A PRESERVAÇÃO PATRIMONIAL MUNICIPAL: CONDEPHAT – Franca: 1981- 2005

July 4, 2017 | Autor: Ligia Guido | Categoria: Cultural Heritage Management, Heritage
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LIGIA SOUZA GUIDO

A PRESERVAÇÃO PATRIMONIAL MUNICIPAL: CONDEPHAT – Franca: 1981- 2005

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Faculdade de História, Direito e Serviço Social, da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, para obtenção do Título de Bacharel e Licenciado em História. Orientadora: Profa. Dra. Teresa Maria Malatian

FRANCA 2008

Dedico às minhas avós Ninoca (in memoriam) e Cida – elos preciosos entre a memória histórica e as novas gerações.

AGRADECIMENTOS

Meus sinceros agradecimentos...

... aos meus pais Wilson e Maria Luiza pelo apoio e incentivo constantes. ... à minha irmã Viviane, Vó Cida e Cassinha, pela compreensão. ... ao meu namorado Márcio, pelo suporte tecnológico e psicológico. ... aos meus amigos da graduação, os que fiz em Franca e aos que deixei em Itu. ... aos colegas de trabalho do Arquivo Histórico e do Condephat, pela ajuda e aprendizado que obtive nestes dois anos de estágio na Prefeitura de Franca. ... aos meus colaboradores Ary Pedro Balieiro, Maurício Sandoval Ribeiro, Mauro Ferreira, Mildred Regina Gonçalves, Linda Teresinha Saturi e Maria Margarida Borges Pansani. ... à Graziela Alves Corrêa e Gilberto Luís Naldi, pessoas incríveis que confiaram e investiram neste trabalho. ... ao Prof. Dr. Marcelo Pini Prestes, pelas valiosas sugestões. ... a todos os meus professores, especialmente à minha orientadora Profa. Dra. Teresa Maria Malatian, pelos esclarecimentos e apontamentos precisos.

Nada vejo por essa cidade Que não passe de um lugar comum Mas o solo é de fertilidade Zé Ramalho

GUIDO, Ligia Souza. A preservação patrimonial municipal: CONDEPHAT – Franca: 1981 2005. 2008. 86 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharel e Lincenciado em História) – Faculdade de História, Direito e Serviço Social, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Franca: UNESP, 2008

RESUMO Este trabalho visa compreender o processo de preservação patrimonial no município de Franca-SP, através do entendimento do funcionamento de seu órgão municipal, o CONDEPHAT (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Artístico e Turístico de Franca) de sua criação em 1981 até o início de sua sexta gestão, em 2005. Analisando iniciativas individuais e/ou coletivas tanto de atuação favorável ou não à preservação de bens culturais, pretende-se entender as relações políticas estabelecidas pela sociedade (e seus representantes) no processo de construção e valorização da memória coletiva. Pautando-se pela documentação produzida pelo Conselho, notícias de jornais e especialmente pelo depoimento de pessoas envolvidas, levantam-se os principais elementos de cada gestão e o contexto em que tais práticas se desenvolveram.

Palavras-chave: Patrimônio histórico. Preservação. Franca (SP). CONDEPHAT.

LISTA DE SIGLAS

CONDEPHAT

Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Artístico e Turístico (Franca – SP)

CONDEPHAAT

Conselho

de

Defesa

do

Patrimônio

Histórico,

Artístico,

Arqueológico e Turístico (Estado de São Paulo) DPHAN

Departamento do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional

EMBRATUR

Empresa Nacional de Turismo

ICOMOS

Conselho Internacional de Monumentos e Lugares de Interesse Artístico e Histórico

IPHAN

Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional

SPHAN

Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional

UNESCO

Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura

SUMÁRIO INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 08 CAPÍTULO 1 PATRIMÔNIO CULTURAL DA HUMANIDADE 1.1 Conceitos e termos........................................................................................................ 11 1.1.1 Utilização do termo patrimônio ................................................................................... 12 1.1.2 Monumento ................................................................................................................. 12 1.1.3 Tombamento................................................................................................................ 13 1.1.4 Preservação ................................................................................................................ 14 1.2 Da herança grega à UNESCO ...................................................................................... 14 1.3 A prática preservacionista no Brasil ........................................................................... 22 CAPÍTULO 2 A CIDADE DE FRANCA E O APRENDIZADO DA PRESERVAÇÃO 2.1 Caracterização da região e a formação da cidade....................................................... 29 2.2 Práticas de salvaguarda anteriores ao Conselho ......................................................... 30 2.2.1 Tombamento do Relógio do Sol ................................................................................... 30 2.2.2 O Serviço do Patrimônio Histórico .............................................................................. 31 2.3 O Hotel Francano e a criação do Condephat .............................................................. 33 CAPÍTULO 3 A ATUAÇÃO DO CONDEPHAT 3.1 O primeiro Conselho .................................................................................................... 41 3.2 Modificação na representação do colegiado ................................................................ 46 3.3 O segundo Conselho ..................................................................................................... 46 3.4 O terceiro Conselho ...................................................................................................... 51 3.5 O quarto Conselho ....................................................................................................... 53 3.6 O quinto Conselho ........................................................................................................ 53 3.6.1 Estudos para o tombamento da Catedral ..................................................................... 55 3.6.2 Estádio do Palmeiras .................................................................................................. 57 3.6.3 Ginásio Clube dos Bagres ........................................................................................... 59 3.7 Constatações ................................................................................................................. 60 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS .......................................................................................... 62 REFERÊNCIAS ................................................................................................................. 64 ANEXOS Anexo A .............................................................................................................................. 70 Anexo B .............................................................................................................................. 71 Anexo C .............................................................................................................................. 72 Anexo D .............................................................................................................................. 73 Anexo E .............................................................................................................................. 74 Anexo F............................................................................................................................... 75 Anexo G .............................................................................................................................. 77 Anexo H .............................................................................................................................. 83 Anexo I ............................................................................................................................... 84 Anexo J ............................................................................................................................... 85 Anexo K .............................................................................................................................. 86

INTRODUÇÃO

O presente trabalho busca compreender na cidade de Franca, a relação entre a sociedade civil e seu patrimônio cultural, através do órgão idealizado para a proteção de seus bens – o Condephat (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Artístico e Turístico), de sua criação em 1981 até o ano de 2005. Proposto e constituído em um contexto de mobilização social em torno da preservação do Hotel Francano, o Conselho municipal encontrou durante sua atuação inúmeras adversidades. Ao reconstituir a trajetória do CONDEPHAT, sob uma análise política, procuramos entender suas ações, os interesses e aspirações que permeiam um grupo reunido para aconselhar o prefeito municipal sobre o que deve ser priorizado, em termos de memória e representatividade para os francanos. Partindo da documentação escrita disponível pertencente ao Conselho - processos administrativos e atas de reuniões, utilizamos outras duas fontes: periódicos da cidade e os depoimentos de ex-membros do Conselho. Este trabalho de História Oral nos permitiu preencher lacunas documentais e depreender alguns posicionamentos dos entrevistados, apesar das dificuldades que esta metodologia impõe. Desta forma, foi possível estabelecer um diálogo entre a documentação escrita e as fontes orais. As transcrições das entrevistas estarão disponíveis para consulta, no acervo do Arquivo Histórico Municipal “Capitão Hipólito Antonio Pinheiro”, de acordo com a permissão dos colaboradores. No primeiro capítulo, apresentamos uma breve explicação dos conceitos usualmente empregados na área do patrimônio cultural, de forma a pontuar suas origens e significados. Tal aclaração se faz necessária, pois visa facilitar o entendimento dos termos técnicos utilizados no presente trabalho. Montamos uma breve cronologia do desenvolvimento das práticas de salvaguarda desde a Antiguidade até a Organização das Nações Unidas, em uma perspectiva mais ampla e depois, especificamente no Brasil. No capítulo 2, tratamos da cidade de Franca, traçando uma rápida trajetória de seu desenvolvimento e pontuando ações visando a preservação de elementos históricos representativos anteriormente à criação do Condephat. Destacam-se o tombamento em âmbito estadual do Relógio do Sol, a atuação do Serviço do Patrimônio Histórico, o episódio da venda e demolição do edifício do antigo Hotel Francano e a criação do Conselho.

No terceiro capítulo, analisamos cinco gestões do Conselho, de forma a contextualizar e ressaltar as suas principais características. Na quinta gestão, dada a grande quantidade de documentação, nos detemos em estudar três casos de forma mais aprofundada, pois apresentam elementos cruciais para a compreensão da manifestação contrária ao tombamento, do debate público e as posturas assumidas pelo Conselho e Prefeitos.

CAPÍTULO 1 PATRIMÔNIO CULTURAL DA HUMANIDADE

1.1 Conceitos e termos

A fim de facilitar o entendimento dos conceitos aqui trabalhados, apresentamos uma breve caracterização dos termos patrimônio, monumento, tombamento e preservação.

1.1.1 Definição de patrimônio

A designação utilizada para abranger construções, objetos, cidades, festas, costumes, saberes e técnicas, enfim, qualquer obra de produção humana representativa de uma localidade, nação ou possuidora de caráter universal, dotada de valores ou de singularidade, é a de patrimônio ou bem cultural. O estudo referente às mudanças dos termos empregados ao que hoje denominamos genericamente patrimônio cultural, suas categorias: artístico, histórico, arqueológico, etnográfico, paisagístico. É pertinente, pois espelha as diversas visões elaboradas e o processo de transformação, agregação de valores desenvolvido por cada geração sob a herança cultural que lhe é deixada. Encontramos no dicionário Aurélio 1 os seguintes significados para o vocábulo patrimônio: 1. Herança paterna. 2. Bens de família. 3. P. ext. Os bens, materiais ou não, de uma pessoa ou empresa. 4. Fig. Riqueza: patrimônio cultural. Analisando sua origem latina patrimonium, Funari e Pelegrini2 observam que “o conceito de patrimônio, surgido no âmbito privado do direito de propriedade, estava intimamente ligado aos pontos de vista e interesses aristocráticos” 3 dos antigos romanos. Segundo Françoise Choay4, o conceito de patrimônio inicialmente nos remete à herança, um legado de uma geração à outra em uma família.

1

FERREIRA, A. B. de H. Miniaurélio: o dicionário da língua portuguesa. 6. ed. rev. Curitiba: Positivo, 2005. Verbete patrimônio. 2 FUNARI, P.P. PELEGRINI, S.C. Patrimônio histórico e cultural. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2006. (Passo-a-passo, 66) 3 Ibid. p. 11. 4 CHOAY, F. A alegoria do patrimônio. São Paulo: Editora UNESP/Estação Liberdade, 2001.

1.1.2 Utilização do termo patrimônio “A idéia de posse coletiva como parte do exercício da cidadania inspirou a utilização do termo patrimônio para designar o conjunto de bens de valor cultural que passaram a ser propriedade da nação, ou seja, do conjunto de todos os cidadãos” 5. Françoise Choay utiliza esta definição para compreender o conceito de patrimônio hoje: um bem destinado ao usufruto de uma comunidade que se ampliou a dimensões planetárias, constituído pela acumulação contínua de uma diversidade de objetos que se congregam por seu passado comum: obras e obras-primas da belas-artes e das artes aplicadas, trabalhos e produtos de todos os saberes e savoir-faire dos seres humanos.6

Carlos Lemos7 utiliza-se da classificação do patrimônio apresentada por Hugues de Varine-Boham8 em três categorias: elementos pertencentes ao meio ambiente (natureza), técnicas e “saber fazer” (patrimônio imaterial), e os artefatos (categoria numerosa), elementos resultantes da ação do homem sob seu habitat.

