A obra a mulher no século XX e sua contribuição para a normatização feminina na sociedade portuguesa. In: Cultura, corpo e educação Diálogos de gênero

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Descrição do Produto

Maria Izilda Santos de Matos Pedro Vilarinho Castelo Branco organizadores

Cultura, corpo .e educação . Diálogos de gênero

Elizangela Barbosa Cardoso - Lená Medeiros de Menezes • Elizabeth Sousa Abrantes • Teresinha Queiroz - Leandro Pereira Gonçalves - Daniela Garces de Oliveira. Rosário da Cunha Peixoto.

Amailton

Maria do

Magno Azevedo -

Yvone Dias Avelino

edulpi

OE~~ CletWitko.~

mlerrneio-,

Editora Intermeios Rua Valdir iemeyer, 75 - Sumarezinho CEP 01257 -080 - São Paulo - SP - Brasil Fone: 2338-8851- www.intermeioscultural.com.br

• CULTURA,

CORPO

E EDUCAÇÃO

-

DIÁLOGOS

DE GÊNERO

© MARIA IZILDA SANTOSDEMATOS I PEDROVILARINHOCASTELOBRANCO Ia EDIÇÃO:OUTUBRODE 2015

• INTERMEIOS- CASADE ARTES E LIVROS CLARICEVILLAC INTERMEIOS- CASADEARTES E LIVROS

Editoração eletrônica, produção Revisão

Capa

• CONSELHO

EDITORIAL

VINCENTM. COLAPIETRO(PENN STATEUNIVERSITY) DANIEL FERRER(ITEMlCNRS) LUCRÉCIAD'ALESSIO FERRARA(PUCSP) JERUSAPIRES FERREIRA(PUCSP) AMÁLIOPINHEIRO (PUCSP) JOSETTEMONZANI (UFSCAR) ROSEMEIREAPARECIDASCOPINHO(UFSCAR) lLANAWAINER (USP) WALTERFAGUNDESMORALES(UESCINEPAB) IZABELRAMOSDEABREU KISIL JACQUELINERAMOS(UFS) CELSOCRUZ (UFS) - lN MEMORlAM ALESSANDRAPAOLACARAMORI(UFBA) CLAUDIADORNBUSCH(USP) JOSÉ CARLOSVILARDAGA(UNIFESP)

Dados Internacionais M433

de Catalogação

na Publicação

- CIP

Matos, Maria Izilda Santos de, Org.; Castelo Branco, Pedro Vilarinho, Org .. Cultura, corpo e educação: diálogos de gênero / Organização de Maria Izilda Santos de Matos e Pedro Vilarinho Castelo Branco. - São Paulo: Intermeios; Teresina: EDUFPI, 2015. (Coleção Enrregêneros). 232 p. ; 16 x 23 em. ISBN 978-85-8499-035-1 1. História. 2. História Culrural. 3. História Social. 4. Relações de Gênero. 5. Feminilidade. 6. Masculinidade. 7. Culrura. 8. Corpo. 9. Educação. I. Tírulo. lI. Diálogos de gênero. III. Série. IV. Matos, Maria Izilda Santos de, Organizadora. V. Castelo Branco, Pedro Vilar inho, Organizador. VI. Masculinidade e prostituição. VII. Mulheres e educação. VIII. Mulheres e escrita. IX. Outras atuações femininas. X. Cardoso, Elizangela Barbosa. XI. Menezes, Lená Medeiros de. XII. Abrantes, Elizabeth Sousa. XIII. Queiroz, Teresinha. XIV. Gonçalves, Leandro Pereira. Xv. Oliveira, Daniela Garces de. XVI. Peixoto, Maria do Rosário da Cunha. XVII. Azevedo, Amailton Magno. XVIII. Avelino, Yvone Dias. XIX. Intermeios - Casa de Artes e Livros. CDU CDD Catalogação

elaborada por Ruth Simão Paulino

930.85:305 900

Sumário

APRESENTAÇÃO

7

Maria Izilda Santos de Matos e Pedro Vilarinho CasteloBranco

I- MASCULINIDADE

PARTE

E PROSTITUIÇÃO

A CULTURA FÍSICA, OS AFETOS

PATRIÓTICOS

PADRÕES DE MASCULINIDADE:

TERESINA

-

E A CONSTRUÇÃO

DE NOVOS

1900-1930

Pedro Vilarinho CasteloBranco PROSTITUIÇÃO,

SOCIABILIDADES

AS DÉCADAS DE 1920

13 E MASCULINIDADE

EM TERESINA

ENTRE

E 1950

Elizangela Barbosa Cardoso DAS MODISTAS PRÁTICAS

33

FRANCESAS AO DEMI-MONDE

E REPRESENTAÇÕES

NA CAPITAL

TROPICAL.

REFLEXÕES

SOBRE

BRASILEIRA

Lená Medeiros de Menezes PARTE

II- MULHERES

o DOTE

E EDUCAÇÃO

DA MOÇA MODERNA:

PRIMEIRAS

DÉCADAS

55

EDUCAÇÃO

E TRABALHO

EM SÃO

Luís

NAS

REPUBLICANAS

Elizabetb SousaAbrantes

71

MULHERES,

MÃES E OPERÁRIAS:

PROPOSTAS

E LUTAS PELA

EDUCAÇÃO FEMININA

91

Maria Izilda Santos de Matos PARTE

Il l -

A POÉTICA

MULHERES

E ESCRITA

DOS SENTIMENTOS

EM LUIZA

AMÉLIA

DE QyEIROZ

Teresinha Queiroz A OBRAA

119

MULHER NO SÉCULO

NORMATIZAÇÃO

FEMININA

XX

E SUA CONTRIBUIÇÃO

NA SOCIEDADE

PARA A

PORTUGUESA

Leandro Pereira Gonçalves Daniela Garcesde Oliveira LYGIA BO]UNGA MULHER.

NUNES:

INFÂNCIA

LITERATURA

139

O PRAZER E O SOFRIMENTO

E GÊNERO: UM DESAFIO

DE SER MENINA/

PARA A

INFANTIL?

Maria do Rosário da Cunha Peixoto PARTE IV - OUTRAS

MULHERES

161

ATUAÇÕES FEMININAS

NEGRAS DO SAMBA PAULISTA

Amailton Magno Azevedo TRAMAS

DA VIDA NA AMÉRICA

189 LATINA:

MULHERES,

COTIDIANO,

DORES E SUPERAÇÕES

Yvone Dias Avelino

213

A obra A

mulher no século .X'X" e sua

contribuição para a normatização feminina na sociedade portuguesa LEANDROPEREIRA GONÇALVES* DANIELA GARCES DE OLIVEIRA**

Este livro é dedicado às mães, esposas, noivas, irmãs, da nação portuguesa

e

da pátria brasileira. Escrevi-o como filho, esposo, pai e irmão. Escrevi-o como homem do meu tempo e o mais ínfimo dos discípulos dAquele dos mestres. (SALGADO,

que é o maior

1949, p. 9)

