A natureza jurídica da ação de improbidade administrativa: a dissociação entre a responsabilidade civil e o crime de responsabilidade advindos do ato ímprobo

July 25, 2017 | Autor: Morton Medeiros | Categoria: Corruption, Ministério Público, Corrupción, Improbidade Administrativa, Corrupção
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«"> 2006 Ministério Público do Rio Grande do Norte

SUMÁRIO

«Qualquer parte desta publicação pode ser reproduzida, desde que citada a fonte. ()s textos dos artigos é de responsabilidade exclusiva dos autores.

Gráfica Editora Planalto Endereço: Rua Coelho Neto, 397 Campo Grande - Recife-PE Tel: (81)3423-1869 E-mail: geplanalto@,bol.com.br

AUTIGOS l A natureza jurídica da ação de improbidade administrativa: a dissociação rni ré a responsabilidade civil e o crime de responsabilidade advindos do ato ímprobo MORTON LUIZ FARIADE MEDEIROS

11

' A ; i n tecipação dos efeitos da tutela e o princípio da efetividade V I I O R EMANUELDE MEDEIROS AZEVEDO

39

Normalização: Elda Cristiane Bulhões de Farias Bibliotecária CRB/4-1236

t A inserção das novas espécies normativas na ordem jurídico-constitucional

lídiloração e Diagramação: Gráfica Editora Planalto

brasileira ADGUSTOCARLOSROCHADELIMA

Capa: Jeann Karlo Dantas Lima Revisão Ortográfica: Luciano Henrique Lourenço dos Santos

55

•l A incumbência constitucional do Ministério Público na tutela do meio nmbiente

Tiragem: 800 exemplares

I I ) 11 ARDO CUNHA ALVES DE SENA e 1'AIILO EDUARDO DE FIGUEIREDO CHACON

73

'< Justiçapopularemcrise ANDRÉMAUROLACERDAAZEVEDO

91

(i O sigilo das votações no tribunal do júri A R M ANDO LÚCIO RIBEIRO

CATALOGAÇÃO NA FONTE REVrSTA DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO RIO GRANDE DO NORTE. (Ano l, n. Ljul./dez. 1997)-Natal: MPRN, 2006.

103

/ Naturezajurídica da transação penal e efeitos decorrentes l« )SMARANTONNI RODRIGUES CAVALCANTI DE ALENCAR

115

Semestral ISSN 1809-5402

K A justiça restaurativa, a violência doméstica e o juizado especial criminal

*,

M A RIANAMARINHO BARBALHO TAVARES

133

I. Direito - periódico I. Ministério Público do Rio Grande do Norte.

' ) l labeasCorpusejustacausa

II. Título. CDU: 34

MH l IELLE DANTAS DE CARVALHO

143

11 A NATUREZA JURÍDICA DA AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA: A DISSOCIAÇÃO ENTRE A RESPONSABILIDADE CIVIL E O CRIME DE RESPONSABILIDADE ADVINDOS DO ATO ÍMPROBO MORTON LUIZ FARIA DE MEDEIROS1

l l INTRODUZINDO A RESPONSABILIDADE

Desde a constatação histórica das formas mais rudimentares de Direito, a noção de •nsíihilidade se faz presente. Isso porque o Direito sempre buscou, bem ou mal, no valor .1 .\o de seus ditames, no afã de atingir a harmonia entre os conviventes e a .n, .u) social. E desde que o uso da força física tornou-se imperioso para a aplicação das iiimbcm a responsabilidade ganhou pujança, uma vez que cada sujeito passou a MI «s ónus de cada comportamento que assumisse em sociedade, na medida axiológica K u ssão de sua conduta. Por mais vetusta que hoje possa parecer a conhecida "Lei de Talião", há de se • < i cm seu advento a virtude da consolidação da proporcionalidade entre o dano e sua iMindcnlc reparação (o que não era observado com frequência até então), como um dos < l;i responsabilidade até hoje vigente. Não por acaso, portanto, os romanos erigiram mil dos pilares da justiça dar a cada um o que é devido (suum cuique tribttere), " 1 1' i iio que, afinal, aproxima a perseguição aojusto e a própria ideia de responsabilidade K is homens, sob a intermediação do Direito que, conforme lembrado por Hart,2

• ItN, Mcstrando em Direito Constitucional na UFRN. [email protected] • ilí, Tctcio Sampaio. Introdução ao estudo do Direito; técnica, decisão, dominação.

