A mulher-cidade: Um delírio sobre moderno, espaço e potência, outro na perspectiva de um mesmo homem

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A MULHER-CIDADE: Um delírio sobre moderno, espaço e potência, outro na perspectiva de um mesmo homem.

Alexandre Linck Vargas Doutorando em Literatura na Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC

Fig. 1 Marv diante do espelho, Sin City: a cidade do pecado (MILLER: 2005, 151).

Não sei por que é para lá, de fato, que meus passos me levam, que vou para lá quase sempre sem objetivo determinado, sem nada de decisivo a não ser esse dado obscuro de saber que ali vai acontecer isto (?). (André Breton: Nadja, 40)

Há certamente uma personagem fantasmagórica e fugaz que perscruta a epistemologia do homem. Essa legenda é, sem sombra de dúvida, de muitas faces, mas tragicamente todas estão voltadas, centradas nos limites de seu próprio perscrutador. Um sujeito solitário num escuro e sinistro salão de espelhos à procura da identidade 1

negada. O que sou homem? – pergunta, aflito. Na falta de uma boa resposta, algumas proposições silogísticas são forjadas. Se homem sou, tudo aquilo que não sou, homem também não será! – pensará o parcialmente aliviado sujeito por poucos e ingênuos segundos até perceber, completamente aterrorizado, o espaço onde se encontra. O salão de espelhos, talvez o lugar por excelência do homem, o frustrará na tentativa de afirmação de um caráter distintivo. Como se pode querer afirmar um Outro quando só há reflexos de um Mesmo? Foucault, em suas andanças nietzschianas, soube muito bem apontar esta analítica da finitude do homem moderno, este espaço do observador observado para, quem sabe, auxiliar na fuga do homem sujeito à maldição dos espelhos. No emblemático capítulo chamado “o homem e seus duplos” de As palavras e as coisas, Foucault busca um ponto, um espaço onde o homem, enquanto conceito, se fez aparecer e desfilar sua verdade positiva para a cultura moderna. Se no discurso clássico, cartesiano, do “penso, logo existo”, onde pensar e existir se confunde na crença da objetividade, da representação enquanto possibilidade de verdade, no discurso moderno o então agora homem se encontra no centro do conhecimento – ao assimilar que tudo só é percebido, compreendido, forjado por si mesmo, o moderno homem voltase ao espelho, narcisista. Não se trata mais do homem descobrir a verdade do universo, mas a verdade do homem no universo. Essa ambígua posição de “objeto para um saber e de sujeito que conhece: soberano submisso, espectador olhado” (FOUCAULT: 1995, 328) pontuará a aurora da modernidade, acontecendo, segundo Foucault, pela transição de três campos particulares, a saber, a história natural em biologia, por Cuvier, a análise das riquezas em economia, em Ricardo, e a reflexão sobre a linguagem em filologia, por Bopp – caracterizando assim uma analítica da finitude onde o antropofágico homem se torna predador e presa de si mesmo, num, não menos conflitante, espaço infinito de finitudes. Sem dúvida, ao nível das aparências, a modernidade começa quando o ser humano começa a existir no interior de seu organismo, na concha de sua cabeça, na armadura de seus membros e em meio a toda a nervura de sua fisiologia; quando ele começa a existir no coração de um trabalho cujo princípio o domina e cujo produto lhe escapa; quando aloja seu pensamento nas dobras de uma linguagem, tão mais velha que ele não pode dominar-lhe as significações, reanimadas, contudo, pela insistência de sua palavra. Porém, mais fundamentalmente, nossa cultura transpôs o limiar a partir do qual reconhecemos nossa modernidade, no dia em que a finitude foi pensada numa referência interminável a si mesma.(...) A cultura moderna pode pensar o homem porque ela pensa o finito a partir dele próprio. (FOUCAULT: 1995, 334)

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Nietzsche havia alertado para a necessidade de uma morte do homem ao anúncio do super-homem – pela potência, vontade porvir, o homem precisaria ir além. Mas por onde começar? Esse caminho é o da filosofia do futuro, certamente – mas se este devir pode ser procurado em um determinado espaço no seio da modernidade, seu tempo precisa ser transgredido, rememorado. E a oportunidade revolucionária, a porta por onde adentra o Messias benjaminiano, a salvação sem “pai” e politizada, onde o historiador consciente “capta a configuração, em que sua própria época entrou em contato com uma época anterior, perfeitamente determinada” (BENJAMIN: 1985, 232) fundando “um conceito do presente como um "agora" no qual se infiltraram estilhaços do messiânico” (Idem, 232) é a mesma porta por onde o Messias jamais penetraria. No platonismo, em eterno retorno, é por onde (re)começamos. Deleuze, em “Platão e o Simulacro” em A lógica do sentido, muito acrescenta à analítica da finitude foucaultiana – ainda mais, complementa a proposta nietzschiana de reversão do platonismo, encurralando o platonismo, trazendo à luz sua motivação. E será no fundamento e no modelo de onde o platonismo parte para a distinção das cópias e simulacros que a finitude, desde cedo, se insinuará metodologicamente. “A dialética platônica não é uma dialética da contradição nem da contrariedade, mas uma dialética da rivalidade, uma dialética dos rivais ou dos pretendentes” (DELEUZE: 1998, 260). Firmado no mito do mundo das Idéias, local onde as almas, antes de encarnarem, tiveram a oportunidade de vislumbrar as Idéias, Platão estabelece um critério base de seleção e valor por similitude entre aqueles que viram muito e conseguem lembrar do mundo das Idéias e aqueles de vista curta e fraca memória. Enquanto condição, a similitude fará a divisão de dois tipos de Imagem: as cópias-ícones da Idéia e os simulacros-fantasmas, imagens distintas que representam “uma agressão, uma insinuação, um desequilíbrio, uma subversão, “contra o pai” e sem passar pela Idéia” (Idem, 263). Esse processo de seleção em meio a boas ou más cópias, ou antes, entre as cópias semelhantes e dessemelhantes, fundará “o domínio da representação preenchido pelas cópias-ícones e definido não em uma relação extrínseca a um objeto, mas numa relação intrínseca ao modelo ou fundamento” (Idem, 264).

A grande dualidade manifesta, a Idéia e a imagem, não está aí senão com este objetivo: assegurar a distinção latente entre as duas espécies de imagens, dar um critério concreto. Pois, se as cópias ou ícones são boas imagens e bem fundadas, é porque são dotadas de semelhança. (DELEUZE: 1998, 262)

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Este território da cópia-ícone é o espaço do Mesmo, mas, também, o da finitude do homem moderno. O fundamento e o modelo platônico não deixaram de operar na invenção do homem. A similitude apenas desdobrou-se de forma mais pungente. Se no platonismo ainda havia algum espaço na consideração e possibilidade de existência – embora odiosa – do simulacro, no homem moderno esse simulacro nem sequer existe mais perante sua percepção. Só restou a cópia-ícone, não mais da Idéia, mas de si próprio, de suas extensões e projeções, de sua figura construída e constituída a partir de um estatuto onde todo o infinito se reporta ao espaço finito de seu Mesmo. O homem moderno é a vitória da cópia sobre o simulacro e o golpe do ícone contra a Idéia – sua referência é agora somente si mesmo, e além dele, nada é... De um extremo ao outro da experiência, a finitude responde a si mesma; ela é, na figura do Mesmo, a identidade e a diferença das positividades e de seu fundamento. Vê-se como a reflexão moderna, desde o primeiro esboço dessa analítica, se inclina em direção a certo pensamento do Mesmo – onde a Diferença é a mesma coisa que a Identidade (...) (FOUCAULT: 1995, 331)

