A Pedagogia Diferenciada na Construção da Escola Para Todos: Conceitos, Estratégias e Práticas

June 4, 2017 | Autor: M. Gomes | Categoria: Pedagogia, Educacion diferencial, Escola para todos
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A Pedagogia Diferenciada na Construção da Escola Para Todos Conceitos, Estratégias e Práticas

Mário Henrique de Jesus Gomes

A PEDAGOGIA DIFERENCIADA NA CONSTRUÇÃO DA ESCOLA PARA TODOS CONCEITOS, ESTRATÉGIAS E PRÁTICAS

Mário Henrique de Jesus Gomes Nascido no Agosto de 1974, em Lisboa, é Professor desde 1997, ano em que concluiu a Licenciatura na Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Lisboa. Doutorado em Ciências da Educação (especialidade: Desenvolvimento Curricular) pela Universidade Aberta, é Mestre em Ciências da Educação (especialidade: Orientação Educativa) pelo Instituto de Educação da Universidade Católica Portuguesa e Mestre em Psicopedagogia Clínica pela Universidade de Léon, onde também fez uma pós-graduação em Dificuldades de Aprendizagem: Diagnóstico e Intervenção. Leccionou Iniciação à Prática Profissional III e IV, na Licenciatura de Educação Básica, e Prática de Ensino Supervisionada no 1.º Ciclo do Ensino Básico I, II e III, no Mestrado em Educação Pré-Escolar e Ensino do 1.º Ciclo do Ensino Básico. Exerceu funções de Gestão e Administração Escolar, como Vice-Presidente do Conselho Executivo, como Coordenador de Estabelecimento e como Director de Agrupamento de Escolas.

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Ao Henrique, à Anabela, aos meus pais, à minha irmã, e aos meus sobrinhos.

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“Educar alguém é comprometermo-nos numa história entre pessoas, onde nada é jogado previamente, onde a singularidade das situações só pode levar à diferenciação dos métodos, onde temos de renunciar em definitivo à procura de soluções universais”. In MEIRIEU, Philipe (1998)

"Educar é mais do que preparar alunos para fazer exames, mais do que fazer decorar a tabuada, mais do que saber papaguear ou aplicar fórmulas matemáticas. É ajudar as crianças a entender o mundo, a realizarem-se como pessoas, muito para além do tempo da escolarização". In Projecto Educativo "Fazer a Ponte"

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ÍNDICE ÍNDICE .................................................................................. 5 ÍNDICE DE FIGURAS .............................................................. 6 INTRODUÇÃO ........................................................................ 7 PARTE 1 ............................................................................... 13 A CONSTRUÇÃO DA ESCOLA PARA TODOS .......................................................... 13 Breve contextualização histórica .............................................................. 13 A Influência Da Teoria Curricular ............................................................ 22 Princípios Fundamentais Da Flexibilização Curricular ........................... 35 A PEDAGOGIA DIFERENCIADA COMO ADEQUAÇÃO DA ESCOLA AO ALUNO ....... 38 O Conceito De Pedagogia Diferenciada ................................................... 38 Porquê diferenciar? .................................................................................. 48 A Diferenciação como factor de inclusão.................................................. 49 O QUE PODE DIFERENCIAR-SE ............................................................................. 52 O conteúdo ................................................................................................ 52 Componentes do Currículo ....................................................................... 52

PARTE 2 ............................................................................... 72 A IMPLEMENTAÇÃO DA PEDAGOGIA DIFERENCIADA ........................................... 72 O M.E.M.: Percursor Da Pedagogia Diferenciada ................................... 72 Experiências decorrentes de Ciclos de Estudos ........................................ 92 Investigação-acção sobre a Prevenção das Desigualdades ...................... 98 (Grupo Rapsodie) ...................................................................................... 98 A Turma da Professora Anabela – Experiência no 1.º Ciclo ................... 106

IMPLICAÇÕES EDUCACIONAIS .................................................... 142 DEFINIÇÃO DE TERMOS .............................................................. 145 BIBLIOGRAFIA ............................................................................ 147

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ÍNDICE DE FIGURAS Figura 1 – Organização Geral do Modelo do MEM ................................................... 88 Figura 2 – Agenda Semanal. .................................................................................... 108 Figura 3 – Exemplo de Acta do Conselho de Cooperação ....................................... 110 Figura 4 – Exemplo de Diário de Turma .................................................................. 112 Figura 5 – Grelha de Registo dos Comportamentos/Atitudes................................... 115 Figura 6 - Exemplo de Cartazes de Apresentação de Trabalhos de Projecto ............ 117 Figura 7 – Exemplo de Cartazes de Apresentação de Trabalhos de Projecto ........... 118 Figura 8 e Figura 9 – Apresentações de trabalhos de projecto ................................. 119 Figura 10 – Sessão colectiva de Expressão Plástica, aproveitando o espaço ao ar livre da escola....................................................................................................... 124 Figura 11 – Grelha de Planificação de Trabalhos de Projecto. ................................. 127 Figura 12 – Grelha de Preparação da Apresentação dos Trabalhos de Projecto ....... 130 Figura 13 – Grelha de Avaliação do Trabalho de Projecto ....................................... 131 Figura 14 – Exemplo de Plano Individual de Trabalho ............................................ 134 Figura 15 – Exemplo de Plano Individual de Trabalho ............................................ 135 Figura 16 – A Biblioteca de Turma.......................................................................... 137 Figura 17 – A Oficina de Escrita.............................................................................. 137 Figura 18 – O Cantinho da Matemática ................................................................... 138 Figura 19 – O espaço do computador....................................................................... 138

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INTRODUÇÃO Este trabalho pretende reflectir acerca da Pedagogia Diferenciada, considerando-a uma eficaz forma de reduzir o insucesso escolar, organizando o espaço e o tempo da turma de forma a respeitar a diversidade de alunos e, desta forma, permitir que, por percursos diferentes, desenvolvam competências comuns. Pretendemos, para além da contextualização teórica apresentar sugestões de organização do processo educativo, avançando pistas de actuação, já testadas e que, tendo tido bons resultados, acreditamos que possam ser replicadas com bons resultados. Podemos dizer, por isso, que apresentamos «boas práticas», na esperança de que o leitor, ao identificar-se com problemas comuns, possa encontrar referenciais para introduzir inovações no seu trabalho pedagógico. Muito se fala de insucesso escolar, muito se escreve sobre tentativas de explicar as suas causas. O Ministério da Educação ensaia reformas atrás de reformas, perseguindo sempre o objectivo de reduzir o insucesso escolar. Como escreve Perrenoud (1999), um professor de quarenta ou cinquenta anos poderia pensar, de boa fé, que o sistema educativo que o emprega «tudo fez» para eliminar o insucesso escolar e as desigualdades sociais com que a educação se defronta: reformas, ciclos de orientação, desenvolvimento do ensino pré-escolar, diversificação de vias após o Ensino Básico,

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reorganização curricular, formação mais exaustiva dos professores, implementação das TIC, etc. Parece termos chegado ao limite dos nossos meios. Apesar de o aparecimento do insucesso escolar como problema social se situar já na década de 50 (IsambertJamati, 1985), estamos actualmente, a verificar, por um lado, uma menor resistência ao princípio da Escola Para Todos mas, por outro, um maior cepticismo em relação às hipóteses de lá chegar (Perrenoud, 1999). Pensamos que, depois das diversas reformas e diplomas legais, não valerá a pena daí esperar milagres na luta contra o insucesso escolar. A luta contra o insucesso escolar passa pelas «mudanças de 3.º tipo», como lhes chamou Perrenoud (1990). São as que afectam as representações e as práticas dos professores para além do que pode ser inflectido pelas estruturas e os programas, na esfera que revela da autonomia profissional e não pode ser objecto de prescrições. Atendendo a que as «mudanças de 3.º tipo» não se implementam por decreto, pensamos que a estratégia a seguir será a de «convencer» os professores a iniciarem estes percursos de mudança. Ainda assim, não podemos desligar a nossa reflexão da análise às mudanças conceptuais ao nível do Currículo e das suas implicações. O que está a mudar no currículo da escola pode resumir-se nalguns pontos essenciais (Roldão, 1999): 8

1. As sociedades actuais estenderam e continuam a estender a escolaridade – vertical e horizontalmente: alarga-se a escolaridade a toda a população e alarga-se a duração da escolaridade básica, considerada essencial a todo o cidadão. 2. As sociedades actuais são cada vez mais heterogéneas do ponto de vista étnico, cultural, linguístico, etc. Portugal não é excepção, tendo-se acentuado estas diferenças nos últimos anos com a imigração que veio trazer para a escola crianças cuja Língua Portuguesa não é a sua língua materna. 3. A escola actual constituiu-se historicamente a partir de um modelo – curricular e organizativo – pensado para uma audiência relativamente homogénea, para um imaginário «aluno médio». 4. A escola actual, herdeira dos séculos XVIII e XIX, reflecte essa estrutura na sua organização e currículo: organização de turmas na base do princípio da norma e da rentabilização de recursos materiais e humanos. 5. A alteração da coerência deste modo organizativo da escola explode a partir da década de 60, com a massificação do ensino, e com o reconhecimento da necessidade de escolarização da população. 6. As mudanças e melhorias que na escola se têm procurado introduzir são inúmeras e valiosas e representam extraordinário investimento e esforço dos decisores e dos professores. Mas não têm, contudo, posto em causa o modelo no seu essencial. É como se acreditássemos que a escola que conhecemos tem de ser forçosamente assim, como a conhecemos, e como se esta 9

forma fosse, à partida, o modo “natural” de ensinar (professor, manuais, turmas…). 7. A “crise” da escola não é assim tão grave, está simplesmente ligada a este desajuste de fundo: queremos aplicar um tipo de escola idêntico – nos planos organizativo e curricular – a uma situação que é totalmente diferente. Em síntese, o grande problema da escola é hoje o de responder satisfatoriamente a todos, garantindo-lhes um bom apetrechamento educativo – sendo que esses todos são cada vez mais diferentes (Roldão, 1998). Não é nossa intenção fazer um livro de «receitas didácticas». Nem sequer acreditamos nelas. Defendemos um estilo de fazer escola reflexivo, fundamentado e muito condicionado pela situação socioambiental de enquadramento. “Toda a educação é cibernética e não um logaritmo fixo de acções numa sequência rígida”. O kibernetes grego era o piloto que guiava o barco e, portanto, tinha como missão ir adequando a direcção, a velocidade e as condições de avanço às circunstâncias de cada situação relativamente ao mar, ao vento, à rota. O professor precisa, à semelhança do kibernetes, de amplos conhecimentos para poder desenvolver adequadamente esta acomodação necessária do processo aos condicionamentos que vão surgindo ao longo do percurso (Zabalza, 1997).

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É neste quadro, que apresentamos este trabalho eminentemente virado para a prática pedagógica. Organizámo-lo em duas partes: uma parte de reflexão e fundamentação da nossa perspectiva e uma segunda com pistas para uma prática pedagógica mais eficaz, com base em investigações: umas já divulgadas e outras resultantes da nossa investigação. No primeiro capítulo, apresentamos uma breve contextualização histórica do percurso que Portugal já fez na construção da Escola Para Todos, na história recente. Aproveitamos, ainda, para clarificar a nossa interpretação dos conceitos da Teoria Curricular e que acreditamos em muito influencia a nossa postura face a estas temáticas. De seguida, debruçamo-nos na temática concreta da Pedagogia Diferenciada, reflectindo não só na sua teoria, mas fundamentando porque consideramos ser uma via de construção de ambientes de aprendizagem verdadeiramente respeitadores da individualidade humana de cada aluno. Num terceiro capítulo, intentamos reflectir no que pode diferenciar-se, à luz do que é sugerido pela UNESCO (2004): conteúdos, metodologias e abordagens aos conteúdos e de avaliar, organização do espaço e do tempo, etc. O quarto capítulo, integrado já na segunda parte, apresenta sugestões para a implementação da Pedagogia Diferenciada, a partir de experiências realizadas e do modelo do Movimento da Escola Moderna. Experiências 11

de «boas práticas» que melhoradas e generalizadas poderão ser um excelente contributo para mais um avanço na construção da Escola Para Todos, verdadeiramente respeitadora da diversidade e da promoção de uma real igualdade de oportunidades perante a escola. Estamos convictos de que as «mudanças do 3.º tipo» (Perrenoud, 1990), as que têm a ver com as representações e leituras que os professores fazem da Educação e os guiam na actuação profissional, podem ocorrer ao reflectirmos acerca do que actualmente se pensa, escreve e pratica no âmbito da Pedagogia Diferenciada, enquanto adequação da escola ao aluno, perseguindo objectivos de generalização do sucesso a todos os cidadãos que se deseja «cumpram» a escolaridade básica, tornando-a verdadeiramente universal.

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PARTE 1 “Não há, não, duas folhas iguais em toda a criação. Ou nervura a menos, ou célula a mais, não há, de certeza, duas folhas iguais”. António Gedeão (“Teatro do Mundo”, 1958)

A CONSTRUÇÃO DA ESCOLA PARA TODOS Breve contextualização histórica

Em Portugal, como na generalidade dos países democráticos ocidentais, tem sido crescente a preocupação com a construção de uma escola de sucesso para todos. A população tem-se voltado, cada vez mais, para as questões educativas, conferindo-lhes uma importância que emerge do papel determinante que o sistema escolar desempenha na formação dos cidadãos, no progresso científico e tecnológico e na formação dos quadros intelectuais e técnicos necessários ao desenvolvimento do país. Contudo, apesar desta crescente importância dada à escola, como motor de desenvolvimento, juntamente com a necessidade de a tornar promotora de sucesso, as estatísticas continuam a colocar o Sistema Educativo Português longe de atingir estas metas. É disso indicador o Estudo Internacional PISA 2003 (Programme for International Student Assessment), que avalia “a capacidade dos jovens de 15 anos para usarem os conhecimentos que têm de forma a enfrentarem os 13

desafios da vida real, em vez de simplesmente avaliar o domínio que detêm sobre o conteúdo do seu currículo escolar específico”, em particular na área da Matemática (OCDE, 2004). Neste estudo, os alunos portugueses surgem abaixo da média dos países da OCDE. Particularmente preocupante, é o facto de cerca de 30% dos alunos portugueses com 15 anos possuir um nível de literacia matemática igual ou inferior a 1 – o que significa que apenas são capazes de resolver situações problemáticas “que não requerem mais do que inferência directa” e interpretação literal. Quanto aos níveis 5 e 6, onde surgem competências como a capacidade de argumentação, reflexão e de formulação de hipóteses, apenas 5% dos alunos portugueses são incluídos. Outro indicador bastante claro é o número de retenções: segundo as Estatísticas da Educação 03/04 (GIASE, 2005), nesse ano lectivo existiram em Portugal 25 658 alunos com 16 anos a frequentar o Ensino Básico (cerca de 27% dos estudantes com esta idade), quando seria esperado que já estivessem no Ensino Secundário. Também ilustrador desta situação é o facto de 12,4% dos alunos que frequentam o 1.º Ciclo terem 10 ou mais anos. A par das classificações finais de período, estes valores sugerem que é urgente que os professores, as escolas, as comunidades e o Estado se mobilizem, de modo a inverter-se a situação. O insucesso escolar, pela sua extensão e por aqueles que penaliza, tende a ser, na prática, o meio privilegiado de selectividade social no acesso à escola que, no princípio do século XX, era desempenhado quase 14

exclusivamente por factores de ordem sócio-económica (Teodoro, 1982). Se pensarmos na nossa história, em Portugal, findo o período ditatorial, os governos da nação preocuparam-se em procurar um consenso inter-partidário e conseguir aprovar uma Lei de Bases do Sistema Educativo. Em 1986, esse objectivo é atingido e é publicada esta lei com uma concepção verdadeiramente humanista da educação, na continuidade da Constituição da República Portuguesa. Demonstram-no algumas das expressões utilizadas, designadamente no Capítulo I, “Âmbito e Princípios”, como: "democratização do ensino" (Art.º 2.º, n.º 2), "igualdade de oportunidades" (Art.º 2.º, n.º 2), "respeito pela liberdade de aprender e ensinar" (Art.º 2.º, n.º 3), "desenvolvimento pleno e harmonioso da personalidade dos indivíduos" (Art.º 2.º, n.º 4). A partir destes princípios, diz-se pretender "formar (...) cidadãos capazes de julgarem com espírito crítico e criativo o meio social em que se integram e de se empenharem na sua transformação progressiva” (Art.º 2.º, n.º 5). Na afirmação destes princípios, abdica-se de um ensino que tem em vista a selecção e, pelo contrário, propõe-se um ensino que, em resposta às necessidades da realidade social, contribua para "o desenvolvimento pleno e harmonioso da personalidade dos indivíduos" (Art.º 2.º, n.º 4). À formação de elites opõe-se, a "formação de cidadãos livres, responsáveis, autónomos e solidários" (Art.º 2.º, n.º 4).

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A abertura da escola a todas as crianças e adolescentes faz com que esta se depare com problemas decorrentes da heterogeneidade do seu público. Face a esta nova realidade, representantes de dezenas de países reúnem-se em Jomtien (na Tailândia) em 1990 e, em 1994, em Salamanca, assinando declarações cujo princípio orientador consiste em afirmar que as escolas devem ajustar-se a todas as crianças, independentemente das suas condições físicas, sociais, linguísticas ou outras. No ano lectivo de 1996/97, numa altura em que começa a questionar-se a reforma curricular decorrente da Lei de Bases e orientada pelo Decreto-Lei n.º 286/89 de 29 de Agosto, o Ministério da Educação, através do Departamento da Educação Básica, lançou o Projecto de Reflexão Participada sobre o Currículo. Foi propósito deste projecto contribuir para a construção de uma escola mais humana e inteligente, tendo em vista a formação e o desenvolvimento integral de todos os seus alunos e a promoção de aprendizagens realmente significativas, no sentido de melhorar a qualidade e a eficácia da resposta educativa (…) face às necessidades e direitos dos indivíduos (DEB, 1997). No início deste movimento, emerge a necessidade de questionar a lógica “aditiva” e “uniforme” da organização curricular tradicional (Abrantes, 2001) e “destacam-se os problemas resultantes da «diversidade sócio-cultural dos públicos e da necessidade de contextualizar e gerir a educação e o currículo em termos da sua adequação aos alunos” (DEB, 1997).

