A nossa Língua é Sexista…: a Reflexão Linguística do Inglês, do Tailandês e do Português

Share Embed


Descrição do Produto

A nossa Língua é Sexista…: a Reflexão Linguística do Inglês, do Tailandês e do Português

*

Korapat Pruekchaikul “Professora: como se forma o feminino? É fácil: às palavras que terminam em “o” se troca essa letra por “a”. Professora: e o masculino? O masculino não se forma! Existe!!!”

(Franco & Cervera, 2006: 16) O que se refere acima pode enfatizar que já existiu, e ainda existe, a desigualdade entre os géneros masculino e feminino na nossa sociedade. Na Inglaterra, as mulheres tinham de lutar pelo direito de voto, quer pacificamente quer não. Esta luta durou muitos anos, e muitas ativistas tiveram de sacrificar a vida. Na Tailândia, Yingluck Shinawatra ganhou, em 2012, a maioria dos votos na eleição geral, tornando-se, pois, a única primeira-ministra da história política no país. Também, em Portugal, Maria de Lurdes Pintasilgo foi entre 1979 e 1980 a primeira-ministra do país. Ela foi a única mulher a ocupar o cargo de chefe de governo em Portugal. O facto de os homens existirem enquanto as mulheres se formarem é claramente visível não só na esfera sociopolítica, mas também na área sociolinguística. Neste trabalho, mostrarei alguns exemplos do inglês, do português e do tailandês, porque são as línguas que estou a estudar e, com as quais, estou familiarizado. Embora muitos sociolinguistas em inglês se interessem pelo uso da língua relativamente à desigualdade entre homens e mulheres, Language and Woman’s Place de Robin Lakoff parece ser o trabalho sobre este tema que se considera clássico e inspirador. O livro, cuja capa tem a imagem de uma mulher com as fitas adesivas na sua boca, revela bem o conteúdo. Lakoff, apresentando os exemplos interessantes sobre a gramática e algumas palavras inglesas neste livro, afirma que o inglês prejudica a feminidade. Por exemplo, na área da gramática inglesa, o uso dos pronomes indefinidos como everybody, everyone, anyone e anybody (Lakoff, 1975: 44) parece sexista, já que estes pronomes são gramaticalmente substituídos por He, que é o pronome do género masculino singular. Além disso, algumas palavras na língua inglesa, de acordo com a autora, são sexistas. Por exemplo, a diferença entre master, bachelor, widower e mistress, spinster, widow é que os primeiros, que remetem para o género masculino, implicam o poder de controlar, seja outras pessoas, seja a juventude, nomeadamente a oportunidade de se casar com alguém e a liberdade de formar uma família, enquanto os segundos se relacionam conotativamente à propriedade sexual ou familiar, ao envelhecimento e até à desesperação para o casamento (Lakoff, 1975: 29, 32-34). Mesmo o adjetivo, professional, em inglês é às vezes sexista, visto que, se for usado para um homem, significará que ele é profissionalmente apto; se for usado para uma mulher, poderá implica literalmente e figurativamente que ela tem muitas experiências sexuais (Lakoff, 1975: 30).

*

Agradeço à Profª. Maria Martins Reis e à Carla Teixeira pela revisão deste texto e pelo comentário precioso.