Com intuito de falar sobre o que as mulheres deveriam ser e com o receio do que se tornariam com a modernidade avassaladora,' Plínio Salgado escreveu, como sugere a epígrafe acima, o livro A mulher no século XX. Esta obra trouxe como conteúdo principal a ser propagado o papel da mulher na sociedade cristã. A abertura do livro e a sua dedicatória nos auxiliam a pensar nas "coisas ditas" (FISCHER, 2001) e escritas como dispositivos do discurso normatizador. Para tal intento, é necessário pensar no contexto da escrita desse entusiasta integralista. Alguns elementos nos permitem recriar o cenário no qual Salgado encontrou campo fértil para a disseminação de suas ideias (GONÇALVES; SIMÕES, 2012). Nosso objetivo neste texto é apresentar fragmentos da obra A mulher do séculoXX e sua relação com as práticas adotadas na sociedade portuguesa da década de 40, como o objetivo de problematizar as formas como este saber atinge o público feminino através da imprensa propagandista; recriando, assim, normas e especificidades que determinam o "ser mulher" (POSSAS, 2004). Também buscamos evidenciar particularidades que relacionam Plínio Salgado a António Oliveira Salazar, ligação essa que promove a junção de discursos uníssonos e uniformes, fazendo uma incursão no caminho a ser trilhado pelas mulheres da época. E, finalmente, destacamos

141 j'v1ARIA IZILDA

140

CULTURA,

CORPO

PEDRa

VILARINHO

CASTELO

BRANCO

E EDUCAÇÃO

a mulher ideal pregada por Plínio Salgado, a mulher que não era ne boneca, tampouco era soldado. rn Não se trata, portanto, de esmiuçar a vida do autor Plínio Salgad . produzi na sociedade portuguesa n o, ruas os e fieitos que seu discurso iSCurSOproduziu 1940 A. . os anos de . qUi o discurso atinge o status de saber-poder, no qual os estudos de Foucault d _.nos convocam a pensar na produção de um saber ' como obijeto d e po er, nao havendo com iSSOuma hierarquia de um sobre o outro ,~~ Iementa comp de. saber-poder e poder-saber, para desta forma o diiScurso . , . Virar pratica e reiterar seu objetivo no sujeito.?

A CONSTRUÇÃO

SANTOS DE MATOS·

DE UM IDEAL FEMININO

A união de Estado autoritário, discurso religioso e motivações conservadoras nos parecem dar conta de explicar o acolhimento de di sse iSCurSO por parte da sociedade portuguesa (PINTO, 2007). Plínio Salgado foi ovacionado em suas conferências em Portugal, viajou o país promovendo suas obras de cunho cristão católico e legitimou discursos acer~a dos desígnios de Deus para homens e mulheres, como nos afirma em sua ~nt:oduçãO ~o tema mulher: "Perdidos os fundamentos espiritualistas e cr.is~aos da Vida humana, tornou-se impossível compreender a alma feminina e o papel que pertence à mulher na família na sociedade e na nação" (SALGADO, 1946, p. 21). ' Em defesa do bem maior da sociedade, a família, Salgado percorre Portugal levando seu entendimento do que seria a retomada do lar como bandeira para as pessoas de bem, combatendo, sobretudo, os ideais e os avanços concedidos pela Primeira República às mulheres (COVA; PINTO, 1997). Salgado encontrou terreno fértil para suas ideias. António Oliveira Salazar em seus discursos, afirmava que [...] quando a família se desfaz, desfaz-se a casa, desfaz-se o lar, desatam-se os laços de parentesco, para ficarem os homens diante do Estado isolados estranhos, sem arrimo e despidos moralmente de mais de metade de si mesmos; perde-se um nome, adquire-se um número - a vida social toma logo uma feição diferente. (SALAZAR, 1936, p. 133-134) Não é possível ao homem criar-se sozinho, afirmava Salazar.' Em seus discursos, manifestava a grandeza da família e o natural destino das

mulheres, o cuidado com a família e com a casa, ,al~m de ser um dos pilares ara a cristandade c}o lar. A mulher que ama a patna, que ama a Deus, quer p sposa ideal E esta a mulher que deve estar ao lado do homem, todas ser a e· . . s formas de feminilidade devem ser combatidas e extirpadas do tra as OU orpo social (REZOLA, 2007). c Não foi difícil para Salgado encontrar simpatia por parte da elite mguesa 4 principalmente em relação a sua doutrina, afinal um c}os por , . ulh 1 " E ates do regime era "a mulher para a família, a m er para o ar. o mue Salgado pretende com suas falas. Ele irá justificar a naturalidad: das ~ulheres com os trabalhos domésticos, a educação dos filhos e o pnvado como lugar ideal para o universo feminino.. Não é em vão que mulheres são orgamzadas

. . nas mais diversas

associações. Durante a vigência do Estado Novo, proliferaram as chamadas ligas, espaços destinados a organizações femininas, com c~nh? pedagó~ico, para, dessa forma, as lideranças femininas .ligadas aos ideais do regime, ensinarem ao público feminino como devenam se portar e como a norma deveria ser seguida, sob pena de perseguições, tortura e banimento da sociedade "normal" (PIMENTEL, 1999). Aqui, todavia, o discurso toma forma e mostra os efeitos causados no mundo feminino; o enquadramento é a palavra de ordem daquele que seria um dos únicos projetos sociais, voltados para as mulheres. Segundo Pimentel

(1998, p. 172):

Embora não fosse explícita, uma das principais funções da MPF consistiu em compensar o projeto, sempre desejado, mas falhado de uma educação escolar especificamente feminina e em atuar contra-a-corrente do ensino sexualmente neutro, ministrado nos liceus e nas universidades. Na escola, as raparigas deviam ser formadas física e moralmente, para as tarefas femininas futuras e para a colaboração com a Igreja Católica e o Estado Novo. Até o fim da Segunda Guerra Mundial, a MPF preocupou-se, sobretudo, com a dupla formação moral e nacionalista, pois Deus e a Pátria andam juntos desde que Portugal nasceu. Com

uma

política

assistencialista

provisória,"

deveria o assegurar dignidade aos menos favorecidos. regime se estabelece co.m baluarte da verdade, essa sempre inquestionada, por conta dos mUltos órgãos que aferiram e penalizavam opiniões ~ontrári~s (PI~~NTEL, 2011). Para as mulheres, parte débil da humamdade, nao sena diferente,

°

o Estado

z

142 CULTURA, CORPO E EDUCAÇÃO

fazia-se necessário apagar as ma rcas da p' . R rbli esquecimento os ideais de igualdade en rimeira epu ica e deixar no o .caráter recuperado- do regime (PI~~ homens e mulhe~es, enaltecendo Pírnenrel elucida (1999, p. 481): NTEL, 2011). Ainda sobre isso,

o

estatuto propunha-se valer sobretudo pela melhoria das co~~~ ~ales e .deficiências dos indivíduos, Içoes morais, econômicas ou " . d os seus agrupamentos naturais b d lhes ori sanrtanas , ca en 0- es onentar tut 1 f: as iniciativas particulares ou susc't ' e ar e avorecer I ar, promover e sustentar 1 ,. b de assistência quando elas falta C e e propno Oras ssern. om uma tô . fi ial preventiva e recuperadora em d . ruca pre erenci mente . ,etnmento do caráter curativo a assistên . d evena ser prestada em coordena çao . Cla corporativos, não favorecer a pr ~om a prevlde.ncla.e com os organismos . egulça ou a pedínchíc- e ter em . aper fieiçoarnenm da pessoa e da família. VIsta o A



JVlARIA IZILDA

SANTOS DE MATOS·

PEDRa

VILARINHO

CASTELO BRANCO

143

Assim, gostaria particularmente de mostrar como pôde formar, no século XIX, um certo saber do homem, da individualidade, do indivíduo normal ou anormal, dentro ou fora da regra, saber este que, na verdade, nasceu das práticas sociais do controle e da vigilância. E como, de certa maneira, esse saber não se impôs a um sujeito de conhecimento, não se propôs a ele, nem se imprimiu nele, mas fez nascer um tipo absolutamente novo de sujeito de conhecimento. Podemos dizer que a história dos domínios do saber em relação com as práticas sociais, excluída a preeminência de um sujeito de conhecimento dado definitivamente, é um dos primeiros eixos de pesquisa que agora lhes proponho.