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Em 1997/98, dez escolas aderiram ao projecto de gestão flexível do currículo, número que foi crescendo nos anos seguintes, com escolas das diversas zonas do país. Estas escolas foram construindo processos de gestão curricular no quadro de uma flexibilidade que procura encontrar respostas adequadas aos alunos e contextos com que os professores trabalham. “A escola básica tem o objectivo de assegurar a formação integral dos alunos e, para isso, precisa de assumir-se como um espaço privilegiado de educação para a cidadania e de integrar, na sua oferta curricular, experiências de aprendizagem diversificadas. O currículo não pode ser identificado como um conjunto de programas extensos, organizados por disciplinas e anos, e o trabalho escolar não pode ser limitado a sequências de aulas separadas sem correspondência com mais e melhores aprendizagens” (Abrantes, 2001). No decorrer do Projecto de Reflexão Participada sobre os Currículos do Ensino Básico, tiveram lugar numerosos debates e reuniões, em especial com escolas e associações de professores. Os resultados deste trabalho estão documentados em dois relatórios, um sobre a primeira fase das discussões (Relatório do Projecto “Reflexão Participada sobre os Currículos do Ensino Básico”, DEB, 1997) e um segundo sobre a unidade da educação básica (A Unidade da Educação básica em análise – Relatório, DEB, 1998). Também se realizou um fórum nacional sobre currículo e diversidade, em 1998, 17

com a participação de cerca de 2000 professores e cujas actas foram publicadas em livro, em 1999 – Fórum “Escola, Diversidade, Currículo” (DEB, 1999). Foram, também, encomendados estudos a especialistas de Teoria do Currículo e de Didáctica, os quais têm dado origem a diversas publicações. De todo este processo, foi emergindo a necessidade de romper-se com a visão do currículo como um conjunto de normas a cumprir de modo supostamente uniforme em todas as salas de aula e de apoiar-se, no contexto da crescente autonomia das escolas, o desenvolvimento de novas práticas de gestão curricular. Em 1998, o Ministério da Educação sintetizou, no Documento Orientador das Políticas Para o Ensino Básico – “Educação, Integração, Cidadania”, os aspectos que a organização curricular deveria considerar de modo a garantir uma efectiva congruência no percurso da escolaridade básica, num processo de clarificação das aprendizagens essenciais em cada ciclo. A visão estratégica da mudança do Ensino Básico “preconiza uma articulação entre o currículo e a avaliação e a autonomia e a organização escolar e ainda a formação de professores, já que estas dimensões têm de ser contempladas e abordadas de forma coerente e intrinsecamente articulada, na procura da inovação e da qualidade” (Alonso, 2001 [1]). Foi esta “falta de visão estratégica conjunta uma das razões do fracasso de muitas das propostas aparentemente consensuais e 18

desejáveis, mas que acabariam por ficar, em grande medida, na retórica do discurso da reforma de 1986” (Alonso, 2001 [2]). A mesma autora refere que no Documento Orientador das Políticas Educativas Para o Ensino Básico – “Educação, Integração, Cidadania” (1998) podem encontrar-se quatro grandes ideias-força para ultrapassar os problemas existentes: - “o reforço da coerência e articulação vertical e horizontal entre o currículo dos três ciclos da escolaridade básica (...), sustentadas numa matriz curricular comum; - a intenção de assegurar uma formação integral de todos os alunos através da definição de competências e de aprendizagens essenciais no final do Ensino Básico e no final de cada ciclo, enquanto instrumento fundamental para a conquista de referenciais nacionais de exigência e de qualidade; - a articulação do currículo com a avaliação, entendendo esta como um elemento regulador das aprendizagens e introduzindo dispositivos de avaliação externa; - o reforço da autonomia curricular das escolas, impulsionando a flexibilização do currículo e da organização pedagógica e a introdução de variantes curriculares específicas de âmbito regional e local” (Alonso, 2001 [1] e Alonso, 2001 [2]). Na última fase deste processo (que envolveu um grande número de professores, grupos de trabalho, documentos, 19

reuniões e pareceres), a partir de meados de 1999, foram produzidas versões preliminares das competências gerais e transversais, assim como aquelas que dizem respeito às diversas áreas e disciplinas do currículo. Foram objecto de discussão e de pareceres dos diversos parceiros envolvidos no processo. Em Março de 2000, foi apresentada uma proposta estruturada, resultante da reflexão e debates realizados que, após prolongada discussão pública viria a dar origem ao Decreto-Lei n.º 6/2001, de 18 de Janeiro, que regulamentaria a reorganização curricular. O documento “Currículo Nacional do Ensino Básico: Competências Essenciais” (DEB, 2001) passa a ser uma referência central para o desenvolvimento do currículo, a partir do ano lectivo 2001/2002. De acordo com os princípios do Decreto-Lei n.º 6/2001, “o Ministério da Educação define o conjunto de competências consideradas essenciais e estruturantes no âmbito do desenvolvimento do currículo nacional (…), o perfil de competências de saída de cada nível de ensino e, ainda, os tipos de experiências educativas que devem ser proporcionadas a todos os alunos” (DEB, 2001). Evidentemente que a gestão flexível do currículo não é algo que possa decretar-se para vigorar a partir de um dado momento, mas é antes um processo que se constrói de forma gradual e devidamente apoiada. O processo de inovação iniciado em 1996, com a “Reflexão Participada sobre os Currículos” e que passou 20

pelo projecto de “gestão flexível do currículo”, tem na reorganização curricular consagrada no Decreto-Lei 6/2001 um elemento legislativo central. Este processo pressupõe “uma transformação gradual do tipo de orientações curriculares formuladas a nível nacional: de programas por disciplina e por ano de escolaridade, baseados em tópicos a ensinar e indicações metodológicas correspondentes, para competências a desenvolver e tipos de experiências a proporcionar por área disciplinar e por ciclo e considerando o ensino básico como um todo” (Abrantes, 2001 [1]). É posto fim à visão do currículo como um texto fixo, a cumprir de forma sagrada e uniforme, renascendo como “um texto aberto que é preciso encher de significado e de sentido em função das necessidades e desafios (...). Optase, assim, por um modelo ecológico e processual de construção do currículo” (Alonso, 2001 [1]). O objectivo último desta reestruturação curricular é a qualidade da educação proporcionada nas escolas, “no sentido de oferecer a cada aluno um currículo e condições de aprendizagem adequadas às suas necessidade e experiências prévias, única forma de possibilitar o sucesso educativo para todos numa escola marcada pela diversidade” (Alonso, 2001 [1]). De entre as razões fundamentais para uma apreciação positiva ao Projecto de Gestão Flexível do Currículo mencionados por Alonso (2001 [1]), destacamos o “ter colocado os alunos (cada aluno na sua diversidade) e a sua aprendizagem no coração do currículo e da acção pedagógica”. 21

A Influência Da Teoria Curricular Conceitos Curriculares

A evolução da Teoria Curricular e a reflexão que se foi construindo à volta destas temáticas da Escola Para Todos e da Igualdade de Oportunidades, trouxe uma forte e nova influência acerca da leitura da realidade escolar e da concepção de currículo. Apesar de o termo «currículo» ser polissémico, carregado de ambiguidade e não possuir um sentido unívoco (Apple, 1997; Ribeiro, 1990) e, por isso, encontrarmos cerca de trezentas entradas na Enciclopédia Internacional de Educação (Husen, 1985), é possível encontrar-lhe um sentido que transparece o que de comum e consensual há nas diversas acepções. Como diria Zabalza (1997), o conceito de currículo é uma realidade social fácil de compreender e difícil de definir. Proveniente do étimo latino «currere», encerra a dimensão de sequência e poderemos defini-lo, para clarificarmos o entendimento que fazemos dele, como um projecto de experiências educativas, cujo processo de construção e desenvolvimento é interactivo, implicando unidade, continuidade e interdependência entre o que se decide ao nível do plano normativo e ao nível do real ou do processo de ensino-aprendizagem. (Pacheco, 2001; Gomes, 2006). Podemos dizer, ainda, que o currículo é “o conjunto dos pressupostos de partida, das metas que se deseja alcançar e dos passos que se dão para as alcançar; é o conjunto de conhecimentos, habilidades, atitudes, etc. que são considerados importantes para serem trabalhados 22

na escola (…). É todo o conjunto de acções desenvolvidas pela escola no sentido de “oportunidades para a aprendizagem” (Zabalza, 1997), em situação escolar através de comportamentos de «tipo profissional» (Scurati, 1982) que, por se considerarem socialmente necessárias num dado tempo e contexto, cabe à escola garantir e organizar (Roldão, 1999). O Currículo Nacional traduz “o que em cada momento cultural e social, é definido como o conjunto de conhecimentos, habilidades, valores e experiências comuns desejados por todo um povo” (Zabalza, 1997). O que se considera desejável varia, as necessidades sociais e económicas variam, os valores variam, as ideologias sociais e educativas variam e/ou conflituam num mesmo tempo – e o currículo escolar corporiza, ao longo dos tempos e em cada contexto, essa variação e essa conflitualidade (Roldão, 1999). O Currículo Nacional pretende, nesta perspectiva, desempenhar uma série de funções, sobre as quais importa reflectir. Zabalza (1997) apresenta-nos essas funções de uma forma estruturada: - funções referidas aos professores (controlo, comparação, protecção, contrato e profissionalização) - funções referidas aos pais (informação e facilitação da colaboração) - funções referidas aos alunos (função de indicação) - funções referidas às autoridades escolares (fundamentação de decisões e controlo) 23

- funções referidas às relações entre os diversos níveis escolares (selecção e coordenação) - funções referidas ao sistema escolar e educativo (inovação e estabilização). O currículo nacional corporiza um projecto curricular de uma sociedade, nas suas grandes linhas. Por sua vez, o projecto curricular que uma escola constrói é sempre um currículo contextualizado e admite ainda a construção de projectos curriculares mais específicos, que nele se integrem adequadamente (Roldão, 1999). A Teoria e o Desenvolvimento Curriculares, como área de conhecimento especializado remonta ao século XIX devido, em parte, à pressão que a sociedade industrial foi exercendo sobre a necessidade de a escolarização cumprir finalidades bem específicas. O termo currículo entra, assim, no vocabulário educacional, a partir do momento em que a escolarização é transformada numa actividade organizada, em função de interesses sociais, culturais, económicos e políticos (Pacheco, 2001). Clarificada a nossa interpretação do conceito de «Currículo», importará apresentar, também, a nossa interpretação da expressão «Desenvolvimento Curricular». Consideramos que ela expressa uma “prática, dinâmica e complexa, que se processa em diversos momentos e em diferentes fases, de modo a formar um conjunto estruturado, integrando quatro componentes principais: justificação teórica, 24

elaboração/planeamento, operacionalização e avaliação (Pacheco, 2001). Que é gestão curricular, afinal? Não será apenas programar a calendarização dos conteúdos, realizar algumas actividades conjuntas ocasionais, como já vimos fazendo? Falar de currículo não se resume, afinal, a discutir os conteúdos dos programas? Embora boa parte destas ideias não sejam totalmente erradas, situam-se num plano que está desajustado da situação real do presente, e merecem reflexão e algum aprofundamento conceptual (Roldão, 1999). Sempre se geriu o currículo e sempre terá que se gerir, isto é, decidir o que ensinar e porquê, como, quando, com que prioridades, com que meios, com que organização, com que resultados… “Mas a maioria dessas decisões passavam-se distantes da escola e dos professores, a nível central, quase limitando a gestão curricular – as decisões – dos professores, no plano colectivo, à distribuição dos conteúdos pelos trimestres e à atribuição das classificações, e, no plano individual, à planificação das suas aulas quotidianas” (Roldão, 1999). As decisões e a gestão central obviamente permanecerão sempre, mesmo em sistemas que tenderão a descentralizar-se cada vez mais. As decisões desse tipo operam nos aspectos globais e a nível nacional. “Mas uma larga maioria das decisões virão a entrar cada vez mais no campo específico da gestão curricular de cada escola e dos seus docentes” (Roldão, 1999). Essa é a diferença que dá maior visibilidade ao processo – e ao conceito – de gestão curricular e maior responsabilidade 25

aos gestores locais do currículo – as escolas e os professores concretos, trabalhando profissionalmente para uma determinada comunidade com o seu conjunto concreto de alunos. A função do Desenvolvimento Curricular é possibilitar que um projecto geral, exactamente o que constitui o Currículo Nacional e que se caracteriza por uma dimensão institucional precisa, possa ir descendo, pouco a pouco, à situação concreta representada por cada uma das escola, situada num determinado contexto geográfico e social, com um determinado corpo docente, com alunos e estruturas particulares (Lodini, 1985). Por seu lado, a função da Teoria Curricular é descrever, explicar e compreender os fenómenos curriculares, servindo de programa para a orientação das actividades resultantes da prática, com vista à melhoria (Pacheco, 2001). O objecto da abordagem dos estudos curriculares e da teorização curricular tem por finalidade a melhoria da prática (Reid, 1980). É importante sublinhar que qualquer teorização sobre o currículo tem que estar directamente ligada à prática curricular, apresentando propostas não só de a formalizar, explicar e interpretar, como também de resolver os problemas existentes. “As teorias curriculares convertem-se em diferentes abordagens das concepções sobre a realidade que abarcam e passam a ser formas, ainda que indirectamente, de abarcar os problemas práticos da educação” (Gimeno, 1988). 26

No caso da educação, trata-se de equacionar caminhos diferenciados dentro de balizas nacionalmente estabelecidas e controladas, que conduzam a um maior sucesso da escola na sua função essencial: conseguir que os alunos adquiram as aprendizagens curriculares com uma eficácia aceitável que lhes permita assegurar a sua sobrevivência social e pessoal e um nível de pertença e desempenho sócio-cultural que permita à sociedade manter-se equilibrada e superar os riscos de ruptura (Roldão, 1999). Assim, se a escola se define como instituição curricular, o projecto educativo de cada escola terá que ser essencialmente um projecto curricular, i.e., de opções quanto às aprendizagens (de todo o tipo) que cada escola queira assumir como suas prioridades (dentro das balizas do currículo nacional) e quanto aos modos que considera mais adequados para o conseguir com sucesso (Roldão, 1999). Se atendermos à comum classificação das várias concepções de currículo, que divide as perspectivas em Teoria Técnica, Teoria Prática e Teoria Crítica, é nesta segunda que nos situamos. Na linha de Schwab (1985), Reid (1980) e Stenhouse (1984), consideramos que os problemas curriculares não são susceptíveis de solução teórica, mas sim de solução prática. Reforçamos o pragmatismo curricular ao aceitá-lo como “uma prática e como um processo de investigação que deve estabelecer a conexão entre a intenção e a realidade” (Pacheco, 2001): “Um Currículo é uma tentativa de comunicar os princípios e aspectos essenciais de um propósito 27

educativo, de modo que permaneça aberto a uma discussão crítica e possa ser efectivamente realizado” (Stenhouse, 1984). A teoria prática reforça a concepção do currículo como processo e não como produto. O objecto de estudo da Teoria e Desenvolvimento Curriculares integra, então, três dimensões principais: teorias curriculares (técnica, prática e crítica); fundamentos ou bases para o planeamento curricular ao nível da análise da sociedade, do aluno, da cultura e da ideologia; contextos de decisão curricular (político/administrativo, de gestão e realização) (Pacheco, 2001). Porque, contrariamente ao que se diz Comenio ter defendido, não é possível ensinar tudo a todos. Também por isto, o currículo é um projecto de formação que tem obrigatoriamente um significado social e político, cujos pressupostos estão nas fontes apontadas por Tyler (1949) para a identificação dos objectivos educacionais: cultura, sociedade e aluno. Níveis De Desenvolvimento Curricular

O desenvolvimento do currículo começa pela proposta formal: o currículo prescrito (Gimeno, 1988), oficial (Goodlad, 1979), formal (Perrenoud, 1995). A segunda fase é a do currículo apresentado (Gimeno, 1988) aos professores, através dos mediadores curriculares (Pacheco, 2001), principalmente dos manuais, em situações em que os professores não trabalham directamente com o Currículo Nacional. 28

Ao nível do Projecto Curricular de Escola (PCE), o currículo é planificação, em grupo e planificado individualmente (Pacheco, 2001), não deixando de ser um currículo moldado (Gimeno, 1988) ou percebido (Goodlad, 1979). Quer dizer, é uma adequação do Currículo Nacional à Escola, destacando os aspectos mais relevantes, em função do contexto. A fase do currículo real (Kelly, 1980; Perrenoud, 1995) ou do currículo em acção (Gimeno, 1988) corresponde ao currículo operacional (Goodlad, 1979) e resulta no currículo realizado (Gimeno, 1988) ou experiencial (Goodlad, 1979). É o nível de desenvolvimento curricular que ocorre em sala de aula, do qual professores e alunos têm consciência e que se vê expresso/clarificado no Projecto Curricular de Turma (PCT). É a este nível que a individualidade de cada aluno é tida em conta. Há, depois, o currículo que não é expresso, que de certa forma é paralelo, o chamado currículo oculto (Torres, 1995). Tem vindo a dar-se uma crescente relevância a este nível, uma vez que é através do mesmo que são transmitidos valores sociais e atitudes (Perrenoud, 1995). A avaliação dos alunos, mas também dos planos curriculares, dos projectos, dos manuais, dos professores, da escola e da administração, constitui o currículo avaliado. (Gimeno, 1988). A gestão, em qualquer campo, é, essencialmente, um processo de tomada de decisões orientado para as finalidades que se pretendem atingir. Trata-se portanto de um processo que implica analisar a situação que se 29

apresenta e confrontá-la com aquilo que se pretende conseguir. Dessa análise resulta a identificação de alguns caminhos possíveis, que têm de ser ponderados quanto à sua viabilidade, possibilidades de sucesso, riscos, etc. Perante essas vias possíveis, quem gere, decide optar por uma, e aplica-a. Tem de acompanhar essa aplicação de uma observação atenta e uma avaliação constante que permitam mudar de rumo ou introduzir ajustamentos a todo o tempo, sob pena de comprometer o resultado pretendido. Gerir é, assim, um processo que podemos estruturar em várias dimensões: - Analisar – ponderar; - Decidir – optar; - Concretizar a decisão – desenvolver a acção; - Avaliar o desenvolvimento e os resultados que decorrem da decisão; - Prosseguir, reorientar ou abandonar a decisão tomada. Em sistemas educativos muito centralizados os níveis de decisão predominantes situam-se na administração, os actores locais tendem a percepcionar-se como executores das decisões de outros. O que justamente agudiza hoje a necessidade de saber gerir é a mudança já atrás referida que se está a processar nos sistemas sociais e económicos, e no educativo em particular, face à impossibilidade crescente de os gerir adequadamente dessa forma. 30

Trata-se de reduzir o campo de acção para agir melhor, sem deixar de perspectivar o global. “Pensar globalmente para agir localmente”. Com vista à construção da Escola Para Todos “todas as orientações políticas e teóricas apontam para um reforço da autonomia das escolas como decisoras privilegiados face às necessidades particulares de cada contexto educativo” (DEB, 1997). Desta forma, reforça-se o carácter flexível do currículo, uma vez que só sendo interpretado à luz de cada escola / turma / aluno, pode fazer sentido. Currículo e Escola

O currículo torna-se projecto curricular quando a escola (ou grupo de escolas servindo uma comunidade) assume o seu conjunto de opções e prioridades de aprendizagem, delineando os modos estratégicos de as pôr em prática, com o objectivo de melhorar o nível e a qualidade da aprendizagem dos seus alunos – quando constrói o seu projecto curricular (que é naturalmente o principal conteúdo do seu projecto educativo). Trata-se, para as escolas, de perguntar: O que quer esta escola conseguir, que “rosto” quer ter nas aprendizagens que oferece? Que pode e quer a escola decidir para o alcançar? Como? Gerir o currículo ao nível da escola implica, partindo destas questões, construir um projecto seu. Implica decidir que ênfases vai a escola atribuir e a que aprendizagens, e porquê? Que aspectos vai deixar na sombra para valorizar outros que considera mais 31

importantes? Que competências prioritárias pretende desenvolver? Como, nas diferentes disciplinas e áreas? Que sequência dá às prioridades (por exemplo, nos primeiros três meses, investimento maciço na língua materna, no período seguinte reforçar outras áreas)? Implica também rentabilizar os recursos e oferecer campos de aprendizagem específicos quando julgue adequado e útil. Em lugar de a escola se gerir administrativamente como uma organização que veicula um sistema uniforme, cujas decisões só emanam do Ministério que a tutela, ela será antes uma organização viva e dinâmica, capaz de escolher a sua própria forma de trabalhar, embora num quadro referencial nacional que tem de ser integrado nas opções do seu projecto educativo/curricular. É este o sentido da autonomia da escola – gerir autonomamente o trabalho que realiza e pelo qual responde socialmente: a promoção das aprendizagens curriculares. O processo curricular incorpora em si a dimensão avaliativa

Definidas as metas, as opções que delas decorrem, os procedimentos e estratégias a desenvolver, há que avaliar todo o processo: para verificar o que resulta ou não, a adequação das opções ou a necessidade de redefini-las, os ajustes a introduzir permanentemente para melhorar a consecução das metas visadas.

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Este é o campo da avaliação curricular – que não se confunde com a avaliação dos resultados de aprendizagem dos alunos. Muitas vezes, esta avaliação é esquecida, não se aceitando que se perseguem objectivos específicos e importa perceber se se atingiram ou não e porquê, o que poderia ser aperfeiçoado, com vista a melhorar o processo. Evolução De Concepções

A evolução do pensamento curricular e a maturação da Teoria Curricular como disciplina autónoma no seio das Ciências da Educação veio pressionando, também, a evolução das perspectivas teóricas e políticas. Podemos mesmo ler, no Relatório do Projecto de Reflexão Participada sobre os Currículos do Ensino Básico que “a investigação mais recente em diversos documentos orientadores de política educativa internacional (Applebee, 1998; Bruner, 1996; Formosinho, 1991; Goodson, 1988; OCDE, 1994; OCDE, 1996; Stenhouse, 1991; Zabalza, 1997) vêm sublinhando que os processos de gerar mudança de práticas e garantir maior eficácia educativa face às realidades sócio-culturais cada vez mais complexas dos tempos actuais exigem, sobretudo, o desenvolvimento de estratégias e projectos de desenvolvimento curricular contextualizados, geridos pelas escolas e pelos docentes envolvidos em cada contexto” (DEB, 1991). Até há duas ou três décadas, o modelo de gestão curricular que se praticava na escola – e que é ainda o 33

que subsiste, com os problemas que se conhecem – parecia aceitavelmente eficaz para os fins socialmente pretendidos. Mas hoje os sinais de desajuste crescem todos os dias e podem manifestar-se no mal-estar dos professores e das escolas e nos dois problemas recorrentes do sistema: o insucesso e a indisciplina. Estes são alguns dos indicadores de que estamos perante uma situação nova. É necessário organizar e gerir de outro modo o currículo escolar, para superar estes problemas. De outro modo, multiplicam-se e autoalimentam-se no próprio sistema. É assim que o currículo escolar tenderá a incluir cada vez mais dois tipos de “conteúdos curriculares”: as competências cognitivas (o conhecimento de todo o tipo e os mecanismos que a ele dão acesso e permitem usálo) e, por outro lado, as competências de convivência e colaboração social (indispensáveis ao equilíbrio da vida colectiva).

