A MULTIPLICIDADE DE VOZES DISCURSIVAS NA ESCRITA DE BLOGS E MICROBLOGS POR ALUNOS DE INGLÊS

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A MULTIPLICIDADE DE VOZES DISCURSIVAS NA ESCRITA DE BLOGS E MICROBLOGS POR ALUNOS DE INGLÊS ELISA MATTOS DE SÁ, RENATA BARCELLOS DA ROCHA BORGES Authentic English Business Language Center e Universidade Federal de Minas Gerais Rua Paraíba, 330, sl 911 – 30130210 e Av. Antonio Carlos, 6627 – 31270-901 Belo Horizonte – MG – Brasil Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial - SENAC Rua São Tomé, 444 – 59025-030 – Natal, RN – Brasil [email protected], [email protected]

Resumo. Este artigo objetiva analisar brevemente a multiplicidade discursiva identificada na escrita de blogs e microblogs de alunos de inglês do SENAC-RN, em Natal (RN), e do CENEX-FALE/UFMG, em Belo Horizonte (MG), respectivamente. Com base nas noções de dialogismo e polifonia de Bakhtin (1981), entendemos que o discurso se faz por uma míriade de vozes e é construído na relação entre os sujeitos. O sujeito discursivo se vê cercado por outros discursos – seu discurso é marcado por sua voz, mas essa voz vem de um sujeito múltiplo. Considerando-se esses pressupostos teóricos, analisamos textos produzidos em blogs e microblogs durante um semestre letivo, nos quais identificamos diferentes movimentos de polifonia discursiva. Palavras-Chave. Polifonia. Dialogismo. Blogs. Microblogs. Inglês. Abstract. This paper presents a brief analysis of discourse variation identified in blogs and microblogs produced by English language students from SENAC-RN, in Natal (RN), and from CENEX-FALE/UFMG, in Belo Horizonte (MG). Drawing from Bakhtin’s notions of polyphony and dialogism (1981), we understand that discourse is developed through a myriad of voices, and that it’s constructed in social interaction. An individual’s discourse is at the same time unique and marked by other voices and discourses. For this paper we analyzed texts from blogs and micro blogs collected throughout one school semester, in which we could observe different examples of polyphony. Keywords. Polyphony. Dialogism. Blogs. Microblogs. English.

1. Introdução Este artigo refere-se à comunicação de mesmo nome realizada no ENELIN 2011 – IV Encontro de Estudos da Linguagem/III Encontro Internacional de Estudos da Linguagem – e apresenta uma breve análise da multiplicidade de vozes discursivas identificadas na escrita de blogs e microblogs produzidos por alunos de inglês do 1 Anais do Enelin 2011. Disponível em: www.cienciasdalinguagem.net/enelin

SENAC-RN, em Natal (RN), e do CENEX-FALE/UFMG, em Belo Horizonte (MG), respectivamente. Dividimos este artigo em cinco seções, e após esta introdução, na seção 2, abordaremos muito brevemente as noções de polifonia e dialogismo. Em seguida, na seção 3, discorreremos sobre as principais caraterísticas dos gêneros aqui tratados – os blogs e os microblogs, e na seção 4, apresentaremos a análise de nossas intervenções pedagógicas. Por ultimo, na seção 5, concluimos nosso artigo com algumas considerações acerca das intervenções realizadas.

2. Dialogismo e polifonia O dialogismo é um princípio constitutivo da linguagem: um locutor enuncia em função da existência de um interlocutor (real ou virtual). Não há discurso – ou língua(gem) – sem a relação dialógica entre os sujeitos. Essa afirmativa é uma das grandes contribuições de Bakhtin, que define o “diálogo” como “toda a comunicação verbal, de qualquer tipo que seja” (Bakhtin, 1981, p.123), ou seja, são as comunicações que se desenvolvem entre os interolocutores, situadas histórica e socialmente, e formam o espaço comum entre os participantes de uma situação interacional. Já a polifonia é caracterizada pela emergência de vários sujeitos (ideológicos) no discurso, nas interações sociais. Os discursos não nascem de um “eu” específico. Eles antecedem esse “eu”, pois já foram ditos por outros. O sujeito fala de diversas posições, legitimadas muito antes de sua existência, através de tantos outros sujeitos e discursos. O dialogismo é entrevisto na polifonia por meio da emergência de várias vozes em um discurso, em uma situação interacional, como reflete Rechdan (2003). Identificamos a presença dessa multiplicidade de vozes nas produções escritas dos alunos, além das diferentes posições assumidas pelos alunos em seus projetos de dizer.