• • l i o u do Rio Grsmli' da Norte, NaiaK a.5, n.7, p.!Í-37Jul.A!e/.2005

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transmuda a conduta humana de opcional em obrigatória. A simplória enunciação romana, porém, esconde extensa profusão de discussões,

i 'i i \a c de reparação, "visto que não havia nítida distinção entre a responsabilidade civil •

l |.< M.l!

'

sentidos e confusões, ainda não resolvidos até o dia de hoje. Com efeito, os simples

Com o desenvolvimento do Direito, resultante do incremento da complexidade das

questionamentos sobre a quem cabe a missão de dar, a quem se deve dar e o que é devido a cada um já são suficientes para dividir os mais atilados juristas e cientistas políticos, sem que qualquer deles nos indique, com clareza, um único caminho possível. Chaim Perelman, por

humanas, começou-se a distinguir a responsabilidade civil da penal, a partir de uma i i u h i i . h . K i da ideia de dolo e de culpa stricto sensu, seguida de uma elaboração da i i n ,ul;i culpa" 5 na Idade Média.

exemplo, reconhecendo a ilusão de querer enumerar todos os sentidos possíveis da noção de Posteriormente, tornando-se o Estado mais robusto, verificou-se a necessidade de se justiça, exemplificou-os, apenas para concluir apontando o perigo que cada um desses i i n ,.int,oes de natureza administrativa a seus agentes, até que, jáno final do século XIX, exemplos enfeixa . i ' i i» 1'slado, como pessoa jurídica diversa de seus integrantes, passou a assumir Tal dificuldade, contudo, é absolutamente insuficiente para afastar a necessidade e a > i > 11 u lade pé los atos praticados por seus agentes. importância de atribuir algo a alguém, segundo uma determinada ou ao menos determinável A observação do desenvolvimento dogmático da responsabilidade pode levar a crer

regra de justiça, o que ressaltamos apenas para destacar o relevante papel que o instituto da

i '.nladc da norma corresponde à diversidade dos tipos de responsabilidade", como

responsabilidade exerce em favor da própria sobrevivência do homem, como ser gregário, e da

'i < arvalho Filho 6 , de modo que "se a norma tem natureza penal, a consumação do

concretização da justiça.

i ' > i provoca responsabilidade penal; se a norma é de direito civil, teremos a 2 A RESPONSABILIDADE E SUA CRESCENTE COMPLEXIDADE

1 1 . 1 1 ii l,u li- civil; e, finalmente, se o fato estiver previsto em norma administrativa, dari

..ibí l idade administrativa." 7

A responsabilidade atribuível ao homem pelos seus atos partiu, portanto, de uma

d no 1 , parece exato, entretanto, o parâmetro indicado para essa diferenciação.

sujeição a sanções subjetiva e arbitrariamente determinadas, para um sistema, gerido pelo

n i i - |ioii|ue limita a responsabilidade civil aos prados do Direito Civil, olvidando

Estado, de cominação, apuração e execução das sanções, em que se permitia vislumbrar mais

mplos de responsabilidade civil colhidas do Direito Público8 (v.g., ação regressiva

objetivamente a medida axiológica utilizada.

i dano, ação civil pública visando ao ressarcimento ao Erário), tampouco

Em princípio, a responsabilidade apresentava uma só faceta, o caráter ambivalente de i .......h n.rriln Civil brasileiro, v. 7 (Responsabilidade civil). IS.ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 10. l «l SaciPmilo Alias, 2001, p. 158. Vciclinnn .i|in -,. ni.i «. \ i - f i i n i i f s exemplos: l A cada qual a mesma coisa; 2. A cada qual segundo seus méritos; 3. A cada qual segundo suas obra t \ id.i ,.iiipiii M«rl« Erminún» CtlvSo. SSo Paulo: Martins Fontes, 19%, p. 9).

l! dii Miiiisliivio l

• iinli: l 1 ') Ia/ lembrai que a "responsabilidade civil requer prejuízo a terceiro particular ou Estado."