Se em Nietzsche esse homem moderno começa a adoecer, envenenado por si mesmo, vergonhoso de sua condição diante da fulguração do super-homem, será ao longo do século XX, precisamente, no pós-guerra, de Auschwitz a Hiroshima, que o homem perceberá a dimensão do problema que lhe toma a frente. É neste momento que o escuro salão de espelhos, onde aguarda, o inquieto sujeito, mostrar-se-á a queda do homem e suas faces. Estas rosticidades ainda são as da finitude, mas seu reflexo é inexato, distorcido, como verá o sujeito, agora diante de uma luminosidade com um pouco mais de nitidez – ou sob um olhar acostumado à escuridão. Será, portanto, a imprecisão imagética, sintomático ao homem moderno e sua descrença, que fará seus reflexos soarem tão estranhos a ele. Estaríamos diante da vingança do Outro, infiltrado, disfarçado como extensão do Mesmo para traí-lo, apunhalá-lo diante do horror de admirar-se no espelho, e diante dele, avistar algo impensado, um Outro devir? O impensado (qualquer que seja o nome que se lhe dê) não está alojado no homem como uma natureza encarquilhada ou uma história que nele se houvesse estratificado, mas é, em relação ao homem, o Outro: o Outro, fraterno e gêmeo, nascido não dele, nem nele, mas ao lado e ao mesmo tempo, numa idêntica novidade, numa dualidade sem apelo. (FOUCAULT: 1995, 342)

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No espaço do homem, e neste caso não só do moderno, também está a masculinidade, validado sob a tradição patriarcal, e retrabalhado no momento em que a modernidade abriu suas portas com o homem – e somente com ele. Assim como em todos seus reflexos, agora projetos distorcidos de suas premissas, o homem moderno verá também uma crise no masculino – e por tabela no feminino – ao deslumbrar um outro espaço. Esta crise, imprecisão imagética, problema de ocupação de espaços, assumirá infinitos desdobramentos, dentre eles, destaco, o herói – ou anti-herói –, do filme noir. Para Frank Krutnik, no western, ou no filme de ação-aventura, o herói funciona como uma figura idealizada de identificação narcisista, promotora da ideologia da onipotência e invulnerabilidade masculinas. Já o herói (ou anti-herói) noir, mesmo no caso o detetive durão, constitui uma inversão desse ego ideal, por suas notórias características de ambigüidade, derrotismo, isolamento e egocentrismo. (MASCARELLO: 2006, 183)

O protagonista do cinema noir dos anos 1940 e 1950, ou antes, da cinefilia noir1, traz na decadência, seja ela social, moral, ou na experiência afetiva – principalmente com as mulheres – sua mais notória marca. No desconforto deste sujeito do pós-guerra, onde, na imensa maioria de suas narrativas, o crime, a transgressão, a violação do código, é o único elemento a ter êxito em atrair sua atenção, lançando-o numa aventura, além da imobilidade, para no final da jornada, retornar ao vazio original, que a crise do homem parece assumir uma rosticidade peculiar. Ao homem noir é legado a abismal queda em um vazio sem fim – mas de forma cíclica, onde, aparentemente, só não parte para um outro espaço, devido a sua incapacidade ou desinteresse em enxergar saídas. Se na decadência em repetição, portanto, o homem em queda no noir encontra algum espaço, mesmo não sendo um dos mais confortáveis, mas ainda assim um local a resguardar-se, é na ausência, ou melhor, na supressão do espaço tradicional do masculino que o personagem noir defronta-se com seu principal conflito, desdobrado em um antagonista de duas faces: a mulher e a cidade. Frank Miller e seus quadrinhos são tidos como exemplos de narrativa em quadros num momento, mais precisamente a partir da segunda metade dos anos 1980, onde a grande indústria americana de HQs buscava uma conciliação entre liberdade autoral e mercado editorial, pensando sobre uma linguagem quadrinhística própria e autônoma, no geral, de outras artes – no entanto, a influência do cinema não deixou de 1

O gênero noir vive sofrendo de problemas ontológicos, portanto, se é inseguro afirmar um cinema noir, uma cinefilia noir é muito mais palpável e garantida.

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ser menos determinante para os quadrinhos. Sin City é o tributo de Miller ao cinema noir – mais do que isso, talvez seja, mesmo em quadrinhos e sob o contexto dos anos 1990, uma das melhores compilações das características e problemáticas do universo noir. Sua composição em quadros pretos e brancos, sem tons de cinza, com raras aparições de pontuais elementos coloridos primariamente, sob traços duros e relações luz e sombra ricas em densidade, que torna Sin City ainda mais significativo ao noir do que se fosse um filme.2 A noite está quente como o inferno. Tudo gruda. Um quarto nojento, na parte nojenta de uma cidade nojenta. O ar-condicionado é um pedaço de sucata barulhento, incapaz de resfriar um drinque mesmo que estivesse em cima dele. Eu estou diante de uma deusa. Ela está dizendo que me quer. E ela fala como se me quisesse mesmo. Não vou perder nem mais um segundo me perguntando como foi que eu virei um cara tão sortudo. Ela tem o perfume que os anjos devem ter. (MILLER: 2005, 10-11)

No primeiro volume, Sin City – a cidade do pecado, conhecemos Marv, um homem feio, pobre e truculento, um protótipo de fracasso do bom cidadão. Por meio de narração em primeira pessoa – em analogia às narrações em off do cinema –, o avistamos pela primeira vez surpreendido diante do inexplicado motivo pelo qual uma mulher loira, Goldie, de corpo escultural, perfumada e elegantemente vestida, se submete sexualmente a ele. Do breve cochilo ocasionado pela fervorosa e intensa relação, Marv então desperta, se veste, coloca no pescoço seu colar com um crucifixo e acende um cigarro.

Daí, percebo que Goldie está morta... Tudo me diz que foi só um infarto enquanto ela dormia... Tudo, exceto aquela coisa fria dentro de mim, ficando cada vez mais fria... (...) Quem foi você além desse anjo de misericórdia que deu a um perdedor como eu a noite de sua vida? Só Deus sabe por quê. Com certeza, não foi minha aparência. Nem minha aparência e nem mais nada meu... Damas sem um décimo de sua categoria me excluem de cara pelo porco machista que eu sou, então por que aquele salão sujo? Por que aquele sorriso dançado? Por que toda a gentileza, Goldie? Agora eu pergunto por quê. Mas, quando você ficou assustada, quando tremeu e seus olhos brilharam feito os de uma menina, eu não perguntei por quê. Não naquela hora. Naquela hora, eu não dei a mínima para o que te incomodava. (MILLER: 2005, 14-15)

Logo após a morte de Goldie, a polícia surge sem aviso, em grande número, dando a Marv a certeza que se trata de uma cilada. Goldie foi assassinada e agora ele 2

O que de fato aconteceu com a adaptação cinematográfica de 2005. Sin City, dirigido pelo próprio Miller e Robert Rodriguez enquanto cinema não parece desenvolver o noir no mesmo nível de potência que nos quadrinhos.

