A interpretacao keynesiana do funcionamento da economia e o papel do governo

June 19, 2017 | Autor: Débora Adorno | Categoria: Government, Keynesian Economics
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A interpretação keynesiana do funcionamento da economia e o papel do
governo

Ricardo Carneiro

1. Introdução


- até o advento da revolução keynesiana – a publicação de "A teoria geral
do juro, do emprego e do dinheiro", em 1936 – prevalecia um preceito de
fundamentação "moral", segundo o qual o governo não deveria gastar sem
arrecadar o equivalente em impostos (de forma a não comprometer as
gerações futuras por meio de dispêndios excessivos no presente que,
ademais, apresentavam benefícios no mínimo duvidosos): remete-se aqui ao
princípio ortodoxo da responsabilidade fiscal, segundo o qual "o único
orçamento bom é o orçamento equilibrado" (Adam Smith, 1776, citado por
Nordhaus e Samuelson, 1992, p. 715: ver Nordhaus, Willian D. e Samuelson,
Paul A. Economia. Lisboa: McGraw- Hill, 1992)


- Keynes atacou vigorosamente a interpretação da economia neoclássica e,
mais especificamente, a denominada lei de Say (a idéia de que a
realização da produção não é problemática) e a existência de forças
autoreguladoras de mercado, que manteriam a economia numa situação de
equilíbrio de longo prazo, desde que não houvesse restrições
institucionais à livre flutuação da taxa de juros, salários e preços
(Oliveira, 2009) para Keynes, a economia poderia alcançar o equilíbrio,
sem que este fosse de pleno emprego dos fatores de produção
(insuficiência da demanda agregada), ou apresentar "excesso de demanda
sobre a capacidade produtiva, padecendo de pressões inflacionárias"
(Oliveira, 2009, p. 42). A partir dessa leitura, o autor atribui ao
Estado um papel de relevo na economia, atuando por meio de políticas
anticíclicas de administração da demanda (agregada ou efetiva), o que irá
configurar a denominada função estabilizadora


- embora o keynesianismo seja associado mais diretamente às políticas de
administração da demanda como forma de garantir o desempenho eficiente da
economia (o uso das políticas monetária e fiscal), sua contribuição vai
além da prescrição de um papel ativo do Estado no sentido de assegurar
uma situação próxima ao pleno emprego. Sua análise identifica, como um
dos principais problemas do sistema capitalista, a "distribuição
inequitativa da renda". Sobre a questão, afirma que "os principais
defeitos da sociedade econômica em que vivemos são a sua incapacidade
para fornecer o pleno emprego e a sua arbitrária e desigual distribuição
da riqueza e das rendas (1983, p. 253, apud Omar, 2001, p. 219)


- a concentração da renda e da riqueza constitui um resultado "natural"
da dinâmica de mercado. No pensamento liberal, reivindicações de melhores
salários e serviços sociais por parte da classe trabalhadora levariam a
aumento de custos de produção e desvio de recursos do investimento,
implicando menor crescimento econômico, acumulação de capital e
produtividade (ou seja, demandas por maior consumo por parte dos
trabalhadores eram, assim, exigências particularistas, contrárias ao
desenvolvimento nacional e ao interesse coletivo). A interpretação
keynesiana enseja (ou fundamenta) uma mudança radical nessa visão: a
demanda efetiva passa a ser vista como força motriz da economia, o que
transforma os interesses da classe trabalhadora em interesses
universalistas, isto é, os interesses dos trabalhadores coincidem com os
interesses gerais da sociedade o compromisso dual: pleno emprego
(administração da demanda visando à regulação do nível de emprego) +
redução das disparidades sociais (implementação de uma rede de serviços
sociais e de seguridade social que está na base do denominado Estado de
Bem Estar Social)

2. ciclos econômicos e intervenção governamental (as proposições
keynesianas)


- teoria keynesiana sobre a recessão: perda de confiança dos agentes
econômicos no futuro (as incertezas), refletindo no comportamento adotado
no presente aumento da poupança, derrubando o consumo, os investimentos
e a renda


- no modelo keynesiano tradicional, a curva de oferta é horizontal até o
pleno emprego (y*). A partir desse ponto, a curva se "quebra", tornando-
se vertical, conforme gráfico 1. A situação de equilíbrio com desemprego
caracteriza-se pela interseção da demanda agregada com a parte horizontal
da oferta


- isto posto, cabe ao governo promover o aumento da demanda agregada para
se alcançar a situação de pleno emprego (y*)

- como?