'

Essa família, apregoada pela l' . . difundida Id tífi d po itica Salazansta, será amplamente . en 1 ca a com as polír; h" . normatizador e visand ' icas igiernsras e com caráter regulador, o a recuperação d . di íd do que' o m lVl uo que estava à margem o projeto governamental . . . . os órgãos e t d quena, perceberemos as mstrtuições o as as estruturas do .al . ' para através de um saber es ecifico cor~o SOCl unirem seus poderes, coagirem os individ . p , mamfestarem seus quereres e assim 1 uos a VIverem sob tut 1 d di N- fi' díf e a o iscurso estatal. ao 01 1 erente com as mulh que viveram naquele período. Al eres, com os homens e crianças intimidade do . d' íd _ guns estudos nos esclarecem que a s m rvi uos nao fora da' combate ao trabalho fie " fi conta a. s ardis empregados no rrunmo, ora d fi . d fi que condenaram a sexualidade a lib a es era pr~va. a, oram os mesmos Primeira Repúbl" P ,erdade e os direitos adquiridos com a rca ortuguesa. Freire (2013, p. 56) estabelece . intimidade portuguesa que "[...] persiste no arrnano da uma enorm di id d Das poucas gavetas abertas, podemo: rversi a e de gaveta~ por abrir". margem do regime tentava resistir e ne_nxergar um mundo ~lverso, que à na clandestinidad d' ao obstante, consegUIra sobreviver e, no escuro o quart fi d E ' . o ou no un o da gaveta ra necessano regular proteger d . . em práticas que não era b . e a vertir para os males contidos m em VIstas pelo d . d Foucault (2002, . 8) nos " . po er normatiza oro Por isso, Conforme o exce~to: posslbllrta pensar essa sociedade da vigilância.

As regras eram Deus, Pátria e Família, um tripé que bastava à sociedade, a cada um o seu lugar." A modernidade que assustava o conservadorismo, também produzia um saber sobre cada indivíduo e esse processo de conhecimento sobre os sujeitos, produzira no período os enquadramentos, talvez esse seja um grande traço da modernidade,? a produção do conhecimento para vigilância, como nos afirma Foucault na sua extensa obra sobre as vigilâncias modernas e as formas de penalizar os comportamentos desviantes ao longo da história. É isso que propõe Plínio Salgado, a volta às coisas espirituais, a mulher ao que é seu naturalmente, em detrimento das coisas profanas. Há, todavia, uma preocupação sempre presente nos seus escritos, tudo que se refere aos desejos mundanos, às coisas da carne e uma clara condenação do chefe do integralismo no que se refere a cuidados exacerbados com o corpo, com a aparência. Para isso deixa registrado no seu escrito, a repugnância à bijulatria (POSSAS, 2004). E isso está claramente explicitado e é fruto de suas angústias e posteriormente será publicado no livro A mulher no século XX, conforme observamos: Como pode a mulher preparar seus filhos para a vida pública, se ela ignora a história da sua própria Pátria, a grandeza dos heróis e a santidade dos santos? Como pode incutir os nobres ideais que, elevando os indivíduos, elevam as Nações, se ela só se preocupa com o luxo e o conforto, cuja mola é o dinheiro, e aponta, como exemplo aos filhos, não os homens mais honrados, porém os mais ricos? Como pode ensinar aos filhos a lição do trabalho, se ela própria é uma ociosa, que anda dos chás aos cocktails, e dos cassinos ao veterinário, e do veterinário à modista, e da modista ao bridge, sem que nada de útil e

145 O CASTELO BRANCO MARIA IZILDA SANTOS DE MATOS·

144

PEDRO VILARINH

CULTURA, CORPO E EDUCAÇÃO

de produtivo demonstre, nem com a pena, nem com a agulha, nem com a própria palavra, já que a sua conversação habitualmente flutua à superfície dos assuntos banais? (SALGADO,

1949, p. 81)

Salgado, conforme texto acima, nos apresenta um modelo hegemônico feminino, antagônico ao feminino pensado pela historiadora Joan Scott anos mais tarde. Ela preconiza o estudo da diferença dentro de um mesmo grupo, alertando para as especificidades e os múltiplos femininos presentes em um mesmo microcosmo. Plínio enxerga as mulheres através das suas lentes e de sua normativa visão, nega as diferenças de classe, as diferenças culturais, as diferenças raciais que circundam o universo feminino. Embora esteja falando para um público feminino europeu, nega as muitas especificidades presentes entre as portuguesas. Mesmo que a sociedade portuguesa tenha vestido e a imprensa divulgado a homogeneização, sabemos que um universo é sempre heterogêneo. As discussões intensas em torno do "ser mulher", eram teorizadas sempre que possível e viraram um campo privilegiado para ação católica que também tinha a mesma preocupação (MATOS, 2011). Estas preocupações nortearam as conferências proferidas por Plínio Salgado, consonante com a política conservadora de Salazar. Em plena sintonia com a ordem do momento, suas palavras incidirão sobre um público feminino preocupado em manifestar seu apreço a Deus e à Pátria. Aqui, não descartamos que outras feminilidades tenham sido criadas nesse contexto. Porém, é necessário que nos perguntemos de que feminino estamos falando (LOURO, 2002). Por certo, de um feminino branco, heterossexual e de classes abastadas, é a esse tipo de mulher que Plínio e Salazar rogam suas doutrinas (RAGO, 2009). São essas mulheres que precisam submeter-se a este modelo de feminino, tendo em vista que são elas que criam o homem que servirá à Pátria e a mulher que servirá ao marido, a Deus e à Pátria. Nessa esteira é criada uma outra experiência do "ser mulher". Como sabemos, às mulheres coube a fatia maior das relações servis, é a elas que seria facultado o privilégio da resignação e da subserviência. A intenção, todavia, é criar uma classe feminina que copiasse as mulheres da elite, capaz de compreender suas funções e promover um ideal feminino a ser propagado e almejado por todas, mesmo aquelas que estão fora desse formato. Poucos dos acontecimentos sociais fugiam ao crivo de Salazar, nada era feito sem seu aval (PINTO, 2007). "Ditador 'catedrático', Salazar

. a1 movimento de ideias de perto" n de o di ão como por conseguinte, companhava a política internaclO a h e rn a tra iça , . U om . _ b espaço que a mulher deveria (PINTO, 2007, · P: 28)..d . rn sua Vlsao so re o . eram tradicionais suas 1 elas e .1: me por isso a aproxlmaçao . d d t nsamente unitor , a e pre e d 1:' ra Não foram poucas as ocupar nessa SOCle · Pl" Salga o prolen . . com as doutnnas que mio id al dotado de particulandades I falaram de um ser 1 e , . u1 d ocasiões em que e es ldadas todos os campos estlm a os que deveriam ser educadas e mal~ .. ' (IRlGARAY 2002). d dici n lemmmo ' pertenciam ao mun o tra !CiO di d António Oliveira Salazar como r António Costa Pinto encara o ltado a pedagogia tradicional para der preocupa o com d um nato organlClsta, um 1 .' . lta à tradição na volta e olítlca mvestlU na vo '.. al as massas. Salazar, em sua P . . direcí do à identidade tradlclOn · t rehglOso e ire CiOna b um ensino emmentemen e . ignificativas incursões so re 10 diSSOveremos as s dá . portuguesa, como exemp r ostando em lazeres sau avelS o folclore, no resgate de hábitos pecu lares, ap •



Íí

às famílias (PINTO,

A IMPRENSA

1998).