1.1.3 Monumento

Françoise Choay na obra A alegoria do Patrimônio, trabalha com a (trans) formação de conceitos e valores desenvolvidos na Europa e tornados universais e essenciais para a teoria e prática patrimonial. Um valioso conceito é o de monumento. Do consagrado verbete Documento/Monumento, Jacques Le Goff9 define este segundo conceito, buscando sua origem lingüística monere – “fazer recordar”, “avisar”, “iluminar”, “instruir”, e o caracteriza como possibilidade de “ligar-se ao poder de perpetuação, voluntária ou involuntária, das sociedades históricas (é um legado à memória coletiva)“ 10.

5

FONSECA, M.C.L. O Patrimônio em processo: trajetória da política federal de preservação no Brasil. Rio de Janeiro: Editora UFRJ; MinC – Iphan, 2005. p. 58 6 CHOAY, op. cit. p. 11. Definição atual de patrimônio. 7 LEMOS, C. O que é patrimônio histórico. São Paulo: Brasiliense, 2004. p. 8 et. seq. 8 Curso coordenado pelo Condephaat, Iphan e o Departamento de História da Arquitetura da FAU-USP para diplomados em arquitetura, promovido no ano de 1974. RODRIGUES, M. Imagens do passado: a instituição do patrimônio em São Paulo: 1969-1987. São Paulo: Editora Unesp: Imprensa Oficial do Estado: Condephaat: Fapesp, 2000. p. 72 9 LE GOFF, J. História e Memória. Campinas: Editora Unicamp, 2003. p. 525 10 Ibid., p 526

Na introdução, Choay estabelece a diferenciação entre dois termos: monumento e monumento histórico. Segundo definição da autora, monumento é qualquer objeto confeccionado com o objetivo de advertir, lembrar às outras gerações fatos, acontecimentos notáveis, de forma não neutra, “[...] mas de tocar, pela emoção, uma memória viva.” 11 Já o monumento histórico, não é concebido enquanto tal12. Determinado objeto torna-se um testemunho histórico de acordo com o julgamento de um historiador ou crítico de arte, determinado a posteriori. A criação do termo monumento histórico é atribuída a Aubin-Louis Millin, antiquárionaturalista francês, que em 1790 apresenta uma proposta de preservação dos bens nacionais à Assembléia Nacional Constituinte. Ele utiliza este termo para designar “[...] as antiguidades nacionais por oposição às da Antigüidade e engloba todas as suas categorias, sem privilégio para os edifícios”. 13 O conceito de monumento histórico vigorou até 1960, tendo o seu auge no século XIX, quando a autora denomina como a fase da “Consagração do Monumento Histórico (1820 – 1960)”.14

1.1.4 Tombamento

Muitas vezes relacionado ao verbo tombar (deitar ao chão, fazer cair), o termo Tombamento, nome lusitano cuja origem diz respeito à Torre do Tombo, acabou por se transformar em um brasileirismo de uso corrente e substitui 15 classificação, adotada na França e, atualmente, também em Portugal .

O tombamento, um ato administrativo “[...] é o instituto jurídico pelo qual se faz a proteção do patrimônio histórico e artístico, que se efetiva quando o bem é inscrito no livro do tombo.”16

11

CHOAY, op. cit. p. 18 Neste ponto, a autora recorre à definição de Aloïs Riegl, historiador da arte austríaco, conservador do Museu de Artes Decorativas de Viena, presidente da Comissão Austríaca dos Monumentos Históricos e responsável pela nova legislação para a conservação dos monumentos. p. 25. 13 CHOAY, op. cit. p. 96 14 Ibid. Capítulo IV. 15 Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Brasil). Cartas Patrimoniais. 3a ed. Rio de Janeiro: IPHAN, 2004. p. 11 (grifo do autor) 16 SILVA, F.F. As cidades brasileiras e o patrimônio cultural da humanidade. São Paulo: Peirópolis: Editora da Universidade de São Paulo, 2003. p. 122 12

Audrey Gasparini o caracteriza: é precedido de um procedimento no qual são feitos os estudos acerca do valor histórico, cultural, artístico, turístico ou paisagístico do bem, é concedido o direito ao contraditório ao proprietário para que se manifeste acerca de sua concordância ou não e ainda é fixada a data a partir da qual o bem deve ser oficialmente preservado.17

Amplamente utilizado em âmbito federal, estadual e municipal, o tombamento é confundido com preservação.18

1.1.5 Preservação As noções modernas de monumento histórico, de patrimônio e de preservação só começam a ser elaboradas a partir do momento em que surge a idéia de estudar e conservar um edifício pela única razão de que é um testemunho da história e/ou uma obra de arte.19

No artigo A cidade como bem cultural20, o Prof. Dr. Ulpiano Toledo Bezerra de Meneses faz uma importante ressalva sobre a utilização do termo preservação: A palavra preservação está aqui empregada no sentido mais amplo, que inclui não só diversas modalidades de proteção legal e física do patrimônio cultural (tombamento, desapropriação etc. etc. etc., mas ainda conservação, restauração, reabilitação etc. etc.), como, também, as operações de identificação (pesquisa, documentação, análise) e valorização 21 (principalmente pelo uso e garantias de fruição social).

1.2 Da herança grega à UNESCO

Françoise Choay questiona-se acerca do tratamento que cada era histórica desenvolvia sob o legado que herdara, por exemplo, como Roma tratou o legado da Grécia, como os humanistas trataram a produção cultural da Idade Média e assim sucessivamente.

17

GASPARINI, A. Tombamento e direito de construir. Belo Horizonte: Fórum, 2005. p. 51 FONSECA, op. cit. p. 180 19 Ibid., p. 53 20 MENESES, U.T.B. de. A cidade como bem cultural. In V. Mori, M. Campos de Souza, R. Bastos e H. Gallo (orgs.) Patrimônio: atualizando o debate. São Paulo: 9a. SR/Iphan, 2006. 21 Ibid., p. 35 18

Choay estabelece uma linha cronológica iniciando sua análise em relação às peças gregas remanescentes: a admiração e coleção que os atálidas 22 desenvolviam desde 210 a.C.23, a prática de espoliação empreendida pelos romanos, que, posteriormente empregaram esculturas e objetos de arte decorativa em suas residências e expostas em espaços públicos.24 Dessa forma, atálidas e romanos apropriaram-se de objetos gregos, dotando-os de um novo valor de uso25. Na Idade Média (séculos VI – XV), “as criações da Antigüidade não desempenhavam o papel de monumentos históricos. Sua preservação é, de fato, uma reutilização”26. Algumas construções remanescentes de espaços pagãos, agora devidamente “purificadas” 27, servem à Igreja Católica como templos e monastérios (como muitas edificações em Roma). A autora ressalta outros dois pontos importantes dentro do período medieval: o surgimento da noção de distância histórica, ou seja, encarar a Antigüidade como algo distante e impenetrável28 e, o papel contraditório dos papas em relação às obras antigas. Um exemplo: em 1462, quando o papa Pio II Piccolomini publicou a bula Cum almam nostram urbem, indicando preocupação em não apenas prestar manutenção, mas também em punir severamente todos os envolvidos em demolições e danificações aos edifícios da Antigüidade 29. Entretanto, ao mesmo tempo em que se mostravam rigorosos com os infratores, os papas foram responsáveis pela destruição de importantes obras arquitetônicas romanas, como o Coliseu, a mansão Adriana, o porto de Óstia, o Capitólio com o intuito de obterem o mármore necessário às suas construções – como o palácio papal Vaticano).30 Funari e Pelegrini ressaltam que a Igreja agregou um novo valor ao patrimônio, o religioso. Assiste-se à monumentalização das Igrejas - espaços de caráter aristocráticos, mas de utilização coletiva, ou seja, um bem coletivo 31. No período Renascentista, o movimento humanista retoma elementos da cultura antigo-clássica: inspiração no mundo antigo como forma de oposição ao modelo medieval. A dedicação ao estudo, levantamento e coleção de obras da Antigüidade se torna uma importante

22

Dinastia helenística dos soberanos de Pérgamo, que reinou do séc. III ao II a.C. Grande Enciclopédia Larousse Cultural. Nova Cultural n˙3 1998 p.493 23 CHOAY, op. cit. p. 32 24 Ibid., p. 33 25 Ibid., p. 34 26 Ibid., p. 40 27 Ibid., p. 36 28 Ibid., p. 38 29 Ibid., p. 54 30 CHOAY, op. cit. p. 56 31 FUNARI; PELEGRINI, op. cit. p. 12

atividade entre artistas, humanistas e principalmente, os antiquários (eruditos). 32 Choay aponta que entre os séculos XVI e XIX, as antiguidades foram exaustivamente estudadas e inventariadas.33 “Alguns estudiosos enfatizam que o patrimônio moderno deriva, de uma maneira ou de outra, do Antiquariado que, aliás, nunca deixou de existir e continua até hoje, na forma de colecionadores de antiguidades”34. A principal forma de conservação desenvolvida pelos antiquários é catalogação em forma de livros ilustrados. A autora conclui que tanto na Inglaterra, quanto na Itália e na França, a conservação de exemplares da arquitetura histórica só se efetivou “[...] graças a circunstâncias excepcionais e à instigação de personalidades incomuns” 35. Apesar do imenso deleite pelas obras de arte, artistas e humanistas não desenvolveram “[...] um julgamento estético. O conhecimento histórico continua sendo o primeiro e único necessário na instituição das “antiguidades”

36

”.