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Princípios Fundamentais Da Flexibilização Curricular

O Ministério da Educação, de acordo com os princípios do Decreto-Lei n.º 6/2001, “define o conjunto de competências consideradas essenciais e estruturantes no âmbito do desenvolvimento do currículo nacional, para cada um dos ciclos do Ensino Básico, o perfil de competências de saída deste nível de ensino e, ainda, os tipos de experiências educativas que devem ser proporcionadas a todos os alunos”. O documento central para o cumprimento destas orientações é o “Currículo Nacional do Ensino Básico: Competências Essenciais” (2001, DEB). Na perspectiva de contribuir para a construção de uma concepção de currículo mais aberta e abrangente, associada à valorização de práticas de gestão curriculares mais flexíveis e adequadas a cada contexto, a reorganização curricular, está associada aos seguintes princípios (Abrantes, 2001 [1]): a) um currículo baseado em competências e experiências educativas essenciais. A sua concretização é um processo flexível que implica a interpretação de cada contexto, considerando os recursos disponíveis e tomadas de decisão apropriadas. A noção de currículo integra a procura de respostas adequadas às necessidades e características de cada aluno, grupo de alunos, escola ou região. Implica maior autonomia da escola e dos professores e está, também, ligada às ideias de Pedagogia Diferenciada, adequação e flexibilização, sendo esta relativa a um quadro de 35

referência que estabelece orientações (as competências a desenvolver). b) consistência entre currículo e avaliação. Requer a utilização de uma variedade de modos e instrumentos de avaliação adequados à diversidade das aprendizagens que pretendemos promover e à natureza de cada uma. Deve assumir um carácter positivo, formativo, indicando aspectos em que as aprendizagens devem ser melhoradas e apontando modos de o fazer. c) o papel da escola e dos professores na gestão curricular. Num primeiro nível, a escola define o seu projecto curricular (PCE). As decisões que, dentro dos limites do currículo nacional, são tomadas neste nível, são orientadas pela análise do contexto, pelas prioridades e pela apreciação dos recursos passíveis de serem mobilizados. Num outro nível, a definição do projecto curricular de turma, pelos profissionais que trabalham com cada grupo de alunos (nos casos do 2.º e 3.º ciclos) ou pelo professor titular da turma (1.º ciclo), com a colaboração de possíveis professores coadjuvantes. Num terceiro nível, a responsabilidade cabe a cada professor, implicando a tomada das decisões adequadas e a condução do trabalho concreto com os seus alunos, dentro do enquadramento dos níveis anteriores. d) natureza das actividades de aprendizagem. Não basta adquirir conhecimento. É necessário compreender, dar sentido e saber usar o que se aprende, assim como desenvolver o gosto por aprender e a autonomia no processo de aprendizagem (aprendizagens significativas). 36

São fundamentais os hábitos de experimentação e reflexão. O Decreto-Lei n.º 6/2001 estabelece um enquadramento que visa dar às escolas melhores condições de concepção, desenvolvimento e gestão dos seus próprios projectos curriculares. Convém, contudo, clarificar que a reorganização curricular não é a generalização de um projecto, não é o início nem o fim de um processo, mas sim mais um passo na construção de uma escola para todos e de qualidade.

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A PEDAGOGIA DIFERENCIADA COMO ADEQUAÇÃO DA ESCOLA AO ALUNO O Conceito De Pedagogia Diferenciada Não há uma definição de Pedagogia Diferenciada que reúna o consenso dos diversos autores e investigadores que se debruçam sobre esta temática. A expressão engloba diversas dimensões e é bastante abrangente, de onde decorre uma dificuldade em conseguir uma definição exacta e consensual do entendimento que dela se faz. Tomlinson, no início de um capítulo sobre Pedagogia Diferenciada numa publicação da UNESCO intitulada “Changing Teaching Practices: using curriculum differentiation to respond to student’s diversity”, define-a como um caminho que consiste em «agitar» a sala de aula, para a tornar mais adequada a mais alunos (UNESCO, 2004). Perrenoud, citado por Sá (2001), encontrou outras palavras para a definição. Entende-a como o “processo pelo qual os professores enfrentam a necessidade de fazer progredir no currículo cada criança em situação de grupo, através da selecção apropriada de métodos de ensino, adequados às estratégias de aprendizagem (e de estudo) do aluno”. Deste modo, podemos dizer que é o procedimento que procura empregar um conjunto diversificado de meios e de processos de ensino e de aprendizagem, a fim de permitir a alunos de idades, de aptidões, de comportamentos, de savoirfaire heterogéneos, mas agrupados na mesma turma, atingir, por vias diferentes, objectivos comuns (Gomes, 2001). Porém, uma característica comum ressalta de todas as tentativas de definição: o papel central do aluno, o respeito pela sua individualidade, a valorização da riqueza da diferença e da diversidade.

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A Pedagogia Diferenciada implica, portanto, uma concepção diferente do processo educativo e da organização da sala de aula. Com esta perspectiva, procura-se “a identificação e a resposta a uma variedade de capacidades de uma turma, de forma que os alunos, numa determinada aula, não necessitem de estudar as mesmas coisas ao mesmo ritmo e sempre da mesma forma” (Grave-Resendes, 2002). Esta concepção de Pedagogia Diferenciada acentua o papel do professor como organizador de respostas para que a aprendizagem de cada aluno possa processar-se. Não implicando a exclusão de momentos colectivos, de trabalho de grupo ou de trabalho directo aluno-professor, a Pedagogia Diferenciada assume a heterogeneidade como um recurso fundamental da aprendizagem: integra novas formas de tutoria entre alunos, adopta a colaboração dos alunos no estudo e as estratégias cooperativas de aprendizagem. Para permitir o sucesso educativo a todos os alunos, o professor tem de proporcionar condições adequadas às suas diferentes características (Sá, 2001). Implica, por isso, a utilização de estratégias diversificadas. Esta é uma preocupação importante numa escola que tem de ser para todos, constituindo um interessante desafio aos professores. Em suma, “não é um método pedagógico, mas sim a assumpção de todo o processo de educação global e complexo em que o ser/indivíduo, em todas as suas manifestações, é o centro condutor das acções e actividades realizadas nas escolas” (Boal, 1996). É uma perspectiva que considera o

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aluno como indivíduo com as suas características intrínsecas e extrínsecas, sociais e culturais e tem como objectivo o sucesso educativo de cada um, na sua diferença. Opondo-se à uniformização dos conteúdos e condenando a uniformidade de ritmos de progressão e a uniformidade de métodos, de didácticas e de práticas pedagógicas e organizacionais, a Pedagogia Diferenciada vê o aluno como

autor da sua aprendizagem e parceiro do professor e dos colegas. Inverte, por conseguinte, o sentido do acto pedagógico e a forma de gerir o currículo. Niza, nos seus diversos textos e comunicações, defende que só a partir de uma Pedagogia Diferenciada, centrada na cooperação entre professor e alunos e destes entre si, poderão pôr-se em prática os princípios da inclusão, da integração e da participação democrática (Niza, 1998; Niza, 2000). Esta mudança de uma pedagogia centrada no professor e no ensino igual para todos para uma pedagogia centrada no grupo – aceitando, integrando e valorizando a diversidade, como factor natural em todos os grupos humanos – não é fácil. A diversidade dos alunos exige que a escola não se limite a oferecer a igualdade de oportunidade em termos de acesso à educação. A diversidade dos alunos exige diversidade de respostas no processo educativo. Esperar que os alunos de uma mesma turma atinjam os mesmos objectivos, com o mesmo ritmo de trabalho, através das mesmas actividades, sob uma mesma metodologia de ensino, apesar da diversidade de 40

características pessoais, estilos de aprendizagem e conhecimentos prévios, é uma esperança vã, pela improbabilidade de se conseguir. A improbabilidade aumentará infinitamente ao extrapolarmos para a dimensão de um país. A via da uniformidade não concebe a diversidade como um aspecto enriquecedor da própria comunidade escolar (turma, escola, país). A escola actual propõe-se, por via da Lei de Bases do Sistema Educativo Português, com os seus valores humanistas, assegurar a todas as crianças, independentemente das suas características (sociais, físicas, intelectuais, culturais ou outras) e diferenças individuais, uma escolaridade de base. “O problema reside em encontrar formas de organização das escolas e dos trabalhos das turmas de modo a que todas as crianças e jovens possam experimentar uma aprendizagem com sucesso” (Ainscow citado por Cadima, 1998). Sérgio Niza (2000) refere que a Pedagogia Diferenciada é um direito a que o aluno deverá ter acesso. Considera-o mesmo uma questão dos Direitos da Criança. De um modo geral, os alunos estão ainda longe de serem assumidos como cidadãos por parte dos cidadãos professores, segundo interpreta, sublinhando a necessidade de alterar o estado da Educação e as concepções dos professores.

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Grave-Resendes (2002) sintetiza as conclusões de alguns estudos da relação entre as orientações de uma escola para todos e os resultados escolares obtidos. Segundo o que refere, os resultados científicos são encorajadores e comprovam que: - Não existe uma relação determinista entre a cultura, a classe social e os resultados escolares obtidos; - Os resultados académicos das escolas estão sistematicamente relacionados com as características dos processos educativos que desenvolvem; - Uma escola que é capaz de promover o progresso educativo de um grupo de alunos, também o promove nos outros alunos, ou seja, a eficiência ou ineficiência de uma escola afecta todos os alunos que a frequentam, independentemente de diferenças de género, classe social e etnia. Estes dados vieram, de certa forma, como também já foi referido em páginas anteriores, chamar à atenção para o facto de as causas do insucesso não se centrarem só nas crianças, nas famílias e no meio social, mas (e grande parte) no processo de escolarização. A flexibilização curricular procura inverter a história passada, marcada por tentativas de solução que acentuavam mais as diferenças, aprofundando a discriminação. Ao longo da história, os sistemas educativos têm adoptado medidas para responderem às diferenças dos alunos, utilizando diferentes estratégias (formas de organização) curriculares. De uma forma esquemática 42

podem referir-se cinco metodologias (Grave-Resendes, 2002): O método selectivo: assente em objectivos e conteúdos fixos e comuns para todos os alunos. Os alunos irão deixando o sistema educativo quando não conseguem alcançar esses objectivos. O método temporal: pressupõe a existência de conhecimentos comuns a todos os elementos de uma sociedade e que os alunos que tenham necessidade possam dispor de mais tempo para alcançá-los. Reconhecem-se diferenças no ritmo de aprendizagem. O método de neutralização: baseia-se no princípio de que factores sociais ou culturais originam dificuldades na escola em alguns alunos, os quais deverão ser compensados. O método de adaptação de objectivos: parte do princípio de que não se podem realizar as mesmas aprendizagens devido à diversidade dos alunos que frequentam uma escola. Diversificam-se assim os objectivos criando currículos paralelos. O método da adaptação do ensino: tem em conta que um único método de ensino/aprendizagem não consegue dar resposta às necessidades de todos os alunos. Por isso, adaptam-se a organização e as estratégias de ensino às necessidades de desenvolvimento curricular dos alunos, sem diferenciar objectivos, mas diversificado os processos. É esta última concepção que nos remete para a Pedagogia Diferenciada que defendemos. 43

“Não será todo este discurso de diferenciação apenas uma vestimenta up-to date para práticas que nunca poderão nem deverão ser muito diferentes? Provavelmente muitos professores, no seu íntimo, estão convictos disto mesmo. Contudo, mudanças reais estão a ocorrer por força da evolução social e económica, queiram ou não os actores e os decisores, e é fundamental dar conta delas e compreender a sua natureza” (Roldão, 1999). Uma das questões, decorrente da concepção de Pedagogia Diferenciada, é como gerir a aprendizagem do grupo/turma. Há professores que afirmam que consideram todos os seus alunos da mesma maneira, que para eles são todos iguais, que não têm em linha de conta quem são nem de onde vêm. Este tipo de afirmações são proferidas com a convicção de que é para bem dos alunos esta posição. Contudo, consideramos interessante e irónica esta perspectiva de assumir que são todos os alunos iguais, para que não se criem desigualdades e, ao mesmo tempo, se promova um ensino igual para todos, o que acentua e reforça as desigualdades. Para implementar a Pedagogia Diferenciada, é necessário criar um clima securizante que passa pelo reconhecimento, por parte do professor, do aluno enquanto pessoa, com um determinado património sociocultural, com os seus interesses, necessidades, saberes, expectativas e dificuldades. Alargando-se ao grupo turma, este reconhecimento evidencia uma 44

heterogeneidade que exige que não se ensinem todos os alunos como se fossem um – o “aluno médio”. É necessário que se criem condições para um ensino individualizado, “no sentido do percurso e das regulações” (Benavente, 1992 e Perrenoud, 1995). A heterogeneidade começa, à partida, pelas diversas proveniências dos alunos. Estudos realizados em França e referidos por João dos Santos (1991), da comparação das condições de vida dos melhores e piores alunos, num certo número de turmas e escolas concluiu-se que um pai intelectual (e sobretudo se for professor de profissão), a proximidade da escola e de habitação, o quarto individual e a família pouco numerosa, são as mais importantes condições de êxito académico. As crianças provenientes de determinados ambientes socioculturais não entendem uma escola que não tem nada a ver com a sua realidade social. Também a escola não entende e tenta-se a rejeitar essas crianças que “falam outra língua”. Há famílias que não preparam, na relação familiar, as crianças para receberem, na escola, instrumentos de cultura que ela fornece e impõe. Já João dos Santos (1991) nos dizia que “se a criança, antes de chegar à escola, não tiver aprendido, ajudada pelo amor da mãe, os fundamentos da linguagem verbal e se não tiver depois podido praticar toda a espécie de jogos verbais no ambiente liberal da casa paterna, o ensino escolar torna-se, para ela, ineficaz”. Este «ensino escolar» é um ensino estandardizado. Porém, perante a Pedagogia Diferenciada, estas crianças teriam uma

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oportunidade de desenvolver as competências necessárias à sua progressão de sucesso. É ineficaz agir como se, à chegada a uma turma, todos os alunos estivessem no mesmo nível de desenvolvimento de competências e conhecimentos. “O que a criança aprende antes de entrar na escola é mais importante, qualitativa e quantitativamente do que o que depois se aprende em anos e anos de escola” (Santos, 1991). Para concretizar-se a Pedagogia Diferenciada tem, também, que valorizar-se o sentido social das aprendizagens, criando situações que permitam partilhar o que cada um tem e partir do que cada aluno sabe. O papel da interacção social é relevante nas mudanças cognitivas dos alunos ao longo dos seus processos de aprendizagem. Dá-se, aqui, importância ao recurso à aprendizagem cooperativa e à avaliação subjectiva, subjacente à avaliação diagnóstico, nos processos de construção dos conhecimentos em interacção. Trata-se, em suma, de gerir a heterogeneidade e promover a igualdade de oportunidades. Implica, em primeira instância, estar atento às diferenças. É aqui que a Pedagogia Diferenciada começa, seguindo-se a adequação das estratégias de ensino encontradas pelo professor para aproximar-se das estratégias de aprendizagem de cada aluno. No essencial, diferenciar significa definir percursos e opções curriculares diferentes para situações diversas,

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que possam potenciar, para cada situação, a consecução das aprendizagens pretendidas. Gerir o currículo pressupõe diferenciar a vários níveis: – diferenciar as opções de cada escola para responder melhor ao seu público; – diferenciar os projectos curriculares das turmas ou grupos de alunos para melhorar a aprendizagem; – diferenciar os modos de ensinar e organizar o trabalho dos alunos para garantir a aprendizagem bemsucedida de cada um. A todos estes níveis, requer-se um equilíbrio constante entre o modo de diferenciação que se escolhe e a aprendizagem que se quer assegurar. Ou seja, as escolas diferenciam os seus projectos, mas para que em todas elas se alcancem melhor as aprendizagens socialmente necessárias, comuns a todos; diferenciam-se os métodos pedagógicos e as actividades para corresponder às diferentes vias de acesso e pontos de partida dos alunos, mas para que assim todos eles cheguem a um nível mais elevado de aprendizagem. Diferenciar é estabelecer diferentes vias – mas não pode ser nunca estabelecer diferentes níveis de chegada por causa das condições de partida. Diferenciar também não equivale a hierarquizar metas para alunos de grupos diferentes – mas antes tentar, por todos os meios, os mais diversos, que todos cheguem a dominar o melhor possível as competências e saberes de que todos precisam na vida pessoal e social. 47

Porquê diferenciar?

Considerando que cada aluno tem pontos fortes, interesses, necessidades, estilos e ritmos de aprendizagem diferentes, “os alunos aprendem melhor quando o professor toma em consideração as características próprias de cada um (...); quando o professor respeita a individualização” (Grave-Resendes, 2002). O estudo das diferenças cognitivas foi revolucionado pela investigação de Howard Gardner (1983), psicólogo e professor da Faculdade de Estudos Pós-Graduados da Universidade de Harvard que, nos últimos quinze anos, se têm dedicado às questões da inteligência e à sua definição. No seu livro Frames Of Mind: The Theory Of Multiples Intelligences (1983), Gardner concebeu um suporte teórico necessário para repensarmos a nossa visão pedagógica. No referido livro, defende a chamada teoria de «inteligências múltiplas», que se traduz no facto de todos os seres humanos possuírem pelo menos oito modos diferentes de conhecer o mundo: através da linguagem, da análise lógico-matemática, da representação espacial, do pensamento musical, da expressão corporal, da compreensão de outros indivíduos e de si próprio e da capacidade de se relacionar com a natureza. O indivíduo possui todas estas inteligências, que funcionam em inter-relação, evidenciando-se mais uma(s) do que outras. De certa forma, podemos considerar que a teoria de Gardner veio chamar a atenção para o facto de um ensino uniforme, igual para todos, não ir ao encontro das 48

especificidades cognitivas de cada aluno. Efectivamente, proporcionar igualdade de oportunidades aos alunos não quer dizer terem todos o mesmo livro, o mesmo horário ou as mesmas actividades, mas ter-se em consideração que os alunos não aprendem todos da mesma forma, visto que têm estilos individuais de aprendizagem. Alonso, Gallego e Honey referem-se a “estilos de aprendizagem” definindo-os como “as marcas cognitivas, afectivas e fisiológicas, que servem como indicadores relativamente estáveis dos modos como os alunos percebem, interagem e respondem aos ambientes de aprendizagem” (Alonso, 1994). Estes autores apresentam quatro estilos de aprendizagem: o estilo activo, o estilo reflexivo, o estilo teórico e o estilo pragmático. O aluno que possui um estilo activo de aprendizagem tem como principais características ser animador, improvisador, curioso, arriscado e espontâneo. Já o aluno que possui um estilo reflexivo é caracterizado por ser ponderado, consciente, receptivo, analítico e exaustivo. Por outro lado, o aluno cujo estilo de aprendizagem é o estilo teórico dispõe de características semelhantes às do aluno cujo estilo de aprendizagem é reflexivo, visto ser metódico, lógico, objectivo, crítico e estruturado. Em contrapartida, o aluno que possui o estilo pragmático, é experimentador, prático, directo, eficaz e realista (Alonso, 1994). A Diferenciação como factor de inclusão

A Pedagogia Diferenciada é também um factor de inclusão, na medida em que, “é a identificação e a 49

resposta a uma variedade de capacidades de uma turma, de forma que os alunos, numa determinado aula não necessitem de estudar as mesmas coisas ao mesmo ritmo e sempre da mesma forma”; (…) “os professores defrontam-se com a necessidade de fazer progredir no currículo, uma criança em situação de grupo, através da selecção apropriada de métodos de ensino e de estratégias de aprendizagem e de estudo” (GraveResendes, 2002). Esta concepção de Pedagogia Diferenciada acentua o papel do professor como organizador de respostas para que a aprendizagem de cada aluno possa processar-se. Não implicando a exclusão de momentos colectivos, de trabalho de grupo ou de trabalho directo aluno-professor, a Pedagogia Diferenciada assume a heterogeneidade como um recurso fundamental da aprendizagem: integra novas formas de tutoria entre alunos, adopta a colaboração dos alunos no estudo e as estratégias cooperativas de aprendizagem. Diferenciar é, também, diversificar. O aluno é autor da sua aprendizagem e parceiro do professor e dos colegas, invertendo o sentido do acto pedagógico e a forma de gerir o currículo. Para GraveResendes (2002), Niza (1996) e Benavente (1994), diferenciar não significa individualizar o ensino: significa que as regulações e os percursos devem ser individualizados num contexto de cooperação educativa que vão desde o trabalho contratado ao ensino entre pares. Niza, nos seus diversos textos e comunicações, defende que só a partir de uma Pedagogia Diferenciada, 50

centrada na cooperação entre professor e alunos e destes entre si, poderá pôr-se em prática os princípios da inclusão, da integração e da participação democrática. Esta mudança de uma pedagogia centrada no professor e no ensino igual para todos para uma pedagogia centrada no grupo e que aceite, integre e valorize a diversidade, como factor natural em todos os grupos humanos, não é fácil. A diversidade dos alunos exige que a escola não se limite a oferecer a igualdade de oportunidade em termos de acesso à educação. A diversidade dos alunos exige diversidade de respostas no processo educativo.