3. Blogs e microblogs Discorreremos, agora, sobre os gêneros abordados em nossas intervenções, a começar pelos blogs, que podem ser definidos como o espaço em que o escrevente “pode expressar o que quiser na atividade da (sua) escrita, com a escolha de imagens e de sons que compõem o todo do texto veiculado pela internet” (Komesu, 2004, p.113). Nesse gênero, o projeto de dizer do escrevente pode ser voltado para leitores específicos ou não (Sá, 2005) e, de acordo com Marcuschi (2004), as principais características dos blogs são: a) relação temporal assíncrona, b) texto corrido, c) função interpessoal e tema livre, d) estilo informal, e) presença de diferentes semioses, entre outras. As definições que encontramos sobre os microblogs originam-se de trabalhos da área de Comunicação. Na área de Letras, não encontramos literatura sobre o gênero, que tem sido descrito como direcionado para a produção e a divulgação de textos de até 140 2 Anais do Enelin 2011. Disponível em: www.cienciasdalinguagem.net/enelin

caracteres (Kwak et al, 2010; Silva, 2010; Praça, 2011), em que o escrevente tem livre escolha de seu projeto de dizer. Embora encontremos outros serviços de microblogging no meio virtual, o Twitter é o mais populoso e pesquisado. Os microblogs mostram-se híbridos: podem ser vistos como um misto de blog com rede social e comunicador instantâneo (Orihuela, 2007). Por serem parte comunicador instantâneo, estão propensos a intensa troca interacional – interatividade. Além disso, possuem características semelhantes às listadas por Marcuschi (2004) para os blogs, e a possibilidade de envio de mensagens privadas (direct messages, DM), criando, para aqueles que assim desejam, mais privacidade.

4. Intervenções pedagógicas A primeira intervenção envolve uma turma de Intermediate do SENAC-RN, e contou com a participação de 10 alunos. O objetivo principal em mente foi levar os alunos a desenvolver a prática escrita em sala (no laboratório de informática da instituição) e extraclasse. Não houve distribuição de pontos para a tarefa. A intervenção durou um semestre letivo. Vejamos agora a análise da escrita de um blog. Tabela 1. Seleção de posts de um blog produzido por uma aluna de nível intermediário 1. Because sometimes the sky is blue when I cry my world changes. After... the clouds makes party, slowly... Trying to hide the strong blue of the sky. 2. Cos the age arrives The age always arrives. Today it arrived again. This is like MY new year. Just for me. Calls, holds, messages, kisses, cake... How many candles are there in my brain? Lighting my thought... making my cake better... So... Big party... in my soul! kisses little world. 3. Cos my teacher gives order Where's my inspiration today? Dear teacher... I don't know where is it. Can you forgive me?

O primeiro post da aluna já expressa grande subjetividade e adota um viés poético para a produção de seu blog, o que se mostrou surpreendente. As passagens destacadas em negrito e amarelo indicam, no primeiro post, a subjetividade presente na escrita da aluna. No segundo post, percebemos como a aluna decide abordar seu aniversário – também em forma de poesia, mais uma vez carregada de subjetividade. No 3 Anais do Enelin 2011. Disponível em: www.cienciasdalinguagem.net/enelin