Em consonância ao projeto “democratizante” Iluminista, algumas coleções particulares são expostas ao público, inaugurando no final do século XVIII, o Museu, semelhante à forma como o entendemos hoje. Essa forma organizacional é muito relevante, pois “[...] institucionaliza a conservação material das pinturas, esculturas e objetos de arte antigos e prepara o caminho para a conservação dos monumentos da arquitetura” 37. Funari e Pelegrini ressaltam um importante aspecto no sentido de melhor compreender o processo de formação dos Estados Nacionais: a influência do sistema jurídico derivado do direito romano (civil) ou do direito consuetudinário (anglo-saxão)38. Destacar essa diferença entre regiões latinas e regiões de tradição anglo-saxônica é essencial, pois cada sistema jurídico possui uma forma distinta de compreensão acerca de seu patrimônio nacional. A principal diferença entre estes dois sistemas é a restrição ao direito de propriedade. Na tradição do direito consuetudinário, se o indivíduo encontra em sua propriedade qualquer forma de riqueza natural, mineral, arqueológica, etc, esta lhe pertence e pode ser comercializada. “Já na tradição do direito romano, tais bens são considerados públicos e não podem ser usados pelos particulares a seu bel-prazer”. O nascimento do moderno sistema de preservação patrimonial se dá em pleno processo revolucionário francês em 1789. Com a inversão dos personagens da cena política, os 32

CHOAY,op. cit. p. 62 Ibid., loc. cit. 34 FUNARI; PELEGRINI, op. cit. p. 13 35 Ibid., op. cit., p. 91 36 Ibid., op.cit., p. 50 37 Ibid., op. cit. p. 62 38 FUNARI PELEGRINI, op. cit. p. 17 et. seq. 33

chamados integrantes do terceiro Estado, até então excluídos da participação direta do poder, estabeleceram uma nova ordem política, posicionando-se radicalmente contrários à monarquia. Foram duas as motivações que suscitaram a mobilização por parte do governo revolucionário francês: a declaração 39 de todo o patrimônio monárquico, religioso e dos emigrados como bem nacional, em 1789 e, os atos de vandalismo ideológico contra ícones do Antigo Regime, que passaram a ocorrer a partir de 1792. A posse de um vasto patrimônio implica na necessidade de mecanismos eficientes de gestão por parte do Estado. Com este intuito, foi criada a Comissão dos Monumentos, idéia de Mirabeau e Talleyrand 40 Sua missão é tombar as categorias e inventariar os bens. Desenvolvem-se duas categorias classificatórias, utilizadas até hoje: a de bens móveis e imóveis 41. O projeto se completaria com a exposição dos primeiros em museus, com a “função de servir à instrução da nação”. Neste momento de turbulência política (Governo Jacobino), pensa-se o museu como principal mecanismo pedagógico nacional, encarregado da transmissão de história e civismo. O movimento de violência contra peças e edificações representativas do Antigo Regime foi consentido pelos comitês revolucionários. Transformar armações de telhados em peças de artilharia, sinos em moedas republicanas 42 foi sinônimo de atitude cívica e patriótica. Ao mesmo tempo, são publicados os decretos condenando atos de destruição e mutilação ao patrimônio nacional43. Portanto, podemos depreender que as primeiras legislações protecionistas francesas foram regidas por uma preocupação prática. O principal valor atribuído ao patrimônio é o nacional, em seguida do histórico e por último, o artístico; pois “[...] o conceito de arte ainda é impreciso e a noção de estética mal acaba de surgir”44. Fonseca ressalta: “A idéia de um patrimônio da nação, ou “de todos”, conforme o texto legal, homogeneiza simbolicamente esses bens heterogêneos e de diferentes procedências, que passam a ser objeto de medidas administrativas e jurídicas [...]”45 Com a ascensão de Napoleão Bonaparte, a atividade das comissões responsáveis pela preservação patrimonial foram encerradas. Bonaparte apenas investiu no museu do Louvre, o 39

CHOAY, op. cit. p. 98. Constituinte de 2 de outubro de 1789. Ibid., op. cit. p. 99 et. seq. 41 Ibid., p. 100 42 Ibid., p. 109 43 CHOAY, p. 110. Decreto de 3 brumário, proposto pelo Comitê de Instrução Pública 44 Ibid., p. 118 45 FONSECA, op. cit. p. 58 40

primeiro museu moderno, graças à “[...] pilhagem criteriosa e sistemática dos grandes museus e coleções de arte da Europa”46. Na Inglaterra, a proteção patrimonial possui um perfil distinto, pois a função de preservação cabe às associações privadas, como a Society for the Protection of Ancient Buildings, criada por W. Morris em 1877 47. Choay ressalta a importância da Revolução Industrial e do movimento Romântico para compreendemos melhor o século XIX, pois durante toda a sua duração, ocorreram uma série de transformações. O advento industrial promove mudanças significativas na sociedade, no entendimento do homem em relação ao tempo, ao espaço, e o movimento romântico, estabelece o desenvolvimento de uma nova estética, retomando signos do passado (nostalgia), elementos da natureza. Esta característica do movimento romântico constitui em uma importante contribuição para a formulação de valores que se desenvolve no século XIX. Pois como citado anteriormente, o valor artístico era o menos preponderante 48 A conclusão da autora sobre o papel da Revolução Industrial sobre a conservação patrimonial é positiva:

Como processo irremediável, a industrialização do mundo contribuiu, por um lado, para generalizar e acelerar o estabelecimento de leis visando à proteção do monumento histórico e, por outro, para fazer da restauração uma disciplina integral, que acompanha os progressos da história da arte49.

A partir dessa contribuição romântica: desenvolvimento da estética, nostalgia e culto ao passado, que possibilita a entrada de filósofos e empreendedores na prática de preservação patrimonial em toda a Europa. O debate iniciado no final do século XIX desenrolou-se pelo século XX, produzindo uma rica e acirrada diversidade de posturas teóricas e práticas, sendo a mais polêmica, travada entre a vertente da “reverência ao monumento”, desenvolvida pelo inglês John Ruskin e a da “restauração interpretativa”, do engenheiro francês Viollet-le-Duc, responsável por uma prática intervencionista incisiva em monumentos arquitetônicos.

46

FONSECA, op. cit. p. 120 CHOAY, op. cit. p. 148 48 Cf. nota 37 deste capítulo. 49 CHOAY, op. cit., p. 127 47

Aloïs Riegl50 no início do século XX, desenvolveu uma teoria de valores, completamente diferente51 dos preceitos surgidos do processo revolucionário francês de 1789, que estabelecem o valor nacional em pé de igualdade aos valores histórico e artístico e a utilização do termo patrimônio. Esta teoria de valores consiste na diferenciação dos valores em duas categorias 52: os Valores de rememoração (ligados ao passado) e os Valores de contemporaneidade. Os primeiros estão relacionados com a memória, a história, a história da arte e um novo valor, o de ancianidade - que pode ser compreendido com um culto aos monumentos. Já os de contemporaneidade, ligados ao valor artístico e de uso. Neste último, Riegl já considera a exploração turística, mas não pode imaginar os impactos ocasionados pela mercantilização dos bens culturais53, problema que se coloca posteriormente ao período deste teórico. Riegl concentra-se no conceito de monumento, englobando o valor artístico ao histórico, uma vez que “[...] todo monumento da arte é, simultaneamente, um monumento histórico, na medida em que representa um estágio determinado na evolução das artes plásticas, de que não é possível, stricto sensu, encontrar um equivalente.”54 Riegl conclui “se o século XIX foi o do valor histórico, o XX parece ser o do valor de ancianidade55” No século XIX ainda, com o envolvimento e interesse crescente de profissionais das áreas de engenheria e arquitetura, a restauração se aperfeiçoa e institui-se como disciplina, dotada de técnica e procedimentos específicos 56. Fernando Fernandes da Silva 57 aponta para as resoluções desenvolvidas dentro do direito internacional interestatal, como as convenções de Haia de 1899 e 1907. Estas convenções foram organizadas no intuito de estabelecer normas para disciplinarem atos de violência e pilhagem contra objetos e edifícios significativos, hospitais e propriedades civis em tempos de guerra. Tal proteção era dispensada a objetos possuidores de valores artísticos, científicos e aos monumentos históricos, em razão de suas finalidades. O termo bem cultural ainda não consta neste período. Essa discussão sobre os limites dos ataques em uma guerra nos demonstra não apenas uma tentativa de se “humanizar” a atividade bélica, mas também, o início de um diálogo internacional, promovendo a assinatura 50

Cf. nota 13 deste capítulo CHOAY, op. cit., p. 117 52 Segundo esquema de Choay, nota 108, p. 168 53 FONSECA, op. cit. p. 69 54 FONSECA, op. cit. p. 65 55 Apud RIEGL, A. Le Culte moderne dês monuments. Paris: Seuil, 1984. p.56 In: FONSECA, op. cit. p. 67 56 CHOAY, op. cit. p. 171 57 SILVA, op. cit. p. 49 et. seq. 51

de tratados multilaterais a partir de então. O autor caracteriza essas duas convenções como “marco inicial do quadro evolutivo da proteção internacional dos bens culturais imóveis 58”. Durante o século XX, assistimos a uma série de congressos, preocupação: o patrimônio, seja ele histórico, artístico, natural ou arqueológico. Como resultado destes encontros, temos as resoluções e as cartas. Reunidas e publicadas, estas resoluções são denominadas Cartas Patrimoniais59. São estes documentos os responsáveis pelas reflexões A primeira iniciativa em âmbito internacional, foi uma conferência realizada em outubro de 1931 em Atenas por iniciativa do Escritório internacional dos museus e sociedade das nações, tendo como resultado, a Carta de Atenas, um documento que reúne os preceitos jurídicos, administrativos, de restauro; reafirma a importância da preservação dos monumentos e estabelece a cooperação internacional para a conservação dos monumentos.60 A partir de 1928, passam a ser organizados os Congressos Internacionais de Arquitetura Moderna (Ciam), sendo os mais significativos, o realizado na cidade de Atenas em 1933 (também denominada Carta de Atenas) e o II Congresso internacional sobre conservação e restauração de monumentos e sítios, realizado em maio de 1964 em Veneza (Carta de Veneza). O tema do primeiro foi a Cidade Funcional, cuja discussão focou-se em quatro necessidades básicas para o bom funcionamento de uma cidade: habitação, lazer, trabalho e circulação. Segundo o autor61, foi a partir de uma sugestão da delegação italiana que se incluiu uma seção referente ao “patrimônio histórico.” Encontramos como justificativa, a preservação de itens que “constituem a expressão de uma cultura anterior e que correspondam a um interesse geral. 62” A Carta de Veneza diferencia-se da Carta de Atenas em relação à preocupação com a restauração. Segundo Fonseca, a teoria adotada para subsidiar a prática da restauração, é baseada no valor de ancianidade de Riegl, onde “[...] qualquer intervenção estranha ao desgaste natural é inaceitável63”. De acordo com o artigo 9˚, a restauração “tem por objetivo conservar e revelar os valores estéticos e históricos do monumento e fundamenta-se no respeito ao material original e aos documentos autênticos”. Mais adiante: “todo trabalho complementar [...] deverá ostentar a marca de nosso tempo”.

58

SILVA, op. cit. p. 28 Cf. nota 16 60 IPHAN, op. cit. p. 16 61 SILVA, op. cit. p. 52 62 IPHAN, op. cit. p. 52 63 FONSECA, op. cit. p. 67 59

A autora conclui: “Essa concepção, que inspirou a Carta de Veneza, elaborada em 1964, se contrapõe aos princípios da Carta de Atenas, de 1933, fruto das idéias funcionalistas dos Ciam64”. A Carta de Veneza reflete a preocupação com a deterioração dos monumentos ocasionada pela Segunda Guerra Mundial. Considera-se como inegáveis contribuições desta carta, o “interesse universal pela conservação dos monumentos históricos”, a mudança de entendimento do que é monumento, uma vez que discute-se a possibilidade de adaptação de um bem (seja um objeto ou um centro histórico) às funções e necessidades atuais, contrariamente à noção de “musealização” do monumento e o início de um debate que culmina no ano seguinte, com a criação do Conselho Internacional de Monumentos e Lugares de Interesse Artístico e Histórico (Icomos) 65. Analisando as iniciativas no âmbito do Direito das Organizações Internacionais, Silva aponta que o Pacto Roerich “é o primeiro tratado multilateral adotado para tratar exclusivamente da proteção dos bens culturais”, mas semelhante às Convenções de Haia, apenas preocupou-se com a preservação em tempos de guerra66. Segundo o autor, apenas observamos um crescimento de ações e interesse na preservação de bens culturais em âmbito internacional, com a criação da UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura), em 1945, para substituir a Comissão Internacional de Cooperação Intelectual. Sobre a definição e estrutura, Silva assim apresenta:

A Unesco é uma organização internacional de caráter governamental vinculada à Organização das Nações Unidas (ONU), especializada em promover uma política de cooperação cultural e educacional. As principais decisões são tomadas na Conferência-geral, constituída pelos representantes dos Estados-membros da Organização, que se reúne a cada dois anos.67

A UNESCO, ainda hoje, é a mais importante instância no campo cultural: promove campanhas internacionais, patrocina convenções e constituiu o centro reflexivo de diversas áreas, com comissões especializadas. Constitui-se como um centro irradiador e aglutinador de novos conceitos e práticas da área cultural.