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seria o principal suspeito. Marv cobre-se com seu sobretudo, firmando-o na cintura, e a ação prossegue numa violenta fuga, na qual ele fere gravemente diversos policiais em seu caminho. Confuso, machucado, mergulhado no rio onde jogou um carro da polícia, consigo dentro, para despistar os perseguidores, ao voltar à tona, Marv começa a esboçar sua nova linha de conduta.

Não sei por que, não sei como e... merda! Eu nem te conhecia antes dessa noite. Mas você foi mais do que uma amiga quando eu precisei de uma... E quando eu descobrir quem te matou, não vai ser nem rápido, nem silencioso, como foi com você... Ah, não... Vai ser barulhento e sujo. O meu jeito de matar. Eu vou olhar bem para a cara do desgraçado e rir enquanto ele gritar por Deus. E vou rir ainda mais alto quando ele chorar que nem um bebê... E, quando eu tiver acabado e ele tiver morrido, o inferno para onde eu o mandei vai parecer um paraíso. Eu te amo, Goldie. (MILLER: 2005, 28)

Em busca de ajuda Marv dirige-se sorrateiramente até o apartamento de Lucille, que sem saber quem é que está adentrando por sua janela, pega um revólver em uma gaveta e o engatilha. A voluptuosa e seminua Lucille então aponta a arma para Marv, coberto de band-aids. “Ah... é você!” (Idem, 36) diz ela, ainda com a arma apontada para ele. Deixando o revólver de lado, aparentando não possuir medo algum dele e sem a menor pressa em se vestir, Lucille entrega a Marv um frasco com pílulas. Lucille é minha oficial de condicional. Ela é sapata, só Deus sabe por quê... Com esse corpo, ela podia ter o homem que quisesse. Quem consegue as pílulas é a namorada dela. Uma psiquiatra. Ela até tentou me analisar uma vez, mas ficou assustada demais... (MILLER: 2005, 37)

Marv conta à Lucille que está com problemas com a polícia. Ela tenta lembrá-lo de todas as conseqüências que sua postura acarretará, das explicações que ele terá que dar. Marv então se exalta, o balão de texto torna-se irregular, em ondas bruscas e acidentadas – ele a agarra pelos ombros, deixando seus rostos muito próximos. “Não tem nada que explicar, gata! Não dessa vez! De jeito nenhum!”(...) “Calma aí, Marv! Toma outra pílula!” (Idem, 38) diz Lucille assustada. Marv declama a odisséia de vingança que irá proferir, Lucille o adverte do inferno que se tornará sua vida quando ele for pego. Marv rebate: Inferno?! Você não sabe nada do inferno. Ninguém de vocês sabe. Inferno não é apanhar, ser retalhado ou arrastado na frente de um júri cagão. Inferno é acordar todo santo dia sem saber por que você existe. Por que você respira. Isso é o inferno! E eu finalmente saí de lá. (MILLER: 2005, 39)

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Marv segue para a casa de sua mãe, onde, escondido, no seu quarto de menino, onde um modelo de avião militar permanece pendurado sobre sua cama, ele pega Gladys em um baú – sua pistola nomeada assim em homenagem a uma das freiras de sua escola. “Por um tempo, a gente fica só se sentindo. É bom como sempre. Eu conto a ela sobre Goldie e sobre o que precisamos fazer” (Idem, 44). Marv então parte numa jornada em busca de pistas no submundo da cidade.“Vá até o beco certo em Sin City e você pode encontrar de tudo” (Idem, 48) nos diz Marv, em silhueta, com seu sobretudo, de cabeça baixa, rodeado por duas latas de lixo também enegrecidas, em contraste a um beco branco que pela suas laterais, marcadas pelo relevo dos tijolos, e ausentes de teto no quadro, parecem não ter fim. De pista em pista, violência sobre violência, ocorrerá uma sucessão de acontecimentos – dentre eles a aparição de uma Goldie tentando persegui-lo e matá-lo, onde Marv constatará que “quando você tem um problema é muito ruim esquecer de tomar o remédio...” (Idem, 83) e a descoberta do sujeito por trás do assassinato: um cardeal, um homem publicamente santo, da família Roark, a mais poderosa de Sin City, do estado e uma das mais do país. Numa forte tempestade, de pingos em riscos brancos, onde o relevo de Marv ao vento diante da imensa estátua do cardeal Roark, surgindo perante ele de braços erguidos e com enorme crucifixo no peito, ao fim de uma escadaria ao ar livre, faz Marv dimensionar o desafio, o jogo de forças totalmente desiguais, postado diante de si como uma maldição, um profecia agourenta, um destino implacável e uma ousadia louca. Ainda assombrado com o pesado fardo que despenca sobre suas costas – e sobretudo –, Marv questiona se não está alucinando, se não se transformou naquilo que todo mundo disse que ele acabaria virando: “Um maníaco? Um louco assassino?” (Idem, 138). É preciso então assegurar-se, descobrir de fato quem foi Goldie, procurar razões críveis, afinal “não se pode matar um homem sem ter absoluta certeza de que você tem que fazer isso... e eu preciso ter certeza absoluta” (Idem, 138). Goldie era uma prostituta de luxo informou Lucille, que viria também a investigar o caso e acabaria morta por comparsas do mesmo assassino. Marv ficaria sozinho, e a busca pela verdade o levaria ao centro velho.

A mercadoria ta sendo mostrada. Não tá nem aí pro frio. Logo, mais limusines e pick-ups vão começar a encostar e os negócios vão esquentar. Falei centro velho porque ninguém chama esse lugar de “Basin city” como tá no mapa. Naquele tempo [no velho oeste], esse lugar era uma cidade do ouro que estava se transformando numa cidade-fantasma. Então, o velho Roark

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[patriarca da família] teve uma idéia... ele gastou cada centavo que tinha importando as melhores vagabundas da França e de lugares do tipo... A notícia se espalhou rápido e Sin City passou a ser a parada mais quente do oeste. As pessoas vinham de muito longe. As pessoas ainda vêm. O centro velho manteve sua tradição. Tradição passada de mãe para filha... 3 (MILLER: 2005, 139)

Marv descobre que a aparição do duplo de Goldie tentando matá-lo é sua irmã gêmea, Wendy, que achou que ele era o verdadeiro assassino. Imbróglio resolvido, Marv tem o apoio das prostitutas do centro velho e a perturbadora companhia de Wendy, “ela é Wendy, a irmã gêmea da Goldie. Eu não posso me confundir com isso” (Idem, 154). Na noite em que finalmente se chega ao capítulo final da trama, que a cruzada requer seus últimos sacrifícios, Marv, diante de um espelho, com seus traços duros, estanques, vívidos apenas em sua pele marcada nas dobras de luz e nos recortes de sombra, pensa, diz a si mesmo:

Imagine a morte. Sinta ela. Vá se acostumando a ela. E então guarde ela onde deve ficar guardada. Você ainda tem que matar algumas pessoas. E, se você fizer do jeito certo, não vai ter importância o que disserem depois. Você vai pro caixão como um vencedor. (MILLER: 2005, 151)