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O QUE PODE DIFERENCIAR-SE O conteúdo

Antigamente, os professores ocupavam-se, num primeiro nível de planificação das actividades lectivas, da escolha do(s) conteúdo(s) a ensinar. Hoje, é fundamental que se entenda o conteúdo como o que se espera que o aluno aprenda, que entenda, que seja capaz de fazer. Até à última revisão curricular, os conteúdos eram rigidamente prescritos pelo Ministério da Educação. Hoje, com o fim do Currículo Nacional inflexível a cumprir de forma quase sagrada, os professores, ao nível da escola e ao nível de cada turma, são convidados a escolher os conteúdos, tendo em conta os interesses e necessidades dos alunos e os recursos da escola e da comunidade. Pela Pedagogia Diferenciada, os professores são encorajados a seguirem esta via da adequação ao real, de atenderem à diversidade dos seus alunos, respeitando e valorizando a diferença. Componentes do Currículo Métodos de apresentação

Para além da adequação ao real, na selecção dos conteúdos a trabalhar, outro componente do currículo – os métodos de apresentação – pode contribuir para a Pedagogia Diferenciada. Variando as técnicas de abordagens aos conteúdos, os materiais pedagógicos utilizados e a utilização de recursos e informações dos alunos, da escola e da comunidade. É importante a 52

variedade de técnicas e, acima de tudo, incentivar a participação dos alunos na partilha da informação que têm e na procura de informação complementar. Há várias formas de apresentar ou incluir um conceito ou competência: observando, lendo, ouvindo e fazendo (input modes). É possível, ainda variar os métodos, utilizando-os individualmente, a pares, em pequenos grupos ou em grande grupo. Métodos de treino

Também a este nível (output modes), é possível diferenciar, recorrendo a várias estratégias de treino/aplicação dos conhecimentos e competências: escrever, falar, desenhar, fazer … Avaliação

Por tradição, a avaliação praticada nas escolas, baseava-se essencialmente na medição e encaminhava-se predominantemente para fins sociais, satisfazendo três funções: classificadora, de certificação e selectiva. Estas funções ficaram intimamente ligadas à massificação escolar e à transformação da escola a partir do século XIX. Ano após ano, a avaliação praticada nas escolas foi fundamentalmente do tipo sumativo: “as notas eram atribuídas e distribuídas em função do grau de aproximação ou afastamento dos conhecimentos de cada aluno face ao conteúdo do discurso do professor. A classificação de um aluno dependia, então, mais do professor e do grupo em que o aluno estava inserido do 53

que propriamente dos seus conhecimentos” (Valadares, 1998). A influência da tradição psicométrica em avaliação escolar foi muito forte, ao tentar combater a sua subjectividade com a utilização de instrumentos precisos. Porém, muitas vezes, preocupados com a objectividade e o rigor, descurou-se o essencial. É feliz a frase de Pinto (s.d.) quando diz que a “obsessão pelo termómetro nunca fez baixar a febre e o papel do professor é fazer baixar a febre”, aludindo a que o objectivo último é desenvolver as competências e a avaliação apenas faz sentido como regulador do processo. Sob a influência de Tyler (1949), a avaliação passa a ser concebida como um processo através do qual se determina a congruência entre a performance do indivíduo num dado momento e os objectivos do ensino definidos para esse momento. A nota atribuída ao aluno passa a exprimir a relação proximidade-afastamento dos conhecimentos revelados face aos objectivos enunciados. A informação recolhida através da avaliação é reinvestida no processo pedagógico. O ano 1973 é caracterizado como um “período de afirmação e institucionalização em que se assiste a um grande desenvolvimento profissional e à ampla difusão de critérios que orientam os trabalhos de avaliação” (Valadares, 1998). Foi após este período que foi estabelecida uma dimensão pedagógica na avaliação. Dimensão que resulta de esta ocorrer durante o processo de ensino-aprendizagem e ter como objectivo orientar a acção do aluno e do professor. Contudo, para além destas 54

novas funções, a avaliação continuou a ter as clássicas funções de classificação, selecção e certificação. Foi o construtivismo que pressionou para que a avaliação passasse a ser olhada como um processo que visa orientar o aluno quanto ao trabalho escolar, procurando identificar as dificuldades, de modo a auxiliálo na descoberta de formas de superação e permitir a progressão na sua aprendizagem. A avaliação passa a ter uma dimensão de contributo para que cada aluno aprenda a aprender (domínio da meta-aprendizagem). A avaliação passa a ter, essencialmente, uma função pedagógica, ela “fornece ou pode fornecer aos intervenientes nos processos educativos, um conjunto de informações e referências susceptíveis de serem utilizadas em reajustamentos mútuos com vista à prossecução dos objectivos pedagógicos” (Pinto, s.d.). Aliás, é um elemento essencial no processo de ensino e de aprendizagem: “A avaliação é um elemento integrante e regulador da prática educativa” (Despacho Normativo n.º 30/2001, ponto 2). Valter Lemos (1998) apresenta um diferente esquema de entendimento das funções essenciais da avaliação. São elas a orientação (diagnostica a situação dos alunos face aos objectivos planeados para ajustar estes face aos resultados), a regulação (verificação do progresso de aprendizagem em vista aos objectivos fixados, ao longo da execução das diversas partes do plano de ensino), a certificação (verificação do nível final de aprendizagem face aos objectivos definidos, possibilitando o 55

enquadramento numa escala relativa aos níveis de sucesso/insucesso). Hoje, a evolução das perspectivas de avaliação no âmbito da Teoria Curricular reflecte-se nos documentos oficiais e na legislação. Assim, quando falamos em avaliação como elemento regulador, “entendemos por regulação da aprendizagem todo o acto intencional que, agindo sobre mecanismos de aprendizagem, contribua directamente para a progressão e/ou redireccionamento dessa aprendizagem” (Santos, 2000). Ao falar de acção sobre os mecanismos de aprendizagem, está a considerar-se o papel central do sujeito, daquele que aprende. Nesta perspectiva, o acto regulador passa pelo papel activo do aluno. Está impressa nesta visão a influência das teorias cognitivas da aprendizagem que apontam que a aprendizagem implica inevitavelmente a acção do próprio sujeito. De acordo com a função que desempenha no processo de ensino-aprendizagem, é comum definirem-se diversos tipos de avaliação: prévia (determina onde deve integrarse o estudante ao iniciar uma nova fase), diagnóstica (diagnostica dificuldades no decorrer do processo de aprendizagem), formativa (aquilata acerca do progresso), formadora (contribui para que aprenda a aprender) e sumativa (afere a consecução do estudante no final de uma fase). Como consequência dos resultados obtidos, os juízos de valor que se formulam acerca da aprendizagem de 56

cada aluno são verdadeiramente comparações. Para compararmos usamos referentes. Estes podem ser um critério ou uma norma (Lemos, 1998). Quando o professor faz avaliação do tipo criterial, portanto referida a um critério, a consecução de cada aluno é comparada com um critério ou padrão de consecução e que é definido como aquele que se lhe poderia exigir. Cada aluno é avaliado por si, sendo formados juízos de valor acerca do grau em que possui uma(s) determinada(s) competência(s). A consecução do aluno é traduzida numa nota. Quando o referente é a norma, a consecução do aluno é descrita em termos da posição relativa às notas de um determinado grupo (a norma). A norma pode ser o conjunto de notas dos alunos da própria turma. Desta forma, pode traduzir-se a performance de cada aluno face à sua posição na sua própria turma. “Quando a avaliação é referida a uma norma, o que interessa não é se o aluno atingiu e em que medida atingiu este ou aquele objectivo, mas em que posição se situa face aos resultados de um grupo que são considerados como referente importante” (Valadares, 1998). É claro que na vida da sala de aula as coisas não são tão lineares. Por vezes, faz-se uma dupla interpretação, tentando avaliar em simultâneo a consecução individual do aluno face a determinado(s) objectivo(s) e discriminar os aluno no que respeita ao seu grau de consecução global.

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Muitas vezes, também é adoptada a auto-referenciação: o aluno é avaliado por comparação com os seus desempenhos anteriores. A utilização dos testes como único instrumento de avaliação é, com frequência, associada a um ensino predominantemente expositivo, pretendendo-se aferir se os alunos conseguem reproduzir com fidelidade aquilo que o professor explicou. Como resultado de um teste é aplicada uma nota. Com base nas notas dos testes, os professores decidem uma classificação final do período do ano escolar. O teste constitui o instrumento dominante (às vezes exclusivo) de avaliação dos alunos. A esta sobrevalorização dos testes corresponde a indução dos alunos a uma maneira de estudar destacando aqueles aspectos que são fácil e habitualmente avaliáveis: a memorização e o treino. Em vez de estudar para aprender, estuda para uma nota. Esta visão deturpa fortemente o conceito de avaliação, misturando-se as suas funções. O problema não reside em utilizar testes, mas na forma como se utilizam. Os testes devem ser encarados pelos professores como mais um instrumento de que dispõem para avaliar, devendo variar o tipo de testes, o tamanho, a frequência e a articulação com outros instrumentos. Além disso, os testes deveriam ser associados a aulas «normais» e não a aulas especiais.

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Os testes não deveriam ser os únicos instrumentos de avaliação, como dissemos. A bem de uma verdadeira Pedagogia Diferenciada, ao nível da avaliação, dever-seia, recorrer a outros instrumentos, tais como: relatórios, portfolios, instrumentos metacognitivos (mapas conceptuais e vês epistemológicos), apresentações orais, questionários (opiniões, atitudes, valores, apreciações subjectivas), registos de observações (desempenhos/respostas nas aulas, tpc, skills psicomotores, etc.) (Valadares, 1998; Lemos, 1998). É da conjugação dos dados obtidos através dos diversos instrumentos e modalidades de avaliação “que deve emergir a classificação que traduza a efectiva aprendizagem, de cada aluno” (Nova, 1997). A fundamentação dos juízos de valor que um professor formula é tanto maior “quanto maior for a riqueza e a variedade dos dados que obtém, o que pressupõe a utilização de uma ampla gama de instrumentos de recolha de informação” (Valadares, 1998). No Despacho Normativo n.º 1/2005, quando são referidos os princípios da educação, valoriza-se esta diversidade, indicando que “a avaliação das aprendizagens e competências assenta na (…) utilização de técnicas e instrumentos de avaliação diversificados (n.º 6, alínea b). Mesmo a crença de inspiração psicométrica de que os testes avaliam de uma forma mais objectiva a aprendizagem é posta em questão com o facto de haver muitas e incomensuráveis variáveis a influenciar a performance do aluno no momento da realização do teste. 59

Para além disso, há questões que podem colocar-se sempre em relação a cada teste: a validade, a diferencialidade, a fidelidade e a objectividade. A utilização dada à informação ao longo do processo de avaliação é mais importante do que a informação em si própria, sendo, então, fundamental o modo como o professor tem em conta a diversidade dos elementos recolhidos. Uma das expressões mais felizes dos últimos anos é a que define a avaliação como «instrumento regulador da aprendizagem». Deve ser essa mesma a essência da avaliação, a sua função primordial, a de reguladora da aprendizagem. O despacho acima referido considera claramente que, no contexto da diversidade, “a avaliação, enquanto parte integrante do processo de ensino aprendizagem, constitui um instrumento regulador das aprendizagens, orientador do percurso escolar e certificador das diversas aquisições realizadas pelo aluno” (DN n.º1/2005, introdução) E, mais adiante, refere que a avaliação visa “apoiar o processo educativo, de modo a sustentar o sucesso de todos os alunos, permitindo o reajustamento (…) nomeadamente quanto à selecção de metodologias e recursos” (n.º 2, alínea a, DN n.º1/2005). A regulação da aprendizagem advirá de uma multiplicidade de processos, incluindo também a coavaliação entre pares e a auto-avaliação. A auto-avaliação, dado ser um processo interno, é o processo por excelência de regulação. É que o itinerário de aprendizagem do aluno não segue necessariamente a 60

lógica da disciplina, nem tão pouco a do professor; o que é dito pelo professor não é garantidamente apropriado pelo aluno; os erros só podem ser ultrapassados pelos que os cometem e não por aqueles que os assinalam, uma vez que as lógicas de funcionamento são diferentes (Santos, 2000). A auto-avaliação é um processo de metacognição, entendido como um processo mental interno através do qual o próprio toma consciência dos diferentes momentos e aspectos da sua actividade cognitiva. Cabe ao professor, neste contexto, a responsabilidade de construir um conjunto diversificado de contextos facilitadores para o desenvolvimento da auto-avaliação, tornando-se o aluno gradualmente mais autónomo (Santos, 2000). Ainda em relação à concepção de avaliação como instrumento regulador da aprendizagem, “alguns trabalhos têm demonstrado a estreita relação entre o primeiro e o último resultado dos alunos, no mesmo ano escolar. A maioria dos alunos que têm classificação insuficiente ou negativa no início do ano, numa dada disciplina, vêm a ter insucesso na mesma, no final do ano” (Lemos, 1998). Algumas vezes, o professor continua clama e paulatinamente «dando o programa», sem ter em atenção tal facto, provocando naturalmente o cada vez maior «afastamento para baixo» daqueles alunos. Ora, uma das funções mais importantes da avaliação, enquanto reguladora, é dar informação quanto à

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necessidade de realização de acções de recuperação dos alunos. Para além das actividades de recuperação nas aulas, os trabalhos de casa, podem ser uma estratégia ligada quer à recuperação quer ao desenvolvimento dos alunos. O professor não precisa de recomendar as mesmas tarefas como trabalho de casa. Devem ser adequados ao percurso individual de cada aluno. O que é preciso saber acerca dos alunos

Para implementar a Pedagogia Diferenciada, é necessário, em primeiro lugar, recolher informação acerca de cada aluno, no que diz respeito aos seus conhecimentos e competências prévios, aos conhecimentos e competências que ainda não adquiriu, aos seus interesses, experiências realizadas e estilos de aprendizagem. Conhecer mais e melhor os nossos alunos e as suas características individuais ajuda-nos a perceber que parte do currículo temos necessidade de diferenciar, em função dos seus conhecimentos e experiências prévios, dos seus interesses e estilos de aprendizagem. Para o efeito, pode recorrer-se à observação e registo (em papel ou gravação), “brainstorming” e resumos de textos, de preferência em grupos. Uma sugestão apontada pela UNESCO (2004) é a utilização da técnica «KWL». Esta técnica consiste na resposta a três questões acerca do que novo conceito que vai ser introduzido. As questões são: - o que já sei? (K – What do I know?) 62

- o que quero saber? (W – What do I want to know?) - o que aprendi? (L – What did I learn?) – questão que surgirá no final do processo. Podem, também, ser feitos «teste diagnósticos», no sentido convencional do termo, que por si só são redutores mas, em conjunto com os anteriores, podem fornecer informações importantes.

Interesses dos alunos

Uma estratégia para saber mais acerca dos interesses dos alunos pode passar pela realização de entrevistas entre pares, com vista à construção de um esquema que retrate os interesses particulares, os interesses comuns e as diferenças. A partilha destas informações, a pares e colectivamente, além de proporcionar troca de experiências sociais entre os alunos, fornece ao professor informações determinantes para a aprendizagem e a motivação do aluno. Estilos de aprendizagem

A terceira dimensão a ter em conta, no conhecimento dos alunos relaciona-se com os estilos de aprendizagem. Os estilos de aprendizagem estão relacionados com as “Inteligências Múltiplas” de Gardner: linguística, lógicomatemática, corporal/cinestésica, musical, espacial, intrapessoal e interpessoal. 63

Já anteriormente nos tínhamos referido aos estilos de aprendizagem como “marcas cognitiva, afectivas e fisiológicas, que servem de indicadores relativamente estáveis dos modos como os alunos percebem, interagem e respondem aos ambientes de aprendizagem (Alonso, 1994). Também nos referimos aos trabalhos de Gallego e Honey e aos quatro estilos de aprendizagem – activo, reflexivo, teórico e pragmático. Os estilos de aprendizagem estão, ainda, relacionados com as concepções que os alunos têm da aprendizagem, “o significado que o fenómeno da aprendizagem tem para os indivíduos” (Marton e Booth, 1997, citados por Duarte, 2002). São, como refere Duarte (2000), determinadas pelas experiências de aprendizagem anteriores, influenciada pelas características individuais do aprendente e pelo contexto. A fenomenografia destaca a importância da concepção que o indivíduo tem sobre os fenómenos, reafirmando que e aprendizagem é uma mudança na concepção dos fenómenos, “uma consciencialização de mais ou novos aspectos desse fenómeno” (Marton e Booth, 1997, citados por Duarte, 2002). Estes autores destacam assim a importância da concepção que o indivíduo desenvolve sobre o acto de aprender: “de modo a aprender algo, tem de se ter alguma ideia sobre aquilo que se está a aprender” (idem).

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A fenomenografia identificou a “concepção que os/as estudantes têm do fenómeno da aprendizagem” como uma variável crucial para o acto de aprender (Marton e colaboradores, citado por Duarte, 2002). Assim, importa compreender que tipos de concepções podem ser encontradas nos estudantes, de modo a compreender se será este um factor de insucesso (e como o ultrapassar). Marton e colaboradores (1999) identificaram seis diferentes concepções de aprendizagem: 1) A aprendizagem como ampliação do conhecimento (“increasing one’s knowledge”); 2) A aprendizagem como memorização (“memorising”); 3) A aprendizagem como aplicação do conhecimento (“applying”); 4) A aprendizagem como compreensão (“understanding”); 5) A aprendizagem como observar os fenómenos de outra perspectiva (“seeing something in a different way”); e 6) A aprendizagem como alteradora do indivíduo (“changing as a person”). Como refere Duarte (2002), estas seis concepções têm sido identificadas em estudos realizados por outros autores (como Cliff, em 1998), em diferentes contextos. Marton e colaboradores (citados por Marton et al, 1999, e por Duarte, 2002) consideram existir uma hierarquia de sofisticação entre estas seis concepções, evoluindo desde a “aprendizagem enquanto reprodução de material” para a aprendizagem enquanto interpretação, “transformação de conteúdos” e reflexão (Marton et al, 1999). Estas seis concepções foram reunidas por estes autores em dois grupos: as três primeiras (1, 2 e 3) correspondem a uma concepção quantitativa da aprendizagem e as seguintes 65

(4, 5 e 6) correspondem a uma concepção qualitativa deste processo. Como descreve Duarte (2002), a concepção quantitativa reúne atitudes perante a aprendizagem como a “recolha e acumulação, por memorização, de unidades discretas de informação”. Para os aprendentes que têm uma concepção quantitativa de aprendizagem, aprender não é mais do que absorver informação indiferenciadamente e repeti-la quando consideram necessário, de modo mecânico ou algorítmico, envolvendo uma “representação pouco diferenciada da aprendizagem”. Esta concepção tem algum paralelismo com a definição de aprendizagem aceite no séc. XIX, mas que consideramos insuficiente. Por seu lado, os indivíduos que têm uma concepção qualitativa da aprendizagem encaram o acto de aprender como compreensão, relação e reorganização de significados. De acordo com esta perspectiva, a aprendizagem é um “processo activo”, que pode resultar no “desenvolvimento pessoal” (Duarte, 2002). Esta concepção aproxima-se claramente da definição de aprendizagem defendida por autores como Marton (2000), Duarte (2002) e Lunenberg e Korthagen (2003). Estes dois tipos de concepções de aprendizagem (quantitativo e qualitativo) diferem, fundamentalmente, na existência – ou não – de significado, como explicita Duarte (2002). Na primeira concepção, a estratégia primordial é a memorização; na segunda, o indivíduo prefere compreender e reflectir sobre a aprendizagem, podendo mesmo alterar a sua visão sobre a questão. 66

A par das concepções quantitativa e qualitativa, Biggs e Moore (1993, citados por Duarte, 2002) identificaram uma terceira, que denominaram de concepção institucional. Os alunos que têm este tipo de concepção da aprendizagem representam o acto de aprender como uma resposta às exigências da escola, atingindo padrões satisfatórios de performance e, como tal, obtendo reconhecimento (Duarte, 2002). Entwistle, Marton e Ramsden referem que os alunos com esta concepção analisam aquilo que é esperado deles e, em função disso, “direccionam os esforços do estudo” (citados por Entwistle, 2005). Deste modo, os alunos com uma concepção institucional da aprendizagem optam por memorizar e/ou compreender, consoante aquilo que consideram que lhes é exigido. Assim, podem conjugar aspectos das concepções quantitativa e qualitativa, conforme considerarem ser o necessário ou adequado para obter reconhecimento da escola. Importa compreender, neste quadro, qual a relação entre a concepção de aprendizagem, o tipo de motivação que os move e as estratégias utilizadas perante a situação de aprendizagem. À associação entre estes aspectos do tipo de abordagem que cada indivíduo pode fazer da aprendizagem, os autores que defendem a perspectiva fenomenográfica denominaram teoria das abordagens à aprendizagem. A primeira abordagem à aprendizagem é denominada como superficial, correspondente à concepção quantitativa da aprendizagem. É geralmente associada a uma motivação instrumental, caracterizada pelo “desejo 67

de evitar o fracasso através de uma correspondência mínima às exigências” (Duarte, 2002). É uma motivação de cariz extrínseco, que consiste em evitar o insucesso. À abordagem superficial à aprendizagem correspondem naturalmente estratégias de superfície: o aluno despende o mínimo de esforço possível, de modo a memorizar a matéria básica. Não utiliza estratégias de compreensão, reflexão ou análise – apenas soma parcelas e, em situações de avaliação, reproduz os conteúdos memorizados (Entwistle, Marton e Ramsden, citados por Entwistle, 2005). Marton e Lewis (1997, citado por Marton, (1999), nas suas investigações têm verificado que a maioria dos estudantes tem uma abordagem superficial à aprendizagem, utilizando estratégias de repetição e reprodução nos trabalhos e exames. Quando inquiridos, os estudantes afirmaram que consideravam que aprender é “aquisição de informação” e colocavam a compreensão como um fenómeno distinto da aprendizagem. A abordagem profunda à aprendizagem caracteriza-se pela relação estreita entre a concepção qualitativa da aprendizagem (a aprendizagem enquanto compreensão, análise e reflexão, que pode alterar o indivíduo) e uma motivação do tipo intrínseco. Na verdade, o indivíduo que possui este tipo de motivação aprende porque quer saber, tem interesse, muito para além daquilo que a escola espera dele. O indivíduo motivado intrinsecamente aprende para “actualização de interesses ou