64

FONSECA, loc. cit. SILVA, op. cit. p. 53 66 SILVA, op. cit. p. 56 67 SILVA, op. cit. p. 55 65

1.3 A prática preservacionista no Brasil

A correspondência entre o Conde de Galveias e o Governador de Pernambuco, datada de 1742, é a primeira iniciativa de preservação no Brasil.

68

Neste documento, o Conde tenta

convencer Luís Pereira Freire de Andrade de que a construção de um novo quartel será menos onerosa do que rebaixar um palácio (o Palácio das Duas Torres, obra de Maurício de Nassau) a um quartel.69 É importante frisar que iniciativas de salvaguarda sempre existiram, mas como país de influência latina (o Estado desempenhando o principal agente, através de suas instituições) temos no Brasil, a instituição de mecanismos de preservação patrimonial apenas na década de 1930, com a Constituição de 1937. Carlos Augusto Machado Calil70 , aponta a iniciativa de um grupo formado por Mário de Andrade, Olívia Guedes Penteado, Oswald de Andrade, Tarsila do Amaral e Blaise Cendrars, que a partir de uma visita às cidades de São João del Rei, Tiradentes, Ouro Preto, encantaram-se com as obras de Aleijadinho e organizaram-se na Sociedade dos Amigos dos Monumentos Históricos do Brasil em 1924. Cendrars escreve os estatutos da Sociedade que, segundo Calil, enquadra-se como uma “entidade privada, isto é, pública não-governamental, segundo modelo anglo-americano”. Conceitualmente, enquadrava-se em um projeto da elite, prevê a desapropriação do bem, a administração seria descentralizada, com ramificações em vários estados e possuía já estruturada a parte financeira da sociedade, proveniente de doações e venda de produtos e suvenires. A Sociedade possuía uma postura vanguardista, uma vez que previa a salvaguarda de outros elementos- “a ecologia, a culinária e as manifestações populares, com suas festas pagãs e religiosas71” além do patrimônio material edificado (monumentos). Calil ressalta que este estatuto teria exercido grande influência sob Mário de Andrade, doze anos depois, quando elabora o anteprojeto72 para a criação do Serviço do Patrimônio Artístico Nacional, a pedido 68

SPHAN/PRÓ-MEMÓRIA. Proteção e Revitalização do Patrimônio Cultural no Brasil: uma trajetória. Brasília, 1980. p. 9 69 SPHAN/PRÓ-MEMÓRIA. Proteção e Revitalização do Patrimônio Cultural no Brasil: uma trajetória. Brasília, 1980. op. cit. p. 31 70 Carlos A.M.Calil “Sob o signo do Aleijadinho – Blaise Cendrars precurssor do patrimônio histórico” in V.Mori, M.Campos de Souza, R.Bastos e H.Gallo (orgs.) Patrimônio: atualizando o debate. São Paulo: 9ª.SR/Iphan, 2006. 71 Ibid., p. 84 72 SPHAN/PRÓ-MEMÓRIA. op. cit. p. 55

do Ministro da Educação e Saúde, Gustavo Capanema em 1936. Pires assim analisa o anteprojeto: o plano de Mário de Andrade revelava grande riqueza de conhecimento da matéria, especialmente sob o aspecto técnico. Nele, foram estabelecidas definições de patrimônio artístico nacional, obra de arte patrimonial, artes arqueológicas e ameríndias, arte popular, arte histórica, arte erudita, arte aplicada, e apresentando um organograma de estruturação e de 73 funcionamento do serviço.

Na década de 1920, alguns projetos com intenção de preservação do patrimônio surgiram em âmbito federal, mas sem obterem aprovação no Congresso Nacional, pois estabelecia a desapropriação dos imóveis 74, como o projeto de Luís Cedro75 e de Araújo Pinho76. Em âmbito estadual, foram criadas Inspetorias de Monumentos Históricos em Minas Gerais, Bahia e Pernambuco. Segundo Fonseca, a primeira iniciativa do governo federal, foi “a elevação de Ouro Preto à categoria de monumento nacional, pelo decreto n˚ 22.928, de 12 de julho de 1933 77“. Com uma nova conjuntura política, o Estado Novo e um crescente interesse pela questão do patrimônio por setores da elite intelectual e política, “o ideário do patrimônio passou a ser integrado ao projeto de construção da nação pelo Estado 78”. O SPHAN, Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional passa a existir pelo decreto-lei n˚ 25, de 30 de novembro de 1937, vinculado ao Ministério da Educação e Saúde, graças aos esforços do então ministro Gustavo Capanema, Mário de Andrade e de Rodrigo Melo Franco de Andrade - responsável pela primeira fase do órgão (1937-1967), denominada fase heróica, o período inicial, de consolidação e afirmação das políticas federais de salvaguarda. Apesar de criado, patrocinado e acolhido no seio de um regime político totalitário, o SPHAN e seu Conselho Consultivo, gozavam de grande autonomia política e administrativa. A delicada questão do direito à propriedade, foi solucionada, do ponto de vista legal, a partir do estabelecimento dos “limites ao direito de propriedade, definindo-lhe o conceito de função social79” pela Constituição de 1934. Como atesta Gasparini, “esta é a primeira vez que

73

PIRES,M.C.S. Da proteção ao patrimônio cultural: o tombamento como principal instituto. p. 35 FONSECA, op. cit. p. 96 75 SPHAN/PRÓ-MEMÓRIA, op. cit. p. 33 76 SPHAN/PRÓ-MEMÓRIA, op. cit. p. 46 77 FONSECA, op. cit. p. 95 78 Ibid., p. 96 79 Ibid., p. 105 74

é colocada uma restrição à fruição plena do direito de propriedade. Proibiu-se, expressamente, o uso da propriedade contra o interesse social ou coletivo.”80 Fonseca ressalta que Rodrigo M. F. de Andrade propositalmente deixou o conceito de patrimônio em aberto para abarcar uma maior tipologia de possíveis bens – manifestações culturais, lendas, superstições, etc. Mas esta escolha comprometeu a viabilização da proteção legal, uma vez que “era necessário referir-se a coisas (“ bens móveis e imóveis”) 81. Embora reconhecesse a importância do processo de “educação das massas”, colocado por Mário de Andrade, Rodrigo mantinha o SPHAN dentro de uma postura elitista, limitandose ao estrito cumprimento do que considerava de sua competência – a proteção de bens e a produção e divulgação do saber necessário ao exercício desta função, através dos procedimentos usuais no meio científico: publicações, 82 conferências, cursos etc.

Portanto, podemos concluir que o SPHAN da fase heróica se caracterizava como uma instituição eminentemente técnica, que desenvolvia um trabalho altamente especializado e de grande responsabilidade científica e social, na medida em que era juridicamente responsável pela constituição do patrimônio histórico e artístico nacional e penalmente responsável pela proteção dos bens tombados.83

Em 1961, o presidente Jânio Quadros sanciona a Lei n˚ 3.924 84, que regula especificamente “os monumentos arqueológicos e pré-históricos”. Dessa forma, as jazidas arqueológicas não mais estão submetidas à legislação patrimonial. Quando encontrada, basta comunica-la e registra-la junto ao Iphan para garantir sua conservação. Não se procede o tombamento neste caso. No final da década de 1960, Rodrigo M. F. de Andrade se aposenta, deixando o SPHAN com estrutura idêntica a da sua criação e muito desgastada. O serviço não modernizou-se. Ainda mantinha credibilidade devido à figura respeitosa de seu diretor85. Um novo problema que se inicia na década de 1970 com o grande movimento migratório populacional do campo para a cidade e que perdura até hoje: a especulação 80

GASPARINI, op. cit. p. 27 GASPARINI, op. cit. p. 27 82 Ibid., p. 124 83 FONSECA, op. cit. p. 125 84 BRASIL. Lei n˙3.924 de 26 de julho de 1961. Dispõe sobre os monumentos arqueológicos e pré-históricos. Disponível em: http://portal.iphan.gov.br/portal/baixaFcdAnexo.do?id=203 Acesso em: 2 setembro de 2008. 85 Ibid., p. 140 81

imobiliária. O SPHAN recorreu à UNESCO para “reformular e reforçar sua atuação, visando a compatibilizar os interesses da preservação ao modelo de desenvolvimento então vigente no Brasil86.” A postura de embate direto é substituída por uma mais branda, de negociação e conciliação entre interesses particulares e os institucionais (de salvaguarda), tentando demonstrar a viabilidade econômica de se desenvolver o potencial turístico, aliando valor cultural e valor econômico 87. Apesar de já constar no decreto de criação - a descentralização das atividades do SPHAN é a partir dos Compromissos de Brasília e de Salvador realizados respectivamente em 1970 e 1971 que surgem recomendações no sentido que “estados e municípios exercessem uma atuação supletiva à federal na proteção dos bens culturais de valor nacional, e assumissem, sob a orientação técnica do então Dphan 88, a proteção dos bens de valor regional 89”

. Foi neste período que se institucionaliza a preservação patrimonial no estado de São

Paulo, com a criação do Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico, o Condephaat. A idéia de se estabelecer um órgão de preservação cultural em âmbito estadual data da década de 1930, quando Mário de Andrade dirigia o Departamento de Cultura da Prefeitura de São Paulo e foi estudada juntamente com Paulo Duarte, deputado pelo Partido Constitucionalista, 90 personagem muito atuante na área cultural, editor da Revista Anhembi. Utilizando como base o anteprojeto desenvolvido para Rodrigo M. F. de Andrade, Mário de Andrade e Paulo Duarte montam o projeto para a criação do Departamento de Patrimônio do Estado de São Paulo em 1936, mas encontram resistências para sua implementação, pois esta idéia ia de encontro do projeto centralizador federal de Getúlio Vargas, que cria o SPHAN no mesmo período e por São Paulo ser um reduto de oposição varguista. No ano seguinte, Duarte monta uma longa campanha (em publicações em jornais) para obtenção de apoio ao projeto, que em novembro de 1937, passaria em votação no Legislativo. Enquanto estava em estudo, ocorreu o Golpe do Estado Novo e as atividades legislativas são encerradas. São observadas poucas iniciativas na área a partir de então. Marly Rodrigues

86

BRASIL. Lei n˙3.924 de 26 de julho de 1961. Dispõe sobre os monumentos arqueológicos e pré-históricos. p. 142 87 BRASIL, loc. cit. 88 Em 1946, o SPHAN passa a denominar-se Departamento do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Dphan) e em 1970, transforma-se em Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). 89 BRASIL, op. cit. p. 143 90 RODRIGUES, p. 32

aponta que Jânio Quadros como governador do estado incentivou a instalação de museus históricos e pedagógicos nos municípios paulistas. 91 Analisando o contexto em que nasce o Conselho estadual, Marly Rodrigues aponta que a iniciativa parte de uma elite intelectual que utiliza da proteção ao patrimônio para se destacar socialmente, reafirmando a “identidade bandeirante” e imbuídos de uma “missão civilizadora”, próxima à linha de Paulo Duarte92 e muito distante da concepção cultural pluralista de Mário de Andrade 93 que embasou o SPHAN. Outra característica marcante na criação do Conselho, é um reflexo da política federal de Castelo Branco, de incentivo da atividade turística, criando a Empresa Nacional de Turismo (EMBRATUR).