1

Além dos exemplos gramaticais e lexicais, Lakoff também fala sobre a feminidade através da linguagem. A autora diz que existem algumas componentes na língua inglesa que são consideradas femininas. Por exemplo, o uso de alguns adjetivos para descrever algo ou alguém (Lakoff, 1975: 53). Estes adjetivos têm um valor mais pragmático do que gramatical, porque implicam a emoção ou o sentimento excessivos. Este valor nem sempre é usado pelos homens na interação deles. Também, o uso da expressão interrogativa acrescentada a uma afirmação ou uma negação para sugerir concordância (“You like some orange juice, don’t you?), bem como o uso de algumas palavras que significam a incerteza (“It’s kinda expensive.”), compõem a linguagem feminina (Lakoff, 1975: 53), porque, de acordo com a autora, ser boas mulheres é ser apoiante e submissivo. Além da língua inglesa, o português é também sexista. Através da minha observação e experiência como aluno estrangeiro que estuda esta língua, o sexismo do português não é muito diferente do inglês. É possível comprovar alguns exemplos que implicam o sexismo gramatical. Se for sexista o uso do pronome masculino, he, para substituir everyone, everybody, anyone e anybody em inglês, serão sexistas também os pronomes indefinidos em português como alguém, ninguém e tudo. É porque estas palavras, mesmo significando pessoas masculinas e femininas em geral, são gramaticalmente substituídas pelo pronome ou complemento direto do género masculino, ele ou o. À semelhança do inglês, algumas palavras em português são também sexistas. O touro implica o homem fisicamente forte e fogoso, enquanto a vaca significa a mulher gorda, feia e até desavergonhada (Dicionário Priberam). Há mulheres mundanas que são prostitutas, mas não há homens mundanos que são prostitutos (Dicionário Priberam). Existem putas que são prostitutas, mas putos são apenas os miúdos. A governanta manda em casa, mas o governante vai trabalhar fora. A diferença semântica das palavras dos dois géneros e as regras gramaticais já mencionadas, mesmo parecendo insignificantes, podem implicar que, na língua portuguesa, os homens são social e profissionalmente mais visíveis e mais existentes do que as mulheres. Alguns exemplos sobre palavrões em português, também, implicam o sexismo nesta língua. A ironia existe porque esta palavra pertence gramaticalmente ao género masculino, e é usado pelos homens mais do que pelas mulheres; porém, inclui muitos membros lexicais do género feminino, como porcaria, p…ta, m…rda, caraças ou filho da p…ta entre outros. Mais, enquanto a fofoca, que vem do português do Brasil, é marcado gramaticalmente pelo género feminino, o discurso pertence gramaticalmente ao masculino. A meu ver, isto deve-se porque a primeira é sobre os assuntos caseiros pouco importantes que são do domínio das mulheres mais do que pelos homens, enquanto o segundo é mais formal, mais importante, mais público e mais educativo. Portanto, generalizaríamos, de acordo com estes exemplos da língua portuguesa, que ser feminino é ser sociolinguisticamente insignificante e doméstico. Mesmo que o tailandês não tenha o sistema morfológico para marcar os substantivos e os verbos, o sexismo ainda existe lexical e discursivamente. Em termos de sexismo lexical, o caso é parecido com o inglês e o português. Algumas palavras com sentido negativo pertencem ao género feminino. Por exemplo, existem mais palavras que referem as prostitutas ou as mulheres adúlteras do que os prostitutos ou os homens adúlteros. Na Tailândia, os prostitutos chamam-se os homens que vendem a água. Este termo é menos vulgar, ou até mais educado, do que as palavras que se usam para chamar as prostitutas. Além disso, existem ainda algumas palavras para as mulheres adúlteras aludidas nas literaturas clássicas tailandesas. Wān Thōng é uma das palavras que tem a origem na literatura tailandesa, e que significa negativamente a mulher adúltera. Contrariamente, o nome do seu marido, Khŭn Phăn, que tem muitas mulheres, tem o sentido positivo, porque significa um homem valente, bonito e amoroso. Também, na Tailândia, existe a palavra a flor de ouro, que exclusivamente 2

metaforiza a uma mulher adúltera. Por isso, esses casos de sexismo lexical enfatizam que as mulheres são passivas e se encontram sob a dominância masculina, apesar da modernização social. O sexismo em tailandês também existe discursivamente. O estilo de fala na língua inglesa mencionado por Lakoff acima não é diferente do estilo na língua tailandesa. As raparigas tailandesas são ensinadas mais do que aos rapazes a falarem de modo suave e bem-educado. Por exemplo, o uso da expressão interrogativa acrescentada a uma afirmação ou uma negação para sugerir concordância

(“คุณเห็นด้วยกับดิฉนั ใช่ไหมคะ?”), bem como o uso de algumas palavras que significam a incerteza (“เสือ ตัวนี ก็ดูสวยดีนะ”) (Lakoff, 1975: 53), são frequentes entre as mulheres tailandesas. Mais, as raparigas e as mulheres tailandesas gostam de usar, ou até inventar, os adjetivos para descrever algo e alguém. Pois, enquanto os rapazes e os homens tailandeses usam só bonito/a e feio/a para descrever as coisas ou as pessoas, as raparigas e as mulheres tailandesas têm mais palavras sinonímicas. Além disso, já que a língua tailandesa é tonal, muitas raparigas ou mulheres tailandesas usam ainda o tom crescente ou mais alto quando conversarem. Esta característica é estranha, ou até condenada, se for usada pelos homens na Tailândia. Em resumo, os exemplos linguísticos nas línguas inglesa, portuguesa e tailandesa que aqui mostrei podem indicar que a língua prejudica as mulheres mais do que os homens. Enquanto as primeiras são submissivas, passivas, domésticas, delicadas e reservadas, os segundos são ativos, duros, abertos e extrovertidos. Essas características denotam o facto já mostrado na parte introdutória em que a feminidade se deve formar, mas a masculinidade tem de ser. Por isso, poderíamos concluir que, no jogo linguístico desigual entre os dois géneros, os homens são valorizados através da formação física natural, mas as mulheres são apreciadas por causa dos aspetos formados ou criados. Referências Bibliográficas Dicionário Priberam da Língua Portuguesa «https://www.priberam.pt» Franco, P. V. & Cervera, J. P. 2006. Manual para o Uso Não Sexista da Linguagem. Em «www.observatoriodegenero.gov.br». Obtido em 7 de Novembro de 2015. Lakoff, R. 1975. Language and Woman’s Place. N.Y.: Harper & Row.

3

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.