A influência de certos termos socialmente salientes (nexus) e da imagem sobre a percepção de um objeto social

July 22, 2017 | Autor: Rafael Pecly Wolter | Categoria: Social Representations, Affect/Emotion, Affect Studies
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A influência de certos termos socialmente salientes (nexus) e da imagem sobre a percepção de um objeto social Rafael Pecly Wolter Michel-Louis Rouquette1

Resumo

Abstract

O objetivo deste trabalho é observar a influência de uma forma específica do pensamento social chamada nexus sobre a implicação psicossocial. Concretamente foi estudado o papel de certos termos socialmente salientes e afetivamente marcados nas três dimensões da implicação psicossocial. Também foi observado como uma imagem e estes termos se juntam para implicar os participantes. Para responder a estas questões foi utilizado o método experimental, com uma amostra de 109 participantes, onde as variáveis independentes foram a etiqueta (nenhuma etiqueta versus “catástrofe natural” versus “tsunami”) presente no texto e a ativação lexical (texto com imagem versus texto sem imagem). A variável dependente foi a implicação psicossocial dos participantes. Os resultados demonstram que tanto as etiquetas quanto as imagens aumentam a implicação psicossocial, agindo em duas dimensões, a valorização do objeto e a possibilidade percebida de ação. A etiqueta “tsunami” aumenta radicalmente a implicação tendo um efeito significativamente maior que a etiqueta “catástrofe”, resultado explicado pela maior carga afetiva do termo “tsunami”.

This experimental research aims to explore the effects of a specific form of social thinking called nexus on an individual’s personal involvement with regard to a social object. This study (n = 109) focuses on the influence of affective and socially salient items on the three dimensions of personal involvement with regard to a social object, when it’s labelling is associated vs. non-associated with an image. The independent variables are (1) the type of label presented to participants (“natural catastrophe”, “tsunami”, or no label at all) and (2) the type of lexical activation (label only, vs. image added to label). Participants’ personal involvement is a dependent variable. Results show that personal involvement increases when participants view an image in addition to label. This increase concerns significantly two of the dimensions of personal involvement, namely participants’ perceived possibility of action and their object’s valuation. Moreover, the label “tsunami” increases participants’ personal involvement significantly more than the label “natural catastrophe” does. This result is explained by reference to the affective charge of the term “tsunami”.

Palavras-chave: Implicação. Pensamento social. Nexus. Imagem.

Keywords: Personal involvement. Social thinking. Nexus. Image.

1 Université Paris-Descartes, Laboratoire de Psychologie Environnementale CNRS UMR 8096, Institut de Psychologie, 71 av. Edouard-Vaillant 92100 Boulogne-Billancourt, France. E-mails: [email protected] e [email protected]. 2 Em francês: “font corps et sens”. 3 O que chamamos de efeito etiqueta. Ver Rouquette, 1994, para mais detalhes.

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Geralmente opomos ao pensamento científico o pensamento social. Este seria o domínio da insuficiência, da irracionalidade, onde erros e vieses proliferam. O pensamento científico seria, ao contrário, objetivo e eficaz. Esta antinomia nos parece um pouco ultrapassada. Para Rouquette (1988), os processos cognitivos que ocorrem no pensamento social são ligados uns aos outros e não acontecem de forma aleatória. Assim sendo, podemos afirmar que eles formam um “corpo”. Estes processos cognitivos fazem sentido2 porque “[...] suas ocorrências, a propósito de um certo objeto, são quase sempre a assinatura de uma posição social particular” (ROUQUETTE, 1988, p. 33). O pensamento social não pode ser reduzido a um pensamento irracional, repleto de vieses; ele é “[...] um pensamento diferente” (GUIMELLI, 1999, p.18), com sua lógica própria. A noção de nexus introduzida por Rouquette (1994) é uma forma específica de conhecimento social; ela se estrutura como nódulos afetivos pré-lógicos compartilhados por um grande número de pessoas dentro de uma sociedade. O autor descreve os nexus como núcleos afetivos, porque eles ligam entre elas várias atitudes afetivamente carregadas, que não atingem a consciência e por esta razão são pré-lógicos. Os nexus explicariam certos comportamentos, como as mobilizações coletivas. Eles constituem referências enraizadas para certas comunidades de pessoas e se manifestam na forma de opiniões e atitudes polarizadas, onde o meio termo e a hesitação não existem. Na presença de um nexus, as pessoas são a favor ou contra. Para ilustrar esta polarização, basta pensar no nexus nazista; se afirmamos que algo é nazista os estudantes o rejeitarão massivamente3. Estes termos não são simples eventualidades lexicais, porque “[...] suas realidades cognitivas e coletivas pesam nas condutas dos indivíduos e das massas” (ROUQUETTE, 1994, p.68). A mobilização que apaga as diferenças intergrupais é uma das características dos nexus. Esta mobilização resulta do caráter afetivo destas “etiquetas” que são os nexus. Na presença de um nexus, a razão perde sua influência, os sentimentos predominam. Para Rouquette os nexus respondem às seguintes características: 1. Um caráter coletivo, pois são compartilhados pela maioria dos membros de uma comunidade. 2. São mobilizadores e apagam por um tempo as diferenças inter e intragrupais. 3. São ativados essencialmente em períodos de crise e perigo. 4. O nexus não é uma elaboração do real, mas uma elaboração do imaginário social. É uma elaboração que não é redutível a um conteúdo particular, é então um “quase-conceito”. 5. Um só termo traduz um nexus. Nenhum termo equivalente pode substituir este termo único. Por exemplo, nacional-socialista não é um nexus, nazista sim. Revista de Educação Pública, Cuiabá/MT, v. 15, n. 29, p. 79-89, set.-dez. 2006