A criação do órgão de proteção ao patrimônio em São Paulo inscreveu-se nos contornos do culto cívico ao passado e da consagração pragmática desse mesmo passado, enquanto produto de consumo cultural valorizado com a 94 expansão da indústria do turismo.

A Lei n. 10.247 de criação do Condephat foi aprovada pela Assembléia em 22 de outubro de 1968. No início de suas atividades, o Conselho contava com poucos conselheiros - que desempenhavam tarefas de técnicos devido à falta de verba para a contratação de profissionais especializados e pouca autonomia. Em 1969, os conselheiros se mobilizam em forma de protestos e paralisações, reivindicando mudanças estruturais, buscando melhorar lacunas do estatuto, como incluir o patrimônio arqueológico, atribuir ao secretário da Cultura a deliberação final sobre os tombamentos95. O Conselho possui a seguinte constituição: Conselho Deliberativo, Comissão Técnica de Estudos e Tombamentos, Serviço Técnico de Conservação e Restauro, Seção TécnicoAuxiliar, e Secretaria de Administração.96 “Os bens tombados deveriam ser inscritos em cinco

91

RODRIGUES, p. 40 Duarte divulga em 1938 a campanha “Contra o vandalismo e o extermínio”, onde acusa o progresso, o descuido do poder público e à ignorância do povo como sendo os responsáveis pelos “crimes contra o patrimônio”, In: RODRIGUES, p. 34 93 Cf. p. 15 94 RODRIGUES, p. 46 95 Idem p. 51 96 RODRIGUES, p. 54 92

livros do Tombo, o Arqueológico, Etnográfico, Paisagístico; o das Artes Aplicadas; o das Artes; o das Artes Populares; e o Histórico.97” Nos anos de 1983 e 1984 foram incluídas representações dos Departamentos dos Cursos de Ciências Sociais, Geografia, História e História da Arquitetura de todas as universidades públicas do Estado98, diversificando a formação do Conselho Consultivo, pois como aponta a autora, participavam antes apenas “poucos profissionais da arquitetura e eruditos que viam na História uma forma de expressão de seus conhecimentos e de culto ao passado.99” Em relação à política de atuação do Condephaat, “até 1987, os critérios de valoração de bens ampliaram-se sem que, entretanto, fossem definidas explicitamente políticas de preservação.100” As solicitações de tombamento até a década de 1980 advindas de órgãos públicos e de setores da população, caracterizavam apenas no valor histórico e estavam vinculadas à fatos históricos ou personalidades da história oficial. 101 Portanto, podemos depreender que a atuação dos órgãos de preservação cultural inscrevem-se dentro de uma vertente historiográfica tradicionalista.

97

Em âmbito federal, constam no decreto de criação apenas quatro livros do Tombo: Livro do Tombo Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico; Histórico, Belas-Artes e Artes Aplicadas. In: PIRES, p. 149. 98 RODRIGUES, op. cit. p. 55 99 Ibid, p. 43 100 Ibid, p. 58 101 Ibid, p. 59

CAPÍTULO 2 A CIDADE DE FRANCA E O APRENDIZADO DA PRESERVAÇÃO

2.1 Caracterização da região e a formação da cidade

A região em que hoje se situa a cidade de Franca, entre os rios Grande e Pardo (divisa nordeste do Estado de São Paulo com Minas Gerais) foi habitada por grupos ceramistas de tradição Jê e Tupiguarani, ate meados do século XIX, segundo pesquisas arqueológicas do Prof. José Anthero Pereira Júnior. 1 Rica em diamantes, recurso mineral que gerou uma significativa atividade econômica, desde a extração, lapidação e o comércio. Atuando nessas duas últimas, destaca-se a colônia árabe, estabelecida em Franca.2 A região passou a se caracterizar como importante entreposto comercial com as rotas adentrando o interior, em busca de ouro e comercialização. Especialmente a Estrada do Goyases, propriciou a formação dos pousos e paragens, indispensáveis para o descanso e reforço de mantimentos e acessórios. 3 A expansão da atividade pecuária atraiu grande contingente populacional de Minas Gerais a partir do século XVIII para a Capitania de São Paulo, especialmente para o Desemboque, Araxá, Farinha Podre e ao Sertão do Rio Pardo.4 Em 29 de agosto de 1805, o Sertão do Rio Pardo se transformou em Freguesia da Franca. 5 E em 28 de novembro de 1824, foi instalada a Vila Franca do Imperador. 6 Durante o século XIX e início do XX, sua principal atividade econômica foi o café, caracterizada por pequenas propriedades, baixo número de escravos. A chegada da Estrada de Ferro Mogiana em 1887 propiciou a dinamização da atividade cafeeira em Franca. Segundo Tosi, “não foi Franca que se ligou às demais cidades

1

PEREIRA JUNIOR, J. A. Contribuição para o estudo da arqueologia do extremo norte paulista. Separata do Volume LIV da Revista do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo. [s. l.]: Gráfica Canton Ltda., 1957. p. 315. Caixa 23 Subsídios Históricos - AHMF 2 Franca, Banco de Dados. Coletânea de textos de Everaldo Gonçalves e José Pereira Algarte. Tópico Diamantes. Sem numeração. Sem data. - AHMF 3 OLIVEIRA, L. L. de. Economia e História em Franca: século XIX. Franca: UNESP-FHDSS: Amazonas Prod. Calçados S/A, 1997. p. 45 4 CHIACHIRI FILHO, J. Do Sertão do Rio Pardo à Vila Franca do Imperador. Ribeirão Preto: Ribeira, 1986. p. 34. 5 Ibid., p. 59 6 Ibid., p. 66

pela força de seus senhores, que, àquela altura, [...] foi o complexo cafeeiro que projetou seus tentáculos por meio da ferrovia e fez reproduzir em Franca os padrões que o caracterizavam.” 7 Através da estrada de ferro, vão chegando novos elementos construtivos para as edificações e imigrantes espanhóis e italianos, transformando a rústica vila em representante da Belle Époque no nordeste paulista. O café apresentou uma vigorosa produção até 1906, quando uma grave crise desvaloriza as propriedades e os preços declinam.

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A pecuária facilitou a produção do couro, matéria-prima para os calçados.9 Tem-se fabricação artesanal de “chinelos e sapatões” desde o século XIX. 10 De acordo com Braga Filho e Sousa, a atividade calçadista em Franca “atravessou as diferentes fases da industrialização, passando do artesanato para a manufatura e chegando à grande indústria.” 11 Desta formação sócio-econômica, Franca herdara um conjunto arquitetônico representativo principalmente nos bairros do Centro, Estação e alguns bairros mais antigos, como o de Miramontes. Ainda possuía grande parte destas construções na década de 1980. Neste panorama de aquecimento econômico e de crescimento que a cidade de Franca experimentou na década de 1980, os exemplares arquitetônicos da elite cafeeira não mais correspondem ao novo programa de necessidades atual: alargamento da cidade, surgimento de condomínios fechados, garagem. Então, as edificações passam por um processo intenso de descaracterizações ou mesmo, demolições. É neste contexto em que se enquadra o caso do Hotel Francano.

2.2 Práticas preservacionistas anteriores ao Conselho

2.2.1 Tombamento do Relógio do sol

7

TOSI, P. G. Capitais no interior: Franca e a História da indústria coureiro-calçadista (1860-1945). Franca: UNESP – FHDSS, 2002. p. 85 8 TOSI, op. cit. p. 131 9 BRAGA FILHO, H.; SOUSA, A. C. de. Breve esboço da indústria do calçado de Franca a partir da descrição dos industriais do setor. Disponível em: Acesso em: 15 setembro 2008. p. 25 10 Franca, Banco de Dados. op. cit., Tópico 4.6. A indústria de calçados. 11 BRAGA FILHO, H.; SOUSA, A.C. de. op. cit. p. 25

Em ofício de 27 de março de 196912, o secretário do Condephaat, Vinício Stein Campos encaminha à presidente Lucia Piza F. M. Falkenberg, o requerimento de tombamento do Relógio do Sol de “Franca do Imperador”, solicitado pelo conselheiro Paulo Duarte. 13 Respondendo a um ofício de 22 de agosto de 1969, José Chiachiri, responsável pelo Museu Histórico de Franca, lista quatro “relíquias” da cidade que possuiriam potencial para o recém-conselho estadual tombar.14 Dentre as elencadas, temos além do relógio solar, a Cachoeira do Ribeirão dos Bagres (descrita por Luis D‟Alicourt), Morte do Juiz Pombo (cruz de aroeira que demarca o local da morte do Juiz Manoel Rodrigues Pombo, ocorrida em 1842 durante a “Anselmada”) e o Curral do Padre (local relacionado ao descanso da tropa do eclesiástico Jenoíno Gonçalves Macedo). Neste documento, um elemento curioso foi a forma pela qual José Chiachiri denomina seu cargo ao final do ofício (timbrado do Museu Histórico): Del. do Cons. de Def. do Patr. Histórico,15 pois não havia tal cargo nem órgão de preservação no município em 1969. Os estudos sobre o Relógio do Sol prosseguem. O arquiteto Carlos Lemos vem à Franca para examina-lo e consta em seu parecer: “A peça é realmente interessante, constituindo, na verdade, exemplar único e digno da nossa atenção.” 16 O colegiado delibera favoravelmente ao tombamento em reunião de 28 de fevereiro de 197217 e o tombamento é assinado aos 8 de março do mesmo ano.18 Curioso notar que na Resolução de tombamento, não consta a delimitação da área envoltória, item essencial para esse aparelho urbano que requer grande área livre em seu entorno para se proceder a leitura das horas.

