A música no pensamento de Merleau-Ponty [Resumo Expandido]

May 28, 2017 | Autor: Paulo Amado | Categoria: Maurice Merleau-Ponty, Fenomenología, Música
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Anais do SEFiM, Porto Alegre, V.02 - n.2, 2016.

A música no pensamento de Merleau-Ponty The music on the thought of Merleau-Ponty Palavras-chave: Música; Expressão Musical; Fenomenologia; Merleau-Ponty. Keywords: Music; Musical Expression; Phenomenology; Merleau-Ponty.

Paulo Vinícius Amado Universidade Federal de Minas Gerais [email protected] A obra de Maurice Merleau-Ponty (1908-1961) pode ser entendida como uma filosofia acerca da psicologia e do comportamento humanos (CERBONE, 2012), uma fenomenologia como “psicologia descritiva” (MERLEAU-PONTY, 1999, p. 3) que tratará das noções de percepção e expressão, estas duas últimas muito próximas (MATTHEWS, 2010 e MÜLLER, 2001). O fenomenólogo francês tratou, sobremaneira, de um “sentido sensível” (REIS, 2008) do – e no – mundo. Em seu empreendimento filosófico e crítico chama atenção sua defesa de uma descrição fenomenológica que sublinhe o sensacional – o substrato primeiro de toda percepção. O trazer do pensamento merleau-pontyano para perto de reflexões acerca da música ainda é tarefa pouco empreendida, principalmente no Brasil. Outros filósofos importantes como Friedrich Nietzsche (1844-1900) ou Gilles Deleuze (1925-1995) e, especialmente na corrente fenomenológica, Martin Heidegger (1889-1976) e Alfred Schultz (18991959) são visitados com maior frequência por estudiosos que lidam com aproximações e implicações entre filosofia e música. Como exemplos dos poucos trabalhos sobre música onde se cita Merleau-Ponty, tomem-se CAZNOK (2003), HELLER (2006), BERGER (2008) e NOGUEIRA (2009) – autores, entretanto, que não se dedicaram ao estudo pormenorizado do uso do termo “música” pelo pensador em questão. Ora, conforme se nota, o filósofo de Rochefort-sur-Mer em alguns de seus mais importantes trabalhos menciona a música e elementos da construção musical1. Se não desponta claramente de seus escritos nenhum tratamento extenso sobre as propriedades dos fenômenos musicais, ao menos nomeadamente a categoria música se inscreve em pontos da “Fenomenologia da Percepção” (MERLEAU-PONTY, 19992) e também naquele que seria, segundo leitores assíduos, seu trabalho de revisão – os artigos do volume de “O Visível e o Invisível” (MERLEAU-PONTY, 20143). Considerando a “Fenomenologia da Percepção”, especialmente nos trechos que tocam no assunto música, chama atenção a seguinte ideia: “um romance, um poema, um quadro, 1 Além da palavra “música”, os textos merleau-pontyanos contam com a aparição de termos como “melodia” (MERLEAU-PONTY, 1999, p. 118, 187), “nota” e “tom” (MERLEAU-PONTY, 2014, p. 202) e outros. 2 A primeira publicação é de 1945. 3 A edição original é de 1964, publicação póstuma sob os cuidados de Claude Lefort (1924-2010).

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uma peça musical são indivíduos, quer dizer, seres em que não se pode distinguir a expressão do expresso, cujo sentido só é acessível por um contato direto, e que irradiam sua significação sem abandonar seu lugar temporal e espacial” (MERLEAU-PONTY, 1999, p. 209). Algumas páginas adiante, o filósofo trata das noções de música e expressão, e, para tanto, apresenta o significado de uma sonata vinculado ao seu particular sonoro e à sua apreciação imediata: “[A] potência da expressão é bem conhecida na arte e, por exemplo, na música. A significação musical da sonata é inseparável dos sons que a conduzem: antes que a tenhamos ouvido, nenhuma análise permite-nos adivinhá-la [...]”. A passagem considera também que “só poderemos, em nossas análises intelectuais da música, reportar-nos ao momento da experiência; durante a execução, os sons não são apenas os ‘signos’ da sonata, mas ela está ali através deles, ela irrompe neles” (Idem, p. 248). Em “O Visível e o Invisível” o tratamento da arte musical não destoa do anterior; a este respeito colocam-se menções diretivas e respaldadas em autores como Marcel Proust (1871-1922). Aqui, cita-se a inferência de que a música é algo sem equivalentes: “a ideia musical [...] os modos de exibição do som [...] falam-nos, possuem sua lógica própria, sua coerência, suas imbricações, suas concordâncias [...] é como se o segredo em que se acham [...] fosse seu modo de existência.” (MERLEAU-PONTY, 2014, p. 144); e, completando isto: “por que não admitir – e isso Proust o sabia bem, disse-o algures – que tanto a linguagem como a música podem, pela força de seus próprios ‘arranjos’, sustentar um sentido, captá-lo nas suas malhas [...].” (Idem, p. 147-8). Depreende-se dos fragmentos textuais acima que, para Merleau-Ponty, contundentemente, a música se expressa: as ideias musicais imbricam-se dum sentido que é todo do seu artesanato e facticidade, escuta e experienciação; o sonoro-musical e a maneira com que este se apresenta – a “forma” e o “conteúdo” de uma música – dão-se mutuamente ao significado, um não sendo nada senão pela presença e moldura do outro. As citações destacadas no artigo permitem concluir que embora Maurice Merleau-Ponty não dedique nenhum volume específico ao estudo fenomenológico da música, em alguns momentos suas obras revelam o pensamento de que a música é uma categoria expressiva. A escrita merleau-pontyana revela, portanto, uma maneira de compreender a música; e esta compreensão permite ao filósofo, em algumas oportunidades, oferecer exemplos crucias às suas reflexões sobre a expressão e acerca das possibilidades e limites da linguagem. Referências BERGER, Harris M. “Phenomenology and the Ethnography of Popular Music”. In: Shadows in the Field: New Perspectives for Fieldwork in Ethnomusicology. New York: Oxford University Press, p. 62-74, 2008. CAZNOK, Yara Borges. Música: entre o audível e o visível. São Paulo: Ed. UNESP, 2003. CERBONE, David R. Fenomenologia. Petrópolis: Ed. Vozes, 2012. HELLER, Alberto A. Fenomenologia da expressão musical. Florianópolis: Letras Contemporâneas, 2006. MATTHEWS, Eric. Compreender Merleau-Ponty. Petrópolis: Ed. Vozes, 2010. MERLEAU-PONTY, M. Fenomenologia da Percepção. São Paulo: M. Fontes, 1999.

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______. O visível e o invisível. São Paulo: Perspectiva, 2014. MÜLLER, Marcos J. Merleau-Ponty acerca da expressão. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2001. NOGUEIRA, Marcos. “Da ideia a experiência da Música”. In: Claves: periódico do programa de pós-graduação em música da UFPB. João Pessoa: UFPB, n. 1, p. 7-22, 2009. REIS, Nayara B. “Um sentido sensível do mundo na filosofia de Merleau-Ponty”. Filogênese: Revista Eletrônica de Pesquisa. Marília: UNESP, v. 1, n. 1, 2008.

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