CATÓLICA COMO PORTA-VOZ DO REGIME, NA

DISSEMINAÇÃO DE UM IDEAL FEMININO

. al Novidades traz o relato do que Em 24 de fevereiro de 1946, o J~rn Pl'· Salgado. É importante · f, ~ . rofenda por lnlO . tivera ocorndo na con erenCla p ._ mostrar quais sujeitos tmham . al usadas na ocaSlao e evidenClar as P avras . d d A manchetes descrevem que uma · id d nessa SOCle a e. s 1 representatlvl a e t a elite ocupava o seu ugar e parte da sociedade lisboeta estava presen e, ditava as regras. sociais é clara, no relato do . ~. de alguns atores l' . Essa óbvia ausenCla v·lntes atentos de P mio , fi - de quem eram os ou . J·ornal A voz esta a a rmaçaoformar e engrossar os quadros da uniformidade Salgado e quem estava por _ d d 10 único do feminino. Para di inação e um mo e ~ de pensamento e isserni h ~. o Estado Novo portugues delo egemonlCO, divulgar e promover esse mo. El foi um dos pilares de divulgaçao ração da imprensa. a 01· . 1 b contou com a co a o . d chefe maior António rveira e principal órgão a propagar os desejos o

°

Salazar. . . eriódico católico, editado e publicado jornal Novidades, tradlClOnal p. dos de obscurantismo sua traJetona peno de 1885 a 1975, teve em d írnento do conservadorismo, REMÉDIOS,2003). Porém,com o recru disse . ção de ideias e ideais ( , u1 ra a lssemma ele servira de importante vere o pa »Ó»

'

146 CULTURA, CORPO E EDUCAÇÃO

construídos a partir de modelos engessados na cultura cristã. Salazar não era o provinciano como muitos pensam, mas o sujeito de algumas tradições que via, no ensino religioso, a moral que os indivíduos precisavam para os ideais de amor à Pátria. Silveirinha, ao considerar o papel que os media tiveram na vida da mulher portuguesa, sublinha que [...] este processo é, porém, muito mais complexo que, à primeira vista, possa parecer. Por detrás das imagens "lisas" dos textos mediáticos que nos dão retratos do que consumimos de modo acrítico ou que, pelo contrário, reconhecemos como "distorcidas", residem complexas lutas em torno dos significados, da sua produção, da sua compreensão e das suas implicações normativas. Como e por que se produzem certas imagens? Qpe lógicas têm os media e a quem servem essas lógicas? Que efeitos têm os seus silenciamentos , as suas trivializações, a sua abertura a um acesso discursivo desigual e "genderizado"? (SILVEIRlNHA, 2004 p. 8) São os silenciamentos que também nos provocam e ao mesmo tempo invocam a pesquisa, a quem o discurso da uniformidade feminina num regime conservador serviria? Certamente essas mulheres foram parte considerável de um projeto de permanência no poder. Contudo, pensamos que os micropoderes podem servir para que os discursos de ordem dentro da Pátria perpassem toda a vida do indivíduo. Dentro da perspectiva do que foi dito e silenciado, analisamos as especificidades do regime e as fontes históricas que este produziu a respeito das mulheres do período. Concordamos com Fischer, quando ela fala que escapamos "da fácil interpretação daquilo que estaria por trás dos documentos, procurando explorar os materiais, na medida em que eles são uma produção histórica, política, na medida em que as palavras são também construções; na medida em que a linguagem também é constitutiva de práticas" (FISCHER, 2001). Por esse viés, no qual o discurso produz prática, analisamos o papel desses ditos na subjetividade feminina, asseverando que a subjetividade está ligada aos cuidados de si, a reinvenção e a constituição da relação com o outro, o que por si só é uma prática individual e libertária, mas que foi refutada pelo Estado Conservador.

a

discurso que encontra eco nessa sociedade é amplamente divulgado pela imprensa, é ela que se encarregará de propagar as palestras e

MARIA IZILDA SANTOS DE MATOS·

PEDRa

VILARINHO

CASTELO BRANCO

147

conferências ministradas pelo senhor Plínio Salgado. Quando este escreve um livro voltado para as mulheres, no que concerne ao seu comportamento e à natural vocação para a reprodução, maternidade e obediência a Deus e ao marido, ele encontra uma sociedade ávida por suas teorias, conforme suas próprias palavras: A minha intenção, de resto, é propagar, em cada uma dessas oportunidades que se me oferecem, algumas ideias, bem antigas e sempre novas, sobre verdades que, por muito evidentes, passam desapercebidas daqueles a quem mais importam. De fato, os temas variam de conferência a conferência, mas o pensamento central é sempre o mesmo, isto é, aquele que expendi na Vida deJesus cujas centenas de páginas podemos sintetizar dizendo que o Cristo, é o único solucionador de todos os problemas humanos. (SALGADO, 1946, p.9) Combatendo, com seus livros e palestras, a modernídade" e a crescente masculinização da mulher, Plínio Salgado adquire status de profeta da ordem, da família e da pátria. que fica do que passa são as reflexões que buscam entender as relações dos sujeitos nessa sociedade, na qual o discurso religioso compreende muitos aspectos, dando conta da complexidade desse estudo e da grande gama de interpretações existentes. A imprensa a serviço do Estado e da Igreja Católica nos remetem aos esforços empreendidos no combate ao socialismo, bem como à consolidação da bandeira do direito à propriedade privada. Com o objetivo de divulgar e tomar um campo antes ocupado pela ausência, a imprensa, através da Ação Católica, convoca os leigos a construírem uma sociedade baseada na moral e na delimitação do espaço dos católicos nesse novo modelo social.

a

De forma a concretizar os seus objetivos de recristianização da sociedade, a A.C.P. apostou no uso da imprensa como meio de propaganda dos seus ideais sociais. Assim, com a criação da A.c.P. deu-se uma expansão da imprensa especializada. Segundo o boletim da Ação Católica de maio-junho de 1954, a A.C.P. contava com vinte publicações periódicas, algumas com títulos bastante sugestivos quanto às suas aspirações. Cada organização fundou o seu órgão de modo a dar a conhecer as suas atividades junto dos seus (potenciais) militantes e divulgar a doutrina social da Igreja. Ao abrigo da concordata de 1940, nenhuma destas publicações eram sujeitas à censura prévia, pelo menos

