A praça de guerra como cenário barroco

June 3, 2017 | Autor: M. Tavares da Con... | Categoria: Military History, Art History, Architectural History, Urban Studies, Fortifications
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Sob vários pontos de vista, e pensando até a sua função estritamente militar, a praça de guerra pode ser entendida como manifestação da cultura e da mentalidade barrocas. Como modelo teórico, e mesmo considerando somente o seu fundamento tratadístico, quer na produção europeia, quer na manualística portuguesa, a praça de guerra começa por ser uma unidade operativa inserida numa hierarquia de âmbito territorial, constituindo sem dúvida um ícone representativo que resume a força do braço militar do Estado Moderno. Ainda enquanto intenção ou projecto, com um desenho mais ou menos sofisticado, experimentando uma geometria mais ou menos complexa, pontuando sempre a linha de fronteira nas representações cartográficas, a praça de guerra é, desde logo, uma afirmação da lógica castrense do poder político nos séculos XVII e XVIII. O investimento na formação dos técnicos militares que asseguram esta engenharia é testemunho seguro de uma tal preocupação. Quando construída e equipada no terreno, a praça de guerra adquire uma realidade material e percepcional, cujo significado é também inequívoco. Independentemente da sua maior ou menor operacionalidade militar, constitui o símbolo monumental da pertença de um território a determinado poder. Sintetiza, por definição própria, o palco do teatro de guerra, onde se inscrevem igualmente alguns traços estilísticos indelevelmente barrocos na sua concepção. Uma tal intencionalidade retórica ainda é mais perceptível num terceiro nível de análise, o da vivência dos espaços. O vasto catálogo de exercícios militares, como as paradas, as fanfarras, o toques dos metais ou o rufar dos tambores, compõem rituais quotidianos que invadem o espaço urbano e transformam a arquitectura utilitária ou de equipamento em boca de cena. Um caso exemplar — e que servirá de base à análise a desenvolver no texto — é o Quartel de Infantaria da Praça de Almeida, projecto da provável responsabilidade do próprio engenheiro-mor do reino, Manuel de Azevedo Fortes. Esse sentido é especialmente visível quando o quartel foi utilizado como suporte para o cenário desenhado por João Bernardo Real da Fonseca, também um engenheiro militar, durante as festas realizadas em 1760 para a comemoração do casamento entre a Princesa do Brasil D. Maria (futura D. Maria I) e o Infante D. Pedro. O General Manuel Freire de Andrade, então governador da praça, publicou um minucioso relato das festas, nas quais o "ensaio militar ou ataque e defesa duma praça simulada", que encerrou esta celebração militar, reflecte claramente a natureza barroca da praça de guerra.
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