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14 compreensível apenas nos lindes do Direito Administrativo. Por outro lado, a distinção apontada negligencia espécie de responsabilidade que vem

i" i|''' \nlade que acompanha a própria discussão problemática acerca da distinção entre l'"ln n'11 c Direito, de que ora nos ocuparemos.

tomando corpo com a consolidação de Estados democráticos por todo o mundo e que apresenta

l in trabalho anterior10, tivemos a oportunidade de abordar a clássica ideia de Política

contornos deveras peculiares: a responsabilidade política, notadamente a decorrente" do

nulo aquilo ligado ao governo dos homens, o que, imediatamente, a aproxima sem se a

cometimento dos chamados crimes de responsabilidade.

u n i u - da ideia hodierna de Estado, bem como da própria noção de Poder, visto como o

O ordenamento jurídico pátrio é pródigo em exemplos da diferenciação entre as

D iii.incjado para se alcançarem determinados fins (políticos). Naquele ensejo,

apontadas espécies de responsabilidade. Destarte, o Código Civil de 1916, em seu art. l .525, já

u m e ; uma característica intrínseca ao sistema político: a exclusividade do uso da força

pontificava ser a responsabilidade civil independente da criminal, preceito mantido na lei atual

. iiinlit.-Mo para que a Política desempenhe, em última instância, a. função de tomar

(art. 935). Do mesmo modo, o Código de Processo Penal prevê a possibilidade de propositura

^^•l colctivamente vinculantes. Ademais, enunciaram-se o código binário de

de ação civil, não obstante sentença absolutória no juízo criminal, "quando não tiver sido,

M i inlerna (governo/oposição) e o programa nomeadamente teleológico da Política,

categoricamente, reconhecida a inexistência material do fato" (art. 66) e em outras hipóteses

i que as "razões de Estado" possam ser invocadas mesmo ao arrepio de preceitos i pudemos concluir a interdependência entre os sistemas político e jurídico,

Persiste, todavia, certa dúvida quanto à natureza da responsabilidade política. l,..., AHII.III.IO ,1.1 l < I I I Í H r prMlU-N do processo administrativo disciplinar. São Paulo: Saraiva, 1987, p. 235

ilo Norte. Natal. a.5. it.7, p. l l-37,jul,/dc7,2005

, , .U- A Política, o Direito e sua interdependência: o esforço pela busca . . il» Mlnlitírio Público do Rio Grande do Norte, Natal, n. 6, jan./jun. 2005.

' Grande do Norte. Nasal, a.5, si.7, p.! 1-37, jul,/tiez,2005

16 operando-se a partir da legitimação ou justificação que o Direito confere à Política, e da efetividade baseada no monopólio do uso da força física que esta atribui àquele. Essa relação, em princípio, não ameaça a autonomia dos mencionados sistemas, porquanto exprime uma abertura cognitiva, e não operativa, abertura que é visivelmente conduzida por intermédio da Constituição. Não se olvidam, contudo, os perigos desse relacionamento, que pode chegar ao ponto da perda de controle das operações do sistema político, redundando no próprio perecimento da autonomia do sistema jurídico, tentado que ficaria em manusear um código operativo e um programa que não lhe são próprios. Essa discussão torna-se ainda mais oportuna no momento histórico atual, em que se discute, em sede da Reclamação n.° 2.138, em trâmite perante o Supremo Tribunal Federal, se a responsabilidade prevista na Lei n.° 8.429/92, popularmente conhecida como "lei de combate à improbidade administrativa", se confunde com a decorrente dos crimes de responsabilidade e, em razão do princípio da especialidade, é abarcada pelas leis instituidoras desses crimes. Ajurisprudência brasileira tem firmado rijo entendimento de que as sanções previstas na Lei n.° 8.429/92 possuem natureza civil, e não criminal ou política, como abaixo se registra, com grifos acrescidos: "Habeas corpus. Ação de responsabilidade civil por improbidade administrativa. Matériaextra-penal. Inadequação ao instituto do habeas corpus. Competência. O habeas corpus não é o remédio jurídico apto para dirimir questão de competência em ação de responsabilidade civil por improbidade administrativa. Habeas corpus não conhecido." "Improbidade administrativa. Inquérito civil, ação cautelar inominada e ação civil pública. Foro por prerrogativa de função (membro de TRT). Competência. Reclamação. Segundo disposições constitucional, legal e regimental, cabe a reclamação da parte interessada para preservar a competência do STJ. Competência não se presume (Maximiliano, Hermenêutica, p. 265), é indisponível e típica (Canotilho, in Resp-28.848, DJ de 02-08-93). Admite-se, porém, competência por força de