2.2.2 O Serviço do Patrimônio Histórico

Em 23 de junho de 1979 foi publicado no jornal Comércio da Franca 19 o Decreto n˚ 4.094 de 20 de junho de 1979, que “Estabelece a organização funcional do Departamento de 12

Processo 008499. Solicita o tombamento na cidade de FRANCA DO IMPERADOR, do relógio do sol ali montado em anos passados por Frei Germano d‟Annecy. 28 mar. 1969. 13 Cf. p. 18 do primeiro capítulo. 14 Processo 008499. Solicita o tombamento na cidade de FRANCA DO IMPERADOR, do relógio do sol ali montado em anos passados por Frei Germano d‟Annecy. 28 mar. 1969. Processo fotocopiado. Acervo Condephat – AHMF. f. 4 15 Ibid., f. 5 16 Ibid., f. 6 17 Ibid., f. 14 18 Ibid., f. 16 19 Comércio da Franca, 23 de junho de 1979. p. 9

Educação e Cultura”. Na Divisão Cultural, são criados os seguintes serviços: Biblioteca Pública Municipal “Dr. Américo Maciel de Castro Jr”, Museu Histórico Municipal “José Chiachiri”, Serviço de Patrimônio Histórico, Cultural e Paisagístico, Serviço de Turismo. O Serviço de Patrimônio Histórico, Cultural e Paisagístico era constituído por três setores, o de conservação e restauração; o de cadastro, arquivo e documentação, e o setor de pesquisas e projetos. A seção IV do Decreto, estabelece as atribuições do Serviço do Patrimônio: Seção IV Do Serviço do Patrimônio Histórico, Cultural e Paisagístico: Artigo 20) O Serviço de Patrimônio Histórico, Cultural e Paisagístico tem as seguintes atribuições: I – executar os serviços de preservação e restauração do patrimônio histórico, cultural e paisagístico; II – desenvolver pesquisas e projetos relativos à sua área de atuação; III – cadastrar e manter o registro e controle do acervo; IV – executar fotografias e “slides” e reproduzir documentos; V – classificar bens culturais, históricos e naturais do município; VI – compatibilizar e promover a prática da política de proteção ao patrimônio histórico e natural e dos valores culturais; VII – promover e apoiar campanhas de defesa ao meio ambiente (urbano, ecológico e outros). Parágrafo Único – Ao Serviço do Patrimônio Histórico, Cultural e Paisagístico, compete coordenar as atividades da Pinacoteca Municipal “Miguel Ângelo Pucci” e do Teatro Municipal, enquanto estes órgãos permanecerem à nível de (sic) Setor.20

Maria Margarida Borges Pansani chefe do Museu Histórico, logo que admitida na Prefeitura, foi trabalhar no Serviço do Patrimônio Histórico, juntamente com Marcos Valentim Neroni. 21 Sobre as funções do órgão,

consistiam em vistorias nos monumentos, a gente contava com um serviço de transporte. E a vistoria era feita para ver o que precisava de manutenção. Então, depois que foi feito todas as vistorias, nós resolvemos elaborar essas fichas, fotografar e montar um catálogo para futura publicação, que nunca saiu. Tem até um boneco (esboço) que é do tempo da Wanira Salles Tincani (Departamento de Educação e Cultura) que a gente ia publicar, mas não teve verba, não deu continuidade no trabalho, então ficou apenas na ficha. 22

20

Comércio da Franca, 23 de junho de 1979. p. 9 PANSANI, M. M. B. O Serviço do Patrimônio Histórico, Cultural e Paisagístico de Franca. Franca, 16 jul. 2008. Entrevista a Ligia Souza Guido. p. 1 22 Ibid. Os originais encontram-se MHMF e cópia no AHMF. 21

Apesar da abrangência em seu nome e Decreto de criação, a atuação do Serviço apenas circunscreveu-se aos bustos e monumentos das praças de Franca. Mais especificamente, o que se desenvolviam eram

[...] manutenção, porque na época não tinha uma pessoa encarregada de restauro. O que a gente fazia era dar manutenção de pintura, de jardinamento (sic), plantio de árvores, poda em volta dos monumentos, plantinha baixa, nesse sentido. Agora, mexer nos monumentos nunca ninguém mexeu. A não ser o Relógio do Sol que foi o Jubileu do Amendoim que restaurou. Mas era só manutenção mesmo, a parte do busto a gente não mexia. Mexia só no suporte dele, mandava passar tinta e em volta, mandava cuidar do jardinamento (sic), da jardinagem. 23

Consta no Relatório de atividades do Departamento de Educação e Cultura no ano de 1981, a seguinte descrição sobre o Serviço de Patrimônio: Foi realizado um levantamento de todos os monumentos, estátuas, obeliscos e bustos da cidade. Em uma ficha própria, foram cadastrados dados sobre estes monumentos como: Histórico, autor, material utilizado, estado de conservação, local, além da fotografia de cada um. 24

Segundo Margarida, o Serviço funcionou até o ano de 1983. Com a criação do Condephat em 1981, ficou subordinado ao conselho e atuando em parceria da Secretaria de Obras, responsável pelos espaços públicos. “A gente fazia o pedido, para fazer a vistoria dos monumentos, para autorizar a vistoria e autorizar a mexer no que precisava. Mas essa parte de dar manutenção, era a própria Secretaria de Obras que fazia, não tinha pessoal técnico para fazer.” 25 Em um processo de 198126, logo nas primeiras atividades do Conselho, encontramos uma solicitação do secretário do Conselho ao Serviço do Patrimônio Histórico para que providencie os ofícios necessários, e logo abaixo, a resposta do funcionário Wagner de Campos. Portanto, o Serviço do Patrimônio Histórico, Cultural e Paisagístico atuou de forma auxiliar ao primeiro Conselho do Patrimônio.

23

PANSANI, M. M. B. O Serviço do Patrimônio Histórico, Cultural e Paisagístico de Franca. Franca, 16 jul. 2008. Entrevista a Ligia Souza Guido. p. 1. 24 Franca, Relatório de atividades do Departamento de Educação e Cultura, de 1977 a 1981, sob a direção do Prof. Paulo de Tarso Oliveira, Vol. I. Administração Maurício Sandoval Ribeiro. Caixa 12 Subsídios Históricos – AHMF. p.287 25 Ibid., p. 2 26 Processo n˚. 003103. Demolição. 18 fev. 1982. p. 8

2.3 O Hotel Francano e a criação do Condephat

Esse prédio possui uma história conturbada desde sua construção, pois o espaço destinado à sua construção era uma área pública, pertencente à municipalidade, o Largo da Misericórdia, um descampado defronte da Santa Casa de Misericórdia 27. Como muitos dos vereadores eram acionistas, votaram em prol de um estabelecimento particular se instalar em um espaço público28. Analisando a questão da concessão de privilégios e incentivos do Poder Público à classe dominante, Fransérgio Follis constatou que “o espaço urbano apareceu então como solução dupla: instrumento de aplicação do capital de uma oligarquia enriquecida com o café e com o comércio, e local de exercício da civilidade que tal grupo pretendia.”

29

Inaugurado em setembro de 1928, já inicia suas atividades em um contexto conturbado, pois em 1929, ocorre a Quebra da Bolsa de Nova Iorque, e a partir de então, o Hotel decreta falência em 1930, é vendido em 1935 e arrendado por diversas vezes 30. Segundo Attié, No início dos anos 70 o hotel foi fechado, e em 1973 vendido para Antônio Donato, Pelegrino José Donato e Wagner Garcia da Silva, estes ligados ao Grupo Magazine Luiza. Em 1977 Antônio Donato repassou sua parte para o Grupo Magazine Luiza, que elaborou um pretenso projeto de um gigantesco prédio onde seria funcionaria (sic) um Shopping Center, um novo hotel, além de escritórios do próprio Grupo Magazine Luiza. No entanto, a crise que assolava não só a cidade, mas o país todo fez com que tal intenção fosse abandonada, e para além disso, o Código de Zoneamento não permitia a construção de tamanho prédio.31

Gilberto Luís Naldi, trabalhando no Consórcio Brasileiro de Hotéis neste período, comenta que o grupo pertencente a Luís Sersson e Issaac Tepermann, chegou até a estudar a possibilidade de se instalar no Hotel Francano uma de suas franquias, mas constatou que não haveria mercado para se implantar um hotel de suas proporções. Aponta também que a rápida aquisição do imóvel pelo Grupo Magazine Luiza se deu pelo receio do Grupo Mesbla, de São

27

FERREIRA, M. Franca, itinerário urbano. São Paulo: Laboratório das Artes, 1983. p. 94. ATTIÉ, G. A.O Hotel Francano: símbolo da modernização francana. O tombamento, o público e o privado. 2006. 49 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharel e Lincenciado em História) – Faculdade de História, Direito e Serviço Social, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Franca, 2006. p. 15 29 FOLLIS, F. Modernização urbana na Belle Époque paulista. São Paulo: Editora UNESP, 2004. p. 139. 30 Ibid., p. 16 31 Ibid., p. 17 28

Paulo, instalar ali um estabelecimento comercial nos moldes de um shopping center, conceito inovador para o período. (informação verbal) 32 Mauro Ferreira, arquiteto, Chefe de Setor de Projetos e Cálculos da Prefeitura Municipal de Franca na época, aponta que quando o Grupo Magazine Luiza esboçou interesse em demolir o prédio do hotel para o citado projeto, já começou a questionar tal idéia, propondo à prefeitura desapropriar, criar a Casa da Cultura: começamos a fazer um movimento para salvar o Hotel Francano. Qual seria o jeito para fazer isso? A única forma que a gente encontrou na época, era um grupo de pessoas, tinha arquitetos, tinha professores, então era pedir o tombamento para o Condephaat estadual. Então nós fizemos isso. Fizemos um movimento, fizemos uma manifestação na praça, na porta do hotel. Eu lancei um livro lá na porta, no dia desse manifesto, o professor Carrato foi, fez um discurso pela preservação do patrimônio e então coletamos as assinaturas, fiz uma espécie de um dossiê e tenho até uma cópia dele aqui e mandamos esse dossiê para São Paulo. Em 1979 isso. 33

O Condephaat delibera pelo tombamento do hotel, mas o então secretário da Cultura, Cunha Bueno não acata o parecer do conselho. A imprensa francana assume a posição dos grandes grupos econômicos, seus anunciantes. Temos no artigo O que fazer com o ex-Hotel Francano34 um belo exemplar de seu posicionamento. Adjetiva a edificação de “incômodo pardieiro” e o culpa por estar “obstruindo totalmente o aspecto urbanístico de uma cidade que tenta a todo custo modernizar-se.” Mais adiante, critica a pretensão do município de reconhecer algum valor na edificação, pois apenas o Conselho criado pela União poderia preservar, “Ninguém mais, ninguém mesmo.” E coroa: “O grupo privado que o possui precisa agilizar o dinheiro ali invertido e a cidade precisa evoluir em seu centro comercial.” “Em setembro de 1980 o grupo Magazine Luiza vende o prédio para o Banco Itaú S/A, o qual propôs a demolição para a construção do atual prédio situado no mesmo local.” 35 Ferreira define o processo: “[..] um rolo compressor, porquê era um poder econômico violento. [...] O Magazine quando viu que o negócio estava complicado, pegou e vendeu para o banco Itaú. Daí entrou outro gigante na história.” 36 Ary Pedro Balieiro, então vereador, comenta sobre a venda:

32

NALDI, G. L. em entrevista pessoal, dia 29 jul. 2007. FERREIRA, M.Dados e reflexões sobre o Condephat - Franca. Franca, 22 jul. 2008. Entrevista a Ligia Souza Guido. p. 1 34 Comércio da Franca, de 5 de novembro de 1978, p. 7 35 ATIÉ, op. cit. p. 18 36 FERREIRA, op. cit. p. 2 33

Sabíamos que estava sendo vendido para um banco e que seria demolido. Mas nós não conseguimos. Não me lembro se o pessoal entrou com liminar na justiça, isso eu não me lembro. Mas como não existia um órgão, que hoje tem um poder de veto total, que é o Condephat, não é? Como não existia esse órgão, a venda foi efetuada, e uma vez a venda efetuada, quem entrou de posse resolveu fazer aquilo. Que infelizmente foi isso. Nós não tivemos força. Foi lamentável.37

Maurício Sandoval Ribeiro, prefeito de Franca entre 1979 e 1982, relata sobre o Hotel Francano:

