A necessidade de laudo médico oficial, para fins de isenção de imposto, deve ser compatibilizada com os princípios da livre convicção racional e o da tutela judicial efetiva

September 26, 2017 | Autor: Ricardo Perlingeiro | Categoria: Direito Tributário
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Nº CNJ RELATOR APELANTE APELADO ADVOGADO REMETENTE ORIGEM

: 0020763-04.2010.4.02.5101 : DESEMBARGADOR FEDERAL RICARDO PERLINGEIRO : UNIAO FEDERAL / FAZENDA NACIONAL : LIANA ALMEIDA REISEN : BRUNO CALFAT E OUTROS : JUIZO FEDERAL DA 5A VARA-RJ : QUINTA VARA FEDERAL DO RIO DE JANEIRO (201051010207639)

RE L AT ÓRIO Cuida-se de Embargos de Declaração opostos pela UNIÃO FEDERAL / FAZENDA NACIONAL contra acórdão que deu provimento à Apelação apenas para alterar o índice de correção monetária dos valores a serem restituídos, mantendo, no restante, a sentença que reconhecera o direito da Demandante à isenção de imposto de renda por ser postedora de doença grave (cegueira). Em suas razões, a União alega, em síntese, que o acórdão embargado, ao entender comprovada a existência de cegueira capaz de assegurar à Demandante o benefício tributário, "afastou o art. 30 da Lei nº 9.250/1995, que impõe a comprovação da moléstia por laudo pericial emitido por serviço médico oficial da União, dos Estados, do DF ou dos municípios, sem que tal dispositivo tenha sido declarado inconstitucional pelo Pleno do Tribunal". Por esse motivo, considera haver violação à cláusula de reserva de plenário (art. 97, CRFB), configurando omissão em declarar a norma inconstitucional (fls. 24/26). Contrarrazões às fls. 31/33. É o relatório. Em mesa para julgamento. RICARDO PERLINGEIRO Desembargador Federal

VOTO O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL RICARDO PERLINGEIRO: (RELATOR) Consoante relatado, trata-se de Embargos de Declaração opostos pela UNIÃO contra acórdão que reconhecera o direito da Demandante à isenção de imposto de renda por ser postedora de doença grave (cegueira). A Embargante alega que o acórdão, ao reconhecer a existência de cegueira, desrespeitou o art. 30 da Lei nº 9.250/1995 sem declará-lo inconstitucional, o que constitui violação à cláusula de reserva de plenário. Sobre este particular, restou decidido no voto condutor do acórdão que: No caso concreto, a União alega que a Demandante teria desrespeitado requisito essencial à percepção do benefício, qual seja, a comprovação da moléstia por meio de laudo pericial emitido por serviço médico oficial da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, consoante determinado pelo art. 30 da Lei nº 9.250/1995. Contudo, da análise dos autos verifica-se que o documento de fl. 45 preenche os requisitos legais, por ter sido emitido por junta médica do Exército (órgão oficial da União) e por atestar, durante inspeção de saúde realizada para fins específicos de isenção de imposto de renda, a existência de cegueira no olho esquerdo e visão subnormal no olho direito desde 14 de abril de 1994 (data do início da doença). Desta forma, tem-se que este documento, por si só, já seria idôneo e suficiente para garantir a isenção do imposto de renda. Ademais, o laudo pericial produzido em juízo - e não impugnado pela União ou por seu assistente - reafirmou que a Demandante sofre de cegueira funcional, sendo absolutamente incapaz para o trabalho, bem como para executar atos rotineiros (fl. 156), além de esclarecer que

