À Janela dos livros: Memória de 30 anos de Círculo de Leitores

June 8, 2017 | Autor: Rui Beja | Categoria: Cultural Sociology, Book Publishing
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À Janela dos Livros – Memória de 30 anos de Círculo de Leitores Rui Beja PREFÁCIO

Fevereiro de 2011 ISBN: 978-972-42-4675-8 CONTEÚDO

I. II.

Primeiras Páginas A Janela fechada – Censura e repressão, condicionantes do acesso ao livro e do desenvolvimento da sociedade portuguesa ! Portugal de cortinas cerradas: o bloqueio ao desenvolvimento sociocultural no país de Salazar e Caetano ! Nascer e crescer a espreitar pelas frestas: o quotidiano marcado pelo contexto sociopolítico e pelo estigma do «orgulhosamente sós» III. Quando a janela se abre – Palavra escrita e leitura, fonte do saber e da inteligência ! Reflexões sobre o livro ! A importância do livro em tempo de mudança ! A aventura de cada livro ! A palavra escrita IV. Círculo de Leitores, anos 70 – Paixão pelo livro e fé no seu poder de sedução, inspiram o êxito do clube do livro ! Círculo de Leitores: a génese e o sucesso de uma grande aventura e de uma paixão ainda maior ! 25 de Abril e PREC: tempos de enorme fascínio e grande turbulência ! Confiança no futuro: dez anos de crescimento e afirmação estimulam novos desafios do clube do livro V. Círculos de Leitores, anos 80 – Assinaláveis exclusivos editoriais reafirmam que a nossa Pátria é a língua portuguesa ! Décimo aniversário: uma comemoração que deixou marcas ímpares na cultura portuguesa ! Círculo de Leitores: quinze anos fazendo amigos ! Revista Ler: uma ousada iniciativa de informação e divulgação cultural ! Missão cumprida: corolário de uma década de iniciativas culturais, inovação, progresso e dinâmica empresarial VI. Círculo de Leitores, anos 90 – Prestígio sociocultural confirma lugar de relevo face ao mundo novo que se anuncia ! Vigésimo aniversário: meio milhão de sócios, publicação anual de duzentos títulos, dois milhões de livros distribuídos em cada ano ! 25 Anos de livros. 25 Anos de Paixão – a magia do livro ! Fundação Círculo de Leitores: responsabilidade cultural e social ! Portugal e os portugueses: publicação de grandes obras de referência histórica e documental marca a última década do milénio ! Novos projectos e novos estímulos: a terceira década vivida em ritmo alucinante VII. Círculo de Leitores, anos 2000 – Prosseguir a missão institucional e consolidar o projecto empresarial em tempos de mudança ! Trigésimo aniversário: a celebração do sortilégio do livro ! Viragem do milénio: início da quarta década com o entusiasmo de sempre ! Trinta anos no Círculo de Leitores: trinta anos de uma relação profissional intensamente vivida VIII. Últimas páginas