[...] quando eu entrei, já estava vendido, eu lutei para que não derrubassem, propus troca, tudo, e eu não podia, um dia eu respondi para o Mauro, eu não podia ter desapropriado, baseado em que? Pegar um dinheiro, uma quantia enorme para desapropriar, para pôr a Casa da Cultura e também não fazer mais nada na cidade naquele ano, dois anos aí talvez sem ter recursos para fazer o que nós fizemos, nós começamos a atacar na infra-estrutura, asfalto, luz e tudo, esgoto, saneamento básico. 38

A inauguração da agência do banco Itaú em 21 de junho de 1982 contou com efusiva comemoração, como notamos nos artigos e anúncios no Jornal Diário da Franca 39. Em Avançada tecnologia bancária Itaú chega na cidade colonial de Franca, ressalta-se que A grandiosidade do prédio que hoje se ergue ao centro da Praça Dom Pedro II chama a atenção para a agência bancária considerada uma das mais belas do País. O Banco Itaú proporciona, assim, à comunidade francana um empreendimento arquitetônico do qual os habitantes da cidade podem se orgulhar. A agência Itaú, entre verdes jardins é uma contribuição ao embelezamento da paisagem, ao mesmo local onde tempos atrás, entre palmeiras e tamareiras se erguia o famoso Hotel Francano, inaugurado em 1928. Pela impossibilidade de restauração do antigo prédio, e querendo dar a Franca uma obra que surpreendesse tanto quanto a que ali havia no passado, é que o Itaú não poupou esforços. A comunidade de Franca ganha agora uma obra de real magnitude. 40

E empresas de Franca exaltando a construção e desejando sucesso, publicaram no mesmo jornal, como é o caso do depósito de materiais para construção São José, 41 O Banco Itaú tem razões de sobra para se sentir orgulhoso de sua obra. Afinal entrega a Franca uma colossal agência, que vem enriquecer sobremaneira o setor urbanístico da cidade. E ademais vem racionalizar

37

BALIEIRO, A. P. A criação do Condephat e o segundo Conselho (92-94). Franca, 16 jul. 2008. Entrevista a Ligia Souza Guido. p. 2 38 RIBEIRO, M. S. O prefeito e o Conselho. Franca, 11 jul. 2008. Entrevista a Ligia Souza Guido. p. 8 39 Diário da Franca, 20 de junho de 1982. p. 3. Cf. Anexo A 40 Diário da Franca, 22 de junho de 1982. p. 9. Cf. Anexo B 41 Diário da Franca, 20 de junho de 1982. p. 5 Cf. Anexo C

extraordinariamente a sua atividade nesta praça, além de proporcionar amplas condições de conforto e atendimento aos seus numeroso clientes.

A marmoraria Jesus Blanco:42

Hoje é um dia festivo não só para a família Itaú mas para toda a Franca que recebe hoje um conjunto arquitetônico maravilhoso [...] São obras como estas que valorizam a cidade que chegam a empolgar a todos quanto acompanham os passos do crescimento multidirecional de nossa terra.

Ambos contém a idéia de que a agência, por trazer o mais novo sistema bancário computadorizado, estaria tirando a cidade de Franca de um grande descompasso tecnológico e urbanístico, salvando a praça Dom Pedro II de seu destino fatídico, o de abrigar um “incômodo pardieiro”. Enfim, a tão sonhada modernização43. Ferreira esclarece: Eu sei que esse foi o estopim dessa coisa de patrimônio em Franca, assim, que foi para a imprensa e que se tornou uma discussão pública dessa necessidade ou não, e tal. Com base nisso, quando fomos derrotados, nós pensamos: „Então nós não podemos contar com o Condephaat estadual, é muito longe, naquela época não tinha internet, eu tinha que ir de ônibus para São Paulo levar documento e tudo do bolso da gente. Era uma coisa voluntária, era um grupo que não tinha nenhum, então vamos criar um aqui em Franca, se a gente conseguir criar aqui, pelo menos aqui o poder de pressão é maior. Então, fui eu pessoalmente que peguei a lei do Condephaat estadual e adaptei. E eu não sei o porquê, eu tirei o arqueológico, você pode ver que não tem o arqueológico. Não lembro o porquê que eu fiz isso, não sei se foi para não ficar igual, que lá é condephaat, então, vamos fazer condephat, isso eu não lembro. Escrevi toda a documentação e como eu já havia trabalhado com o Ary Balieiro, que é um arquiteto, que hoje é o viceprefeito, eu fui funcionário da empresa dele e tudo, tinha amizade com ele, eu levei para ele, falei: „Ary, nós gostaríamos que você apresentasse isso na Câmara para que se tornasse lei‟ então o Ary pegou o projeto que eu escrevi e ele apresentou e aprovou.44

O Projeto de Lei N˚ 14 de 01 de junho de 1981, foi encaminhado para o Presidente da Câmara Municipal de Franca pelo vereador Ary Pedro Balieiro, apresentando a proposta de criação do Conselho, justifica:

CONSIDERANDO que, também os municípios devem se engajar nesta luta de tamanha repercussão na didática cultural; CONSIDERANDO que, um povo que cultiva suas tradições, no resguardo de sua história, constrói um futuro mais firme; [...] 42

Diário da Franca, 20 de junho de 1982. p. 5 Cf. Anexo D Cf. Anexo E. 44 FERREIRA, 2008, op. cit. p. 2 43

CONSIDERANDO que, é imperativo que alguém tome iniciativa para a criação de instrumento legal que regulamente e regularize esta tão importante atuação de uma comunidade, apresento o presente projeto anexo.45 Dois vereadores apresentam ementas para o projeto de Lei. Sidnei Franco da Rocha inclui a frase “[...] sendo suas atividades consideradas como relevantes serviços prestados ao município.” ao § 3º do Artigo 4º. E Fábio Celso de Jesus Liporoni acrescenta o § único ao Artigo 6º: “Aceito pela Prefeitura Municipal o parecer do Conselho, toda e qualquer desapropriação deverá ser objeto de aprovação da Câmara Municipal, através de projeto de lei de iniciativa Executivo.” 46 Em 03 de agosto de 1981, o Prefeito Municipal sanciona a Lei Nº. 2.736, criando o Conselho do Patrimônio Histórico, Artístico e Turístico do Município de Franca, publicado no jornal Comércio da Franca em 5 de agosto de 1981 47. E no mês seguinte, o Decreto Nº. 4.486, de 21 de setembro de 1981, regulamentando a Lei. 48 A criação de um órgão municipal de salvaguarda do patrimônio histórico, artístico, turístico e paisagístico em 1981 mostra-se muito inovadora, mesmo que talvez a Câmara Municipal não tivesse se dado conta da importância ou desconhecesse as implicações que um conselho de defesa do patrimônio pudesse ocasionar à propriedade particular e pública, como aponta Ferreira,

[...] acho que eles sabiam que isso não ia ter desdobramento, eles não imaginavam o que poderia acontecer com isso, era um conselho como qualquer outro. Que tem cinqüenta conselhos criados, quantos que funcionam? uns três ou quatro, os de saúde, os que têm verba são os que funcionam. Os outros, são meramente consultivos. Então, para um vereador, pode ter o conselho consultivo que quiser. Nós vamos discutir isso é com o prefeito, o prefeito é que vai deliberar no final. E é verdade, quer dizer, o colegiado decide, vai para o prefeito, ele acata ou não. Ou seja, se eu quero fazer pressão política, eu não vou lidar com Condephat, eu vou direto no prefeito „Prefeito não tomba isso, não faça isso e pronto.‟ Então para a Câmara, não é realmente uma coisa conflituosa. Porque ela tem mecanismos de pressão outros, para poder fazer valer o seu ponto de vista.49

45

Franca. Projeto de lei n˚ 14 de 01 de junho de 1981. Cria o Conselho de defesa do Patrimônio Histórico, Artístico e Turístico do Município de Franca. Arquivo da Câmara Municipal de Franca. 46 Franca. Projeto de lei n˚ 14 de 01 de junho de 1981. Cria o Conselho de defesa do Patrimônio Histórico, Artístico e Turístico do Município de Franca. op. cit. p. 12 47 Franca. Lei n˙. 2.736, de 03 de agosto de 1981. Cria o Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Artístico e Turístico do Município de Franca. Comércio da Franca, Franca, 5 ago. 1981. p. 9 Cf. Anexo F. 48 Franca. Decreto n˙. 4.486, de 21 de setembro de 1981. Dispõe sobre a regulamentação da Lei n˙. 2.736, de 03 de agosto de 1981. Comércio da Franca, Franca, 1 out. 1981. p. 10 Anexo G. 49 FERREIRA, 2008, op. cit. p. 4

Daniela Campos de Abreu Serra, ressalta que “o artigo 30, inciso IX, da Constituição Federal, inovou ao delegar só aos Municípios a competência para a gestão do patrimônio cultural local.”

50

Temos então, apenas na Constituição de 1988 : “IX – promover a proteção

do patrimônio histórico-cultural local, observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual.”51 Portanto, entendemos que a criação do Condephat foi muito significativa, pois espelha a concretização de uma reivindicação da sociedade civil em um contexto de início de abertura política, um avanço preservacionista para o período, por que as cidades no geral, dependiam e, até hoje dependem muito do Conselho estadual. Uma prematura iniciativa perante os entraves e burocracias estaduais.

50

SERRA, D.C.A. A participação da sociedade civil organizada na gestão do patrimônio cultural de Ribeirão Preto: o CONPPAC/RP. 2006. 259 f. Tese (Mestrado em Serviço Social) – Faculdade de História, Direito e Serviço Social, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Franca, 2006. p. 18 51 VADE Mecum. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2007. p. 36

CAPÍTULO 3 A ATUAÇÃO DO CONDEPHAT

3.1 O primeiro Conselho

São nomeados para o Condephat, o Prof. José Ferreira Carrato (Unesp), Arquiteto Ary Pedro Balieiro (Câmara), Quequer Bortoleto (Cúria), Arquiteto Luís Carlos de Laurentis (Unifran), Prof. Francisco dos Reis de Almeida, Arquiteto Manoel Garcia Filho (IAB), Arquiteto Mauro Ferreira (Associação), Wanira Salles Tincani (DEC). Ocorreram apenas duas reuniões, a primeira de posse do Conselho em 18 de março e a segunda em 23 de abril de 1982. Na primeira, o Conselho analisou um pedido de demolição de três residências situadas à rua do Comércio. O Conselheiro Luís Carlos di Laurentis previamente, já havia elaborado um parecer, pois o Fiscal de Obras e Posturas encaminhou ao Condephat antes de emitir o alvará de demolição, em 4 de março1. Este parecer é montado de forma muito simples, sem dados precisos sobre as edificações (data, técnica construtiva, elementos arquitetônicos) com apenas um histórico muito primário da rua do comércio, sugerindo o tombamento e a proibição do trânsito. O Conselho aprova o parecer. O conselheiro Ary aponta que com este primeiro tombamento, “poderia ser percebido pelo Conselho o caminho burocrático correto, bem como as forças que se ergueriam contrariamente à pretensão do Conselho.” 2 O Conselho encaminha então a notificação da abertura do processo de tombamento ao proprietário das residências, senhor Antonio Carlos de Oliveira, ao diretor do Departamento de Economia e Planejamento e ao comandante do 15˚ Batalhão da Polícia Militar. O proprietário das residências contesta o tombamento em ofício 3 ao prefeito. Argumenta que “[...] trata-se de um velho edifício, quase um pardieiro, sem estilo ou qualquer detalhe que o distinga como monumento histórico ou artístico [...]”