"o termo cegueira se refere aos estágios mais avançados de deficiência, com grave comprometimento da acuidade visual, não necessariamente com perda total da visão" (resposta ao quesito 3, fl. 157). Desta forma, confirma-se o enquadramento da Demandante na hipótese legal de isenção de imposto de renda, o que enseja a anulação dos lançamentos realizados para cobrar os tributos referentes aos anos de 2003 a 2006 (fls. 47/50) Portanto, verifica-se que o voto destacou a existência de laudo emitido por junta médica do Exército (órgão oficial da União), o qual atestou, durante inspeção de saúde realizada para fins específicos de isenção de imposto de renda, a existência de cegueira no olho esquerdo e visão subnormal no olho direito desde 14 de abril de 1994 (fl. 45). Desta forma, conclui-se que a pretensão da Demandante foi julgada procedente em conformidade com o referido o art. 30, não havendo violação ao mencionado artigo de lei que justifique a declaração de sua inconstitucionalidade pelo Tribunal Pleno. Destaca-se , ainda, o entendimento do E. STJ segundo o qual "a norma contida no art. 30 da Lei n. 9.250/95 condiciona o reconhecimento da isenção do imposto de renda à comprovação oficial das doenças relacionadas no inciso XIV do art. 6º da Lei n. 7.713/88. Contudo, a determinação do art. 30 da Lei n. 9.250/95 tem como destinatária a Fazenda Pública, impondo-lhe a concessão da isenção tributária nas circunstâncias nela previstas; e, de outra forma, não poderia se conduzir a Administração porque, em se tratando de isenção tributária, não há discricionariedade. Todavia, em sede de ação judicial, em que prevalecem os princípios do contraditório e da ampla defesa, pode a parte utilizar-se de todos os meios de provas em direito admitidos na perseguição do reconhecimento de seu direito, de forma que não está o magistrado adstrito aos termos do mencionado dispositivo legal, uma vez que é livre na apreciação das provas. Por conseguinte, não está adstrito ao laudo médico oficial, podendo valer-se de outras provas produzidas no curso da ação cognitiva. O Código de Processo Civil, nos termos dos arts. 131 e 436, consagrou o princípio da persuasão racional em matéria de interpretação de prova" (1ª Turma, AgRg no REsp 1015940, Rel. Min. DENISE ARRUDA, DJe 24.9.2008). Tendo em vista a orientação jurisprudencial do E.STJ, torna-se possível a comprovação da moléstia mediante outros elementos além de laudo pericial emitido por serviço médico oficial, sendo certo que o Juízo não fica adstrito às conclusões periciais (art.436 do CPC), aplicando o

princípio da livre valoração das provas para julgar o mérito e fundamentar as razões do decisum. Assim, ainda que a pretensão autoral não tivesse sido proferida com base no laudo médico oficial (o que não é o caso), haveria a possibilidade de interpretar o art. 30 em harmonia com os princípios da livre convicção racional - que entendo aplicado tanto ao processo jurisdicional quanto ao procedimento administrativo -, segundo o qual qualquer meio de prova deve ser hábil a demonstrar a existência de um fato, bem como da tutela jurisdicional efetiva, sem necessidade de declarar o mencionado dispositivo inconstitucional. Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO AOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. É como voto. RICARDO PERLINGEIRO Desembargador Federal

EMENTA E MBARGOS DE DE CL ARAÇÃO. I MP OS T O DE RE NDA. I S E NÇÃO. CE GUE I RA. VI OL AÇÃO À CL ÁUS UL A DE RE S E RVA DE P L E NÁRI O. I NE XI S T Ê NCI A. 1. O laudo pericial emitido por junta médica do Exército e que atesta a existência de cegueira no olho esquerdo e visão subnormal no olho direito preenche os requisitos do art. 30 da Lei nº 9.250/1995 para concessão de imposto de renda. Inexistência de violação à cláusula de reserva de plenário. 2.“[...] A determinação do art. 30 da Lei n. 9.250/95 tem como destinatária a Fazenda Pública, impondo-lhe a concessão da isenção tributária nas circunstâncias nela previstas [...]. Todavia, em sede de ação judicial, em que prevalecem os princípios do contraditório e da ampla defesa, pode a parte utilizar-se de todos os meios de provas em direito admitidos na perseguição do reconhecimento de seu direito, de forma que não está o magistrado adstrito aos termos do mencionado dispositivo legal, uma vez que é livre na apreciação das provas. Por conseguinte, não está adstrito ao laudo médico oficial, podendo valer-se de outras provas produzidas no curso da ação cognitiva. O Código de Processo Civil, nos termos dos arts. 131 e 436, consagrou o princípio da persuasão racional em matéria de interpretação de prova" (1ª Turma, AgRg no REsp 1015940, Rel. Min. DENISE ARRUDA, DJe 24.9.2008). 3. À luz do princípio do livre convencimento racional, aplicado tanto ao processo jurisdicional quanto ao procedimento administrativo, qualquer meio de prova deve ser hábil a demonstrar a existência de um fato, não ficando o Juízo adstrito às conclusões periciais. 4. Embargos de Declaração não providos.

ACÓRDÃO Vi st os, r el at ados e di scut i dos est es aut os, em que são par t es as aci m a i ndi cadas, deci de a T er cei r a T ur m a E specializada do T r ibunal Regional F eder al da 2ª Região, por unanimidade, negar provimento aos E mbar gos de Declar ação, na f or ma do r elatór io e do vot o, const ant es dos aut os, que f i cam f azendo par t e do pr esent e j ul gado. Ri o de Janei r o, 17 de dezem br o de 2013 ( dat a do julgamento) . RI CARDO P E RL I NGE I RO Desem bar gador F eder al

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