148 CULTURA, CORPO E EDUCi\ç'\Q

até a chegada ao poder de Marcelo Caetano. Em finais de 1969 esta sim _ . . _ . ' 1 açao sena alterada com a obngaçao, Imposta pelo regime de submeter t d . . 'o Os Os jornais ao exame prévio. (DUARTE, 2011, p. 103)

A polícia política vigiava os temas abordados e alguns ass . . untos eram proibidos, sobretudo os que nadavam contra a corrente do re i Sala~a~ist~. Ideai~ ~e. trab~ho, terra e pão para todos, como pr:g:~ o crtstianismo primitrvo, nao eram exatamente os ideais desse regime conservador/autoritário. O governo, imposto e forjado com o aval da Igre·a ~orvezes determinará sanções aos católicos operários que lhes sustentara~: E o caso das diversas censuras estabelecidas sobre as correntes operárias que produziam os textos. Alguns ardis foram utilizados para a publicação: Para

difundir

especificamente

a sua

mensagem,

a imprensa

usava

religioso e apelava à vocação do homem

Segundo A.C.P., a recristianização

um

jVlARIA IZILDA SANTOS DE MATOS·

PEDRO VILARINHO

149

CASTELO BRANCO

de casa. Deviam transmitir valores cristãos aos filhos. Esta ideia é patente em todos os jornais católicos, quer sejam femininos, quer sejam masculinos. Tanto o regime como a Igreja Católica faziam a apologia do modelo de família tradicional que assentava o regresso da mulher ao lar e a glorificação da maternidade. (DUARTE,

2011, p. 108)

Em desalinho com as conquistas herdadas pela primeira república a ual as mulheres puderam de alguma maneira exercer uma pequena n q . ., . l"berdade - a política e a religião preViam comportamentos aceitáveis Iara homens e mulheres, e nesse contexto apenas um modelo serviria aos interesses da nação. Com amor à pátria e à instituição familiar, a mulher era cobrada a ter zelo e compromisso com ideais cotidianamente semeados. Eis o excerto, tal como apareciam nas colunas dirigidas às mulheres:

vocabulário

como apóstolo.

passava pelo apostolado do semelhante

pelo semelhante para que a mensagem de Cristo penetrasse mais eficazmente no meio operário. Esta ideia é patente em alguma iconografia do Juventude Operária, em que operários erguem uma cruz num mundo a desfazer-se. (DUARTE, 2011, p. 107)

Esta ideia também é patente na imprensa juvenil. A educação das raparigas constituía uma importante preocupação no seio do catolicismo. Esta passava, principalmente

por inculcar certos princípios para que se tornassem filhas

exemplares, boas cristãs e cidadãs responsáveis. Para atingir seu objetivo, a imprensa tinha recurso a uma linguagem simples, clara e apelativa: "Sê delicada para com todos, Ajuda tuas colegas de trabalho, Mostra-te

E assim, num mundo a desfazer-se, os ideais de um homem integral, que buscasse seu lugar dentro da sociedade, conforme os preceitos cristãos, era a única esperança para uma sociedade doente e carente de uma reordenação. A modernidade, a quem atribuíam a culpa das mudanças e do caos social, segundo o discurso clerical, era um dos mais intensos instrumentos de normatização e dominação. Não o é, de modo algum, libertária como imaginavam Salgado e Salazar naquele contexto. No entanto, para combatê-Ia, a inimiga da moral, era necessário que a imprensa trabalhasse a favor do regime. Por isso: A imprensa

difundia a sua visão do mundo

e da sociedade portuguesa,

em particular, com um manifesto tradicionalismo

sempre

alegre e sorridente, Na família, sê atenciosa e ajuda nos trabalhos de casa e No Eléctrico, oferece o lugar às pessoas mais idosas." (DUARTE,

2011, p. 109)

Visando formar um sujeito integral, a imprensa também tratava de dirigir seus apelos aos homens. Esses eram chamados a ser bons trabalhadores, homens honestos e cooperativos com o sistema patronal. O objetivo da família e do homem integral presentes na fala dos padres, bispos e fiéis. Os que destoavam desses ideais, certamente estavam nas listas da polícia de Salazar. Com pressupostos baseados na estrutura nuclear da família, Pimentel, em seu estudo sobre as organizações femininas no Estado Novo, nos informa que esse era o principal edifício corporativo do Estado Novo.

no que respeita ao lugar

e função do homem e da mulher: papéis bem codificados que em nada se distinguiam da ideologia Salazarista. Nas décadas de 1940 e 1950, a imprensa feminina insistia, portanto, na ideia de que o lugar da mulher era no lar. Chamava a atenção das suas leitoras para o papel de esposas, mães e donas

NEM

A MULHER-BONECA,

NEM A MULHER-SOLDADO

Em benefício às casas de São Vicente de Paulo, em 23 de fev~reiro de 1946, o autor proferiu, no Teatro Trindade, em Lisboa (DIARIO

STELO BRANCO

150

CULTURA,

CORPO

E EDUCAÇÃO

POPULAR, LISBOA, 03 fev. 1946), a conferência A mulher no século XX, evento organizado pelas ilustres senhoras da obra religiosa (A VOZ LISBOA, 03 fev. 1946). Assim como as outras atividades do autor eU: Portugal, o evento foi marcado por uma forte repercussão midiática. O católico Novidades noticiou a expectativa que havia em torno das palavras de Salgado, pois a associação estabelecida entre o autor e a doutrina social da igreja eram questões evidentes e intensas que marcavam profundamente a presença do líder integralista em Portugal, sendo essa a imagem do exílio: "Vem sendo, pelo fulgor da sua palavra, e pelo apostolado de uma doutrina que ele vive como católico integral, que é, o mais alto Embaixador do catolicismo social cuja realização é um dos grandes títulos de honra do Brasil cristão que criamos" (NOVIDADES, LISBOA, 23 fev. 1946). Inicialmente o tema era uma incógnita para a sociedade lisboeta, pois a temática "mulher" nunca foi tratada por ele, no entanto, em entrevista ao microfone da Rádio Renascença, o autor esclareceu o conteúdo da conferência e mostrou mais uma vez tratar-se da exaltação do cristianismo, no entanto com a utilização da mulher como foco de análise e engrandecimento de suas análises. Na seção De tudo um pouco, o entrevistador Paulo Bravio pediu-lhe para comentar alguma coisa sobre a conferência e, ao responder, Plínio disse:

o tema já está anunciado. Falarei sobre A mulher no séculoXX. Para quem me conhece, fácil será adivinhar como encaro esse problema. Fá-Io-ei do ponto de vista cristão e de acordo com ciência dos nossos dias. Mostrarei que não existe um problema da mulher em cada século, porém apenas o problema da mulher em todos os séculos. (SALGADO, 1947, p. 20) O evento foi caracterizado como uma notável e ardente lição de cristianismo "com a qual o grande escritor e pensador brasileiro arrebatou uma assistência de verdadeiro escol e para a qual foi pequeno o Teatro Trindade" (DIÁRIO DA MANHÃ, LISBOA, 24 fev. 1946). Já o conferencista foi classificado pelo Professor Luís Pinto Coelho, comissário nacional da Mocidade portuguesa,9 como "um dos mais altos embaixadores do catolicismo social brasileiro" (DIÁRIO DE NOTÍCIAS, LISBOA, 24 fev. 1946). O autor falou aproximadamente "cerca de hora e meia, sendo, a cada passo, interrompido com calorosos aplausos" (NOVIDADES, LISBOA, 24 fev. 1946). O sucesso do evento beneficente foi direcionado ao conferencista que segundo o jornal A voz:

I\1ARIA

IZILDA

SANTOS DE MATOS·

PEDRa

VILARINHO

DI

CA

. má ica varinha de condão O nome de Plínio Salgado f01, porventura, a . g poder surpreendente u1 idã . a de sentIr O que atraiu toda aquela m ti a~ ans~os 1 . artistas diplomatas, todas . • . d lite - mte ectualS, ' da sua palavra. A ssistencia e e deliciosamente mulher portuguesa, as notabilidades lisboetdas1- ebmquteemaaioria punha nota feminina da sua d or uma es um ran , representa a p vir o que acerca delas, pensa Plínio curiosidade e do seu interesse e~ ou êcul (A VOZ, LISBOA, 24 Salgado, neste atormentado e delirante sec o .