Noite adentro, após muita luta, é defronte ao inimigo, desfiando a rede, que Marv descobre que o cardeal Roark juntamente com o garoto Kevin, assassino de Goldie, são canibais – no entendimento de Roark, comedores de alma em busca de êxtase, do toque ao paraíso. Goldie era apenas uma das prostitutas, vítimas recorrentes da dupla, que poderia reconhecê-los como suspeitos no desaparecimento de tantas garotas. Goldie “tava procurando proteção e pagando por ela com seu corpo e mais! Pagando com amor, com tesão, fazendo eu me sentir como um rei, como uma porra de um cavaleiro! Me fazendo sentir como um herói... Que piada!” (Idem, 132). Após a

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Ainda sobre o centro velho: no 2° volume, Sin City: A dama fatal, Dwight, protagonista desta narrativa, comenta “Centro velho. Onde a beleza é barata, desde que você só tenha vindo pra olhar... mas se você está pronto pra gastar, então você pode ter qualquer coisa que imaginar...” (MILLER: 2005, 17) Novamente Dwight, no 3° volume, Sin City: A grande matança, a respeito de um carro policial que segue arruaceiros que partem em direção ao centro velho enquanto as prostitutas, alertas, preparam-se empunhando armamento pesado: “O tira desliga a sirene. Ele não está muito certo sobre como fazer esse jogo. Sabe que não é a lei. Não no centro velho. As damas são a lei aqui, lindas e impiedosas. Se você tiver grana e jogar dentro das regras, elas realizam todos os seus sonhos. Mas, se traí-las... Pode se considerar um cadáver” (MILLER: 2005, 30). Irresistível se torna relacionar, na pesquisa de Benjamin em Jogo e Prostituição, com a seguinte passagem: “J. Pellcoq descreve a perna erguida no cancã com a legenda: Apresentar armas!” (BENJAMIN: 1994, 260).

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longa tortura e morte dos dois, Marv é pego pela polícia.“Eu realmente saio do sério quando caras barbarizam com as damas...” (Idem, 181) diria ele em outro momento. Forçado a assumir a culpa dos assassinatos das prostitutas e do cardeal Roark em troca de sua mãe que seria morta, Marv assina uma confissão depois de quebrar o braço do promotor público em três lugares. Condenado à pena de morte na cadeira elétrica, Marv recebe na sua última noite a visita de Wendy que se entrega a ele e o permite chamá-la de Goldie. Marv é executado, mas são necessárias duas tentativas, já que na primeira, ele ainda vivo, gargalha, perguntando se “isso é o melhor que podem fazer, suas bichas?!” (Idem, 198). A crônica de Marv, seu fatalismo e crueldade, é apenas mais uma na rotina de Sin City. Outros volumes da série, protagonizados na imensa maioria, por homens, intrépidos e severos, apenas reforçam o caráter da cidade como palco do universo noir onde esses homens, ou antes, esses masculinos são condenados às demandas da crise sócio-cultural do pós-guerra, personalizado naquilo de mais próximo, e ao mesmo tempo mais estranho, que surge diante do homem: a mulher4, sua contraparte sexual, agora sob outra posição, e portanto, catalisadora do movimento masculino na busca por novos espaços. Para Marv, o clamor pela aventura virá na figura de uma mulher, Goldie, e no crime em que a vitimou. O mesmo se repetirá com Dwight com Ava5, Shellie6 e Gail7, Hartigan com Nancy8, Wallace com Esther9, entre outros.

Um dos temas mais recorrentes da história da arte, no noir, a femme fatale, metaforiza, do ponto de vista masculino, a independentização alcançada pela mulher no momento histórico do pós-guerra. Ao operar a transformação dela 4

Emblemático, portanto, se tornam as prostitutas de Sin City com seus brincos onde todos os tipos de símbolos podem ser encontrados, na maioria das vezes, combinamos de forma aleatória. O símbolo de Vênus, de Marte, a cruz cristã, a estrela de Davi, foice, martelo, a suástica nazista, estrela, coração, raio, sol, lua, o símbolo da paz, um ícone da bomba de hidrogênio, entre muitos outros, parecem associar-se pelo puro prazer estético em nome de um total esvaziamento de suas significações. Esse mesmo exercício repete-se nas prostitutas parisienses, só que desta vez nas roupagens, conforme coletado por Benjamin, em Jogo e Prostituição , o seguinte comentário de F.F.A.Béraud, em As mulheres públicas de Paris, de 1839: “Com o olho apenas um pouquinho exercitado, é fácil constatar que uma mulher, às oito horas em um costume elegante, fino, é a mesma que aparece às nove horas como costureirinha, e que se mostra as dez como camponesa, e vice-versa” (BENJAMIN: 1994, 253). 5 Sin City: A dama fatal. Este volume com uma titulação tão cara ao noir traz um interessante relato da vilã protagonista que dá nome a esta edição: “existe uma palavra para o que sou, mas ninguém mais a usa hoje em dia. Ninguém quer enxergar a mais simples verdade. Se quisessem, matariam pessoas como eu assim que nos revelássemos. Mas não matam. Fecham seus olhos e divagam sobre psicologia! E dizem que ninguém é realmente mal. Foi por isso que eu venci. É por isso que eu sempre venço!” (MILLER: 2005, 116). 6 Sin City: A grande matança. 7 Sin City: A noite da vingança. 8 Sin City: O assassino amarelo. 9 Sin City: De volta ao inferno.

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em sedutora malévola e passível de punição, o noir procura reforçar a masculinidade ameaçada e restabelecer simbolicamente o equilíbrio perdido. Mas, ao mesmo tempo como observa Deborah Thomas, também a mulher “redentora” presente no noir é retratada como ameaçadora, por simbolizar a tentações e os perigos da domesticação do herói. (MASCARELLO: 2006, 182)

O desconforto e ansiedade de Marv perante o destino que a ele se desdobra, o fazendo pôr em dúvida sua sanidade por diversas vezes, e, principalmente, o direcionando na urgência de encontrar um espaço onde sua vida social fará algum sentido, permanece, em todos seus aspectos, rodeado pela sombra do feminino. Goldie e sua irmã gêmea, Wendy, ocupam na trama o papel da mulher fatal, aquela que por seus atributos físicos e poder de sedução, lança o herói num espaço onde ele terá que lutar pela afirmação da sua masculinidade. Seja na morte de Goldie, onde Marv precisa fazer justiça, dar o troco, honrar a dama, pagar o tanto de prazer que ela lhe concedeu, seja no confronto e posterior conciliação com Wendy, para quem ele terá que provar sua capacidade de protegê-la e conservá-la, como no momento em que Marv lhe dá um tapa, deixando-a inconsciente para que ela não veja o as torturas que infringirá a Kevin (MILLER: 2005, 177). Outro modelo de mulher fatal se personifica em Lucille, quando esta constantemente o reprime em sua selvageria, domesticando-o com suas pílulas – e por ser homossexual e não demonstrar qualquer pudor em exibir seu corpo escultural para Marv, Lucille também surge como uma provocação e lembrança de tudo aquilo que ele poderia fazer, mas não deve. Com menor importância na trama, mas também numa faceta da mulher fatal está a mãe de Marv, por quem ele opta se sacrificar para salvá-la, para morrer como um herói, como um dos mocinhos – posição que sua mãe cega nunca reconheceria, mas o “Marvin, querido” (Idem, 44) soube, nos seus últimos momentos, que finalmente se adequou ao projeto de bom cidadão que sua mãe simboliza no engessamento da tradição dos bons e velhos costumes do bom mocismo. Marv é por tipagem o herói noir. A mulher fatal de muitas faces que o rodeia é a própria fatalidade do feminino ao homem do pós-guerra, e especificamente neste caso, por se tratar de uma história dos anos 1990, mais ainda a fatalidade distendese na liberação sexual feminina e na obrigação do homem a ela ser satisfatório, tanto no quesito das relações econômicas e de conservação na configuração clássica – Marv precisa retribuir à Goldie pelo o que ela lhe deu, além de resguardar Wendy –, quanto no aspecto sensual, onde o corpo será seu objeto afirmativo e recompensador ao feminino – quando Lucille, vitimizada, depois de um abraço gentil de Marv, desliza seu 11