(i) política monetária expansionista: aumento da oferta monetária de
forma a induzir as empresas (consumo produtivo) e as famílias (consumo
final) a aumentar gastos e, por conseqüência, a renda a política
monetária expansionista pode não ser eficaz (a armadilha da liquidez)

(ii) a resposta keynesiana à armadilha da liquidez é o governo fazer o
que as empresas e as famílias não estão fazendo, ou seja, estimular a
demanda agregada por meio da política fiscal (incorrendo em déficits
públicos). Alternativas: (1) redução de impostos: estímulo aos gastos
privados de consumo e investimento (redução tributária implica aumento da
renda disponível do setor privado aumento das despesas de consumo
(produtivo e final); (2) aumento dos gastos governamentais (inclusive
transferências para o setor privado) de forma a compensar a insuficiência
do consumo e dos investimentos privados. Discussão das alternativas (1) e
(2): os multiplicadores macroeconômicos (dos gastos públicos, da
tributação e das transferências)

- se, ao contrário, a situação for de equilíbrio com inflação (excesso de
demanda agregada), conforme gráfico 2, a solução é a inversa da anterior

- como?

(i) e (ii), com sinal inverso. A política fiscal, contudo, não é dotada
de simetria no caso de equilíbrio com inflação, ou seja, os superávits
fiscais (para reduzir a demanda efetiva) não se mostram tão eficientes
como os déficits públicos no caso de equilíbrio com desemprego (cabe
ressaltar, a respeito, que a observação de inflação mesmo em
circunstâncias de demanda efetiva insuficiente mostra que a política
fiscal não pode ser usada como único instrumento do controle
inflacionário ênfase na política monetária (um adequado controle da
oferta monetária e do crédito tende a apresentar resultados mais rápidos
e é mais flexível que a política fiscal)

3. a curva de Philips e o trade off entre emprego e inflação (o ataque
monetarista a Keynes)

- o modelo básico keynesiano (curva de oferta horizontal até o pleno
emprego) não reproduz os fatos (a realidade): a curva de oferta tende a
se inclinar positivamente em todo seu percurso, conforme gráfico 3. Isto
coloca em evidência a existência de um trade off entre nível de emprego
(redução da taxa de desemprego) e nível de preços (inflação), conforme
descrito pela curva de Phillips (gráfico 4)

- no entanto, o arcabouço teórico da curva de Phillips, da mesma forma
que o modelo tradicional keynesiano, apresentou falhas evidenciadas pela
realidade (a empiria), mais especificamente, o fenômeno da estagflação (a
existência de inflação junto ao desemprego), que serve de apoio as
proposições monetaristas (a defesa de que o principal objetivo da
política monetária é a estabilidade da base monetária)

- as anotações monetaristas dedicadas ao exame da estagflação (que
derruba a curva de Phillips, como já comentado), afirmam que a validade
do trade off que esta (a curva) expressa se dá apenas no curto prazo a
expansão monetária, com vistas a impulsionar a demanda efetiva,
devidamente acompanhadas de alta de preços, elevaria o nível de emprego
apenas no curto prazo, se os efeitos inflacionários de tal expansão não
fossem totalmente antecipados. Ocorrendo o ajuste nas expectativas dos
agentes no tocante à inflação, o desemprego voltaria ao ponto determinado
pelos componentes estruturais da economia: a defesa da existência de uma
taxa natural de desemprego da economia ou "taxa de desemprego de inflação
não-acelerada" (Krugman, 1997, p. 53)

- para Friedman, conforme Krugman (1997), não é possível usar a política
monetária para se alcançar uma meta definida politicamente de "pleno
emprego" sem acabar produzindo uma inflação inaceitável, o que serve de
fundamento a que o autor (Friedman) afirme que o governo deve deixar de
lado a gestão da economia Krugman (1997) critica a proposição de
Friedman, afirmando que a economia de mercado levaria naturalmente a uma
taxa de desemprego de longo prazo em torno do denominada "taxa natural".
Para o autor, nada assegura que isto ocorra, com a observância de
oscilações abrangentes da taxa de desemprego em torno da "taxa natural",
o que é razão mais que suficiente para se apelar para as políticas
keynesianas com o intuito de estabilizar a economia.




Referência bibliográfica:

Krugman, Paul. Vendendo prosperidade: sensatez e insensatez econômica na
era do conformismo. Rio de Janeiro: Campus, 1997, Parte I.
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