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competências” e obtém como recompensa “satisfação pessoal” (Duarte, 2002; Entwistle, 2005). Associada à concepção qualitativa de aprendizagem e à motivação intrínseca, surge consequentemente a utilização de estratégias profundas. Estas estratégias passam pela análise, pela reflexão e até pela “transformação de conteúdos” (Marton, 1999), implicando necessariamente a relação daquilo que se está a aprender com o que já se sabia anteriormente. Perante uma tarefa escolar, o indivíduo tende a “implicar uma consulta ampla e diversificada de fontes de informação”, investindo frequentemente muito tempo no estudo e no aprofundamento das matérias (Duarte, 2002). Entwistle (2005) refere que a intenção do estudante que aborda profundamente a aprendizagem é criar uma opinião sobre o conteúdo daquilo que aprende. Para tal, relaciona esses mesmos conteúdos com o que aprendeu previamente, compara-os e examina-os, de modo a tirar as suas próprias conclusões, que sabe argumentar. Este autor refere também que a memória também é utilizada, mas de forma estratégica e como base de suporte à compreensão. As aprendizagens efectuadas através da utilização de estratégias profundas são, de um modo geral, de longa duração, por contraponto às estratégias superficiais, que apenas permitem uma “retenção estrita e temporária da informação” (Thomas e Bain, 1982, citados por Duarte, 2002). Este aspecto enfatiza a importância da utilização de estratégias profundas na aprendizagem: na “Era do Conhecimento” que estamos a atravessar, se o indivíduo 69

não procura compreender e integrar os novos conteúdos a que está frequentemente exposto, acabará por “perderse”, uma vez que não conseguirá situar-se criticamente perante novas aprendizagens que surjam. A abordagem profunda é mais complexa do que a abordagem superficial, uma vez que implica a utilização de estratégias intelectualmente mais elaboradas. Esta afirmação é corroborada por vários autores, que demonstraram que, geralmente, ao longo da escolaridade, os estudantes desenvolvem concepções mais sofisticadas de aprendizagem, pelo que a abordagem profunda aparece com maior expressão em fases avançadas da escolaridade (Marton e colaboradores, 1993; LindblomYlänne, 1996; citados por Duarte, 2002). No entanto, Duarte (2002) ressalva que pode ser falacioso considerar a abordagem profunda hierarquicamente superior, uma vez que não há verdadeira compreensão sem memorização. Como refere este autor, a memorização “assegura a acumulação de conhecimento” e a compreensão “garante uma mudança de perspectiva”. A abordagem de sucesso à aprendizagem é denominada desta forma devido ao tipo de motivação que a caracteriza. De facto, o aluno que possui este tipo de abordagem à aprendizagem é motivado pelo sucesso ou realização, pelo reconhecimento social do seu esforço. Esta motivação é de natureza extrínseca, como na abordagem de superfície à aprendizagem; porém, para o aprendente motivado pelo sucesso, não basta “passar” – é necessário obter bons resultados, para atingir um nível de 70

“excelência pessoal, com base na competição com os pares” (Entwistle e Ramsden, 1983, citados por Duarte, 2002). Assim, o tipo de estratégias que utiliza varia consoante aquilo que os professores pretendem, pelo que o estudante motivado pelo sucesso procura esclarecer-se sobre o conteúdo e os critérios de avaliação. As estratégias que utiliza não são predominantemente profundas ou superficiais, mas organizacionais, gerindo disciplinadamente todo o processo de aprendizagem – tempo, espaço, materiais. Na verdade, não é a aprendizagem que o move, nem a necessidade de conseguir o suficiente para progredir; para estes estudantes, o que os motiva é o fortalecimento do autoconceito académico (Duarte, 2002).

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PARTE 2 “As turmas com mais êxito são aquelas em que o professor e os alunos assumiram o compromisso de não deixar ninguém para trás”. (Sérgio Niza)

A IMPLEMENTAÇÃO DA PEDAGOGIA DIFERENCIADA O M.E.M.: Percursor Da Pedagogia Diferenciada

O Movimento da Escola Moderna (MEM) é uma associação de professores e profissionais da educação, com algumas décadas de vida em Portugal. Reconhecido pela Federação Internacional dos Movimentos da Escola Moderna em 1966, a Associação formalizou-se em 1976, começando a publicar o seu Boletim Escola Moderna em 1978. O MEM baseia-se na pedagogia de Célestin Freinet, um professor francês que, no decurso do seu trabalho como docente do 1.º ciclo, iniciado em 1920, desenvolveu um método natural de aprendizagem. Destacam-se, na sua pedagogia, algumas inovações, tais como: a "aula-passeio", uma aula dada fora da sala, pondo os alunos em contacto com a realidade exterior e motivando-os para a aquisição de conhecimentos, de uma forma mais significativa; a produção de textos livres, quando e como a criança quer, a partir dos quais se faz a aprendizagem da leitura e da escrita, segundo o método natural; a imprensa escolar, com entrevistas, pesquisas, 72

vivências, relatos de aulas-passeios e textos livres; a correspondência interescolar; o livro da vida, que funciona como um diário da turma; auto-avaliação; e plano de trabalho. Com o desenvolvimento das tecnologias de informação e comunicação, hoje, podemos recorrer às novas tecnologias, como, por exemplo, o vídeo, o computador e a Internet. O MEM faz formação de professores, num modelo de autoformação cooperada, organizada em grupos de trabalho que reflectem sobre as suas práticas e partilham experiências e instrumentos de trabalho. O MEM dispõe, também, do referido Boletim "Escola Moderna" e de um Centro de Recursos e a formação inicial é assegurada através de acções de formação que pressupõem o apoio ao professor na aplicação do modelo pedagógico preconizado por este movimento às suas turmas.

O MEM pratica uma pedagogia de cooperação, em que alunos e professores negoceiam actividades e projectos a desenvolver à volta dos conteúdos programáticos, tendo por base os interesses e saberes dos estudantes e o contexto comunitário. Esta organização cooperativa promove o desenvolvimento moral e cívico, a capacidade de iniciativa, a co-responsabilização dos alunos pela sua aprendizagem e a aprendizagem da democracia. Para cada aluno é definido um plano de trabalho autónomo. O professor acompanha e regula a sua 73

execução, evitando a acumulação de dificuldades. Desta forma, procura-se respeitar o ritmo e as características de cada aluno e garantir o sucesso de todos. Toda a turma é implicada no sucesso de cada aluno, através do apoio prestado pelos que têm mais facilidade àqueles que apresentem mais dificuldades, em qualquer área. O MEM assenta na defesa de valores: a democracia, a solidariedade, a justiça e a cooperação dentro da sala de aula; concebe a escola como uma unidade que garante o desenvolvimento global dos alunos. Esta forma de trabalhar pode ser aplicada em todos os graus de ensino mas, em Portugal, encontra-se maior implementação ao nível do 1.º ciclo, por ser aí se verificar a monodocência e, logo, haver uma maior autonomia e interdisciplinaridade. O modelo do MEM assume “que a heterogeneidade das turmas, incluindo as que englobam alunos com necessidades educativas especiais, é uma riqueza e que a melhor forma de trabalhar é em cooperação e não em competição. As turmas com mais êxito são aquelas em que o professor e os alunos assumiram o compromisso de não deixar ninguém para trás, sendo que os colegas têm por missão puxar uns pelos outros" (Niza, 2000) e esta metodologia não prejudica os bons alunos. No MEM, professores e alunos reúnem-se no chamado "Conselho de Cooperação" para decidir e planificar o trabalho que irão desenvolver ao longo do ano, mês, semana. Os alunos podem indicar o que mais gostam e negociar com a turma e o docente o trabalho a realizar. 74

Seguidamente, é-lhes distribuído um horário geral da disciplina, com quatro tempos diferentes: o tempo mensal para a Assembleia de Turma (aqui os alunos autoavaliam-se e avaliam os colegas em relação aos comportamentos e atitudes); o tempo semanal para os alunos fazerem pesquisa acerca dos projectos que escolheram; o tempo semanal para os alunos estudar na sala de aula de forma autónoma, e o tempo semanal reservado às comunicações dos alunos à turma e às comunicações do professor. Cada aluno traça o seu plano autónomo - ajustado às suas capacidades, interesses e dificuldades -, que o professor vai acompanhando, de forma a evitar que as dificuldades se acumulem. Com este método, garante Sérgio Niza, "os alunos sentem-se respeitados e sentem que a sua opinião é valorizada". Acima de tudo, é o momento privilegiado para o avanço individual em certas áreas disciplinares, bem como para a promoção e desenvolvimento da autonomia, auto-regulação e tomada de decisão. A turma não é obrigada a utilizar manuais escolares mas terá de ter ao seu dispor uma multiplicidade de recursos, como livros, dicionários, gramáticas e fichas, de modo que possa compreender que não existe apenas uma fonte de conhecimento. Os alunos cumprem também os mesmos momentos de avaliação dos demais, simplesmente o processo é participado por toda a turma.

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Proposta do MEM para a Implementação De Uma Pedagogia Diferenciada

No seguimento do que atrás foi dito, o Movimento da Escola Moderna propõe a implementação de um conjunto de rotinas de gestão do espaço, do tempo e da actividade, da turma na sala de aula. De uma forma esquemática, apresentamos a descrição de cada uma dessas instituições/ferramentas. A organização, a avaliação e planeamento Instituição / Ferramenta O Conselho

Descrição  instituição de regulação social da vida escolar, com o apoio cooperante do professor; por aqui passa o balanço intelectual, o progresso moral e social do grupo-turma a partir dos registos de pilotagem das acções planeadas e dos juízos fixados no Diário de Turma.

O Diário de Turma Da avaliação para a planificação:  as colunas, «Gostámos», «Não gostámos» e «Fizemos» permitem, pelo debate, uma clarificação dos valores ajustada aos acontecimentos;  a coluna «Queremos fazer» ajuda a planear as actividades futuras A avaliação cooperada

Os informantes da regulação cooperativa são:  os registos colectivos e individuais de produção mapas e planos  as comunicações várias dos alunos à turma  acompanhamento dos processos de produção  as ocorrências registadas no Diário de Turma  o debate e a reflexão em Conselho

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Do planeamento da acção à retroacção reguladora e participada

A organização e gestão dos conteúdos, dos meios didácticos dos tempos e dos espaços são o fulcro da acção pedagógica. A organização democrática A organização participada e dinamizada por processos de cooperação progressivamente reforçados, garantindo o exercício directo e continuado dos valores de evidente respeito, de autonomia e de solidariedade Os Projectos  têm origem em perguntas de Trabalho e  este tipo de trabalho é fundamental pois de Estudo pressupõe a passagem da actividade escolhida para um conjunto de actividades ordenadas para a resposta a uma questão  a necessidade de comunicar o processo e os resultados de um projecto de trabalho dá sentido imediato às aprendizagens:  «Ensinar é a melhor maneira de aprender» As interacções com as famílias e a comunidade

 dão sentido imediato às aprendizagens escolares  os alunos pedem-lhes muita colaboração para a realização dos seus projectos, quer recolhendo informações, quer convidando pessoas que sabem coisas que devem ser conhecidas por todos  a identidade cultural é trazida para a escola pelas situações vivenciadas em interacções constante com a comunidade

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O envolvimento e implicação das famílias e da comunidade são indispensáveis quer para resolver os problemas quotidianos da organização quer para ajudar a escola a cumprir o seu papel de mediador e de promotor das expressões culturais das populações que serve.

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Modelo do MEM aplicado ao 1.º Ciclo

O Modelo Pedagógico da Escola Moderna Portuguesa é um “modelo sociocêntrico cuja prática democrática da gestão de conteúdos, das actividades, dos materiais, do tempo e dos espaços se fazem em cooperação” (GraveResendes, 2002). A participação dos alunos na organização, gestão e avaliação cooperadas de toda a vida da turma, estimula a liberdade de pensamento e de expressão, permite orientar as aprendizagens consoante as capacidades e necessidades dos alunos e, ao mesmo tempo, expô-los a uma ambiente que estimula a descoberta, a resolução de problemas, o trabalho de grupo ou entre pares e o saber viver em grupo. A acção educativa decorre de um estilo de trabalho centrado nos alunos como autores dos seus percursos de aprendizagem realizados em cooperação com os colegas e com o professor, apoiado em instrumentos e técnicas que vão ao encontro das necessidades de ensino/aprendizagem de todos e de cada um dos alunos. O modelo assenta na comunicação, na cooperação e na participação democrática (Niza, 1998), operacionalizadas na expressão livre dos alunos, nas aprendizagens em interacção e no sentido social das aprendizagens. “A expressão livre pressupõe que seja criado, na sala de aula, um clima afectivo que torne possível que as falas, as produções artísticas e os escritos dos alunos sejam acolhidos, estimulados e valorizados pelos destinatários: a turma, os correspondentes, a comunidade e não só o professor” (Grave-Resendes, 2002). 79

A acção educativa do MEM pressupõe um espaço educativo organizado em função dos conceitos ensinoaprendizagem que defende e dos instrumentos que os operacionalizam. Grave-Resendes (2002) apresenta um conjunto de sugestões para quem pensa introduzir estratégias de Pedagogia Diferenciada, começando por diferenciar o espaço:         

organize a sala de aula de modo que os alunos possam realizar, em simultâneo e autonomamente, diversas actividades; ponha-lhes à disposição materiais de apoio ao trabalho autónomo; faça com eles uma visita guiada ao espaço reorganizado, apresente-lhes os materiais e informe-os acerca do seu funcionamento; analise com os seus alunos os aspectos positivos e as dificuldades que estas alterações introduzem no funcionamento da sua turma; valorize e reforce os aspectos positivos; procure com os seus alunos modos de resolver algumas dificuldades, sem recurso a castigos; registe e afixe na aula as decisões que tomaram; lembre-se de que qualquer mudança cria sempre obstáculos e de que leva algum tempo a ultrapassá-los; se partilha a sala com outro(s) colega(s), combine com ele(s) a organização do espaço, de modo a chegarem a acordo. Se este não for possível, proponha-lhe que no fim das aulas cada turma deixe a sala arrumada como a encontrou.

Para além da diferenciação do espaço (organização em áreas de trabalho onde os alunos têm à sua disposição 80

materiais de apoio às aprendizagens), o Modelo do MEM propõe a diferenciação das tarefas e responsabilidades (mapas de presenças e tarefas, biblioteca, arrumação de ficheiros, ...), diversificação de materiais de apoio (ficheiros, muitos deles auto-correctivos, guiões, biblioteca da turma, ...), instrumentos de pilotagem do trabalho (planos de trabalho semanal e diário, o mapa dos projectos, os mapas de desenvolvimento curricular, de tarefas e de presenças, a agenda semanal e o diário da turma). Planificação do Trabalho

Neste modelo, as tarefas são combinadas, distribuídas e avaliadas semanalmente, em Conselho, o que obriga muitas vezes a clarificar situações e até a fazer com os alunos uma análise de tarefas que o professor regista e expõe na aula para ajudar o desempenho dos alunos e para lhes permitir uma avaliação mais objectiva. A planificação do trabalho, pelos alunos e pelo professor, é feita semanalmente, em Conselho de Cooperação. Os planos de trabalho são instrumentos que permitem diferenciar o trabalho, o tempo, as actividades e os conteúdos programáticos. Também são instrumentos de controlo, contratos explícitos que comprometem e responsabilizam os alunos e o professor perante si e perante a turma. O plano semanal é a listagem das actividades a realizar ao longo da semana, de acordo com o desenvolvimento

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do projecto curricular da turma e das rotinas de trabalho estabelecidas e a prosseguir. O plano diário decorre do plano semanal e contém a listagem das tarefas a realizar em cada dia pelos respectivos intervenientes. Os planos são afixados na sala, como roteiros de trabalho e como instrumentos de balanço das actividades diárias e semanais. Inicialmente, o registo e o controlo são feitos pelo professor que, gradualmente, vai passando essa competência para as crianças. Ao longo da semana, há para distribuir as seguintes actividades: - apresentação das produções pessoais (ler e mostrar); - trabalho de projecto; - trabalho de estudo autónomo (TEA); - os livros e a leitura; - Língua Portuguesa / trabalho de texto; - Matemática Colectiva; - Actividades de Extensão Curricular; - Sessões Colectivas de Expressão Artística; -… No tempo para a apresentação das produções pessoais (textos livres, criações temáticas, ...), cada aluno faz a apresentação, sendo que, como não é possível todos mostrarem as suas produções, em cada dia, faz-se por ordem de inscrição. Ao longo da semana, todos terão a 82

oportunidade de fazer uma apresentação e de discutir as suas criações, de se sujeitar à apreciação dos outros e de recolher sugestões. É um momento de comunicação oral, de partilha de informação e de estratégias pessoais de aprendizagem, de auto e hetero-regulação de regras sociais de comunicação: saber ouvir, aguardar a vez de falar, não perturbar, defender as suas opiniões e respeitar as dos outros. Este momento faz interagir os conhecimentos que o aluno possui com novos conhecimentos que o grupo introduz, ou para os quais o desafia, provocando novas aprendizagens. O trabalho de projecto é uma estratégia de diferenciação dos conteúdos, das aprendizagens, das actividades e do tempo. Centra-se no trabalho dos alunos, isto é, no aprender, e não na lição do professor, isto é no ensinar. Portanto, implica o lado activo e dispensa o lado passivo do processo de aprendizagem. Os projectos decorrem dos interesses manifestados, por exemplo, um problema/questão levantado por uma criança ou por um grupo, de um acontecimento ou de uma notícia, daquilo que gostariam de saber sobre um fenómeno, etc. Há um quadro na sala – “gostava de saber” – no qual os alunos registam as suas interrogações. Nem todas as perguntas darão origem a projectos. Umas apenas apelam a uma informação do professor ou do grupo, outras dão origem a projectos, se implicarem recolha de informação, necessitar partilharem de trabalho e de responsabilidades 83

e implicarem comunicação de resultados. Organiza-se um mapa de registo dos temas dos projectos e os nomes dos participantes, as datas previstas para finalizar o trabalho, para a apresentação das comunicações e a avaliação. Para a realização dos projectos, os alunos agrupam-se segundo os interesses pelos temas, de acordo com a regra que limita o número de alunos por grupo, aprovada pela turma em função da dimensão desta. Não há grupos fixos, nem homogéneos em conhecimentos ou habilidades. O projecto passará pelas fases de identificação do problema, planificação, execução, comunicação e avaliação. O professor apoia, rotativamente, todos os grupos. O tempo de estudo autónomo (TEA) ocupa, pelo menos, uma hora diária, na agenda. Destina-se ao treino de capacidades e competências curriculares, ao estudo, à escrita de textos e a leituras à escolha dos alunos e ao apoio do professor aos alunos que manifestam dificuldades em qualquer área do currículo, sem os desintegrar dos seus companheiros nem do trabalho que se desenvolve na turma. Por acordo entre o professor e os alunos, algumas crianças dispõem de uma parte do seu tempo para ajudar um companheiro numa tarefa específica, escrever um texto ou fazer uma ficha, por exemplo. Este trabalho de cooperação, entre pares, faz parte dos seus planos individuais. O plano individual de trabalho (PIT) é um roteiro que guia o trabalho dos alunos ao longo da semana. É 84

elaborado por cada aluno no início da semana, gerido e avaliado por ele, e semanalmente, avaliado em Conselho, à Sexta-feira (auto e hetero-avaliação). O PIT é uma folha de papel onde podem distinguir-se: - espaço destinado ao nome do aluno e à semana a que diz respeito; - um espaço destinado ao registo da tarefa; - uma área que contém do lado esquerdo o elenco das actividades possíveis de realizar naquele tempo, na qual cada aluno planifica, regista e quantifica aquilo que pensa fazer ao longo da semana. - do lado direito, um espaço destinado ao registo e à quantificação das actividades efectivamente realizadas; - uma área destinada ao registo dos projectos, à composição do grupo, ao que cada um se propõe fazer e ao balanço do trabalho realizado; - uma área destinada ao registo da comunicação do projecto à turma, de outros trabalhos, ao registo do dia ou dias de trabalho com o professor durante o TEA e do apoio aos colegas; - uma área destinada à auto-avaliação e às sugestões dos colegas e do professor. Os Planos Individuais de Trabalho (PIT) organizam, apoiam e regulam o trabalho escolar do aluno, contribuindo para fazer do aluno sujeito das suas aprendizagens, assumindo a cooperação como factor de aprendizagem.