terceiro post percebemos o projeto de dizer da aluna voltado para a comunicação com a professora. Em outras palavras, podemos dizer que a aluna fala ora da posição de aluna, ora de um lugar mais íntimo, o que é característico da escrita de blogs, mas não era esperado nessa intervenção. O projeto de dizer da aluna está voltado, nos posts 1 e 2 para um leitor virtual, e no post 3 a escrita também volta-se para a professora. A segunda intervenção aqui analisada refere-se a uma turma de Basic 4, do CENEX/FALE-UFMG, durou um semestre letivo e contou com a participação de 15 alunos. O perfil desses alunos é bastante claro: em sua grande maioria são jovens adultos, estudantes universitários e profissionais de diversas áreas. O objetivo inicial dessa intervenção foi o desenvolvimento da fluência na escrita em inglês. Buscava-se maior oportunidade de prática escrita, em especial extraclasse. Foram reservados 2 pontos de participação por aluno (em 100 pontos distribuidos no semestre). Os alunos não foram avaliados quanto à exatidão no uso de gramática e vocabulário, mas sim por sua participação, a qual se iniciou com a criação de um perfil no site www.twitter.com. O aluno, então, estava livre para escrever em inglês sobre o seu dia-a-dia ou quaisquer outros assuntos de sua escolha. Dentre as produções dos 15 alunos, selecionamos 5 para a apresentação no ENELIN 2011 e 1 para análise neste artigo.Vejamos um exemplo: Tabela 2. Seleção de posts de microblog produzido por um aluno de nível básico/pré-intermediário 1. I´m chating on msn 2. my english class was nice today but I´m sad because i had an argument with my girlfriend. 3. I´m going to the job. I really love my EJA students. 4. Beautiful night!! Cruzeiro won!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! 5. @Vivi. Vivi, thanks God that you're well now. Take care! 6. @Carla. Hi Carla. Where is the pub? Maybe next week I´ll go there. I like rock music.

No primeiro post, o aluno menciona apenas que está conversando pelo computador. Já no segundo post podemos perceber a emergência das vozes de aluno (ao falar sobre a aula de inglês) e de namorado (ao mencionar a discussão com a namorada). No terceiro post, identificamos a posição de profissional assumida pelo aluno, que menciona o quanto gosta de seu trabalho e de seus alunos. O aluno, aqui, se assume como professor. No quarto post, o aluno fala do lugar de torcedor de futebol. No quinto e no sexto posts percebemos a interação com outros colegas de sala, que se mostrou intensa durante o semestre. 4 Anais do Enelin 2011. Disponível em: www.cienciasdalinguagem.net/enelin

A relação dialógica estabelece-se entre o aluno como escrevente na projeção de seus leitores, que são seus colegas de sala e sua professora. Era esperado que no desenvolvimento da escrita o aluno assumisse outras posições, não somente a de aluno realizando uma tarefa didática, mas posições que ele também assume em seu dia-a-dia, como é natural nas situações de interação social. Não se esperava, no entanto, que a interatividade entre os alunos fosse tão grande ou que eles buscassem se comunicar em inglês com usuários fora do círculo colegas de sala e professora, o que vemos como extremamente positivo. Além disso, a busca por informações em inglês e pela correção colaborativa da escrita dos colegas foi crescente. Essa atitude pró-ativa, independente e solidária é um reflexo da autonomia dos alunos, e é um dos elementos que a professora esperava ver como resultado da intervenção, o que positivamente foi alcançado. Decidimos não corrigir os erros gramaticais por vezes cometidos, especialmente porque um dos objetivos das intervenções voltava-se para o desenvolvimento da fluência na prática escrita e não para a exatidão gramatical, que foi devidamente abordada em outros momentos em sala de aula. As seleções aqui apresentadas, portanto, encontram-se como originalmente produzidas pelos alunos.