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6. Enfim, a ênfase é a forma de expressão discursiva privilegiada dos nexus. Acreditamos que os nexus reforçam a implicação das pessoas diante do objeto. A variável psicossocial chamada implicação, definida por Rouquette (2003), possui três dimensões supostamente independentes. A primeira dimensão chamada identificação pessoal pode ser definida por uma escala com dois extremos opostos, um onde o objeto atinge os sujeitos pessoalmente e especificamente, e outro onde o objeto atinge todas as pessoas (e não atinge o sujeito mais que qualquer outra pessoa). A segunda dimensão denominada valorização é relativa à importância do objeto para uma pessoa ou um grupo e pode ser definida pela escala que vai do extremo “é uma questão de vida ou de morte” ao extremo oposto “é uma questão sem importância”. A última dimensão é a possibilidade percebida de ação (ou PPA), que traduz a posição sentida da pessoa que se sente como um atuante e acha que sua ação terá um peso, ou que se sente como um paciente e acredita nada poder alterar. Devido à natureza mobilizadora e pré-lógica dos nexus, parece-nos que a PPA e a valorização seriam as dimensões onde os nexus operariam. Por esta razão acreditamos que na presença de uma “etiqueta” as pessoas se sentiriam mais envolvidas, o que se notaria nas medidas da PPA e da valorização. Campos e Rouquette (2003) obtiveram resultados que comprovaram a validade de uma ativação significativa da dimensão afetiva com uma consignação atributiva e com uma indução por imagem. Na seqüência destes resultados, pretendemos ver se a presença de uma imagem reforça o efeito das “etiquetas” na implicação psicossocial. Para testar o efeito dos nexus, associados ou não a uma imagem, sobre a implicação psicossocial, utilizaremos o método experimental no qual, dependendo do grupo, haverá um texto com um termo afetivo (tsunami) ou não afetivo. Cada termo (afetivo versus não afetivo) terá uma condição experimental com ou sem imagem.

Experimentação Variáveis independentes O objetivo desta pesquisa é ver se uma etiqueta e uma imagem tornam um objeto mais implicativo. O plano experimental é do tipo 3*2 onde manipulamos duas variáveis independentes, uma com três modalidades (etiqueta) e outra com duas (tipo de indução). Na experimentação está presente uma imagem e um curto texto, onde é descrita a situação de uma região destruída. Dependendo da condição a devastação é atribuída a um “tsunami”, a uma catástrofe natural, na última condição nenhuma atribuição é feita. A palavra tsunami foi escolhida devido à forte Revista de Educação Pública, Cuiabá/MT, v. 15, n. 29, p. 79-89, set.-dez. 2006

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mobilização da população francesa que seguiu o evento de dezembro 2004 na Ásia. Milhões de pessoas doaram dinheiro para as diferentes organizações humanitárias, e um movimento solidário raramente visto ocorreu no início do ano 2005. Antes da catástrofe, tsunami era uma palavra pouco usada na língua francesa, em apenas um dia virou um objeto “social”. O termo “tsunami” foi escolhido por ter mobilizado milhares de pessoas e também porque acreditamos que ele implicará de modo diferente as pessoas, pois catástrofes naturais ocorrem regularmente na França e tsunamis não. Associamos ao curto texto uma imagem que serve como suporte tanto para a condição “catástrofe” quanto para a condição “tsunami”. A foto mostra um cenário de destruição compatível com o texto apresentado aos participantes. Como descrevemos anteriormente, a primeira variável independente (VI1) é a ativação lexical com duas modalidades: exclusivamente textual, ou contando com a presença de uma imagem associada ao texto. A outra variável independente (VI2) é a etiqueta presente no texto, com três modalidades; na primeira condição, atribuímos a destruição a uma catástrofe, na segunda, a um tsunami e na última condição, nenhuma etiqueta está presente no texto. Quadro 1 - Resumo das seis variáveis dependentes Ativação Imagem+Texto Texto