Xx

fev.1946)

t . . o autor conseguiu demarcar ainda mais a aceitação Com a con erencia, . _ ., era resente em momentos e o público feminino, caractenzaçao que Ja p d J: . ilid d b so r m um discurso a favor a temim 1 a e anteriores em outros evento.s, ~as co s rupos intelectuais, demarcando na socie~ade m~~err:~ :;:~~~o ~~v~ris~ianismo católico social em busca ainda mais a poslçao d ue estava por vir no pós-guerra. id lírica em um novo mun o q . ,. da herança po 1.1 _ d a el da mulher por toda a hlstona, Buscou analisar a evoluçao o p p. ma visão crítica desde a Antiguidade até '" ~ia: cont~po~:e~:~i:;s~bre o papel da baseada no limite do cnstlandlsm~, eZerura O autor evocou o sentido da . d d moderna o pos-gu . mulher na SOCle a e _ Iíti ca da mulher contemporânea, maternidade para iniciar uma concepçao po 1 ~ de qualquer motivo justo, "N- . orta que em razao ao afirmar que: ao imp ,_ . log·lcamente familiarmente, h filh Para ser mae pSlCO , ela não ten. a os. e até oliticamente, não importa o ter ou socialmente, mtelectual~e~te, ~ d lher no seu meio se exerça não ter filhos. O essenClal e que a açao a mu _ ) al" (SALGADO 1949, p. 73 74 . num senti d o matem _'. toda a mulher e dessa bieti d pertar a rnae que existe em O. o Je~lvo era es olítico e intelectual cristão, principqlmente forma msenr a mulher ~o ~ap.el; de sustentação do catolicismo social." por ser essa uma das pnnClpals ases b ulher no século XX, foi das palavras so re a m , A repercussao em torno . d. 7\Tual apenas não obteve , J:.. Ar nça do Sim e o tvao, a q comparável a conlerenCla ta . N' al O Comércio Vid. d Jesus na imprensa lusítana. o Jorn . mais propagaçao qu~ t a ~ Maria Adelaide Paiva, a conferência foi do Porto, em um artigo escnto por . da destacou que não havia ibi s e urgentes e ain lh notificada como conse os sa 10 . d de em tempos d·d ata da sua necessi a d "expressão capaz de ar a "" 1 a ~x " O COMÉRCIO DO PORTO, tão difíceis e de tamanho pen~o sO~vu11al (d - Da mulher" do jornal 1946) Em artigo di ga o na seçao b 5 PORTO,l a r.' . 12 afi ou' "Plínio Salgado é decerto Novidades, a escritora Bertha Leite rrnou:

s

152 CULTURA,

CORPO

E EDUCAÇÃO

além da glória do pensamento brasileiro e honra da língua portugue ' t 1 ' . sa, o apos o o magnanímo que parte e reparte os melhores ensinamentos Or quantos deles carecem mais urgentes" (LEITE, 1940). P Observa-se uma intensa repercussão no núcleo feminino portu ' . al gues que acertou suas p avras e ainda se emocionou, como Maria Trigu . c· "P ~~ que prorenu uma alestra Educativa" intitulada Grandes verdades . , . c ' . cUJa tema~Ic~ era a conlerenCla A mulher do séculon A autora destacou a reação ~o .publIc~ ~resente n~ Teatro Trindade no dia 23 de fevereiro de 1946: Vimos lagnmas de Intensa compreensão em muitos olhos DemI.n. . .. InOs; simultaneamente, sornsos de graça Intencional que eram francos aplaus os, a su bli n h arem o entusiasmo daquela hora."13 . A intensi~ade e repercussão das palavras sobre a mulher alcançaram maIS.força e~ Junho de 1946, quando a Livraria Tavares Martins, do Porto, publicou o livro A mulher do século XX 14com base na conferência realizad em Lisboa, no mês de fevereiro. O jornal A voz ao noticiar afirmou: "~ ilustre brasileiro (agora português de coração) dedica o seu livro às mães esposas, noivas, irmãs, da Nação Portuguesa e da Pátria Brasileira" (A VOZ' LISBOA, 24 jun. 1946). Alguns textos da obra foram publicados periódicos portugueses,15 antes mesmo do lançamento, como estratégia de Plínio para divulgar a obra, uma vez que enxergava A mulher no século XX como uma obra de primeiro nível, estando no mesmo patamar de outros clássicos plinianos. No ato de lançamento da obra, o católico Novidades nomeou-o como "um doutrinador seguro, moderno, audaz, consciencioso e dinâ~ico: inteligência lucidíssima e palavra fluente, dominadora, posta ao serviço da grande obra da restauração das mentes e dos costumes da gente portuguesa, na compreensão e na difusão admirável, através desse apostolado de tribuna e de imprensa" (NOVIDADES LISBOA 07J.un. 1946). ' ,

eU:

D

A notoriedade triunfante, apontada pelo Jornal de notícias, (JORNAL E .NOTICIAS, PORTO, 25 jun. 1946) daquele que ganhou fama, ~dmlr~ção e simpatia com sua formação e discurso espiritual, foi Intensificada com a obra delineadora da mulher como uma refém da concepção materialista, pois a feminilidade da mulher foi destruída justamente pela presença de um marxismo que intelectualmente transgrediu a mulher do seu verdadeiro objetivo moral familiar e cristão. Para o autor, o problema da mulher é uma construção passada que deve ser solucionado através da única solução existente, o cristianismo. Com a busca do discurso

JVlARIA IZILDA

SANTOS

DE MATOS·

PEDRa

VILARINHO

CASTELO

153

BRANCO

cristão, a moralidade deveria ser alcançada pela mulher em um combate contra valores anticristãos, principalmente no momento em que o mundo estava inserido no período pós-guerra. Defendia a ins~rção. d~ mulh:r no mercado de trabalho, no entanto, com certos limites,yOls sena impossível a . aldade total perante o homem. A partir dessa análise, pode-se perceber 19u 1· .. t al a distinção de gêneros presente no pensamento p iruano cUJo ponto cen r , valor maternal e familiar da mulher na sociedade. e o A vulnerabilidade feminina seria protegida pelo cristianismo do grande mal da sociedade: o materialismo que .impe~i~ a formação moral, religiosa e familiar. Por isso, a presença da Igreja Católica ~ra fundamental ra proteger os indivíduos e a instituição família do pengo que rondava pa . , . o mundo, tendo a mulher uma função maternal de suma lmportanCla, no sentido de proteger do perigo desestruturador da ordem ~o~iaL Em torno dessa concepção, analisou o contrassenso entre as pOSSlVelSmulh~res e apontou qual delas seguiria o modelo apontado pelo autor em Nouidades. Segundo ele, deveria ser uma mulher capaz de: Influir maternalmente

na solução das graves questões de assistência, de

amparo e justiça, em prol dos trabalhadores, equilíbrios econômicos, porém sobretudo

não somente

recompondo

recompon~o

equilíbrios morais;

dedicar uma parte do seu tempo ao apostolado cristão e ao levantamento das energias da Pátria pelo culto das virtudes antigas e das preclaras tradições da honra nacional. (NOVIDADES,