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A sua elaboração antecipa a acção do sujeito, o registo das actividades é um guia e permite o controlo do que é feito. A auto e hetero-avaliação contribuem para que os alunos se tornem mais responsáveis, mais autónomos e mais conscientes do que fizeram e do que falta fazer. O momento «os livros e a leitura» ou «hora do conto» é o tempo durante o qual as crianças apresentam aos companheiros e ao professor livros que leram na escola ou em casa. Num segundo momento, o professor lê para eles ouvirem uma história completa ou parte, um poema ou uma peça de teatro. Por vezes, escritores, jornalistas e outras pessoas ligadas ao mundo da escrita vêm à escola animar este momento. Durante o momento da «Língua Portuguesa/Trabalho de Texto»1, escreve-se e lê-se para comunicar, lê-se e escreve-se para recolher informação e aprender, lê-se para fazer qualquer coisa (experiência, um bolo, um guião), escreve-se e lê-se quando se inventam e resolvem problemas matemáticos. Fazem-se actividades de treino, utilizando suportes diversos (livros, jornais, cartazes, rótulos, etiquetas, etc.). Nas sessões de Matemática Colectiva o professor esclarece dúvidas, propõe problemas, resolvem-se problemas elaborados pelos alunos ou pelos correspondentes, introduzem-se novas noções. 1

É o momento privilegiado para enriquecer textos dos alunos, corrigindo erros, acrescentando informação e vocabulário, trabalha-se a forma e o conteúdo.

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Entende-se por «Actividades de Extensão Curricular» as saídas para visitas de estudo, para recolha de informação no âmbito de projectos através de inquéritos ou de entrevistas e também a elaboração do jornal escolar, ultimar a correspondência e preparar o seu envio. Como foi referido, aquilo que substancialmente distingue a pedagogia do MEM é o modo como se gere, organiza e avalia de forma cooperada, o trabalho, o tempo, o espaço, os conteúdos das aprendizagens e a vida social da turma.

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Grave-Resendes (2002) apresenta um esquema da organização geral do modelo pedagógico do MEM, aplicado ao 1.º ciclo, que nos permite uma visualização da forma como é organizada a dinâmica da sala de aula. Esquema da Organização Geral do Modelo Pedagógico do MEM

Organização espacial

Organização semanal do trabalho

Instr. pilotagem do trabalho

Áreas de trabalho

Registo da avaliação dos conteúdos programátic os Fichas de registo de projectos Registo de leituras Registo de produção de textos Mapa de tarefas PIT

Área da organização e pilotagem do trabalho Área da Matemática Área da Experimentaçã o em Ciências Área da Escrita e da Leitura Área da Expressão Artística

Conselho de Cooperação Apresentação de produções Planificação do trabalho Trabalho em várias modalidades (colectivo, peq. grupo, em pares, individualmente) Comunicações Actividades de Extensão Sessão Colectiva de Expressões Conselho Semanal de Cooperação

Gestão e organização da classe

Planeamento

Plano semana Plano diário Projectos Planos individuais de trabalho

Avaliação

Diária Semanal Periódica

Figura 1 – Organização Geral do Modelo do MEM Fonte: Grave-Resendes (2002), adaptado

O Conselho de Cooperação e o Diário de Turma são instituições de participação democrática directa, de organização e de regulação de toda a vida da turma. É formado pelo professor e pelos alunos. O Conselho Diário reúne diariamente para planificar e fazer o controlo do trabalho. O Conselho Semanal, reúne à Sexta-feira, para regular as relações sociais da turma, 88

avaliar as realizações dos alunos durante a semana e programar o trabalho da semana seguinte. Extraordinariamente, reúne sempre que qualquer acontecimento imprevisto necessite de resolução antes do Conselho Semanal. A gestão, planificação e avaliação cooperadas pressupõem o conhecimento daquilo que a escola exige que aprendam, para poderem direccionar o seu trabalho nesse sentido. Ninguém pode empenhar-se num trabalho se não souber o que esperam dele. A apresentação dos currículos aos alunos é feita sob a forma de Mapas de Desenvolvimento Curricular. É uma primeira abordagem, visto as crianças não terem conhecimentos que permitam uma tomada de conhecimento imediata. O Mapa de Desenvolvimento Curricular é uma tabela de dupla entrada, com os nomes dos alunos na horizontal e as rubricas curriculares na vertical. Periodicamente, registam-se, segundo um código convencionado na turma, as aprendizagens de cada aluno. O mapa também funciona como lista de verificação do que se aprendeu e do que falta aprender até à etapa seguinte ou até ao final do ano lectivo. Transportada do mapa colectivo, cada aluno tem uma grelha de auto-avaliação. Vai sendo preenchida à medida que realiza as aprendizagens, permitindo-lhe uma maior aproximação aos conteúdos programáticos e, por outro lado, uma maior mobilização para o trabalho em que sente maiores dificuldades. Estes registos individuais são trimestralmente ou mensalmente passados para o Mapa de Desenvolvimento 89

Curricular, depois de discutidos na turma. É frequente a avaliação individual não corresponder à avaliação do grupo e é necessário chegar a um consenso. Da auto e hetero-avaliação resulta uma crescente tomada de consciência daquilo que cada aluno já é capaz e daquilo que tem de trabalhar para melhorar. A avaliação tem este sentido regulador, servindo para ajudar a direccionar a aprendizagem e o ensino, no sentido de tomar decisões e de encontrar respostas para as necessidades educativas detectadas. Os vários registos apoiam, tornando a avaliação mais objectiva. No processo de avaliação, valorizam-se os progressos, critica-se, exige-se mais, dão-se sugestões e propostas, a fim de melhorar a aprendizagem do aluno. A cooperação entre o professor e os alunos contempla também a participação destes na avaliação a enviar aos encarregados de educação. Em suma, o modelo do trabalho pedagógico do Movimento da Escola Moderna desenvolve: a diferenciação das actividades e das modalidades de realização (as crianças realizam, simultaneamente, actividades diversificadas: individualmente, a pares, em pequenos grupos e em colectivo); a diferenciação do trabalho e dos conteúdos programáticos/curriculares (planos de trabalho semanais e diários, negociados em Conselho de Cooperação, Trabalho de Estudo Autónomo e trabalho em projectos, Língua Portuguesa/Trabalho de Texto e Matemática); a diferenciação das estratégias de ensino-aprendizagem (trabalho em projectos, estudo 90

autónomo, ensino interactivo de apoio individual, trabalho a pares, em pequenos grupos e em colectivo). Toda a organização tem em conta a diferença interindividual e o respeito pela individualidade de cada aluno, com vista a uma verdadeira escola para todos, de sucesso escolar e pessoal de todos e cada um dos alunos.

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Experiências decorrentes de Ciclos de Estudos

No ano lectivo 1994/1995, com o apoio institucional de uma equipa do Instituto de Invocação Educacional, decorreu um Ciclo de Estudos com professores dos três ciclos do Ensino Básico, subordinado à temática da Pedagogia Diferenciada. Das experiências e reflexões desse Ciclo de Estudos resultou um livro editado pelo Instituto de Inovação Educação, integrado na colecção “Desenvolvimento Curricular na Educação Básica” e cujo título é, justamente, “Pedagogia Diferenciada no Ensino Básico: Alguns Itinerários” (Cadima et al., 1997). Na primeira fase (1.º período) – planeamento e preparação da intervenção –, foram abordados os aspectos fundamentais da Pedagogia Diferenciada e a preparação de uma nova organização pedagógica, no tocante ao tempo, espaço e materiais. As novas estratégias exigiam, ainda, materiais diversificados, tanto nos conteúdos como ao nível do grau de dificuldade, de forma a viabilizarem o trabalho autónomo dos alunos. Foi durante esta primeira fase que os professores conceberam estes materiais. Na segunda fase (2.º e 3 .º períodos) – implementação e desenvolvimento –, os professores apresentaram as propostas aos alunos e a forma de implementar um tempo de estudo autónomo, durante o qual poderiam estudar de acordo com as necessidades individuais.

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O conjunto de professores participantes, decidiu dedicar um terço do tempo lectivo a estas actividades. “Os alunos deveriam organizar o seu trabalho de estudo e treino, orientado por um plano individual de trabalho a elaborar mensalmente. Os alunos, ao preencherem o plano, estabeleciam um contrato, assumindo o compromisso de realizar individualmente, em pares ou com o apoio do professor, algumas das actividades sugeridas, como por exemplo: leituras complementares, fichas de treino sobre diferentes conteúdos do programa, fichas auto-correctivas, trabalhos de recolha, etc.” (Cadima, 1997). O professor poderia apoiar individualmente alunos identificados com mais dificuldades, enquanto os alunos trabalham autonomamente no seu plano. Este apoio também era acordado previamente entre o professor e os alunos, no seguimento de solicitação por parte destes ou por proposta do professor inscrita antecipadamente no plano. Em relação aos materiais de apoio, que foram construídos de montagens e adaptações de material, a partir de manuais e de ficheiros disponíveis. Os materiais produzidos podem categorizar-se em quatro tipos: - lista de verificação e planeamento: lista feita a partir de uma transcrição dos conteúdos do programa numa linguagem acessível aos alunos. Esta listagem permite a tomada de consciência do trabalho a desenvolver e facilita a planificação e a avaliação individual.

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- matriz de planificação ou plano individual de trabalho: em função das necessidades sentidas, esta matriz foi adaptada ao longo do ano. Dela consta a lista de actividades que podem ser realizadas (leituras complementares, resumos, relatórios, resolução de fichas, etc.) e espaço para o registo do trabalho que vai sendo realizado, individualmente, a pares ou com o professore. Sobre a designação «sugestões do professor» surge ainda espaço para o professor dar orientações para os futuros planos. No final, há espaço para a auto-avaliação e para a avaliação do professor. No fim de cada ciclo, a turma reflecte sobre os planos de trabalho e planeia novo ciclo de actividades. - mapa de registo de actividades: junto cada instrumento de trabalho existe um mapa de registo que possibilita o controlo do trabalho realizado pelos alunos. - ficheiros de trabalho: são aqui incluídos todos os materiais de estudo, treino e aprofundamento, sobre os diversos conteúdos, organizados por temáticas, tipos de actividades e grau de dificuldades, de forma a permitir um trabalho verdadeiramente autónomo, por parte dos alunos, na execução do seu plano. Dos relatos das experiências realizadas, enquadradas no âmbito do Ciclo de Estudos, há referências comuns aos diversos níveis (1.º, 2.º e 3.º Ciclos) e às diversas áreas curriculares (no caso dos 2.º e 3.º ciclos, Língua Portuguesa, Matemática e Ciências da Natureza. Uma das questões emergentes tem a ver com o espaço. Há necessidade de uma consciencialização da 94

importância da adaptabilidade face ao tipo de actividades (trabalhos de grupo, assembleia de turma, trabalho individual) e, por outro lado, uma disposição dos materiais pedagógicos de acordo com a temática ou função. “É importante colocar os materiais em sítios estratégicos, ou seja, com áreas específicas para certas actividades (…). As paredes são um espaço útil de grande potencialidade: é aí que se colocam quadros com a distribuição de tarefas, a planificação, o registo de observações ou de produção, para além de trabalhos dos alunos” (Gregório, 1997). Sugere-se, para facilitar esta adaptabilidade do espaço, é importante criar e distribuir tarefas entre os alunos, de forma a envolvê-los e responsabilizá-los por determinadas tarefas de gestão do espaço (distribuição, arrumação e verificação do material, a limpeza do material, o registo diário do tempo, etc.). Para a introdução da Matriz de Planificação ou Plano Individual de Trabalho, é descrito todo um processo (Gregório, 1997) que vai da planificação em colectivo, pela professora até passar a ser uma tarefa individual. Um período que durar uns meses e durante o qual os alunos vão tomando consciência do funcionamento deste instrumento condutor e organizador do trabalho e das suas potencialidades. O plano, inicialmente é diário. Mais tarde, passa a ser semanal. O aluno nele indica o que quer fazer e, no final do tempo previsto, assinala as actividades que realizou. 95

Do plano constam as actividades que o aluno escolhe as que a professora sugere. Uma outra estratégia introduzida é o tempo de trabalho de projecto, uma modalidade de trabalho autónomo, realizável individualmente, a pares ou em grupo, praticamente sem a intervenção directa do professor. Os projectos decorrem de motivações diversas: projectos que decorrem de uma pergunta ou projectos temáticos. Nas salas de aula, foram colocados armários com os materiais necessários ao trabalho dos alunos: ficheiros, livros de consulta. Foi, também, rentabilizadas as paredes e placardes para a afixação de materiais e trabalhos. Uma das iniciais dificuldades da implementação desta experiência de Pedagogia Diferenciada, assente num período de estudo autónomo, prende-se com inexistência de recursos (ficheiros) em número suficiente. Um segundo problema, apontado pelas professoras intervenientes, foi o tempo dispendido trabalho autónomo, face à progressão nos conteúdos, utilizando métodos diversificados (aulas experimentais, visitas de estudo, trabalhos de grupo, etc.). Este problema “deve-se, porventura, ao facto de ser um «dado adquirido» (possivelmente incorrecto do ponto de vista pedagógico) que a progressão nos conteúdos é muito importante e se faz por aquilo que o professor programa e executa na sala de aula, mesmo verificando que alguns alunos não

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adquiriram esses conteúdos que foram sumariados” (Ortega, C., Pires, T., 1997). O modelo que se ensaiou aplicar, é em parte semelhante e talvez inspirado no Modelo do Movimento da Escola Moderna, embora tal não seja claramente assumido. Contudo, a perspectiva que está por detrás da importância de implementar um Plano Individual de Trabalho e a criação de condições para um tempo de Estudo Autónomo, vem na linha do preconizado pelo M.E.M.

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Investigação-acção sobre a Prevenção das Desigualdades (Grupo Rapsodie)

O Grupo Rapsodie realizou, em Genebra, uma investigação-acção, que rotularam com o propósito de “prevenir as desigualdades escolares através de uma Pedagogia Diferenciada” (Allal, 1986). Na realização desse trabalho pretendiam alcançar os seguintes objectivos: - melhor compreender as causas do insucesso e das desigualdades do sucesso no Ensino Primário resultantes do insuficiente ou inadequado papel atribuído às diferenças de toda a ordem entre as crianças; - desenvolver uma pedagogia mais diferenciada, já defendida com veemência por Claparède, no início do século, mas também preocupada em respeitar a identidade pessoal e cultural de cada um, de reconhecer na escola o direito à diferença. Rapsodie baseia-se na ideia de que a desigualdade das aquisições escolares não é uma fatalidade, mas resulta de um ensino pouco diferenciado, pouco sensível à diversidade das crianças da mesma idade e que não dispõe dos meios e dos métodos que permitam ajustar a acção pedagógica aos interesses, ao ritmo e ao desenvolvimento de cada um. Para isso, visa explorar concretamente as condições susceptíveis de conduzir um grupo de alunos ao domínio tanto quanto possível igual, no final de um ciclo primário, do conjunto de saberes, códigos, noções, 98

esquemas de raciocínio, métodos de trabalho, capacidades de comunicação, saber-fazer, etc. No projecto Rapsodie, os alunos não são agrupados em classes de 25 alunos, cada uma delas confiada a um único professor. Reúne o equivalente a 2 classes convencionais numa única unidade pedagógica de uma equipa educativa formada por três professores. Sem ser a única medianeira duma Pedagogia Diferenciada, a avaliação formativa é, no entanto, a sua pedra angular (não limitando a ideia a um emprego de provas de referência criterial). Para Rapsodie será formativa qualquer observação, qualquer avaliação que contribua para a regulação da acção pedagógica no sentido do seu ajustamento às características pessoais e culturais das crianças. Há uma reflexão importante, ao debruçar-se neste projecto Rapsodie: não é porque a escola trata as crianças de forma particular que as crianças das classes populares têm geralmente menos sucesso, mas sim porque a escola trata, como iguais em direitos e em deveres alunos que na realidade são muito diferentes. Essas diferenças entre as crianças com a mesma idade escolar, sujeitas a um mesmo programa, partem do seu nível de desenvolvimento intelectual, as suas experiências anteriores, o seu capital cultural e linguístico, a sua atitude face à escola, etc.. Tais diferenças devem-se designadamente à diversidade das condições sociais, mas também a muitos outros factores. É necessário intervir, segundo as sugestões Rapsodie, no aumento da capacidade geral da escola para 99

reconhecer as diferenças entre as crianças e consequentemente diferenciar a acção pedagógica (Allal, 1986). Como métodos de diferenciação da acção pedagógica apontam os ateliers, trabalhos em pequenos grupos, autoaprendizagem, auto-avaliação, o ter em conta a distância cultural entre professores e alunos, etc.. Segundo esta concepção, o Ensino Básico deveria fazer com que todas as crianças beneficiassem duma formação de base equivalente: o domínio de instrumentos fundamentais de pensamento, de expressão; domínio de códigos de comunicação, nos conhecimentos e saber fazer de base, nos métodos de trabalho e de aprendizagem, nas disposições para a criatividade, a autonomia, a cooperação, etc., independentemente de “dons”, origem social, sexo, etc. O grupo Rapsodie aponta o dedo: no momento em que ensina, a escola tem pouco em conta as diferenças, ao contrário, multiplica as ocasiões de sancionar as diferenças de sucesso escolar, através de uma avaliação normativa e comparativa omnipresentes. Recorda, ainda, o efeito de Pigmalião manifesto na interacção selectiva com as crianças mais “gratificantes”, a partir do índice de pertença social e ou excelência escolar, desigualdade perante a avaliação. As crianças das classes superior e média-superior encontram na escola uma cultura muito próxima da cultura do seu meio de origem. Contrariamente, as crianças das classes populares devem sujeitar-se para se adaptarem às normas escolares. 100

Não se pretende, com a Pedagogia Diferenciada, instaurar, ao longo do Ensino Básico, uma via rápida e uma via lenta.  

É necessário que se conceba a Pedagogia Diferenciada: como essencialmente integrada na vida colectiva dos professores e dos alunos; como meio por excelência para evitar transformar as diferenças entre indivíduos em desigualdades escolares (Perrenoud, 1997).

A Pedagogia Diferenciada, tal como foi concebida no quadro de Rapsodie, supõe que a ser regra, que seja contínua e integrada, e torne inútil uma intervenção correctiva externa, para que se evitem acumulações de atrasos, bloqueios ou desencorajamentos. Diferenciar o ensino é, também, fornecer ao aluno possibilidade de escolha na sua forma de elaborar o saber. Partindo-se da sua própria vivência, apoiando-se num ambiente conhecido. Assim, aprenderá a aprender. O direito à diferença implica o recurso a uma teoria operatória da aprendizagem, contrapondo-se à teoria empirista ou behaviorista que pressupõe que o conhecimento vem do exterior e que basta prever as boas sequências da aprendizagem, o que significaria no meio sociocultural outra influência que não fosse a temporal, a teoria operatória apoia-se na noção de interacção entre o sujeito e o objecto. Como já o referimos de formas diversas, a aprendizagem é sempre o produto de uma actividade 101

pessoal do aluno, duma auto-organização da sua experiência. O papel fundamental do professor consiste, principalmente, em introduzir no ambiente dos alunos os elementos, os conhecimentos, os objectos, os símbolos. A situação de aprendizagem aposta na interacção entre alunos diferentes, para aumentar a probabilidade de aparição dos conflitos ao nível da experiência vivida, favorecer a consciencialização, suscitar as diligências para ultrapassar as dificuldades, motivar aprendizagens específicas sistemáticas. Para esse efeito, necessitam-se instrumentos de avaliação individualizados que permitam uma avaliação de diagnóstico que não vise classificar os alunos uns em relação aos outros, mas sim conduzir cada um a uma escolha das situações de aprendizagem susceptíveis de o fazer progredir. “A avaliação formativa é para uma regulação da aprendizagem e não de sanção das aquisições” (Coudinet, 1977 citado por Allal, 1986). Distinga-se esta função de regulação, fundamental numa Pedagogia Diferenciada, da função de selecção que a avaliação cumpre muitas vezes, designadamente através de notas. A avaliação-regulação, feita pelo professor ou ainda melhor e sempre que possível, a auto-avaliação, é indispensável para o desenvolvimento harmonioso das aprendizagens. Acrescente-se, ainda, que a formação duma capacidade de auto-avaliação constitui uma condição necessária para um trabalho autónomo, em que o aluno pode, por si, reorganizar o seu horário, diversificar as suas fontes, 102

renovar as suas estratégias de aprendizagem a partir da constatação de um fracasso relativo. A avaliação incide sempre, em parte, sobre aquisições, sobre o resultado de aprendizagens anteriores, sobre o grau de mestria. Mas deveria dar igual importância às formas de aprendizagem, às aprendizagens do aluno face aos novos problemas, ao funcionamento da interacção educativa, aos problemas de comunicação, de representação dos objectivos de formação, aos bloqueios afectivos, ao grupo, à relação com os professores, etc.. É preciso captar os mecanismos responsáveis pelas lacunas, pelos atrasos de um aluno num domínio específico. Muitas vezes estes mecanismos estão relacionados com a diferença cultural entre a criança e a escola, mas podem ser de ordem cognitiva, sócio-afectiva, relacional. Para os captar e neutralizar, é preciso obrigatoriamente alargar a noção de avaliação à noção de observação, de conhecimento do meio familiar e da personalidade do aluno. Para além da questão da avaliação, para tornar possível uma Pedagogia Diferenciada sensível às diferenças socioculturais, são necessários meios de ensino diversificados. Tais recursos implicam uma abordagem interdisciplinar, concluiu o grupo Rapsodie (ALLAL et al., 1978).

