A influência de ontem sobre amanhã

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Infelizmente, o foco na influência de pais e mães sobre filhos está sendo subtraído da pesquisa e análise científica e entregue ao debate político e ideológico. Em países onde as universidades cumprem sua função de pesquisar, criar conhecimento e divulgá-lo, há mais informação disponível e é mais difícil arrastálo do âmbito científico para o político e ideológico. Por isso, creio importante divulgar o que se sabe em outros contextos para que possam informar, com as restrições inerentes a validade de pesquisas feitas em contextos diferentes, para que incluamos suas conclusões em nosso universo de possibilidades, ainda que de maneira provisória, até que pesquisemos o mesmo tema em condições brasileiras. Uma área sobre a qual tenho lido e pesquisado se refere à duração dos efeitos, positivos e negativos, de práticas usadas por pais e mães sobre filhos e filhas. Há muitas pesquisas e artigos. Concentro em uma. Surpreende como as práticas dos pais seguem influenciando a vida dos filhos, invadindo a vida adulta e até sua velhice. Uma pequena pesquisa feia há uma década por Stimpson, Tyler e Hoyt analisou os efeitos da rejeição paterna e/ou materna sobre a qualidade das relações de idosos e sobre o risco de que enfrentem depressões. A pergunta: até que ponto comportamentos dos pais durante a infância e juventude dos filhos afetam a qualidade da vida dos filhos e filhas dezenas de anos mais tarde, quando eles já são idosos? Essa pesquisa (e muitas outras) mostra que as famílias têm um histórico do desenvolvimento com

os filhos e filhas que influenciam suas respostas décadas mais tarde. Os autores usaram path analysis em famílias em áreas rurais para avaliar o efeito do afeto e do conflito no interior das famílias sobre os filhos décadas mais tarde, passando pela sobrevivência dos conflitos entre pais e mães e seus filhos adultos. Constataram que o comportamento paterno e materno quando os filhos são crianças e adolescentes afetam muito a qualidade de relacionamento com filhos e filhas quando eles são adultos e continua a influenciar suas vidas na Terceira Idade, sendo que os autores se concentraram na qualidade dos relacionamentos de todo tipo dos agora idosos e do seu risco de enfrentar depressões. Percorrendo o caminho inverso, as depressões dos velhos de hoje, assim como suas dificuldades em se relacionar, podem ter se originado lá no passado, na infância e na juventude, quando sofreram rejeição de pai e/ou mãe na infância e na adolescência. Penso esse processo como um stream of influences em que a gênese de alguns problemas da vida (e de suas virtudes também) se encontra ainda na infância e na adolescência, mas que são um processo dinâmico e continuam interagindo com uma miríade de fatores posteriores e sendo modificados por eles. Muitas dessas influências no início da vida sobrevivem de alguma forma e terminam por influenciar as pessoas no fim da vida. É, sem dúvida, uma instigante e pretensiosa matriz de pensamento e programa de pesquisas.

Mas vale a pena. Até para mim, aos oitenta. Pesquisar é viver. Ver mais em Effects of parental rejection and relationship quality on depression among older rural adults, Int J Aging Hum Dev. 2005;61(3):195-210.

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