Sem etiqueta Grupo 1 Grupo 4

Etiqueta Catástrofe Grupo 2 Grupo 5

Tsunami Grupo 3 Grupo 6

Queremos nesta pesquisa verificar a influência de uma etiqueta e de uma imagem sobre a implicação psicossocial dos participantes; então as variáveis dependentes são relativas às três dimensões da implicação. Para medir a valorização, perguntamos aos participantes a importância que eles dão ao evento descrito. As respostas eram dadas numa escala de Likert com cinco alternativas, indo do extremo “importante” ao extremo “irrelevante”. A escala vai de +2 (importante) a -2 (irrelevante); convém ressaltar que, sendo uma escala com cinco alternativas, existia uma alternativa neutra entre os dois extremos. Para medir a identificação pessoal dos participantes, usamos o mesmo procedimento descrito acima, ou seja, uma escala com cinco alternativas em resposta à pergunta “este acontecimento o envolve pessoalmente?”. No que se refere à PPA, usamos duas perguntas como medida. Na primeira, perguntamos aos participantes se eles estão dispostos a ajudar (financeiramente) as vítimas da destruição. Duas respostas eram possíveis; sim e não. Na segunda pergunta, indagamos aos participantes que aceitaram ajudar as vítimas, o montante em euros que eles estariam dispostos a oferecer.

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Temos então quatro variáveis independentes, duas variáveis ordinais (notas na escala de Likert) que medem a valorização e a identificação. A PPA é medida por uma variável binária e uma variável numérica. Os participantes terão em mãos um questionário onde na primeira página existe a condição de haver um texto com o termo Tsunami, um texto com o termo catástrofe ou um texto sem “etiqueta”. Para cada termo existe uma versão com imagem e sem imagem. Pediremos para os participantes observarem atentamente o documento, meio minuto depois pediremos para que virem a página. Nesta segunda página estão as perguntas relativas à implicação psicossocial.

População O protocolo experimental contou com a participação de 109 estudantes de Psicologia das universidades de Amiens, Dijon e Paris V. Os participantes foram escolhidos e divididos aleatoriamente nas seis condições experimentais. A amostra contou com 14 homens e 95 mulheres, com uma idade média de 22 anos. Quadro 2 - Participantes, por condição experimental Sem etiqueta

Catástrofe natural

Tsunami

Total

Imagem + texto

20

17

18

55

Texto

19

17

18

54

Total

39

34

36

109

Hipóteses Hipóteses que se referem à PPA H1: Em presença de uma etiqueta, os participantes se sentirão mais envolvidos, o que se traduzirá por um maior número de participantes dispostos a ajudar as vítimas de Flores, assim como uma maior soma de dinheiro “doado” nas condições “tsunami” e “catástrofe”. H2: A presença da imagem aumenta a PPA, o que se traduzirá por um maior número de participantes dispostos a ajudar as vítimas de Flores, assim como uma maior soma de dinheiro “doado” comparativamente às condições sem imagem. H3: A imagem reforça o efeito das etiquetas, havendo então uma acumulação dos efeitos das duas variáveis, onde os participantes das condições “com etiqueta e imagem” serão mais numerosos a ajudar as vítimas e o total de dinheiro “doado” será maior.

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Hipóteses que se referem à valorização H4: A etiqueta deve aumentar a valorização do objeto, e os participantes das condições “com etiqueta” devem dar mais importância ao acontecimento do que os participantes da condição sem termo indutor. H5: A imagem reforça a valorização do objeto; nas condições onde uma imagem é associada ao texto, as pontuações serão superiores às condições sem imagem. H6: Os efeitos das duas variáveis independentes são cumulativos; veremos então as pontuações mais altas nas condições onde os participantes têm uma imagem e uma etiqueta.