Tiibuiul de Justiça (STJ), S.' Turma, HC 8491-SP, Rd. Min. Felix Fischer, p. noDJU de 14-08-00, p. 00180.

ivIinisUTui Público do Rio Grande do Norte, Natal- iv5. n. 7, p.! l -37, jiil./dez.20í!5

l

17 compreensão, ou por interpretação lógico-extensiva. Conquanto caiba ao STJ processar e julgar, nos crimes comuns e nos de responsabilidade, os membros dos Tribunais Regionais do Trabalho (Constituição, art. 105,1, a), não lhe compete, porém, explicitamente, processá-los e julgá-los por atos de improbidade administrativa. Implicitamente, sequer, admite-se tal competência, porquanto, aqui, trata-se de ação civil, em virtude de investigação de natureza civil. Competência, portanto, de juiz de primeiro grau. De legeferenda, impõe-se a urgente revisão das competências jurisdicionais. À míngua de competência explícita e expressa do STJ, a Corte Especial, por maioria dos votos, julgou improcedente a reclamação." "Apelação cível, improbidade administrativa. Transporte escolar municipal. Licitação. Cartel. Affectio e concíliumfraudis". Agravo retido não conhecido à ausência de reiteração nas razões recursais. Nulidade do processo não declarada por responder o Prefeito, nos casos de ação visando ao reconhecimento de improbidade administrativa (matéria cível e não penal), perante o juízo cível de primeiro grau. O foro por prerrogativa de função estatuído no inc. X do art. 29, da atual Constituição Federal, anteriormente inc. VIII, diz respeito tão-somente a hipóteses delitivas praticadas pelo Prefeito. A busca da conduta ímproba na esfera civil não é alcançada pelo dispositivo constitucional, respondendo no foro originário do fato Ímprobo. Preliminares alijadas. Recurso do Prefeito improvido por ausente circunstância que exclua sua participação culposa no agir ímprobo consistente em lesão ao erário, por ação e omissão, fraude a licitação, permitindo, por isso, locação de bem por preço superior ao de mercado. Inteligência do disposto no art. 10, V, da Lei n° 8429/92. Comissão julgadora da licitação destituída das condições mínimas de cognição para o exercício do mister. Negligência. Designação pelo Prefeito Municipal. Culpa. Superfaturamento de licitação com base em elemento fraudulento consistente planejamento divisor de linhas de coletivos adredemente inventariadas e distribuídas modo a participar só um concorrente de uma licitação por local com preços elevados, sem parâmetros na licitação. Fraude evidenciada a licitação. Violação dos princípios da moralidade, impessoalidade e probidade, além da legalidade no que tange a escolha da modalidade licitatória levada a efeito como tomada de preços ao invés de concorrência pública (art. 22,1, da Lei n° 8666/93) Condutae nexo/liame culposo evidenciado. Recurso improvido. Recurso do Órgão do Ministério Público. Aplicação de pena de suspensão dos direitos políticos. Aplicação de pena que tal erige fato grave, consequências graves e pelo menos culpa civil grave o suficiente "in concreto" cuja intensidade revele necessidade e proporcionalidade relativamente à conduta diligente que se exigia, razoavelmente, frente aos fatos. O juiz não deve se reduzir à condição de automático aplicador de dispositivos normativos. O disposto no art. 12, parágrafo único, da Lei n° 8429/93, deve ser aplicado com observância do "arbitrium regulatum"jurisdicional na forma do art. 93, X, da Constituição Federal, cotejados os critérios da necessidade e proporcionalidade da conduta-fato a pena. Improcedência do recurso neste particular. Responsabilidade dos servidores públicos cuja conduta evidenciada como ilegal. Participação no procedimento licitatório modo negligente e civilmente doloso. Recurso provido neste particular. Responsabilização dos transportadores que se uniram em "consilium fraudis". Prova insuficiente para caracterizar condutas individualizadamente com base na prova jurisdicionalmente produzida, desconsiderada a prova produzida em CPI por não se traduzir no "due process of law". Reserva da jurisdição para a produção da prova como princípio do juiz natural. Recurso improvido neste tópico." "Agravo. Ação civil pública visando apurar responsabilidade por atos de improbidade administrativa. Competência da justiça de primeira instância. Deferimento de liminar afastando os requeridos (prefeito e servidores), das respectivas funções, quebrando o sigilo bancário e decretando a indisponibilidade de bens dos envolvidos. Presença dos requisitos legais. Decisão mantida. Compete à Justiça Comum de primeira instância o exame de ação civil pública movida pelo Ministério Público, com o propósito de apurar responsabilidade por atos de improbidade •'M SP, Rei. Min. Nilson Naves, pub.no DJU de 15-05-00, p. 00112. • Ir Justiça do RS, l .• Câm. Civ., APC 599260908, Rei. Dês, Juiz Carlos Roberto Lofego Canibal, j. em 10-05-OD