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Organização do ensino

As possibilidades de agrupamento das crianças são múltiplas (ALLAL et al., 1978): 

   

a natureza da aprendizagem visada: uma investigação a partir duma situação de matemática, por exemplo, implica a formação de um grupo à altura da tarefa e que dure bastante para a levar a bom termo; as dificuldades específicas de algumas crianças neste ou naquele aspecto que podem conduzir a agrupá-las temporariamente; as preferências das crianças, as suas afinidades mútuas e com os próprios professores; a necessidade das crianças se identificarem com um grupo estável, de partilharem com outras crianças uma vivência suficientemente rica; a colaboração com professores especializados. A Vida Colectiva e Aprendizagem Cooperativa

Na dinâmica da aprendizagem, os factores cognitivos e afectivos estão em constante interacção. As actividades colectivas e de trabalhos em grupo são, por isso, muito importantes. Elas desenvolvem, na criança:   

a consciência da pertença a um grupo; o reconhecimento de um certo número de regras de funcionamento escolhidas pelo grupo e não impostas pelo exterior; o domínio de um funcionamento de acordo com o esquema seguinte: proposta – discussão – decisão – aplicação – crítica – nova proposta - etc.;

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A aprendizagem cooperativa promove a autoaprendizagem, tornando o aluno autor do processo de crescimento intelectual e sócio-afectivo. Não rejeitando o trabalho individual, o processo e o produto do trabalho de grupo, considerando que cada um sabe que pode contar com o(s) outro(s), é de valorizar. São cinco os grandes princípios da escola cooperativa:     

interdependência positiva; entreajuda; responsabilidade individual; desenvolvimento das capacidades de relações interpessoais (liderança, decisão, autoconfiança, comunicação e gestão de conflitos); partilha do trabalho em grupo (a tarefa atribuída a cada um é imprescindível para o produto final do grupo).

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A Turma da Professora Anabela Experiência no 1.º Ciclo

A turma observada e da qual aqui vamos transcrever vivência, é composta por vinte alunos, com idades compreendidas entre os 8 e os 14 anos, dos quais onze são raparigas e nove são rapazes, todos inscritos no 4.º ano do Ensino Básico. É uma turma naturalmente heterogénea, no que concerne ao nível sócio-económico, ao tipo de estrutura familiar, às aprendizagens prévias e até ao percurso escolar, dos interesses às dificuldades. Associada a esta heterogeneidade existente em qualquer grupo, a turma observada inclui uma criança invisual (que acompanha as aprendizagens do grande grupo), quatro crianças amblíopes (duas das quais com deficiência mental associada, que efectuam aprendizagens a um nível mais elementar do que o grande grupo) e uma criança com dislexia. Todos estes motivos são mais do que suficientes para enfatizar a necessidade de diferenciar. Como dissemos anteriormente, a Pedagogia Diferenciada é o procedimento que procura empregar um conjunto diversificado de meios e de processos de ensino e de aprendizagem, a fim de permitir a alunos de idades, de aptidões, de comportamentos, de savoir-faire heterogéneos, mas agrupados na mesma turma, atingir, por vias diferentes, objectivos comuns (Gomes, 2001).

É nesta perspectiva e no quadro desta turma que vamos apresentar a implementação de medidas que respondam à diversidade, valorizando e rentabilizando a diferença,

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procurando que alunos diferentes atinjam competências comuns. A professora identifica-se com o Modelo da Escola Moderna, embora não seja associada e não frequente com regularidade as actividades do Movimento. Põe de parte a possibilidade de ser radical em qualquer dimensão, colocando-se perante as questões pedagógicas como reflexiva e aberta a experimentar e alterar as estratégias, sempre que necessário. Organização do Trabalho A Gestão Pedagógica Cooperada

O pilar central da diferenciação é a gestão cooperada do tempo, de modo a permitir que os alunos possam realizar diversas actividades, de modo organizado e regulado, em simultâneo. Para tal, é determinante a explicitação da agenda semanal, permitindo que o trabalho seja controlado pelo aluno e pelo professor. A Agenda Semanal

Nesta turma, a agenda semanal está exposta na sala de aula, além de ter sido fornecida a todos os alunos. As actividades são planificadas semanalmente de acordo com esta agenda, que “embora não seja uma “bíblia” a seguir, é um guia importante do trabalho”, distribuindo as horas lectivas pelas várias áreas/actividades. A agenda semanal é a seguinte:

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Figura 2 – Agenda Semanal.

Como explica a professora, “a implementação da agenda semanal não foi imediata; a agenda foi sendo construída durante as primeiras semanas de aula cooperativamente, através das sugestões de todos, em função do ritmo de trabalho dos alunos, que varia de acordo com a área”. Um exemplo deste processo foi a inclusão de um tempo para “jogos”, no seguimento de um momento em que a professora promoveu um jogo de perguntas, a que os alunos aderiram entusiasticamente, sugerindo que se repetisse todas as semanas. Desde a primeira versão, já houve a necessidade de alterar a agenda semanal por algumas vezes, de modo a 108

ajustá-la à realidade: “a agenda deve servir-nos e ser adaptada à realidade. Só dessa forma faz sentido existir”, conclui a professora. A agenda semanal inclui várias outras actividades, algumas das quais serão descritas adiante. O Conselho de Cooperação e o Diário de Turma

Um dos momentos centrais da agenda semanal é o conselho de cooperação. Este, ocupando o final das sextas-feiras, é o momento onde se avalia toda a semana – o trabalho desenvolvido, as atitudes, etc. Como refere a professora, “quem vir estas crianças durante o conselho de cooperação, pensará que têm mais idade do que efectivamente têm. A forma organizada como participam, as opiniões argumentadas que expõem, o modo sério e eficaz como os presidentes dirigem o conselho… Considero que isto é que é educar para a cidadania”. O presidente e o vice-presidente têm a função de gerir o conselho, dando a palavra aos intervenientes e fazendo a acta (ver Figura 3 – Exemplo de Acta do Conselho de Cooperação). No entanto, nem sempre foi assim: “nos primeiros conselhos, era eu quem geria as intervenções. Pouco a pouco, fui passando essa função aos alunos, tendo o cuidado de começar por aqueles que têm já desenvolvido algum espírito de liderança”.

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Figura 3 – Exemplo de Acta do Conselho de Cooperação

Neste momento, já qualquer aluno é capaz de gerir o conselho e, como explica a professora, fazem-no de forma muito curiosa: “inicialmente, procuravam imitarme, repetiam as expressões que eu utilizava… era modelagem pura. Agora, há crianças que já têm a sua própria forma de gerir, já evoluíram nesse aspecto, já fogem ao esquema que eu inicialmente imprimi”. A par do desenvolvimento destas competências, o conselho de cooperação tem uma função muito prática, que é regular a vida da turma. Além da avaliação cooperativa das actividades desenvolvidas ao longo da semana, permite planificar as linhas gerais da semana seguinte, em conjunto com os alunos. Quanto àquilo que planifica em conjunto com os alunos, a professora refere que há questões que estão decididas desde o início do ano ou do período, como a apresentação de alguns temas por parte dos alunos 110

(trabalhos de projecto ou pequenos temas preparados com as famílias), cuja data da apresentação é confirmada no conselho. Muitas vezes, é a própria professora que sugere aspectos a trabalhar, decorrentes da vida da própria turma: “quando verifico que há erros ortográficos ou dificuldades num determinado tipo de operações, mais ou menos generalizados, falo com eles a esse respeito e procuro combinar sessões colectivas para ultrapassar estas questões. Também é no conselho que são decididos os textos a trabalhar na semana seguinte, por sugestão dos próprios autores ou minha”, explica. Há ainda espaço para decidir de que forma serão esclarecidas dúvidas colocadas pelos alunos, expressas no diário de turma. No entanto, a professora destaca a importância da sua própria planificação: “Eu levo já a minha própria ideia daquilo que iremos trabalhar, na sequência dos assuntos abordados na semana anterior, formal e informalmente. Faltaria à verdade se dissesse que tudo é significativo e decidido pelos meninos – nem sempre pode ser desse modo. Faço individualmente a planificação anual e trimestral, pois só assim posso regular o meu próprio trabalho. Planificar cooperativamente, no meu entender, não significa demitir-me das minhas funções de decisora e gestora do currículo dos meus alunos. Simplesmente, há áreas em que existe maleabilidade suficiente para programar em conjunto com as crianças, como por exemplo os conteúdos de Estudo do Meio”, explicita. De acordo com a professora, o momento que mais interessa aos alunos, no conselho de cooperação, é a discussão do diário de turma (ver Figura 4 – Exemplo de 111

Diário de Turma). Este é composto por quatro folhas disponíveis num placard da sala de aula, com os seguintes títulos: gostei, não gostei, sugiro e recados. Os alunos podem, livremente, escrever no diário de turma ao longo da semana, sabendo que tudo o que escreverem será lido, comentado e decidido no conselho de cooperação.

Figura 4 – Exemplo de Diário de Turma

A professora refere que “a leitura do gostei é a menos polémica, pois geralmente os alunos escrevem lá aspectos divertidos da semana, que acabam por ser mais ou menos comuns a todos”. No entanto, é na discussão do sugiro e especialmente do não gostei que se ocupa mais tempo, pois é neste último que são discutidos os conflitos gerados e, no outro, que se combinam alterações à rotina da sala de aula – à agenda semanal, às tarefas, etc. “A resolução de conflitos, para mim, é o mais complexo. Em casa, quem resolve os conflitos são geralmente os pais, tendo as 112

crianças uma atitude passiva. Eu própria não tive treino deste tipo de competências na escola, com a idade deles, por isso às vezes receio não gerir este momento da melhor forma”, confessa a professora. “No entanto, procuro sempre que prevaleça o bom-senso. Deixo que os alunos discutam entre si a situação, que tentem resolvêla, e só intervenho se considero estar a ocorrer alguma injustiça. Tento passar-lhes a ideia de que o conselho não é nenhum tribunal, mas uma forma de resolução pacífica dos conflitos, uma oportunidade para se corrigirem fraternalmente, para pedirem desculpas e ultrapassarem a situação”. Mas e os castigos? “Esses só surgem em situações graves, como a violência verbal ou física, ou recorrentes, como nunca cumprir alguma regra da sala de aula – também essas decididas em conselho de cooperação. São feitas várias sugestões de “castigos” e são votadas, mas aqui procuro intervir activamente, conduzindo os alunos a uma decisão correctiva e não punitiva”, fugindo aos efeitos retroactivos, de modo a evitar que a situação se repita. Como explica a professora, “procuro sempre que as decisões tomadas sejam do tipo «da próxima vez que alguém fizer isto, terá que…»”. Planificação e Avaliação Diárias

O carácter avaliador e planificador dos conselhos de cooperação são retomados diariamente, com o plano do dia e a reflexão diária. “No plano do dia, no início de cada manhã, clarifico com os alunos o trabalho que será desenvolvido. Na reflexão diária, minutos antes se 113

sairmos, avaliamos o plano do dia e preenchemos a grelha das atitudes ou comportamentos (ver Figura 5 – Grelha de Registo dos Comportamentos/Atitudes) onde, através de um código de cores, cada aluno auto-avalia o seu empenho nas actividades e o cumprimento das regras”.

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Figura 5 – Grelha de Registo dos Comportamentos/Atitudes

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Diversificar as Sessões Colectivas

Outro aspecto que ocupa algum tempo na agenda semanal são as sessões colectivas. Como refere a professora, “é sempre necessário haver momentos em que são expostos conteúdos, em que o trabalho é comum a todos”. Sessões Geridas pelos Alunos

Esses momentos podem ser de vários tipos. Tal como já foi referido, há temas que são apresentados pelos alunos: “Pode ser um tema com pouca informação, que um aluno trabalhe com a família em casa e que depois exponha aos colegas”, refere a professora. Exemplos disto são alguns episódios da História de Portugal, “como o episódio de Inês de Castro ou da Padeira de Aljubarrota, cuja apresentação foi logo inicialmente delegada nos alunos. E de cada vez que surge uma apresentação destas, a atenção dos alunos fica no auge. Pelos comentários que fazem, e pelas questões que levantam, mostram que conseguem associar causas e consequências, factos com factos…”. Outro modo de sessão colectiva, também liderado pelos alunos, é a apresentação de trabalhos de projecto. Estes diferem dos anteriores por serem efectuados na sala de aula, geralmente em pequenos grupos, de implicarem planificação, pesquisa, selecção de informação, discussão de ideias, tomadas de decisão. Como refere a professora, “se fôssemos enumerar todas as competências que os alunos desenvolvem durante a realização dos trabalhos de projecto, ficaríamos aqui toda a tarde. Basta pegar no 116

Currículo Nacional, ler as competências essenciais que lá são enumeradas, e o trabalho de projecto surge em todas, sem excepção”. Mas sobre as características deste tipo de trabalho falaremos mais adiante. O que importa agora destacar é o carácter comunicativo do trabalho de projecto (ver Figura 6 - Exemplo de Cartazes de Apresentação de Trabalhos de Projecto e Figura 7 – Exemplo de Cartazes de Apresentação de Trabalhos de Projecto): “se eles fizessem aquele trabalho só para eu ver, penso que não despenderiam nem metade das energias. Porém, eles sabem que aquele trabalho é para os colegas, para os outros aprenderem como eles… Naquele momento, são eles os professores, e isso dá-lhes um prazer e, em simultâneo, um sentido de responsabilidade que funciona como motor de todo o processo. É a comunicação que dá sentido a todo o projecto”.

Figura 6 - Exemplo de Cartazes de Apresentação de Trabalhos de Projecto

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Figura 7 – Exemplo de Cartazes de Apresentação de Trabalhos de Projecto

No momento da apresentação de cada projecto (ver Figura 8 e Figura 9 – Apresentações de Trabalhos de Projecto), a turma convida os familiares dos “apresentadores” a assistir, o que traz consigo algum nervosismo: “Como alguns dizem, só de pensar que os pais e os irmãos vão ver, ficam logo a tremer”. Porém, esta experiência tem sido gratificante para alunos e famílias: “após a apresentação oral dos projectos, quando os meninos mostram as cartolinas ou os livros com o produto escrito do seu trabalho, gostam de chamar os pais e mostram-lhes detalhadamente o que fizeram (…) e alguns até pedem para irem apresentar o projecto à turma do irmão ou do primo, que também anda lá na escola”.

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Figura 8 e Figura 9 – Apresentações de trabalhos de projecto

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E os pais, como reagem? “Agradecem sempre e muitos ficam com uma lagriminha ao canto do olho. Para eles, é um orgulho verem os seus filhos num papel que foi durante séculos só dos adultos, o papel de ensinar, de transmitir conhecimento, de liderar, de gerir intervenções, de tirar dúvidas... Eu penso que já está na hora de abrir a escola aos pais, especialmente quando o nosso trabalho é deste tipo. Alguns pais desconfiam, pois quase todos tiveram um ensino centrado no professor, onde o aluno é passivo… se lhes mostrarmos as potencialidades de colocar o ensino e as decisões também nas mãos das crianças, se lhes dermos a oportunidade de compreenderem o que se passa na nossa sala, deixá-losemos mais seguros e, com toda a certeza, ganharemos um aliado”. Há ainda outras sessões colectivas onde a gestão do momento não cabe ao professor: “quando convidamos algum familiar ou alguém de fora para nos falar de algum tema. Por exemplo: já tivemos uma mãe, que é professora de Educação Musical, a dinamizar alguns momentos na nossa sala; estamos agora a preparar a visita de uma escritora, autora de um livro que temos vindo a trabalhar”. Desta forma, a escola enriquece-se, pois bebe da sabedoria de toda a comunidade. Sessões Geridas pelo Professor

Porém, muitas são também as sessões colectivas lideradas pela professora. Como esta refere, “é preciso, com alguma frequência, falar para toda a turma, introduzir novos conceitos, sistematizar, fazer revisões… 120

Não tenho qualquer tipo de preconceito em admitir que, muitas vezes, sou eu quem gere o trabalho, quem expõe os conteúdos. E também confesso que faço algumas cedências àquilo que “é costume” fazer-se, como ensinar a História de Portugal no 4.ºano (embora o Currículo Nacional preveja apenas conhecer factos históricos sobre o meio envolvente). No entanto, não considero que isso faça de mim uma professora tradicional, ou seja, não acho que centralize em mim o trabalho da sala de aula. Há muitas formas de fazer sessões colectivas e, para mim, isso é que é diversificar o trabalho. Tanto posso ser eu a dirigir a aula como um aluno, tanto podemos estar todos a fazer o mesmo como cada um a trabalhar uma área e um nível diferentes”, explica. Os momentos colectivos geridos pela professora, nomeadamente os de introdução de novos conteúdos, podem ser de vários tipos: “Há momentos em que exponho um conteúdo mais teórico, de um modo mais tradicional e, em seguida, escreve-se um resumo no caderno, em colectivo, com o contributo de todos. Noutros momentos, mesmo que seja eu a gerir, dou muito mais espaço à participação de todos, dou-lhes pistas para que cheguem a um conceito, a uma conclusão…”. Muitas vezes, estes momentos prosseguem com exercícios: “na Matemática, após a introdução de um novo conteúdo, promovo sempre a resolução de situações problemáticas; no Estudo do Meio, coloco questões com vários tipos e níveis de dificuldade, desde o simples “verdadeiro ou falso” a “que condições são necessárias para…” ou até

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pedir a sua opinião a respeito de determinado facto ou acontecimento”, explica. Quanto à Língua Portuguesa, quando trabalhada em grande grupo, é abordada fundamentalmente a partir do enriquecimento de textos dos próprios alunos. Como a professora refere, “o trabalho de texto permite-nos fazer tudo: trabalhar a estrutura e a organização textuais, os vários aspectos do funcionamento da língua, o enriquecimento de vocabulário… Tudo o que se refere à escrita pode ser trabalhado a partir daqui”. Quando os momentos colectivos são de sistematização, existem várias alternativas possíveis: “é nestes momentos que utilizo os manuais. Sinceramente, não vejo qualquer interesse neles mas, uma vez que os pais já os tinham adquirido quando me foi distribuída a turma, trabalho com eles sem ansiedade ou desespero. Não os vejo como um apoio ao meu trabalho e, muito menos, à aprendizagem das crianças mas, enquanto compilação de exercícios, acabam por ser úteis em alguns momentos”, explica. Porém, na maioria das vezes, procura que a sistematização seja feita de modo diversificado, para que todos os alunos tenham oportunidade de realmente aprender (no sentido efectivo da palavra, não nos estamos apenas a referir a memorizar). Por vezes, promove jogos, lançando questões aos alunos, abordando a mesma temática de várias perspectivas, dando oportunidade a todos de participarem. Outras vezes, convida os alunos a “criarem eles próprios as questões para colocarem aos colegas” ou a “inventarem situações 122

problemáticas que abordem aquele e outros temas”. Deste modo, não há temas trabalhados numa dada altura e que não são retomados: “embora a avaliação seja muito mais do que isso, todos os trimestres faço fichas de avaliação e nelas coloco sem medo tudo o que foi trabalhado até então, pois estamos constantemente a retomar e relacionar conhecimentos”. Quanto às Expressões, nem todas são da sua responsabilidade directa: “existem professores de Expressão Musical e de Expressão Físico-Motora. No entanto, não me demito de os acompanhar nessas áreas e, com alguma frequência, participo nas aulas que têm com os outros professores ou trabalho essas áreas com eles, quando vem a propósito de alguma outra área curricular”. Quanto às Expressões Plástica e Dramática, refere que “não há um momento destinado para essas áreas na agenda semanal, pois são trabalhadas geralmente em simultâneo com as outras áreas, como complemento. Porém, quando surgem algumas festividades, como o Natal ou o Dia da Árvore, dedicamos várias horas a estas áreas, a preparar apresentações dos mais variados tipos. São aspectos da cultura de 1.ºCiclo que considero ser importante manter, pois também fazem parte das expectativas da comunidade escolar e são boas oportunidades para experimentar novas técnicas” (ver Figura 10 – Sessão colectiva de Expressão Plástica). Quando questionada sobre o espaço para a criação artística livre, a professora refere que “no tempo de estudo autónomo, têm essa oportunidade. Há vários materiais disponíveis na sala e muitas vezes criam 123

trabalhos bastante interessantes. Há um colega que frequenta um curso de Artes Plásticas a quem pedem frequentemente auxílio e opiniões”.