Resultados Efeito etiqueta Quadro 3 - Número de participantes dispostos a ajudar as vítimas em função da etiqueta Sem etiqueta

Catástrofe

Tsunami

Sim

18 (46%)

20 (59%)

29 (81%)

Não

21 (54%)

14 (41%)

7 (19%)

Os resultados mostram que na presença de uma etiqueta (“tsunami e “catástrofe”) os participantes ajudam mais as vítimas, resultado que é estatisticamente significativo (χ2o = 6,01) > (χ2c = 3,84) ao nível .05. Podemos observar que 46% dos participantes das condições sem etiqueta estariam dispostos a ajudar financeiramente as vítimas da destruição. Quando uma etiqueta está presente, 49 participantes (num total de 70%) ajudariam as vítimas, o que representa 70% das pessoas das condições “com etiqueta”. Convém ressaltar que na condição tsunami, 81% das pessoas têm a intenção de ajudar financeiramente os habitantes da ilha destruída. Comparando as duas condições com etiqueta (“catástrofe” vs “tsunami”), podemos ver que “tsunami” tem um efeito estatisticamente maior que o outro termo (χ2o = 3,93) > (χ2c = 3,84)4 ao nível .05. Além dos efeitos já citados, podemos observar uma interação entre as três modalidades da VI1, com o teste do χ2 temos os seguintes resultados: (χ2o = 8,1) > (χ2c = 5,99) ao nível .05, o que nos permite afirmar que dependendo da modalidade da primeira variável independente (sem etiqueta vs “catástrofe vs “tsunami) não temos o mesmo número de participantes dispostos a ajudar as vítimas.

4 Com uma correção de Yates,este resultado não é mais significativo.

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Quadro 4 - Participantes dispostos a ajudar as vítimas s em função da presença da imagem. Imagem

Texto

Sim

41 (74%)

26 (48%)

Não

14 (26%)

28 (52%)

No que se refere à influência da imagem, podemos ver que 75% dos participantes que viram uma foto associada ao texto, ajudariam os habitantes da ilha. Sem a presença da foto, menos da metade (48%) tem esta intenção. O teste do χ2 é significativo pois (χ2o = 6,87) = (χ2c = 6,63) ao nível .01; então podemos afirmar que a imagem influencia os participantes, pois eles se tornam mais dispostos a ajudar as vítimas.

Gráfico 1 Número de participantes dispostos a ajudar as vítimas dependendo da etiqueta e do tipo de ativação (em %).

Interação imagem etiqueta O gráfico 1 mostra que, na presença de uma imagem, a evolução (dos participantes que ajudariam as vítimas) é crescente, em relação à condição sem etiqueta, passando pela condição “catástrofe” até a condição “tsunami”. Quando o texto não é associado a uma imagem, as condições sem etiqueta e catástrofe contam com um número equivalente de participantes dispostos a ajudar as vítimas; este número é inferior à condição onde a etiqueta “tsunami” está presente. Estamos então diante de uma interação pois na ausência de uma imagem, as etiquetas não fazem o mesmo efeito. Embora a magnitude dos resultados seja grande, eles não são estatisticamente significativos. Revista de Educação Pública, Cuiabá/MT, v. 15, n. 29, p. 79-89, set.-dez. 2006

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Os resultados relativos ao montante em euro que os participantes doariam, são análogos aos resultados que acabamos de descrever. Porém a interação entre as duas variáveis independentes é estatisticamente significativa, F(5,103) = 2,614, onde p = .029. Podemos afirmar que, na presença de uma imagem, as etiquetas não agem da mesma forma na implicação (dinheiro doado em euros) dos participantes.

Gráfico 2 Total doado (em euros) às vítimas, em função das variáveis etiqueta e imagem.

Valorização Observando o gráfico 3, podemos ver que todas as notas são positiva, embora a escala variasse de -2 a +2. Todas as notas variam em torno de 1,5, exceto na condição “sem etiqueta e sem imagem”. A valorização só sofre o efeito da imagem, quando nenhuma etiqueta está presente, e só sofre o efeito da etiqueta, quando nenhuma imagem está presente. Vemos efeitos significativos quando comparamos a valorização das condições “sem etiqueta com imagem” e “sem etiqueta sem imagem”, (to = 5,16) > (tc = 3,574) ao nível .001. A diferença entre as condições “sem etiqueta sem imagem” e “com etiqueta sem imagem” também é significativa, (to = 6,98)> (tc = 3,39) ao nível .001. Com esses resultados, podemos afirmar que os efeitos das duas variáveis independentes não se cumulam, a etiqueta só aumenta a valorização na ausência de uma imagem, e a imagem só aumenta a valorização na ausência de uma etiqueta.