corpo no dele, mostrando sua fragilidade, ela fortalece Marv a lançar-se incessantemente, com seu corpanzil contra a porta, até afrouxar as trancas da cela em que estão presos. Mas a fatalidade do feminino não se restringe às mulheres, ou melhor, não só às mulheres o feminino enquanto ameaça ao homem noir se perpetua. Na língua portuguesa tanto mulher, como cidade são substantivos femininos. Sin City, independente da sua origem na língua inglesa, onde o artigo é indefinido, se mostra claramente feminina ao olhar masculino. “Sin City é uma vagabunda bem barata implorando pra ser currada. E eu me deito com ela de novo e de novo, mesmo sabendo que ela não vale nada, e ainda assim ela fica me pedindo mais... Caralho! Como é bom estar vivo” (Idem, 71) diz Marv, radiante, sorrindo, com seu sobretudo ao vento, pulando de um dos parapeitos da cidade – da mesma cidade que mais tarde mostraria sua ira e fatalidade implacável ao condená-lo à sua sina. Sin City vem a ser um feminino típico ao homem noir, onde na mesma medida que lhe dá e lhe tira a vida como em mitos matriarcais, ela o protege10 e o sufoca nas suas ruas convulsivas como no entrelaçamento dos braços calorosos da mãe, ternos porém firmes. Marv entende Sin City como uma prostituta de forma tão alegre e de maneira tão parecida ao êxtase que se fez presente na sua relação sexual com Goldie. Na prostituição, o dinheiro opera uma participação central e definidora no estabelecimento das relações. Walter Benjamin, em Jogo e Prostituição, aponta interessantes reflexões sobre a condição da prostituição na Paris do século XIX.

Sobre a função dialética do dinheiro na prostituição. Ele compra o prazer e, ao mesmo tempo, se torna a expressão da vergonha. “Eu sabia – diz Casanova de uma alcoviteira –, que não teria a coragem de sair sem lhe dar alguma coisa.” Essa frase estranha revela seu conhecimento do mecanismo mais oculto da prostituição. (...) O amor da prostituta é, sem dúvida, venal. Mas não a vergonha de seu cliente. Essa vergonha procura um esconderijo para este quarto de hora, e acha o mais genial de todos: o dinheiro. São tantas as nuances do pagamento quanto as nuances do jogo amoroso – lento ou rápido, furtivo ou violento. (...) A ferida rubra de vergonha no corpo da sociedade segrega dinheiro e se cura. (...) Casanova bem o sabia: o atrevimento lança na mesa a primeira moeda; a vergonha cobre cem vezes a aposta, para não vê-la. (BENJAMIN: 1994, 240)

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Essa particular relação de proteção da cidade ao homem parece confluir com um curioso comentário de Marv quando precisou adentrar um bosque “Eu odeio o mato à noite. Principalmente os barulhos. As pessoas vivem falando da natureza como se ela fosse bonita e agradável. Só sei que elas nunca devem ter passado uma noite amarradas numa árvore no meio do mato” (MILLER: 2005, 85).

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Marv não possui dinheiro. Aliás, dinheiro é um elemento quase que relegado nos meandros da motivação da trama – embora isso não queira dizer que Marv se isente de prestar seu pagamento. Marv paga à Goldie na vergonha de não ter sido capaz de protegê-la, ou mesmo de não poder pagar a quantia pela qual ela mereceria. Já com Sin City a vergonha de Marv reside em ele não ser ninguém relevante naquela cidade, e somente pagando-a com o pouco de sua disposição para com os segredos sujos desta prostituta barata, ela lhe oferecerá toda sorte de grandes aventuras e violentos prazeres. “O amor pela prostituta é a apoteose da identificação de si mesmo com a mercadoria” (Idem, 266). Marv ama a mulher-cidade prostituta, porém essa operação em que o pagamento recobre a vergonha e, consequentemente, reafirma o orgulho no amor devoto, revela consigo uma engrenagem de relações econômicas e de poder tão profundas e subliminares que analisá-las necessitaria de uma investigação muito mais minuciosa. Por ora, voltemo-nos a uma indagação mais pontual: seria na prostituição, da mulher e da cidade, o espaço de possibilidade que Marv encontraria para comprar sua masculinidade perdida, e consequentemente, o remédio para o fim da moléstia do homem? Talvez sim, mas a superação deste procedimento, sempre destinada ao fracasso na crônica noir, não cabe mais ao próprio homem noir. Vejamos...

Tornamo-nos muito pobres em experiências iniciatórias. Adormecer é, talvez, a única que nos restou. (Com ela, no entanto, também o acordar). E, finalmente, também flutuam sobre os umbrais os altos e baixos do divertimento e das mudanças sexuais do amor, como a mudança das imagens oníricas. “Como agrada ao homem – diz Aragon – manter-se nas portas da imaginação!” Não são apenas os umbrais destes portões fantásticos, mas os umbrais em geral, dos quais amantes, amigos se comprazem em sugar forças. As prostitutas, porém, amam os umbrais destes portões de sonho. O umbral deve ser diferenciado claramente do limite. O umbral (Schwelle) é um espaço. Mudança, passagens, marés, são conteúdos da palavra schwellen (crescer, intumescer) e a etimologia deve tê-los presentes. (BENJAMIN: 1994, 243)

O umbral, espaço defronte dos portões da imaginação onde a experiência do homem pode encontrar sua salvação, revolução, sua benjaminiana iluminação profana, está menos para o espaço noir, e muito mais para o espaço do surrealismo. André Breton está mais a vontade com seu (não) resolvido espaço do homem moderno que Marv, e Nadja está bem melhor erigida e efetivada em sua outridade de mulher-cidade do que Sin City e suas mulheres fatais. De um modo geral, nos vanguardistas encontra-se mulheres invisíveis e enigmáticas cujas imagens enganosas e diversas podem se reunir em um

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único obscuro objeto de desejo como no filme de Buñuel, ou ainda em casos romanescos de personagens femininas que, se não se transformam de fato em cidades, se identificam ao desejo das cidades de seus amantes. (ANDRADE: 2005, 16)

“Se você quisesse, eu não seria nada, ou apenas um traço, para você” (BRETON: 2007, 108) diria Nadja, a musa indefinível e espectral do livro de Breton, perdida entre encontros ao acaso e divagações descompromissadas por pontos prosaicos, e no entanto riquíssimos, da cidade de Paris. No “mundo de Nadja, em que tudo tomava imediatamente a aparência da ascensão e da queda” (BRETON: 2007, 125), Nadja talvez seja um passo muito mais amplo em direção da destruição de um homem pela vez de outro, ou antes, uma ética do devir enquanto potência do Ser “escancarado como uma porta” (Idem, 143). Na primeira parte do livro, Breton apenas nos situa, de maneira muito irregular, de seus pensamentos, suas rotinas, filmes que viu, peças que assistiu, amigos com quem convive e impressões que consolida, tendo para isto, o falso auxílio de fotografias em suas pontuações, que sempre parecem mais antagonizar o olhar por ele construído e descrito, do que complementar. Em contradição, as fotografias nos contam uma mesma e uma outra história num movimento só – uma mesma de recortes, uma outra em significações. Breton jamais se esquiva da postura de uma testemunha recorte entre cortes da cidade.