5. Considerações finais Em geral, podemos dizer que o projeto de dizer dos alunos segue um roteiro (vou falar de mim/preciso me apresentar, estou fazendo este blog/microblog para a aula de inglês). Com o desenvolvimento das intervenções, e talvez em grande parte pelo suporte e pelas condições de produção dos gêneros, os alunos abandonam esse roteiro e, ainda que estejam realizando uma tarefa para as aulas de inglês, esse objetivo passa para o pano de fundo de seus projetos de dizer, que se voltam para as diversas posições que esses sujeitos ocupam na sociedade. Os alunos assumiram diversas vozes: de autores de seus projetos de dizer trazendo outros discursos para seus textos, falando na posição de alunos, de profissionais etc. Nos blogs, identificamos marcadores discursivos de interação – os alunos escrevem com um leitor em mente, ainda que virtual. Identificamos, também, textos diretamente escritos para a professora. Os alunos incluíram em seus projetos de dizer elementos inesperados, como a poesia, a argumentação e a reflexão crítica. Várias passagens mostram-se carregadas de subjetividade, fato que pode estar relacionado ao gênero em questão. Nos microblogs foi a crescente interatividade entre os alunos, e entre os alunos e a professora, que nos chamou mais atenção. Além disso, percebemos que os alunos começaram sua escrita na posição de alunos de inglês e, com o tempo, outras vozes emergiram em seus textos: profissionais, universitários, namorados etc. Vários alunos continuaram a utilizar o serviço de microblogging após a conclusão da intervenção, o que concluímos ser um resultado positivo da intervenção.

Referências 5 Anais do Enelin 2011. Disponível em: www.cienciasdalinguagem.net/enelin

BAKHTIN, Mikhail. Marxismo e Filosofia da Linguagem. Tradução LAHUD, Michel & VIEIRA, Yara Frateschi. 2 ed. São Paulo: Hucitec, 1981. KWAK, Haewoon et al. What is Twitter, a Social Network or a News Media? In: WWW 2010, April 26–30, 2010, Raleigh, North Carolina, USA. Disponível em: http://an.kaist.ac.kr/~haewoon/papers/2010-www-twitter.pdf Acesso em: 15 abril 2011. KOMESU, Fabiana. Blogs e as práticas de escrita sobre si na Internet. In: MARCUSCHI, Luiz Antonio; XAVIER, Antonio Carlos (orgs.) Hipertextos e gêneros digitais: novas formas de construção do sentido. Rio de Janeiro: Lucerna, 2004. pp.110-119. MARCUSCHI, Luiz Antonio. Gêneros textuais emergentes no contexto da tecnologia digital. In: MARCUSCHI, Luiz Antonio; XAVIER, Antonio Carlos (orgs.) Hipertextos e gêneros digitais: novas formas de construção do sentido. Rio de Janeiro: Lucerna, 2004. pp.13-67. ORIHUELA, José Luis. Twitter y el boom del microblogging. 2007. Disponível em http://portal.educ.ar/debates/educacionytic/super-sitios/twitter-y-el-boom-delmicroblo.php. Acesso em: 15 abril 2011. PRAÇA, Gabriela Martins da Silva. Subjetividades fluidas, informações permanentes: o caso Mayara Petruso no Twitter. In: Intercom Sudeste, 2011. Disponível em: http://www.intercom.org.br/papers/regionais/sudeste2011/resumos/R240270-1.pdf Acesso em: 15 abril 2011. RECHDAN, Maria Letícia de Almeida. Dialogismo ou Polifonia? In: Revista de Ciências Humanas, volume 9, número 1 – UNITAU Universidade de Taubaté, 2003. Disponível em: http://www.unitau.br/scripts/prppg/humanas/download/dialogismo-N12003.pdf Acesso em: 10 abril 2011. SÁ, Elisa Mattos de. Mecanismos enunciativos em diários virtuais: a emergência de posicionamentos enunciativos. In: I Encontro Nacional de Hipertexto, Recife, PB, 2005. Disponível em http://www.ufpe.br/hipertexto2005/%20TRABALHOS/Elisa%20Mattos%20de%20S% C1.htm Acesso em: 15 abril 2011. SILVA, Maurílio Luiz Hoffman. O Twitter dentro do Universo da Cibercultura – Uma Abordagem Teórica da Ferramenta. In: Intercom Centro-Oeste, 2010. Disponível em: http://www.intercom.org.br/sis/regional/resumos/R21-0142-1.pdf. Acesso em 15 abril 2011.

6 Anais do Enelin 2011. Disponível em: www.cienciasdalinguagem.net/enelin

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