LISBOA, 24 fev. 1946)

A mulher deveria vestir o rótulo do catolicismo antimaterialista. Para isso , analisou as três vertentes femininas existentes: a boneca, a soldado e a cristã. Dois erros são correntes na civilização atual no que concerne ao papel da mulher: o dos que pretendem que ela seja um simples bibelot, um ser vivendo apenas em função da sua feminilidade física; e o dos que, no extremo oposto, querem que ela exerça todas as funções do homem na sociedade, de~de as fábricas e os campos até ao exercício de certas profissões, que contranam

a

sua natureza. Estes pretendem fazer da mulher um concorrente do homem, firmando como regra o que só como exceção deve ser tomado quando, por circunstâncias especiais, a mulher necessita prover a própria subsistência ou a de seus filhos. O serviço das mulheres nas fábricas, nos escritórios ou no

A IZILDA SANTOS DE MATOS'

154

)\IIAR I

comércio deve, evidentemente, ser permitido desde que constitua . , . .' o escudo que as preserva da miseria matenal e moral, e não um meio para dê . per e-Ias Entretanto, preClsamos sempre considerar o afastamento da mulh d . . " ,.. er o lar como evidente anormalidade biológica pOISpartindo do funda ' . . _ " .' mento da diferenciação física e do desenvolvimento dos filhos depois de nas id . . . CIOS, em ntmo murro . . _ mais lento do, que. nas outras espécies animais ,etemos d convIr que a missao da mulher e, acima de tudo a missão educativa da cri . . . ' lança e disciplinadora da casa, numa palavra: a preparação das gerações futu ras, a manutenção do tipo social mais conveniente à vitalidade da Espécie , aos destinos nacionais e às supremas finalidades do Espírito. Como, pois, educar a mulher? Formando o seu caráter, de modo que ela não seja nem a boneca de cabecinha vazia só preocupada com o luxo, a exibição, as futilidades de uma vida ociosa, nem também o ente desgracioso, de passo militar e atitudes masculinas, a aspirar a uma igualdade ridícula com o homem, uma igualdade de funções e não de direitos e deveres inerentes e diferenciações imprescritíveis. (SALGADO, 1949, p. 93-95) Definiu alguns aspectos de relevância na composlçao analítica da mulher do século XX. Impediu a igualdade ao homem, mostrando a necessidade de caracterizar a diferenciação física e biológica, no entanto, não a impede de alcançar espaços e conquistas sociais, mas obviamente dentro da baliza cristã e acima de tudo subordinada ao esposo e à família, colocada como o ponto máximo da relação social, uma vez que a missão educativa, disciplinadora e familiar estava sob a responsabilidade da mulher/ mãe. Através do impedimento da criação da mulher-boneca, bloqueava o estabelecimento da mulher capitalista, consumista e consequentemente aliada ao liberalismo e, em relação à mulher-soldado, faz menções deixando transparecer o impedimento da mulher comunista, assim levando a sociedade do pós-guerra à visão de uma mulher segura e "ordeira", a religiosa, familiar e do lar. A partir dessa caracterização, o jornal Diário da manhã, ao analisar o lançamento do livro A mulher no século XX, afirmou: "O novo livro de Plínio Salgado pode e deve ser tomado como a projeção na nossa vida literária das claridades novas trazidas à terra portuguesa pelas aparições de Fátima, em que a Virgem, na bela asserção do escritor, quis ser também mulher do século para como tal ser tomada por exemplo , " guia e modelo" (DIARIO DA MANHÃ, LISBOA, 07 jun.1946). A aceitação sociopolítica da cultura portuguesa ao pensamento da

PEDRO VILARINHO

CASTELO BRANCO

Plínio" foi evidente principalmente pela marcante consolidação ulh er' de .al me do autor no cenário luso. A busca por um componente SOCI do no ioso era sua luta constante e, no assunto "m ulh er," encon t rou uma e re ligde lucros e vantagens para a criação de concepçoes - bene'fi cas a seu fonte d . lí . que almei nto e principalmente em torno o projeto po tico mejava a same pen .' . consolidação do Plímo-catolico.

"f11

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Entendemos que o universo feminino é composto por uma multiplicidade de mulheres. No entanto, Plínio Salgado ao publicar ~u~conferência bast~~te difundida em Portugal, procurou uniformizar o femmmo. Refutou os vanos femininos e fez da homogeneização a sua maior bandeir~. ~ontu~o, nós acreditamos que as nuances e os vários matizes do femmmo ~st1ver~m sempre presentes, pois esse é um universo em que a heterogene.Idade e ~ maior tônica. Embora as tentativas de padronização sempre estIvessem a espreita e fizessem parte do cenário, com o qual Salgado tinh: inti:ni.dad~ e aceitação de uma parcela da população, os pontos d.e tensao, e~ISt1ram, caso contrário não haveria o esforço em publicar manuais pedagoglcos para as mulheres. As resistências, mesmo veladas, sofreram perseguições. Os jornais levavam ao público o que era esperado como ideal de uma m~her. Ao publicar a norma, o autor busca solidificar sua tese. A ~ulher obediente, temente a Deus, desprovida das vaidades humanas. As futihdades modernas deveriam ser por essas mulheres rejeitadas. Em contraponto as reivindicações das mulheres,

., que Ja estavam

organizadas na busca de direitos desde os sécul~s XVIII e .~' c0n;- ~s primeiras incursões feministas de que temos regIstros .na hIston~, :hmo Salgado e António Oliveira Salazar manifestam o discurso ~edl~O da época que afirmava que as mulheres eram biologicamente .mfenores. Também amparados no discurso religioso, eles irão tecer a escnta e a fala pública sobre a manutenção dos princípios básicos ditados por ~eus e em última instância pelo homem, responsável na terra pelo ser que teimava em seguir os avanços desenfreados da modernidade. .' . Relegadas a seres inferiores, as mulheres tiveram suas capaC1dad~s física, moral e intelectual abaladas pelos discursos normatizadores; nosso mtento, porém, foi pensar as práticas sociais advindas desses novos organiz~~ores do social e também como a norma produz outras subjetividades femmmas.

157 156

CULTURA, CORPO E EDlJC

_ J\çJ\Q

Percebemos um campo propício para a pesquisa, pois muitas . d bl questoes m agaçoes e pro emáticas nos inquietam e nos levam semp , . fi h d .. re a abri arqUlvos ec a os, empoeirados e escondidos na memória das mulh r .. e~qu viveram esse penodo. e REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

jV1A-RIA-

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SANTOS DE MATOS'

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NlARIA IZILDA SANTOS DE MATOS.