Espero, de todo modo, que a apresentação de uma série de observações dessa ordem e da que se segue seja de natureza a precipitar alguns homens na rua, depois de tê-los feito adquirir consciência, se não do nada, pelo menos da grave insuficiência de qualquer cálculo pretensamente rigoroso sobre si mesmos, de toda ação que exija uma aplicação permanente, e possa ter sido premeditada. De nenhum fato, por menor que seja, restará coisa alguma, se ele é verdadeiramente imprevisto. (BRETON: 2007, 62)

Estabelecido isso, o próprio Breton nos avisa da entrada de Nadja na trama, a mulher não encontrável11, próxima à livraria l’Humanité, parece hipnotizar Breton à primeira vista – clichê este que tem seu sentido, na medida em que os olhos são o elemento central da fascinação de Breton por aquela desconhecida e o motivo para sua posterior aproximação. “O que poderia haver de tão extraordinário naqueles olhos? O que se reflete ali, ao mesmo tempo de obscuramente miserável e luminosamente 11

“Nadja telefonou na minha ausência. À pessoa que atendeu, e que a meu pedido perguntou onde encontrá-la, ela respondeu: “Não sou encontrável” ” (BRETON: 2007, 89).

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altivo?” (Idem, 65). A moça de vestes simplórias, histórias pessoais ora desinteressantes, ora vergonhosas, mas principalmente, imprevisíveis, perdidas num acaso lógico e cronológico atrai Breton a encontros sucessivos, dia após dia, em ocasiões não menos imprevistas. A aleatoriedade de Nadja, suas ações e reações inesperadas, mudanças bruscas de humor faz o casal manter-se em constante movimento pela cidade. A transitoriedade dos passos de Nadja e Breton está de certa forma muito bem sintonizada ao próprio fluxo de seus raciocínios, suas vagas, e inegavelmente, ao próprio devir delirante da rememoração do narrador Breton.

Diante de nós derrama-se um chafariz cuja curvatura ela parece acompanhar. “São os seus pensamentos e os meus. Olha de onde eles vêm, até onde se elevam, e como é mais bonito ainda quando caem. Logo em seguida se fundem, se refazem com a mesma força, e recomeça esse arremesso que se despedaça, essa queda... e assim indefinidamente.” (BRETON: 2007, 82)

“Quem vem lá? É você, Nadja? É verdade que o além, todo o além esteja nesta vida? Nada escuto. Quem vem lá? Serei apenas eu? Serei eu mesmo?" (Idem, 134). A presença de Nadja causa a Breton um enorme desconforto à sua identidade, seu ser, já em vias de se perder no surrealismo, e potencializado por Nadja para além do homem. “Quem é você?” E ela, sem hesitar: “Eu sou a alma errante” (Idem, 70). Assim como desaprova a “mania de arrancar os olhos das bonecas para saber o que há por trás deles” (Idem, 85), Nadja, por um mesmo e único gesto dançado, conquista e arrasa qualquer pretensão de crença num ser ou essência, minando toda premissa do mistério do “quem sou?”

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pretensiosamente calcado na busca de uma verdade ontológica13, e

oferecendo em troca um convite embriagado a uma vividez tão distante à experiência do homem moderno. Sinto, perto dela, que estou mais próximo das coisas que estão perto dela do que dela. No estado em que se encontra, ela vai necessariamente precisar de mim, de um jeito ou de outro, de uma hora para outra. Não importa o que me peça, recusar-lhe seria odioso, tão pura que ela é, livre de todos os vínculos terrestres pelo pouco, porém maravilhoso apego que tem à vida. (BRETON: 2007, 86)

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Indagação primeira que abre Nadja, o escrito (BRETON: 2007, 21). Também emblemático ao desinteresse de Nadja por qualquer pretensão de verdade essencial é um dos seus desenhos, dos muitos que ela imprevisivelmente fazia, feito enquanto ela esperava Breton no bar La Régence, e a ele mostrado em outro momento. Nadja insistia “em esclarecer alguns de seus elementos, com exceção da máscara retangular, sobre a qual não pode dizer nada além de que é assim que a vê” (BRETON: 2007, 99). 13

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“No amor esotérico, a dama é de todos os seres o mais inessencial. É o que ocorre com Breton. Ele está mais perto das coisas de que Nadja está perto, que da própria Nadja. Quais são as coisas de que ele está perto?” (BENJAMIN: 1985, 25) Na experiência revolucionária do casal com Paris, responde Benjamin. Nos infinitos, grandes ou pequenos detalhes, corriqueiras pontuações, fugazes recortes da vida das ruas, edifícios, palácios, trens e traunsentes da urbe, sejam descritos ou fotografados, são poética e revolucionariamente capturados, de maneira que “os dois fazem explodir as poderosas forças “atmosféricas” ocultas nessas coisas” (Idem, 25). É nesta atividade, portanto, que uma rostificação da cidade enquanto potência outra se fulgura. “E nenhum rosto é tão surrealista quanto o rosto verdadeiro de uma cidade” (Idem, 26). Não sou quem vai meditar sobre o que advém da “forma de uma cidade”, nem mesmo da verdadeira cidade, alheia e abstrata, daquela em que moro, por força de um elemento que seria para minha mente o que o ar é para a vida. Sem nenhum arrependimento, nesta hora eu a vejo tornar-se diferente e até fugir. Resvala, se incendeia, afunda no redemoinho de suas barricadas, no sonho das cortinas de seus quartos, onde um homem e uma mulher continuarão a se amar indiferentes. (BRETON: 2007, 140-141)

Eliane Robert Moraes, em Breton diante da esfinge comenta tal disposição bretoniana e, não intencionalmente, nos conduz a uma curiosa coincidência – um encontro fortuito de diferentes rostos? – entre Sin City e Nadja. A disponibilidade para os mistérios da cidade (...) será decisiva para o aparecimento de uma tópica central do movimento [surrealista]: a noção de “encontro fortuito”. Central também em Nadja, ela traduz um dos fundamentos da atividade do grupo, dando origem à idéia de “acaso objetivo” (...) Na base de tal conceito está o desejo de confrontar o acaso e a necessidade, visando a investigar as ocorrências subterrâneas que precipitam os encontros significativos. Acaso objetivo exemplar ocorre na calçada de uma das grandes artérias parisienses (...) a rua La Fayette localizada em uma região conhecida pelas ocupações de sua população feminina. Vale dizer, um bairro que se tornara popular por suas videntes ou por suas prostitutas, cujos “olhos violeta” atraem mas também assustam o escritor, que associa a cor à idéia de violação ou de violência. (MORAES: 2007, 9-10)

Rua La Fayette e Centro velho, Paris e Sin City, ambas parecem habitar espaços em condições semelhantes14. Ambas se colocam a partir da invenção da 14