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Gráfico 3 Valorização do objeto (notas) em função das variáveis independentes (imagem e etiqueta)

Discussão Os resultados desta pesquisa mostram que a imagem e a etiqueta reforçam a implicação psicossocial dos participantes, agindo em duas dimensões, a valorização e a PPA. No entanto convém ressaltar que devido ao caráter exploratório deste trabalho, os resultados devem ser vistos com precaução. Também medimos os efeitos das variáveis independentes sobre a terceira dimensão da implicação psicossocial e não obtivemos nenhum resultado significativo ou relevante, o que se explicaria por má operacionalização desta variável e/ou pelo fato da identificação não ser primordial na implicação psicossocial dos objetos estudados. Se nos interessarmos pela PPA, vemos que as hipóteses iniciais se confirmam. Quando uma etiqueta está presente no texto, os participantes se dispõem mais a ajudar as vítimas. A imagem reforça o efeito da etiqueta, aumentando ainda mais o número de pessoas que ajudariam as vítimas. O compromisso evolui então desta forma; “sem etiqueta sem imagem” < “com etiqueta sem imagem” < “com etiqueta com imagem”. No que se refere à valorização, vemos que as duas variáveis independentes reforçam a implicação psicossocial com a mesma intensidade. Talvez os resultados sejam a conseqüência da ativação dos mesmos conhecimentos pela foto e pelas etiquetas. A imagem reforça o caráter mobilizador da etiqueta, aumentando a ativação afetiva criada pelas etiquetas. A foto observada pelos participantes mostra uma paisagem devastada, uma cena de destruição, o que ativaria os mesmos elementos Revista de Educação Pública, Cuiabá/MT, v. 15, n. 29, p. 79-89, set.-dez. 2006

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já ativados pelas etiquetas, ou seja, a imagem apóia e reforça o que as etiquetas ativam. Campos e Rouquette (2003) observaram que, na presença de uma imagem, as respostas dominantes têm uma freqüência mais elevada. Acreditamos que a imagem age reduzindo a liberdade de ação, ou seja, criando limites para a ativação, por isso nos parece que, na presença de uma imagem, os termos evocados seriam menos numerosos, restringindo-se aos termos dominantes (que são igualmente ativados pelas etiquetas) talvez característicos do núcleo central das representações sociais. Délouvée (2005) obteve resultados que demonstram que uma polarização das atitudes (devido a uma forte carga afetiva) age na estrutura interna das representações modificando o esquema atribuição (que é relativo aos operadores justificativos dos SCB5). O efeito do termo “tsunami” é particularmente grande e nitidamente superior ao efeito da palavra catástrofe. Depois do evento ocorrido no sudeste asiático onde faleceram milhares de pessoas, “tsunami” virou um objeto socialmente relevante e intensamente evocado pelos meios de comunicação de massa. Inúmeros programas de televisão e edições especiais de revistas e jornais se focalizaram na catástrofe asiática, milhões de pessoas se mobilizaram para ajudar as vítimas desta catástrofe e, a partir deste momento, tsunami deixou de ser uma catástrofe e se transformou em algo mais. Uma vítima do “tsunami” não era mais como uma vítima de um terremoto ou furacão, passamos da lógica formal à lógica do pensamento social. Do mesmo modo que na experiência feita por Rouquette, em 1994, “nazista” era diferente de “nacional-socialista”, catástrofe não é equivalente a “tsunami”. O recente terremoto no Paquistão ilustra bem essa diferença, pois não houve nenhum programa especial na televisão francesa, e a ajuda foi ínfima, se comparada com a ocorrida para o “tsunami”, confirmando que uma pessoa implicada não raciocina com a lógica formal, e sim seguindo a lógica do pensamento social.

Referências CAMPOS P.H.F.; ROUQUETTE M.L. Abordagem estrutural e componente afetivo das representações sociais. Psicologia: Reflexão e Crítica, v. 16, n°3, 2003, p. 435-445. DÉLOUVÉE, S. Conduites collectives et cognitions polarisées. Etude expérimentale de la composante affective des représentations sociales. Thèse de Doctorat, Université Paris-Descartes, 2005. FLAMENT, C. ; ROUQUETTE, M.L. Implication et contexte. In Anatomie des idées ordinaires. Comment étudier les représentations sociales. Paris : Armand Colin, 2003, p. 17-134. GUIMELLI, C. La pensée sociale. Paris: Presses Universitaires de France, 1999. 5 Schèmes cognitifs de base ou SCB, ou seja, esquemas cognitivos de base.

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ROUQUETTE, M.-L. La psychologie politique. Paris: Presses Universitaires de France, 1988. ROUQUETTE, M.-L. Sur la connaissance des masses. Grenoble: Presses Universitaires de Grenoble, 1994.

Data de recepção: 02/08/2006 Data de aprovação: 24/08/2006

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