia cerebral executaram o andar juntamente com o cantar uma música de sua preferência. Para tanto, optou-se por avaliar o tempo de execução da tarefa e o número de passadas, e é importante enfatizar que a hipótese era a de que crianças com paralisia cerebral levariam maior tempo e utilizariam maior número de passadas na execução da dupla tarefa. No entanto, os resultados mostraram exatamente o contrário, evidenciando que a execução de uma

atividade, aparentemente, facilitou a execução da outra, e, dessa forma, os valores com a dupla tarefa diminuíram tanto no tempo como no número de passadas. Tallis et al.33 e Teixeira e Aloche25 realizaram trabalhos com pacientes com acidente vascular encefálico (AVE) e Mal de Parkinson, e verificaram diferença significativa em dupla tarefa, quando os pacientes aumentaram o tempo de execução da tarefa quando foi realizado o andar conjuntamente com uma tarefa cognitiva. Yang et al.34 também verificaram que dupla tarefa motora acarreta aumento na velocidade de execução das tarefas. Não observarmos a consequência dessa atividade dupla como fator que dificulta a execução da tarefa, que poderia ser evidenciada por aumento do tempo ou do número de passadas na execução da marcha com o cantar. Provavelmente o fator motivação, representado pela utilização da música durante a marcha, foi benéfico para a melhora da tarefa. Outros estudos deverão investigar as diferentes influências (emocionais, lúdicos ou fisiológicos) que a música pode ter sobre a mobilidade de crianças com paralisia cerebral. A motivação do paciente que realiza dupla tarefa com a música de sua escolha e de seu prévio conhecimento pode facilitar a realização dessa tarefa. A música previamente conhecida mobilizou a atividade proposta, aumentando a concentração, e a pulsação da música coincidiu com o próprio aumento da marcha do paciente. Apesar da verificação de que o cantar auxiliou na realização da tarefa de marcha em tempo e número de passadas, não foi avaliada a qualidade dessa marcha. Portanto, é importante o incentivo a outras pesquisas com grupo maior de participantes que investiguem a real influência dessa atividade dupla e a qualidade da marcha.

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