Como éramos em 1970? Passo os olhos pela imprensa da época, mais do que pelos resumos de história política – o país que lia à mesa dos cafés, que frequentava as livrarias nas duas principais cidades e em quatro ou cinco capitais de província, e que comprava livros atrás do balcão. Província era o país todo, aliás, ordenado a tira-linhas e transferidor, sob o céu de chumbo e a poeira das dúvidas: a guerra, os planos de fomento, a vigília na Capela do Rato, a morte de Salazar, a reeleição de Américo Tomás, morrem Almada Negreiros, John Dos Passos, e Jimi Hendrix. E, mesmo assim, como éramos em 1971? Como éramos em 1972? Como éramos em 1973? Quanto tempo demorava um comboio entre Lisboa e o Porto? Quando começou a publicar-se o Expresso, aos sábados de 1973, os assinantes recebiam-no à quarta-feira em Vila Real. O Século de quinta-feira chegava a Bragança ao sábado. De qualquer modo, em 1979, a edição do Diário de Notícias com o suplemento de «letras & artes» (das quintas-feiras) chegava à minha cidade de Trás-os-Montes apenas ao sábado à noite – pouco mudou. Quase toda a gente tinha uma parte das suas famílias em África – ou emigrada em algum lugar. No início de 1973, por milagre, ouvi Smoke on the Water, dos Deep Purple, cujo solo inicial imitávamos em guitarras invisíveis nas traseiras do liceu, e chegava o primeiro livro do Círculo de Leitores a minha casa. Nessa altura, quantos tinham lido Neruda, que foi Nobel em 1971, ou Soljenitsine, em 1970? Quantos tinham ouvido falar de Heinrich Böll ou de Patrick White, prémios Nobel da Literatura de 1972 e 1973? Houve o Setembro Negro, em 1970, Munique em 1972. Houve o ano de Pelé no Mundial do México de 1970. Pela televisão, as mensagens de soldados portugueses nos natais da Guiné, de Angola e de Moçambique. Vamos aos livros da época, vamos aos jornais da época, aos arquivos desses anos triunfais em que o Círculo de Leitores se instala em Portugal, justamente (nunca é exagero citar certas coincidências) logo depois da morte de Salazar: e vemos um país inteiro que discute em surdina, ouve em surdina, passeia devagar pela História (acelerará em 1974, 1975, 1976), descobre a praia, as férias pagas, a colecção de livros RTP (que oferecia uma estante a quem comprasse os cem volumes, cujo peão de ataque tinha sido Maria Moisés, de Camilo Castelo Branco), a colecção Unibolso (eu ajudo: o primeiro título foi O Fio da Navalha, de Maugham), que já tinha passado pela Arcádia de Bolso (a BAB) e pelos primeiros da Europa-América de bolso (inaugurada com Esteiros) e por tantas outras escapadelas antes e depois do futebol, da vida como ela era, pobrezinha, vigiada, como um risco permanente. Nisso tudo, o Circulo de Leitores foi uma aventura fantástica. A minha segunda ou terceira biblioteca (eu vivia a 500 quilómetros de Lisboa) foram esses livros encadernados, cuidados, escolhidos. Clássicos portugueses ou não. Erico Veríssimo e Axel Munthe, Jorge Amado e Roger Vailland, Aldous Huxley e Henry Fielding, poesia, teatro, livros ilustrados e sim, Heinz G. Konzalik, o bestseller da casa, Dickens e Tolstoi, Shakespeare e Lampedusa, Caldwell e Henry James, as irmãs Brontë e Chesterton, Dostoievski e Aquilino, Maupassant e Alberto Moravia – eram os livros que chegavam a casa e foram a minha primeira revolução cultural. Quize anos depois, em 1986, eu próprio entrava pela porta do Círculo de Leitores para descobrir os bastidores dessa máquina de leitura que levava livros pelas províncias de um país que tinha poucas livrarias, fracos hábitos de leitura, poucos incentivos à bibliofilia. Agora, passados todos esses anos, ao reler algumas das passagens do livro de Rui Beja, redescubro a aventura. Redescubro a qualidade da escolha, o prazer do risco, a vontade de editar, a história de uma casa que transformou os costumes portugueses e as paredes das casas de família, com as lombadas e colecções históricas que obrigaram milhões de portugueses a ler, a conhecer os nomes dos autores e a partilhar essa experiência entre pais, filhos, vizinhos – enfim, muito antes da Internet, esta era a verdadeira rede social erigida em nome da leitura.