E entre Marv e Breton também há pequenos cruzamentos. Enquanto Breton lança seu elogio ao Os passos perdidos, em 1924, e em Nadja, “não sei por que é para lá, de fato, que meus passos me levam, que vou para lá quase sempre sem objetivo determinado, sem nada de decisivo a não ser esse dado obscuro de saber que ali vai acontecer isto (?)” (BRETON: 2007, 40), Marv reflete: “não chove em Sin City com muita freqüência. (...) Só que, uma ou duas vezes por ano o deserto tosse e cospe uma chuva de verdade. Uma torrente tão fria que transforma as ruas em vidro e te congela até os ossos. A maioria das

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paisagem urbana pós-industrial e sua incontrolável proliferação de vida sobre vida, apartamento sobre apartamento, vertiginosamente, tornando a cidade, assim, um local latente de segredos ocultos, surpresas por vir e narrativas cortadas e entrecruzadas.15 Porém há uma diferenciação crucial entre Sin City e Paris, na relação do homem noir para a mulher fatal e do homem surreal para Nadja, e esta se dá na postura revolucionária do surrealismo perante o mistério do banal, do fortuito, da vida fragmentária e irracional. A iluminação profana benjaminiana, portanto, se consolida perante a cidade na disposição de eterna descoberta, no enfraquecimento da norma e no trabalho de des-criação do real. “Quem éramos nós diante da realidade, esta realidade que agora vejo deitado aos pés de Nadja, como um cão vadio?” (BRETON: 2007, 102). Se em Sin City os segredos da cidade o conduzem a uma verdade, ainda que parcialmente oculta, com Paris de Nadja e Breton, o mistério é o jogo de respostas em si – potencialização do acabado, do normatizado, do relegado, encerrado e finito. Diante do mistério da esfinge bretoniana, a revelação se dá no Outro olhar, na Outra possibilidade de um Mesmo, reconduzindo-o, ao infinito, para um novo enigma que nunca cessa de produzir e se repetir.

Lembro também – e nada naquele instante poderia ter sido ao mesmo tempo mais belo e mais trágico –, lembro de ter aparecido a ela negro e frio, como um homem fulminado aos pés da Esfinge. Vi seus olhos de avenca se abrirem de manhã, para um mundo em que as batidas de asas da imensa esperança pouco se distinguiam dos outros ruídos, que são o do terror, e neste mundo eu não via senão olhos se fecharem. (BRETON: 2007, 102-103)

Breton fica sabendo que Nadja está louca, que após um suposto exagero de excentricidades nos corredores de seu hotel, foi encaminhada a um sanatório. Contra qualquer um que possa acusar a postura de Nadja ou a companhia e estímulo de Breton como causas inegáveis e determinantes para tal fim, Breton se antecipa, negando rebater tais argumentos apenas dizendo: “acredito não haver para Nadja uma extrema diferença entre o interior e o exterior de um hospício” (Idem, 126) – ainda assim, contudo, o pessoas detesta chuva quando ela é cruel assim. Mas eu? Ah... Eu adoro. Me ajuda a pensar... (...) Eu suspiro e deixo meus pés me levarem para onde eles quiserem... Então, eu penso...” (MILLER: 2005, 129). 15 Benjamin em A obra de arte na era da reprodutibilidade técnica, a respeito da distinção entre uma postura de recolhimento e distração diante da obra de arte, associa a arquitetura à última. Tal comentário poderia render outras poderosas vertentes de análise: “desde o início, a arquitetura foi o protótipo de uma obra de arte cuja recepção se dá coletivamente, segundo o critério da dispersão. (...) Sua história é a mais longa que a de qualquer outra arte, e é importante ter presente a sua influencia em qualquer tentativa de compreender a relação histórica entre as massas e a obra de arte” (BENJAMIN: 1985, 193).

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autor/personagem considera o confinamento e a sujeição ao tratamento psiquiátrico uma situação indigna para Nadja. No contexto de reflexões sobre a internação, o auto-engano da psiquiatria16, dos hospícios, das prisões e suas respectivas operações ao status quo social, em oposição a toda forma de clausura, Breton anuncia:

... que a liberdade adquirida neste mundo ao preço de mil renúncias, as mais difíceis, exija que desfrutemos dela sem restrições enquanto nos for dada, sem consideração pragmática de nenhuma espécie, e isso porque a emancipação humana, concebida em definitivo sob a sua mais simples forma revolucionária, que não passa da emancipação humana sob todos os aspectos, entendamos bem, segundo os meios que cada um dispõe, continua sendo a única causa digna a que servir. (BRETON: 2007, 131-132)

E arrebata com o significativo comentário: “Nadja foi feita para servir a essa causa, nem que fosse só para demonstrar que se deve fomentar em torno de cada ser uma conspiração muito particular” (Idem, 132). Essa ética bretoniana, ou antes, nadjana, se trata da ética do onírico, do não-lógico, do surreal, do homem em delírio perante a mulher e a cidade e do sonho enquanto potência libertadora.

Porque a produção de imagens de sonho depende sempre pelo menos desse duplo jogo de espelhos, nela encontramos a indicação do papel muito especial, sem dúvida eminentemente revelador, o mais alto grau “supradeterminante”, no sentido freudiano, que certas impressões muito fortes são chamadas a desempenhar, nada contamináveis pela moralidade, verdadeiramente percebidas “acima do bem e do mal” no sonho e, em seguida, no que lhes opomos muito sumariamente sob o nome de realidade. (BRETON: 2007, 55)

A mulher-cidade, portanto, é em seu rosto, sua pretensão, ocupação de espaço, uma chance ao homem, pai e filho, do platonismo à modernidade, se redimir de si mesmo. Mas a que preço? No universo noir Marv precisa pagar para merecer o seio da prostituta mulher-cidade, já Breton e os surrealistas embora a desejem muito mais, necessitam apenas a ela observar, atentos, esperar pacientemente, deixá-la livre em suas demandas até que a mulher-cidade surrealista os absorva em sua pulsação e a ela eles se entreguem em amor. Este se deixar levar ao Outro é a queda de um Mesmo homem,

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Também sobre a psicanálise, em outro momento, e com uma postura diferente embora ainda crítica, Breton comenta: “(...) psicanálise, método que aprecio e que penso não visar a nada menos que a expulsar o homem de si mesmo, e da qual espero mais do que as meras funções de oficial de justiça. (...) Assim como, a despeito de seus grandes méritos, já é lhe fazer honras demais admitir que esgote o problema do sonho ou que não ocasione simplesmente novas falhas de atos a partir de sua explicação dos atos falhos” (BRETON: 2007, 29-33).