PEDRa

VILARINHO

CASTELO BRANCO

lY;I

VIANA, Luís. A mocidade portuguesa e o liceu: lá vamos contando ... (19361974). Lisboa: Educa, 2001. NOTAS • Professor Adjunto do Programa de Pós-Graduação em História da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PPGH/PUCRS). Doutor em História pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) com estágio (funior Visiting Fellow) no Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa (ICS-UL), com Pós-Doutorado na Universidad Nacional de Córdoba (Argentina). •• Doutoranda em História das Sociedades Ibéricas e Americanas pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). 1 Sobre a influência da modernidade nas questões que tratam do lugar da mulher na sociedade, evidenciamos o trabalho desenvolvido por Maria Izilda Matos no texto "Delineando corpos: as re resentações do feminino e do masculino no discurso médico", que reúne discurso médico, medidas higienistas e mudanças urbanas, como alicerces da construção dos parâmetros de norma social.

Michel Foucault na obra A verdade e as Formas Jurídicas, nos diz que pretende "buscar as instâncias da produção discursiva (que, evidentemente, também organizam silêncios), de produção de poder (que, algumas vezes têm a função de.interdita~), das, ~roduções d~ saber (as quais, frequentemente, fazem circular erros ou desconhecimentos sistemáticos); gostana de fazer a história dessas instâncias e de suas transformações". 2

3

Os movimentos femininos em Portugal no século XX - O caso particular do MDM.

Destacamos o papel da categoria "classe" na composição da subjetividade das ações de homens e mulheres. A categoria classe tem sido um dos divisores para pensar a diversidade do mun~o feminino, certamente as angústias de mulheres ricas e pobres são completamente opostas. Nao se trata, todavia, de binarismos, mas de saber de qual ator social estamos falando. Não podemos colocar no mesmo cesto as "mulheres", como grupo homogêneo, pois estes sujeitos apresentam múltiplas faces e matizes. 4

REZOLA, Maria Inácia. A Igreja Católica portuguesa e a consolidação do salazarismo. In: MARTINHO, Francisco Carlos Palomanes; PINTO, Antônio Costa (orgs.). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2007. SALAZAR, António Oliveira. As grandes certezas da revolução nacional Discurso no X aniversário do. 28 de maio, em 1936. In: SALAZAR. Discursos e novas políticas. v. II, pp. 133-134. SALGADO, Plínio. A mulher do séculoXX'. São Paulo: Guanumby, 1947. SCOTT,Joan. Gênero: uma categoria útil de análise histórica. In: Educação e realidade. Porto Alegre, v. 20, n. 2, p. 5-22,jul./dez. 1990. ____

oHistória das mulheres. In BURKE, Peter (org.). A escrita da história: novas perspectivas. São Paulo: Editora da Universidade Estadual Paulista, 1992.

António Oliveira Salazar foi um descrente das qualidades dos portugueses, creditava o parco desenvolvimento do país à mendicância e à imprevidência, além da preguiça, outro elemento que fora combatido nos discursos e nas práticas higienistas.

5

6 Segundo Pimentel 1999, a constituição de 1933 dizia que "o indivíduo só existia a~ravés do agregado natural a que está ligado por natureza e a família era considerada un:~ realida~e primária e fundamental de toda a orgânica nacional, na qual se fundava a ordem política e SO~I~ da nação. Vários artigos do mesmo texto fundador do Estado Novo definiram o papel da família e do Estado relativamente a esta instituição: cabia a este nomeadamente assegurar a defesa da família como fonte de conservação e desenvolvimento da raça, como base primária da educação, da disciplina e harmonia social e como fundamento da ordem política e administrativa".

Mesmo que a modernidade assuste o conservadorismo, isso não a torna menos conservadora, ela é intrinsecamente assujeitadora. Baseada em lutas de poder, em que, na maior parte das vezes, o conservadorismo prevalece. 7

160

CULTURA,

CORPO

E EDUCA.çÃO

Plínio Salgado julga combater a modernidade, no entanto, sabemos que foi na modernidad que houve a forte consolidação de estruturas normativas. Entretanto, o que está em disputa é o poder, há sempre pontos de resistência. Salgado está imerso na luta pelo poder, pelo direito d dizer e normatizar a vida dos sujeitos. e 8

A Organização Nacional Mocidade Portuguesa, conhecida como Mocidade Portuguesa CMP) foi uma organização juvenil do Estado Novo que pretendia abranger toda a juventude do paí1S.' Defendia o estímulo ao desenvolvimento integral da sua capacidade física, a formação do Caráter e a devoção à Pátria, no se?timento da ordem, no gosto da disciplina, no culto dos deveres morais, cívicos e militares. A MP deveriam pertencer os jovens dos sete aos quatorze anos e eram divididos em quatro grupos: Lusitos, dos 7 aos 10 anos; Infantes, dos 10 aos 14 anos' Vanguardistas, dos 14 aos 17 anos; Cadetes, dos 17 aos 25 anos. O líder máximo da MP era um comissário nacional, nomeado pelo ministro da Educação Nacional, subordinado ao Presidente do Conselho de Ministros. Na ocasião da conferência de Plínio Salgado, o comissário nacional Luís Pinto Coelho havia entrado há alguns meses no cargo que ocupou até 1951 com a intenção de adaptar o órgão ao novo período do pós-guerra. O MP foi extinto em 25 de abril de 1974. Cf. KUIN, Simon. A mocidade portuguesa nos anos 30: anteprojectos e instauração de uma organização paramilitar da juventude. Análise Social, Lisboa, n. 122, p. 555-588, 1993; VIANA, Luís. A mocidadeportuguesa e o liceu: lá vamos contando ... (1936-1974). Lisboa: Educa,200l.

9

10 A visão da mulher estava inserida no ideário mariano, que era aquela que estava apta para estabelecer um papel de mãe cuidadora, mulher de família e de boa conduta que pregava a devoção ao marido e aos filhos, aproximando ao culto à Virgem Maria. 11

Seção dirigida por Maria de Carvalho.

12

LEITE, Be~tha.A mulher na história de Portugal. Lisboa: Centro Tipográfico, 1940.

13

TRIGUEIROS,

Maria. Grandes verdades (APHRCIFPS-100.003.001).

Lista de autores com livros autorizados e proibidos. Relatório n. 4772. Autorização n. 4772. (ANTT/SNI/Cx.56).

14

15 Em fevereiro de 1946, o jornal Novidades publicou um dos principais capítulos da conferência: SALGADO, Plínio. Nem a mulher-boneca nem a mulher-soldado. Novidades, Lisboa, 27 fev. 1946. Em abril publicou: SALGADO, Plínio. Instrução e educação da mulher.]ornal de Beira, Viseu,20 abr. 1946. No quinzenário da ]EC publicou mais um capítulo: SALGADO, Plínio. O homem do nosso tempo. Flama: quinzenário da ]EC. Lisboa, abro1946. Essa era uma prática comum utilizada por Plínio Salgado, principalmente pela facilidade que possuía para publicar nos periódicos devido à rede inter-relacional estabelecida em Portugal. Ao regressar para o Brasil, continuou com a mesma prática e publicou posteriormente o livro A mulher no séculoXX em capítulos no jornal Idade Nova. CALIL, Gilberto Grassi. A imprensa integralista no PósGuerra: os jornais Reação brasileira, Idade nova eA marcha. In: GONÇALVES; SIMÕES,201l.

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