18 administrativa de Prefeito e Servidores do Município. O Prefeito só tem foro privilegiado para processos criminais. Desde que as circunstâncias recomendem, é perfeitamente possível deferir liminar em ação civil pública para afastar autoridades administrativas de seus cargos ou funções, bem assim decretar a indisponibilidade de bens e a quebra de sigilo bancário, por período determinado, evitando que elas interfiram na colheita das provas. Presentes os requisitos legais (fumus boni iuris e periculum in mora), mantém-se a decisão que concede a medida." "Administração pública. Responsabilidade de ex-prefeito. Ação de rito ordinário para declaração de improbidade pública. Arts. 37, § 4.°, da Constituição Federal. Arts. 21 e 22, do Decreto-lei n°2.300, de 21 de novembro de 1986, com alterações pelos decretos-leis n°s 2.348, de 24 de julho de 1987 (dispunha, àépoca, sobre licitações e contratos da administração). Processo j u d i c i a l por ato de i m p r o b i d a d e a d m i n i s t r a t i v a . Arts. 9°, 10, 11, 12, 14, 17, da Lei n° 8.429, de 2 de junho de 1.992, que dispõe sobre as sanções aplicáveis aos agentes públicos nos casos de enriquecimento ilícito no exercício de mandato, cargo, emprego ou função na Administração Pública direta, indireta ou fundacional, É juridicamente possível o rito ordinário em ação declaratória, proposta pela pessoa jurídica de direito público (Município) para a declaração da improbidade pública praticada por ex-prefeito (art. 17, da Lei n° 8.429/92), com aplicação de sanções, independentemente das sanções penais, civis e administrativas, previstas na legislação específica (art. 12, da Lei n° 8.429/92), e da aprovação ou rejeição das contas pelo Tribunal de Contas (art. 21, da mesma Lei). Os atos de improbidade administrativa podem importar em enriquecimento ilícito (art. 9°, da Lei n° 8.429/92), em causa de prejuízo ao erário (art. l O, da mesma Lei), e nos atentados contra os princípios da Administração Pública (art. 11, da mesma Lei). Apelo provido, para prosseguimento da ação, com a instrução devida. Reexame necessário conhecido e provido."'

Para coroar esse pensamento, a própria Constituição da República (CR), elevando a nível constitucional a preocupação com o combate aos atos de improbidade administrativa,