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certamente – e o homem surreal verá a beleza da queda enquanto o noir apenas sua decadência. Sobre desejo, beleza e razão um comentário se faz pertinente. Platão nos diz, no discurso de Sócrates à Fedro:

... em cada um de nós existem dois princípios de forma e conduta, que seguimos para onde eles nos conduzem: um, inato, é o desejo do prazer, outro, adquirido, que aspira sempre o melhor. (...) Posto isto, assentemos em que, quando sai vencedora a forma orientada pela razão, essa forma chama-se temperança; quando é o desejo que, destituído da razão, nos arrasta para os prazeres e nos conduz a seu belo talante, essa forma chama-se gula. (PLATÃO: 2000, 38-39)

Breton, na última frase em seu escrito, diz “A beleza será CONVULSIVA, ou não será” (BRETON: 2007, 146). Mas o que não será? A beleza senão convulsiva? A convulsão imprescindível à beleza? Ou, no que me parece mais potente, a beleza não convulsiva não será nem beleza, nem convulsão, nem absolutamente nada – a beleza não convulsiva simplesmente nada é. Portanto, se para Platão, o desejo de beleza descomedido, abaixo – ou acima – da razão, atinge a gula, em Nadja não haverá beleza com temperança17. A beleza só será um ato de potência na superação, na intemperança, na convulsividade infinita, onde estará a porta pela qual passará o Messias e lançará sua iluminação profana contra a ordem da tradição platônica. Acontecerá, portanto, no momento preciso em que o surrealismo ultrapassar a dualidade, entendendo a concepção de racionalismo enquanto mais um delírio, uma também surrealidade, a beleza revolucionária, ética por excelência da embriaguez politizada, operará a – sonhada? – reversão do platonismo18, proposta por Nietzsche e elucidada por Deleuze, fazendo “subir os simulacros, afirmar seus direitos entre os ícones ou as cópias” (DELEUZE: 1998, 267) enquanto “potência para afirmar a divergência e o descentramento” (Idem, 270) aonde “nenhum modelo resist[irá] à vertigem do Simulacro” (Idem, 267-268), consolidando-se assim, o devir, o simulacro em eterna transformação, sem repartições finitas em dois ou três, mas em infinitas porventuras. Como fala com sabedoria, esta poetisa embriagada! Certamente afogou a sua embriaguez no vinho? Tornou-se extra-lúcida? Rumina? – antiga e profunda 17

Mas não esqueçamos: Nadja “em russo é o começo da palavra esperança, e (...) é só o começo dela” (BRETON: 2007, 66). 18 Teria Sócrates, personagem de Platão, já anunciado uma ética embriagada, loucura revolucionária? “Mas a loucura, como sabes, comporta duas espécies, uma devida às doenças do corpo, outra proveniente de uma inspiração divina, que atira conosco para fora das regras rotineiras” (PLATÃO: 2000, 99).

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treva da meia-noite, rumina o seu mal em sonhos e, mais ainda, a sua alegria, porque se o mal é profundo, mais profunda ainda é a alegria. (O canto da embriaguez. NIETZSCHE: 2005, 298)

Ao homem moderno no salão de espelhos resta então o esmorecimento gradual, ver no reflexo não mais uma extensão de sua finitude, de seu Mesmo, mas um falso, que ao contrário do binarismo tradicional, este em nada tem a ver com o verdadeiro, nem sequer a ele faz oposição, exceto enquanto potência. O falso é o Outro se fulgurando, subvertendo “a representação, que destrói os ícones: ele não pressupõe o Mesmo e o Semelhante, mas, ao contrário, constitui o único Mesmo daquilo que difere, a única semelhança do desemparelhado” (DELEUZE: 1998, 270). O acontecimento de Nadja para Breton, de Sin City para Marv, da mulher-cidade para o homem moderno então se edifica como o simulacro da Idéia, o Outro do Mesmo, a potência do falso. “Elevando o falso à potência, a vida se liberta (...) tanto das aparências quanto da verdade: nem verdadeiro nem falso, alternativa indecidível, mas potência do falso, vontade decisória” 19 (DELEUZE: 1990, 176). Contrariamente à forma do verdadeiro que é unificante e tende à identificação de uma personagem (sua descoberta ou simplesmente sua coerência), a potência do falso não é separável de uma irredutível multiplicidade. “Eu é outro” substituiu Eu = Eu./ A potência do falso só existe sob o aspecto de uma série de potências, que estão sempre se remetendo e penetrando umas às outras. Tanto assim que os investigadores, as testemunhas, os heróis inocentes ou culpados participarão da mesma potência do falso, cujos graus eles encarnarão, a cada etapa da narração. Mesmo “o homem verídico acaba compreendendo que nunca deixou de mentir”, dizia Nietzsche. O falsário será portanto inseparável de uma cadeia de falsários nos quais ele se metamorfoseia. (DELEUZE: 1990, 163-164)

A mulher-cidade é, certamente, apenas mais uma entre muitas outridades a desconstruir o homem moderno. Simplesmente um dos espelhos do salão, agora movimentado e radiante, a mulher-cidade conquistou sua potência do falso em meio a tantos infinitos outros que também já conseguiram e mais tantos que ainda estão por conseguir. Mas seu apelo está longe de ser esgotado – desenvolver a mulher-cidade ainda torna-se necessário à modernidade e aprofundar suas pesquisas, vital para este quem vos escreve. Ao alquebrado homem, a ordem da mulher-cidade continua a

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Ou também, “Só há devir, e o devir é a potência do falso da vida, a vontade de potência” (DELEUZE: 1990, 173).

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retumbar e ainda o faz tremer. “Diante do mistério. Homem de pedra, compreende-me” (BRETON: 2007, 108).

Fig. 2 Desenhos e pontuações de Nadja (BRETON: 2007, 101).

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REFERÊNCIAS ANDRADE, Ana Luiza. Um livro de mulheres espectrais: montagens para ler e ver. Outra Travessia: Revista de Literatura, Florianópolis, n. 4, 15-24, 2005. BENJAMIN, Walter. A obra de arte na era da reprodutibilidade técnica. In: Obras escolhidas, v. 1: Magia e técnica, arte e política. São Paulo: Brasiliense, 1985. ______. Sob o conceito de História. In: Obras escolhidas, v. 1: Magia e técnica, arte e política. São Paulo: Brasiliense, 1985. ______. Jogo e prostituição In: Obras escolhidas, v. 3: Charles Baudelaire, um lírico no auge do capitalismo. São Paulo: Brasiliense, 1994. BRETON, André. Nadja. São Paulo: Cosac Naify, 2007. DELEUZE, Gilles. Imagem-tempo: cinema 2. São Paulo: Brasiliense, 1990. ______. Platão e o Simulacro. In: Lógica do sentido. São Paulo: Perspectiva, 1998. FOUCAULT, Michel. O homem e seus duplos. In: As palavras e as coisas. São Paulo: Martins Fontes, 1995. MASCARELLO, Fernando. Film Noir. In: MASCARELLO, Fernando (Org). História do cinema mundial. Campinas: Papirus, 2006. Ca 7, 177-190. MILLER, Frank. Sin City: A cidade do pecado. 1 vol. 2. ed. São Paulo: Devir, 2005. ______. Sin City: A dama fatal. 2 vol. São Paulo: Devir, 2005. ______. Sin City: A grande matança. 3 vol. São Paulo: Devir, 2005. ______. Sin City: O assassino amarelo. 4 vol. São Paulo: Devir, 2005. ______. Sin City: A noite da vingança. 5 vol. São Paulo: Devir, 2005. ______. Sin City: De volta ao inferno. 6 vol. São Paulo: Devir, 2006. ______. Sin City: Balas, garotas e bebidas. 7 vol. São Paulo: Devir, 2006. MORAES, Eliane Robert. Breton diante da esfinge. In: BRETON, André. Nadja. São Paulo: Cosac Naify, 2007. 7-16. NIETZSCHE, Friedrich. Assim falou Zaratustra. São Paulo: Rideel, 2005. PLATÃO. Fedro ou Da beleza. 6. ed. Lisboa: Guimarães, 2000.

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