Conheci Rui Beja, que foi meu anfitrião no Círculo de Leitores como administrador, e admirei nele as qualidades de um homem rigoroso e tolerante, aberto, culto, disponível, que pertence a um universo em que o mundo dos gestores de casas editoras nunca esteve separado do mundo dos editores propriamente ditos – nem dos autores, nem dos leitores. O Círculo de Leitores desses anos de pompa, entusiasmo, trabalho, criatividade e procura de uma qualidade milimétrica (recordo que Manfred Grebe, um administrador alemão, impôs a certa altura como meta o objectivo gralhas zero nos livros do Círculo, um acto heróico e muito perto da bela loucura desses anos), foi decisivo para a história da edição portuguesa e, por extensão, da cultura portuguesa. Séries de livros únicos e cuidados reuniram o melhor do romance português (como uma inesquecível colecção intitulada Obras-Primas do Século XX), da historiografia portuguesa, do pensamento europeu, da poesia da nossa língua, sob a direcção de nomes como José Mattoso, João Gaspar Simões ou David Mourão-Ferreira, por exemplo. O mundo mudou bastante – o mundo dos livros mudou enormemente. O Círculo de Leitores esteve, durante estas quatro décadas, na dianteira da edição portuguesa, promovendo livros e valorizando autores, ajudando a reinventar os cânones da cultura portuguesa (o que levou a cabo com o seu trabalho editorial propriamente dito, e ainda pela instituição dos seus prémios literários, pela publicação da revista Ler e por tantas outras iniciativas que inovaram e consolidaram a relação dos portugueses com os livros e a música) e a estabelecer padrões de grande qualidade no universo da edição. A história das décadas de oitenta e noventa do século passado não pode fazer-se sem essa referência ao Círculo de Leitores: o Cancioneiro de Michel Giacometti, Viagem a Portugal de José Saramago (uma encomenda original), a série «Viver Portugal», lançamentos históricos que transformaram o mundo da edição num acontecimento para multidões. Por mais que o mundo tenha mudado, como mudou, essa geração de homens e mulheres pertence ao melhor dele; editar era descobrir, inventar, criar e recriar, arriscar, respeitar os cânones (e os valores, e as tradições, e os critérios de qualidade) diante da absoluta necessidade de inovação que o Círculo de Leitores soube escutar, compreender e perseguir como um imperativo. Por detrás desses livros que fazem parte da nossa história está, também, outra multidão de gente anónima que nem sempre é lembrada com a passagem do tempo: milhares de agentes do Círculo de Leitores que percorreram Portugal levando livros a casas onde, de outro modo, não teriam entrada. Mesmo hoje, quando a Internet, as redes de livrarias ou o livro digital marcam os debates sobre o futuro da edição, esses agentes do Círculo de Leitores têm um lugar na história da leitura em Portugal. Rui Beja (como outros administradores do Círculo de Leitores que eu tive o prazer, a honra e a felicidade de conhecer, como Manfred Grebe ou João Alvim, como outros responsáveis editoriais que marcaram a vida da casa, como Manuel Dias de Carvalho, António Mega Ferreira ou Guilhermina Gomes) é um dos artífices desse milagre português, a quem todos devemos horas de leitura. Ele conhece esse mundo como ninguém, viveu-o a várias dimensões – e explica-o e recorda-o aqui com uma legitimidade muito especial. FRANCISCO JOSÉ VIEGAS Janeiro de 2011

O AUTOR

Rui Manuel Monteiro de Oliveira Beja, nascido em Lisboa em 3 de Janeiro de 1944, casado, três filhos, é licenciado em Controlo Financeiro pelo Instituto Superior de Contabilidade e Administração de Lisboa e membro da Ordem dos Economistas, da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas e do Instituto Português de Corporate Governance. Foi presidente da APEL (Associação Portuguesa de Editores e Livreiros) entre Julho de 2008 e Setembro de 2009 e membro do Comité Executivo da IPA (International Publishers Association) entre Outubro de 2008 e Outubro de 2009. Exerceu funções de Administrador não Executivo e Consultor da Administração da Lisboa Editora / Grupo Porto Editora, de Setembro de 2007 a Setembro de 2009. Leccionou Gestão Editorial no mestrado em Estudos Editoriais, no ano lectivo 2007/2008, como Professor Auxiliar Convidado da Universidade de Aveiro. Foi presidente do Círculo de Leitores entre Julho de 1992 e Dezembro de 2001. Ao longo de 30 anos esteve ligado a esta editora subsidiária da Bertelsmann, o maior grupo europeu de media; acumulou este cargo com a presidência do Conselho de Administração da Fundação Círculo de Leitores, desde a sua constituição em 1995. Foi também presidente da Bertelsmann Portuguesa, SGPS e representou o grupo na qualidade de Country Information Officer. Tendo iniciado a actividade no Círculo de Leitores em 1971, como director financeiro, participou na evolução da empresa desde o seu primeiro ano de actividade operacional, e era seu presidente quando o «clube do livro» foi distinguido, em 1998, com o prémio da Revista Exame para «A Melhor entre as Maiores» empresas de «Edição, Informação e Artes Gráficas». Como presidente do Círculo de Leitores esteve envolvido em vários projectos de âmbito editorial e sociocultural, com destaque para a publicação de obras de referência na historiografia portuguesa, bem como a criação da editora Temas e Debates (1994), da Fundação Círculo de leitores (1995), do Prémio Literário José Saramago (1998) e das Olimpíadas da Leitura (1998). Em consequência da actividade desenvolvida neste grupo editorial foi agraciado pelo Presidente da República, em 10 de Junho de 2002, com o grau de Comendador da Ordem do Mérito. É autor do livro Risk Management – Gestão, Relato e Auditoria dos Riscos do Negócio, publicado em Outubro de 2004

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