19 complexo de atribuições jurisdicionais mediante atividade legislativa ordinária, eis que as hipóteses definidoras da competência originária da Suprema Corte resultam de matriz constitucional. Entendimento que tem apoio em antigo precedente firmado por esta Suprema Corte(1895)."17 "Nem se diga, finalmente, senhora Presidente, que as sanções imponívcis em sede de ação civil por improbidade administrativa revestem-se de natureza penal, em ordem a justificar, com tal qualificação, o reconhecimento, na espécie, da legitimidade constitucional do diploma normativo impugnado nesta sede de fiscalização normativa abstraia. Não se questiona que os atos de improbidade administrativa podem induzir a responsabilidade penal de seu autor, assumindo, na diversidade dos tipos penais existentes, múltiplas formas de conduta delituosa. Ocorre, no entanto, que os atos de improbidade administrativa também assumem qualificação jurídica diversa daquela de caráter penal, apta, por isso mesmo, a viabilizar, no contexto da pertinente ação civil pública, a imposição das sanções previstas, expressamente, no art. 37, §4.°, da Constituição Federal (...). Vê-se, da simples leitura do preceito constitucional em questão, que este distingue, de maneira muito clara, entre as sanções de índole civil e político-administrativa, de um lado, e aquelas de natureza criminal, de outro."18 Min. Sepúlveda Pertence: "A ação de improbidade administrativa é uma ação civil: evidencia-o o art. 37, § 4.°, da Constituição, ao explicitar que as sanções que comina à improbidade administrativa serão impostas 'sem prejuízo da ação penal cabível'." 9 No mesmo sentido, lembra-nos Alexandre de Moraes: "A natureza civil dos atos de improbidade administrativa decorre da redação constitucional, que é bastante clara ao consagrar a independência da responsabilidade civil por ato de improbidade administrativa e a possível responsabilidade penal, derivadas da mesma conduta, ao utilizar a fórmula 'sem prejuízo da ação pena cabível'. Portanto, o agente público, por exemplo, que, utilizando-se de seu cargo, apropria-se ilicitamente de dinheiro público, responderá, nos termos do artigo 9." da Lei n.° 8.429/92, por ato de improbidade, sem prejuízo da responsabilidade penal por crime contra a administração, prevista no Código Penal ou na legislação penal especial."

preceitua que tais atos "importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação

v l ( l s l •< )NS ABILID ADE DO AGENTE POLÍTICO

previstas em lei, sem prejuízo daação penal cabível."16 Corroborando a natureza cível da ação de improbidade, merecem destaque as lições

Malgrado a força e a pertinência dos argumentos acima aduzidos, percebe-se, no meio

extraídas de pronunciamentos de pelo menos dois Ministros do Supremo Tribuna Federal

> l>i iisileiro, a construção de uma tese contrária, especificamente quanto aos chamados

(STF), a saber:

/xi/íticos, que acabou por contaminar o posicionamento dos integrantes do STF naja Min. Celso de Mello: "Improbidade administrativa (Lei n." 8.429/92). Ação civil pública promovida pelo Ministério Público. Réu que é Deputado Federal. Pretendido reconhecimento de sua prerrogativa de foro perante o Supremo Tribunal Federal, mesmo tratando-se de processo de natureza civil. Postulação que busca suporte jurídico na Lei n.° 10.628/2002. Impossibilidade de o Congresso Nacional, mediante simples lei ordinária, reduzir, ampliar ou modificar a competência originária do Supremo Tribunal Federal. Intangibilidade desse

" '

,

1.1, lunliçn do MS, l."T.CIv., AO 67.098-6, Rei. Dês. Josué de Oliveira.], em 24-08-99. l, In,i,,.,, ,1,. PH, :> -Câm. Clv., AC 37.831-2, Ac. 11.485, Rei. Dês. Negi Calixto.j. em 09-08-95. .«Irede,

Kio Grande do Norte. Nalaí, a.5, n.7, p.! l-37.Jul./cle7..2005

i Kcclamação n.° 2.138: a de que tais agentes públicos, diferentemente dos demais, não "i 11 .n i;im às sanções e ao processo previstos na Lei n.° 8.429/92, mas apenas responderiam

ílpiíncia, a partir daqui, à fundamentação engendrada pelo Min. Nelson Jobim em seu voto > < p i i i M i n r n t o d a Reclamação n.° 2 . 1 3 8 . ", eu no. Princípios de Direito Administrativo. 6. ed. São Paulo: RT, 1987, p. 163. M Ó I II. MO, np. dl., p. 484 nilre de Constituição do Brasil interpretada. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2003, p. 2.648..

n11'.ici w Público do Rio Grande do Norte. Natal, a.5, n,7, pJS-37Jul./£lez.2005

20 pelo cometimento dos crimes de responsabilidade ligados à prática de improbidade