Figura 10 – Sessão colectiva de Expressão Plástica, aproveitando o espaço ao ar livre da escola.

Actividades Privilegiadas de Pedagogia Diferenciada

Este aspecto cooperativo da aprendizagem tem bastante espaço na sala de aula desta professora. Em vários momentos, os alunos são convidados a trabalhar em conjunto, a enriquecer-se mutuamente. Além das sessões colectivas, já referidas, há vários outros momentos onde tal acontece.

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Os Trabalhos de Projecto

Uma actividade que permite essa cooperação é o trabalho de projecto. Como refere a professora, o trabalho de projecto é muito diferente de um simples trabalho de grupo, exige dos alunos e do professor mais esforço e preserverança, uma “atitude permanente de investigação” que só é possível se os envolvidos estiverem “motivados, se sentirem que aquilo lhes pertence, que faz sentido”. Desta forma, além de desafiante para os alunos, também o é para o professor, que só pode gerir um trabalho de projecto se realmente acreditar no que está a promover, se acompanhar o processo desde o início, “sem queimar etapas”. A primeira dessas etapas é a escolha dos temas a trabalhar: “inicialmente, fizemos um projecto comum a toda a turma, que foi a criação de uma rede de correspondência com ex-colegas e com dois antigos professores da turma. Para eles foi altamente motivante fazer este projecto, pois ainda foi no início do ano e ainda estavam cheios de saudades dos seus amigos do ano passado”. No entanto, rapidamente se passou para os projectos em pequenos grupos, com temas diferenciados. “A escolha dos temas tem que ser bem cuidada, pois uma falha nesta fase pode levar à desmotivação e, como tal, ao desinvestimento completo dos alunos. Sempre que começamos uma nova etapa de projectos, procuro escrever no quadro vários temas do interesse dos alunos, revelados no sugiro do diário de turma ou noutros 125

momentos da aula. Escrevo também alguns temas que ainda não foram trabalhados e que considero interessante serem desenvolvidos por eles. Depois, deixo-os escolherem livremente que temas querem preparar, bem como a constituição dos grupos”. Quanto à sua intervenção neste processo, a professora deixa claro que procura não interferir muito: “posso até sugerir que um tema é mais adequado a certa criança ou que acho difícil o funcionamento de determinado grupo, mas não tomo decisões. Como já referi, acho determinante que os alunos sintam como seu aquilo que vão fazer”. Quanto às crianças portadoras de deficiência, podem surgir duas hipóteses: “por vezes, são incluídas naturalmente nos outros grupos. Outras vezes, faço eu um trabalho de projecto com elas, procurando desenvolver algumas competências específicas, o que só é possível se tiverem um apoio muito próximo da minha parte”, explicita. A fase seguinte tem também uma função muito relevante neste processo: “Acho que a fase da planificação é a mais enfadonha para os alunos, pois logo no início, quando estão desejosos de pegar numa cartolina e começar a escrever o título, é-lhes pedido que preencham uma grelha com o que já sabemos, o que queremos saber, onde poderemos procurar, como vamos apresentar e quando vamos apresentar (ver Figura 11 Grelha de Planificação de Trabalhos de Projecto). No entanto, considero esta fase determinante e acho que é aqui que alguns colegas meus falham, não dando hipótese às crianças de pararem alguns minutos e reflectirem 126

sobre aquilo que irão fazer. Se as crianças não tiverem um plano claro das próximas sessões de trabalho e da própria apresentação do projecto, farão apenas mais um trabalhinho de grupo, gastarão várias horas tendo aprendido pouco ou nada”.

Figura 11 – Grelha de Planificação de Trabalhos de Projecto.

O preenchimento das grelhas de planificação também é um instrumento de pilotagem essencial para o professor, uma vez que lhe permite rapidamente inteirar-se do processo que determinado grupo está a decorrer: “Apoioos imenso no preenchimento da grelha, exijo deles que o façam com serenidade e consciência, pois aquele será o seu plano de aprendizagem para as próximas sessões. Por outro lado, se eu tiver a certeza de que as grelhas estão 127

bem preenchidas, sei que os grupos estão a trabalhar com um objectivo claro e posso apoiá-los mais facilmente, monitorizar todo o processo em condições, estar por dentro daquilo que estão a fazer sem estar necessariamente sempre sentada ao lado deles. De seguida, recolhe-se e selecciona-se informação: “há salas de aula onde estas duas actividades decorrem em momentos distintos. No entanto, a tendência natural das crianças é fazerem as duas em simultâneo e eu não me oponho a isso. Creio que faz parte do processo natural de investigação, recolher alguma informação inicial, escolher o que é conveniente e acabar por ir procurar mais, pois não se tem tudo o que se queria ou encontraram-se pistas para explorar outros aspectos interessantes”. No entanto, a professora refere que “nesta fase, as crianças podem ter tendência a perder-se. Às vezes, preocupam-se mais com as imagens do que com o conteúdo; outras vezes, entusiasmam-se tanto que acabam imersas em dezenas de folhas com informação, sem saber o que lhe fazer”. É aqui que a intervenção directa do professor é determinante: “é necessário voltar a pegar na grelha de planificação e perceber o que queremos realmente aprender e descobrir. Depois, encontramos essa informação em algumas folhas e as restantes são arquivadas. Nesta sociedade da informação é frequente isto acontecer. É preciso parar e seleccionar”, afirma. Enquanto professora, também sente alguma dificuldade nesta fase: “nunca sabemos bem se estamos a dar apoio 128

aos alunos na medida correcta. Apoio a mais pode impedir que os alunos aprendam, pois fazemos o trabalho por eles, e apoio a menos pode levar o grupo a perder-se e a não atingir o seu objectivo. Enquanto professores, temos que manter uma atitude constante de questionar a nossa prática, em simultâneo com a mesma e quando fazemos a nossa própria avaliação do trabalho diário”. A fase seguinte é a preparação da apresentação: ultimam-se os suportes da apresentação (cartazes, maquetas, livros, …), preparam-se questões para colocar aos colegas e dividem-se as partes que cada um apresenta. “Nesta fase, costumo dar-lhes uma nova grelha, para ajudar à organização da apresentação, onde colocam por tópicos aquilo que vão falar, quem vai falar e com o apoio de que recursos” (ver Figura 12 – Grelha de Preparação da Apresentação dos Trabalhos de Projecto). Porém, nem sempre utilizou esta grelha: “institui-a pela primeira vez este ano, pois vinha a verificar que as apresentações acabavam por ser um pouco desorganizadas, mesmo que treinassem várias vezes o que queriam dizer. Posso considerar que foi uma aposta ganha, pois melhorou consideravelmente a qualidade e a organização da apresentação”.

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Figura 12 – Grelha de Preparação da Apresentação dos Trabalhos de Projecto

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Figura 13 – Grelha de Avaliação do Trabalho de Projecto

Após cada apresentação, a avaliação dos projectos é feita de duas formas: a primeira é através das respostas às questões colocadas pelos grupos; a outra é através de uma grelha de avaliação, que os alunos preenchem a pares, bem como a professora e o grupo que apresentou. Essa grelha permite avaliar o que correu bem (e é de aproveitar para novos trabalhos), o que poderia ter corrido melhor e o que se aprendeu de novo (ver

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Figura 13 – Grelha de Avaliação do Trabalho de Projecto).

“Após o preenchimento da grelha, o conteúdo da mesma é expresso e discutido em colectivo. No final de cada avaliação, saímos todos mais ricos e com várias pistas para novos trabalhos”. Esta avaliação é

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determinante, mas só faz sentido se for encarada como formativa e reguladora. O Tempo de Estudo Autónomo e o Plano Individual de Trabalho Em três momentos da semana, os alunos têm oportunidade de trabalhar aquilo que mais necessitam, para poderem progredir nos seus conhecimentos, de acordo com um plano individual. Esse momento denomina-se Tempo de Estudo Autónomo (TEA) e é um momento privilegiado de Pedagogia Diferenciada. O TEA é um momento em que cada aluno trabalha autonomamente, de modo a “superar as suas dificuldades individuais ou trabalhar nas áreas em que se sentem menos seguros. Também podem trabalhar as áreas em que têm maior interesse, mas dando sempre prioridade às áreas mais frágeis”, refere. Neste momento, cada aluno trabalha de acordo com um plano individual de trabalho (PIT), estabelecido no início da semana, onde coloca as actividades que planeia fazer durante essa semana e onde, conforme as vai concluindo, o regista (ver Figura 15 – Exemplo de Plano Individual de Trabalho). O PIT é avaliado cooperativamente no final da semana, no Conselho de Cooperação, e avaliado pela professora, que discute essa avaliação com o aluno, na semana seguinte. Como refere a professora, “o PIT é muito mais do que um simples plano: é um contrato de trabalho entre o aluno, a professora e toda a turma. Acaba por ser também uma grelha de registo das actividades e um poderoso elemento de avaliação, pois permite aferir o empenho na execução das tarefas, a evolução na superação das dificuldades e a performance no aluno em todas as áreas curriculares”.

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Figura 14 – Exemplo de Plano Individual de Trabalho

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Figura 15 – Exemplo de Plano Individual de Trabalho

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O PIT, além de um instrumento de trabalho essencial para o aluno, é determinante para que o professor regule e controle o trabalho efectuado: “São estes instrumentos de pilotagem que nos permitem garantir que, mesmo quando cada aluno está a trabalhar num sentido diferente dos colegas, eu sei o que cada um faz”, refere a professora. A existência do PIT permite-me saber se eles têm consciência das duas dificuldades, saber o que estão a fazer, controlar o trabalho já efectuado, avaliar a sua evolução em vários âmbitos… é um instrumento riquíssimo!”, refere. Para que o TEA possa ser possível, é necessário que a sala de aula esteja organizada de forma a permitir que os alunos possam estar a fazer várias actividades diferentes ao mesmo tempo. Como tal, a professora tem a sala dividida em várias áreas:       

A Biblioteca de Turma (ver Figura 16 – A Biblioteca de Turma); A Biblioteca da Escola; A Oficina de Escrita (ver Figura 17 – A Oficina de Escrita); O Cantinho da Matemática (ver Figura 18 – O Cantinho da Matemática); O Cantinho do Estudo do Meio; O espaço do computador (ver Figura 19 – O espaço do computador); As mesas comuns de trabalho dos alunos, em grupos de 2 a 4 alunos.

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Figura 16 – A Biblioteca de Turma

Figura 17 – A Oficina de Escrita

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Figura 18 – O Cantinho da Matemática

Figura 19 – O espaço do computador

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Associados à existência desta diversidade de espaços, estão os recursos nela existentes, determinantes para o sucesso do TEA. São alguns deles:  Na Biblioteca de Turma: os livros de histórias, os dicionários, as enciclopédias, as revistas de ciência, os manuais escolares e trabalhos de projecto antigos, em formato de livro;  Na Oficina de Escrita: o ficheiro de escrita criativa, os dois ficheiros de ortografia, o baralho de histórias, o ficheiro de interpretação de textos e as fichas de leitura;  No Cantinho da Matemática: o ficheiro de operações, os dois ficheiros de problemas, a calculadora e os cubos matemáticos;  No espaço do computador: o computador, a impressora, vários CD-ROM educativos (jogos e enciclopédias digitais) e o acesso à internet. A existência destes recursos é determinante para que o TEA possa funcionar. Como refere a professora, “antes de introduzir o TEA, tive que construir alguns ficheiros, organizar a Biblioteca e preparar espaços que permitam o trabalho diferenciado. Sem eles, como poderiam os alunos procurar actividades na área que necessitam trabalhar?”. Outros aspectos tiveram que ser tidos em conta, aquando da introdução do TEA. “Além de uma visita aos vários cantinhos criados, e da apresentação de cada ficheiro, foi necessário explicar-lhes a importância daquele momento, insistir que terão a liberdade de trabalhar nas áreas que escolherem, mas que essa liberdade não é sinónimo de brincadeira”, conta a professora. No entanto, tal como refere, “desde o primeiro dia, os alunos aderiram a este momento de forma entusiasta e responsável – aliás, como em todas as turmas com quem fiz TEA. As crianças sentem-se livres, respeitadas, e retribuem

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esse espaço com trabalho e dedicação. É encantador pegar nos PITs delas e verificar que se esforçam, que trabalham com entusiasmo, que criam, que produzem”. Também o PIT necessitou de alguma atenção especial e foi evoluindo, até àquele hoje existente: “Inicialmente, o PIT não era um plano, não servia para planificar o seu trabalho, mas era apenas uma grelha de registo de actividades. Passadas duas semanas, o PIT passou a “plano”, na verdadeira acessão da palavra, mas muito controlado por mim: era eu quem sugeria, em conjunto com cada aluno, quantas e quais actividades assinalar como indispensáveis à realização. Aos poucos, a função de planificar o trabalho foi passando para eles. A maioria das crianças fá-lo sem qualquer problema, exigindo de si própria, tendo consciência das suas dificuldades e dos seus interesses. Porém, algumas crianças ainda necessitam do meu apoio nesta fase da planificação”, relata a professora. “É curioso que, além do ritmo de trabalho e da qualidade das produções dos alunos ter aumentado com o passar do tempo, também o PIT tem evoluído. Surgem sugestões de actividades, a necessidade de um espaço para observações ou chamadas de atenção dos alunos… Creio que é um instrumento que nunca está acabado, nunca está perfeito, está sempre em mudança e não pode ser igual de turma para turma. Tem que estar feito à medida dos alunos”, afirma. Durante o TEA, os alunos devem trabalhar autonomamente. Porém, há espaço para o trabalho a pares ou em pequenos grupos: “há actividades que eles adoram fazer a pares, como inventar operações matemáticas ou fazer ditados a pares. Também procuram um companheiro para os apoiar, quando sentem particular dificuldade num exercício. Creio que é benéfico para eles esta aprendizagem cooperativa e incentivoa; no entanto, não costumo deixar que funcionem mais do que 3 ou 4 pares em simultâneo, pois pode gerar barulho e, num

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momento como o TEA, a confusão pode ser prejudicial. Pontualmente, também podem trabalhar nos seus projectos, mas é preferível que o façam no momento destinado para tal. É importante assegurar que todos têm o ambiente calmo necessário à actividade intelectual”. Quem não esteja habituado a ver as crianças trabalharem autonomamente, pode ficar impressionado ao entrar numa sala onde esteja a decorrer o TEA: “Por vezes, a sala parece uma anarquia… cada um trabalha para seu lado… mas eu sei sempre o que cada um está a fazer e tenho um cuidado especial no acompanhamento destas actividades diferenciadas, para que os alunos (e até os seus encarregados de educação) saibam que o que fazem tem valor para eles e para mim. Quando alguns colegas [professores] que não seguem estas metodologias dizem que quem trabalha como eu não controla o que se passa na sala, deixando a ideia de que o tempo de estudo autónomo é um momento de brincadeira, eu tenho sempre resposta pronta, pois é efectivamente muito mais trabalhoso corrigir vinte PITs do que vinte cópias iguais, embora eu insista em “corrigir” todos os PITs e comentar cada um deles. É uma questão de convicção, de respeito pela individualidade de cada um. Há quem prefira perder horas de almoço (suas e dos alunos) a dar apoio individual. Eu acredito que todos ganhamos em apostar no estudo autónomo”. Um último aspecto do TEA é destacado pela professora: “o facto de os alunos estarem a trabalhar autonomamente dá-me liberdade para apoiar aqueles que têm mais dificuldades, o que é particularmente importante nesta turma, com crianças portadoras de deficiência, mas em todos os grupos em geral. Às vezes, basta dedicar uns minutos a uma criança que não compreendeu algo, para que ela ultrapasse essa dificuldade e possa avançar sem receios. O TEA dá-me essa disponibilidade em tempo útil de aula”.

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IMPLICAÇÕES EDUCACIONAIS Atendendo a que, como o defendemos, o direito à diferença é uma questão do âmbito dos direitos das crianças, a Pedagogia Diferenciada será uma tomada de posição perante o Ensino. Portugal, «arrastado» pelas conferências internacionais e pela evolução do pensamento curricular, assumiu uma visão curricular vanguardista, com a reorganização curricular do Ensino Básico de 2001. Pondo fim a uma visão do currículo com o conjunto dos programas de cada disciplina a cumprir de forma quase «sagrada» e uniforme em todas as escolas, abriu-se uma nova página na História da Educação. O Currículo Nacional passa a ser um documento de referência, organizado por ciclos de ensino, pronto para encher de significado, na adaptação à realidade, a cada escola, turma e aluno, considerando os recursos de cada região, comunidade, escola, turma e aluno. Diferenciar é diversificar. Para entrarmos em sintonia com o projecto da Pedagogia Diferenciada, temos que romper com a visão da função docente que herdamos dos nossos professores, de quando ocupávamos o lugar de alunos. É necessário arriscar! Ao nível das Escolas aceitar a função de gestores do Currículo, através do Projecto Curricular de Escola onde, de uma forma clara e honesta, olhamos a realidade social e os recursos disponíveis e, sem adaptações de «Projectos

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Modelo» ou importações de projectos provenientes de outras realidades, elaboramos o nosso projecto. Depois, ao nível da turma, dentro das «balizas» do Projecto Curricular de Escola, há que adequá-lo à realidade da turma. Na sala de aula, há muito a fazer: atender às estratégias de gestão do espaço e do tempo que permitam a alunos diferentes usar espaços diferentes e executar tarefas diferentes. Cada criança tem o seu ritmo, os seus interesses, as suas dificuldades, as suas qualidades ou pontos-fortes. Há a diversificar, ainda, a forma de abordagem aos diversos conteúdos, para que, pela diversidade, se consiga «atingir» os diferentes estilos de aprendizagem dos alunos da turma. O mesmo se diga em relação às metodologias de sistematização, de treino ou aplicação de conhecimentos e, também, aos instrumentos de avaliação. Em suma, muito há a fazer. Não haverá organizações perfeitas, turmas perfeitas, professores perfeitos. Não quisemos elaborar um «livro de receitas pedagógicas». Quisemos, isso sim, reflectir sobre as potencialidades da Pedagogia Diferenciada, não como uma metodologia, mas como uma forma de estar perante o acto educativo. À luz da nossa perspectiva e das investigações realizadas, quisemos partilhar formas alternativas de construir ambientes de aprendizagem mais respeitadores 143

da diferença interindividual, da diversidade, da originalidade de cada pessoa-aluno. Cremos, verdadeiramente, que a construção da Escola Para Todos, na continuação dos propósitos da Constituição da República e da Lei de Bases, é possível. Os passos a dar são pequenos, mas todos ficamos a ganhar com os pequenos avanços porque “não há, não, duas folhas iguais em toda a criação”, muito menos alunos. O aluno médio não existe, existem alunos reais, de carne, osso e espírito, que todos queremos ajudar a enriquecer, a desenvolver, a crescer como melhores cidadãos.

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DEFINIÇÃO DE TERMOS Avaliação: “Fornece ou pode fornecer aos intervenientes nos processos educativos, um conjunto de informações e referências susceptíveis de serem utilizadas em reajustamentos mútuos, com vista à prossecução de objectivos pedagógicos” (Pinto). Competência: “É a faculdade de mobilizar um conjunto de recursos (saberes, capacidades, informações, etc…) para solucionar, com pertinência e eficácia, uma série de situações (Perrenoud, 2000). Currículo Nacional: traduz “o que, em cada momento cultural e social, é definido como um conjunto de conhecimentos, habilidades, valores e experiências comuns desejados por todo um povo” (Zabalza, 1997). Currículo: Usualmente entendido como “conjunto de disposições e processos que cada sociedade põem em marcha, para tornar efectivo, através da escola, o direito à educação e ao desenvolvimento social” (Zabalza, 2003). Desenvolvimento Curricular: “Prática, dinâmica e complexa, que se processa em diversos momentos e em diferentes fases, de modo a formar um conjunto estruturado, integrando quatro componentes principais: justificação teórica, elaboração/planeamento, operacionalização e avaliação (Pacheco, 2001).

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Pedagogia Diferenciada: Procedimento que procura empregar um conjunto diversificado de meios e de processos de ensino e de aprendizagem, a fim de permitir a alunos de idades, de aptidões, de comportamentos, de savoir-faire heterogéneos, mas agrupados na mesma turma, atingir por vias diferentes objectivos comuns. Estilos de Aprendizagem: “marcas cognitivas, afectivas e fisiológicas, que servem de indicadores relativamente estáveis dos modos como os alunos percebem, interagem e respondem aos ambientes de aprendizagem” (Alonso, 1994). Gestão Flexível do Currículo: Procura de respostas curriculares adequadas aos alunos e contextos com que os professores trabalham (ver pág. 12). Projecto Curricular: Opções quanto às aprendizagens que se queira assumir como prioritárias (dentro das balizas do Currículo Nacional) e quanto aos modos que considera mais adequados para o conseguir com sucesso (Roldão, 1999). Teoria Curricular: Área disciplinar do âmbito das Ciências da Educação cujo objectivo é “descrever, explicar e compreender os fenómenos curriculares, servindo de programa para a orientação das actividades resultantes da prática, com vista à melhoria” (Pacheco, 2001).

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