21 deitos desta Lei, todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por

administrativa.

dcição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou

Antes de tudo, há de se analisar a ideia esposada pelo Min. Nelson Jobim de que os agentes políticos constituem "categoria subtraída da assimilação aos servidores públicos em

vinculo, mandato, cargo, emprego ou função", deixando expresso o legislador seu desiderato de lazer chegar a lei até os agentes políticos.

geral"21. Ruy Cirne Lima, em obra clássica, já assinalava que "não se consideram prestadores

Por seu turno, o raciocínio desenvolvido pelo Min. Jobim de que a Lei n.° 8.429/92, ao

de trabalho público os condutores políticos das pessoas jurídicas de existência necessária"22, o

Ira/er, em seu art. 14, § 3.°, "que, no momento administrativo da aplicação da lei, a

que foi igualmente defendido por Carvalho Filho, ao dispor que os agentes políticos "não se

icpicsentação contra o agente público, em se tratando de servidores federais, será processada

sujeitam às regras comuns aplicáveis aos servidores públicos em geral; a eles são aplicáveis

n.i forma prevista nos arts. 148 a 182 da Lei n.° 8.112/90", e, não estando os agentes políticos

normalmente as regras constantes da Constituição"23. Entretanto, este último jurista não titubeia em classificar os agentes políticos dentre os agentes públicos, considerados "o conjunto de pessoas que, a qualquer título, exercem uma função pública como prepostos do

'.nbmetidos a esta última lei, tampouco estariam àquela primeira, constitui perigoso sofisma, já i|iu- acaba por confundir o momento administrativo, claramente distinto entre os servidores pnblicos e os agentes políticos, e o momento jurisdicional, que segue regras comuns às duas rnlcgorias.

Estado."24 Ora, se a disciplina peculiar a que se sujeitam os agentes políticos só pode ser delineada na Constituição25, como acima exposto, e havendo esta situado, topograficamente, as sanções por ato de improbidade no capítulo que trata da Administração Pública como um todo inclusive onde faz menção, por exemplo, aos "membros de qualquer dos Poderes" (art. 37, XI) não há argumento plausível para afastá-los, nesse ponto, dos servidores públicos, soando mesmo inconstitucional qualquer interpretação que confunda as responsabilidades civil e criminal, referidas no art. 37, § 4.°, da CR. Aliás, a própria Lei n.° 8.429/92, em seu art. 2.°, reputa "agente público, para os

Não se pode, pois, negar aos agentes políticos sua especificidade, a exigir independência na sua atuação e a capacidade de tomar decisões", como lembrado pelo Min. li >l >i m, nem se pode reconhecer, por outro lado, em todos os agentes políticos (classe que inclui • h M k- o Presidente da República até os milhares de Vereadores de nossos Municípios), "a < .i|i.u idade de tomar decisões que se remetem ao exercício da própria soberania do Estado", n uni) pretende fazer crer, desde que traduzida a soberania interna, com respaldo em i .nu >i i lho, "no monopólio de edição do direito positivo pelo Estado e no monopólio dacoação i legítima para impor a efectividade das suas regulações e dos seus comandos".26 Ademais, a ideia de que os agentes políticos "não devem estar sujeitos ao sistema de

i. Iru-mu. ;i |i;nlir daqui, à fundamentação engendrada pelo Min. Nelson Jobim em seu voto proferido no julgamento da Reclamação n." 2.138. "l IMA, Kny Cirna. Princípios de Direito Administrativo. 6. ed. São Paulo: RT, 1987, p. 163 "l AHVAI 110 Ml. l Kl. iii, ,11 ,11. -IX-i. "1,1, th ./• / K l

A f,1 wu, i j',n,jn,' vá.» 1< I//A/Í/!•///livo, no ensejo em que Pazzaglini Filho, Elias Rosa e Fazzio Júnior corroboram a i" ilc Governadores, Vice-Presidente da República, Vice-Governadores, Prefeitos, • ' ' • . < Io Ministério Público e do Poder Judiciário às sanções da Lei n.° 8.429/92, "em toda i i ..io"!J, reconhecem algumas exceções pertinentes à aplicação das diversas espécies
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