4

e que, ao procurar o

Prof. José Carrato, que

[...] declarou: a) ignorava totalmente aquele assunto; b) não assinara aquele ofício nem autorizara ninguém a fazê-lo em seu nome; c) em sinal de protesto, iria até a Prefeitura entender-se com V. Ex.a para comunicar-lhe esse fato, que reputava da mais alta gravidade, e iria demitirse do cargo de Presidente. 1

.Processo n˚. 003103. Demolição. 18 fev. 1982. p. 4 Livro de Atas n˚ 1 Condephat, Acervo do Condephat – AHMF. f.2 verso 3 Processo n˙006931. Abertura de processo administrativo. 19 abr. 1982. f. 2 - 4. 4 Ibid., p. 3 2

[...] em entendimento com elementos ligados à Prefeitura, pude saber que fora o Sr. Mauro Ferreira, funcionário municipal e membro da assim chamada “CONDEPHAT” (!) local que teria rabiscado uma chancela sobre o nome (datilografado) do Prof. Carrato.5

Adiante, questiona a legitimidade das leis preservação patrimonial, insinua que “o autor do Ofício ser amigo de uma das moradoras do prédio em tela” e acusa o Conselho municipal de “usurpar funções que pertencem à CONDEPHAT de São Paulo.” Solicita ao prefeito Maurício Sandoval Ribeiro:

a) tornar sem efeito o Ofício atribuído com abuso de confiança ao Prof. José Ferreira Carrato; b) determinar a abertura de processo administrativo contra o Sr. Mauro Ferreira, a fim de responsabilizá-lo pelo abuso de confiança e pelo abuso de poder, caracterizados no expediente “sub judice”. 6

Apesar de constar o sinal p/ na assinatura, um correspondente ao pp. (por procuração), o Prof. Carrato não havia comparecido à reunião e desconhecia tal deliberação. No primeiro ato do Conselho, seus representantes agem de forma descuidada, interferindo no procedimento de demolição em propriedade particular. Na segunda reunião, esta contestação é apresentada aos conselheiros, que “reputaram inteiro apoio ao conselheiro injuriado, e unânimemente (sic) resolveram responder.” 7 Em resposta, assinada por todos os conselheiros, exceto o Prof. Carrato, o Conselho rebate todas as acusações, esclarece equívocos quanto à sua atividade e explica a assinatura do ofício:

[...] após o processo ficar paralisado durante quase quinze dias por não ter sido localizado o presidente, o conselheiro Mauro Ferreira que dirigiu a reunião de 19 de março, onde foi deliberada a proposta de tombamento em questão e o secretário Ad-hoc do CONDEPHAT, houve por bem assiná-las “por”, uma vez que tratava-se de mera rotina burocrática e do próprio interesse do proprietário, cujo pedido de demolição estava sem solução definitiva, bem como do interesse público no edifício. Não houve má fé ou dolo, mesmo porque nada foi feito de ilegal, ou com o intuito de prejudicar quem quer que seja, nem seria razoável supor que o professor Carrato ficaria melindrado com ato meramente burocrático. 8

5

Processo n˙006931, op. cit. p. 3 Ibid., p. 4 7 Livro de Atas n˚ 1 Condephat, Acervo do Condephat – AHMF. f. 4 8 Processo n˚. 003103. op. cit. f.19 (grifo nosso) 6

E ressalta que o conselheiro Mauro Ferreira foi indicado como representante pela Associação dos Engenheiros e Arquitetos de Franca, não havendo ligação alguma com seu cargo na prefeitura. 9 No mesmo processo, adiante, temos o parecer do Diretor do DEC, Paulo de Tarso, que estabelece providências quanto da natureza do processo (não poderia ter sido feito no mesmo processo de demolição), quanto ao trâmite (os processos de tombamento devem passar pela direção do departamento de educação e cultura) e solicita ao Conselho um cronograma de suas atividades. 10 E um despacho manuscrito de próprio punho do Prof. Carrato: Ao DEC Pela ordem, acredito estar prejudicado o expediente do Condephat de Franca, por um grave impedimento legal: se bem que nomeado, o Conselho até hoje não tomou posse, perante a autoridade competente. Portanto, por via de direito, todos os atos assumidos não tem amparo legal. S. M. J. Franca, 29. 6. 82 (assinatura) Designado Presidente11

Uma vez colocado este problema de “vazio” do cargo do presidente, o prefeito assina um decreto adicionando dois incisos, um referente à substituição do Presidente e outro estabelecendo a figura de um Secretário Geral12, complementando a lei de criação e o decreto que não estabelecia os critérios de substituição ao Presidente do Conselho. Sobre casos de pedidos de demolição, como este, Maurício Sandoval Ribeiro comenta que “O prefeito pode segurar até um certo dia. O proprietário entra com o pedido de demolição, você não tem como justificar, não pode falar assim: „Tem que esperar‟. Não tem jeito. Já tinha que ter feito o processo e tombado antes.” 13 Em 5 de abril de 1982, o Conselho protocola o pedido de tombamento 14 de quatro edificações situadas à rua Monsenhor Rosa, números 1950, 1932, 1910, 1191 e 1205. Neste processo, há um texto elaborado pelo conselheiro Mauro Ferreira, que consiste em um histórico do período da atividade cafeeira e a justificativa para a preservação: “[...] cujos principais representantes foram impiedosamente demolidos, como o Hotel Francano.

9

Processo n˚. 003103.op. cit. f. 19 Ibid., f. 20 11 Ibid., f. 20 verso (grifo do autor) 12 Franca. Decreto n˙. 4.579, de 03 de junho de 1982. Dá nova redação ao artigo 6˚ do Decreto n˙ 4.486/81. Comércio da Franca, 6 jun. 1982. p. 4 13 RIBEIRO, M. S. O prefeito e o Conselho. Franca, 11 jul. 2008. Entrevista a Ligia Souza Guido. p. 5 14 Processo n˙. 005905. Proposta de Tombamento. 5 abr. 1982. 10

Praticamente o que resta deste período, são estes prédios, e como tal, merecem a preservação.”

15

Porém, não há uma análise arquitetônica específica das edificações. Seguido

de fotografias antigas16 e atuais e a planta cadastral de cada um17. Ferreira comenta esta proposta: [...] vamos tentar salvar uma mancha urbana, que eram quatro do período cafeeiro, vamos pegar uma mancha ao invés de tombar isolado, aquela mancha que era um quarteirão assim, que tinha várias casas da elite cafeeira. [...] E isso daí era enfrentar poderosos outra vez, brigar de novo. 18

Essa proposta de tombamento é semelhante à uma medida adotada pelo Iphan e pelo Condephaat, de preservação de núcleos urbanos, ao invés de se salvaguardar edificações de forma esparsa, comumente difundida e relacionada aquele conceito de monumento já tratado no primeiro capítulo. Um desses sobrados, o n˙1910, era de propriedade da Sra. Maria Augusta Caleiro Pinho, que na época, havia recebido proposta de compra. Ribeiro descreve a difícil situação, [...] lembro que a pressão foi muito grande por parte de quem vendeu também os imóveis, que a pessoa tinha só aquele imóvel, entendeu? A Augusta foi uma que estava precisando, eles perderam tudo e tal, a mãe morreu, sobrou aquilo lá para ela, e ela estava dependendo, podia perder o negócio, entendeu? [...] Como é que o prefeito faz?19

Para Maurício Sandoval Ribeiro, o maior problema do tombamento é desvalorização imobiliária. Segundo ele, se a prefeitura dispusesse de capital para pagar ao proprietário pela desapropriação, seria um procedimento mais justo. 20 Mais uma vez temos a imprensa se pronunciando: Aliás, há tanta coisa para se cuidar nesta cidade, e vem agora um órgão como a Condephat, perturbar a vida da cidade, com medidas arbitrárias, que antes de tudo representam um atentado à propriedade privada. [...] O Condephat de Franca, cujos membros foram nomeados não se sabe por que critérios, está agora desejando se arvorar a donos do patrimônio privado. [...] Afinal, desde quando se é permitido brincar com a propriedade dos outros? 21

Mas o artigo que destaca-se, é O Condephat e o Patrimônio Francano, de autoria do Professor José Ferreira Carrato. Demonstra uma postura pessimista em relação à prática da 15

Processo n˙. 005905. op. cit. f. 3 e 4. Ibid., f. 5 – 7. 17 Ibid., f. 8 – 11. 18 FERREIRA, op. cit p. 3 19 RIBEIRO, op. cit. p. 7 20 Ibid., p. 14 21 Diário da Franca, 30 jun. 1982. f. 1 16

preservação e uma surpreendente definição do que entende por patrimônio histórico. Surpreendente, ou no mínimo inesperada vinda de pessoa designada ao cargo de Presidente do conselho de preservação municipal. Eis sua definição:

Patrimônio histórico é tudo que o homem fez e perdeu o seu uso e utilidade. São coisas mortas (uma igreja interdita, uma pintura, uma velha máquina). São bens que o poder público não quer ou não pode amparar – os chamados “bens culturais da humanidade”. Só a UNESCO competiria obter meios para salvá-los. [...] E também são bens de patrimônio de que os turistas gostam coisas e obras pitorescas, exóticas, antigas e caras. Enfim, uma definição mais corrente de patrimônio: coisas ou obras que não servem mais para a comunidade, mas que são interessantes para o turismo. 22

Sobre Franca, [...] o nosso próprio CONDEPHAT talvez chegue ainda num atraso maior, numa Franca meio desvairada pelo “progresso” que já pôs abaixo seus sobradões oitocentistas e vive apenas os fantasmas de sua frágil memória municipal. Por isso, porque chega tarde, precisa revestir-se de cautela, de prudência, de serenidade. 23

Em 6 de julho de 1982, o prefeito assina o Decreto N˚. 4.592, cancelando os processos de tombamento em andamento e impedindo o Conselho de protocolar novos pedidos até que aprovassem o Regimento Interno, para amparar os processos de tombamento. 24 Na matéria Historiadores acham justa posição do prefeito no caso dos imóveis antigos25, o jornal Comércio da Franca ouviu apenas o professor Alfredo Palermo para embasar tal artigo, que muito se assemelha ao do Prof. Carrato. Ferreira comenta: Ele (Prof. Carrato) se posicionou contra e com isso, o prefeito pegou e anulou tudo. Aí acabou o Condephat. Se a gente não podia fazer aquilo que a gente estava querendo fazer, aquilo desanimou todo mundo. Nós vamos ficar fazendo papel de bobo? Vamos tentar fazer alguma coisa e eles vão bloquear. A gente continuou brigando fora do Condephat.26 O prefeito seguinte nem nomeou, acho que foi o Sidnei Rocha, nem nomeou o conselho.27

22

Diário da Franca, 9 jul. 1982. Última página. Ibid. 24 Franca. Decreto n˙. 4.592, de 06 de julho de 1982. Dispõe sobre cancelamento de processos em andamento referentes a tombamento de bens móveis ou imóveis no município de Franca. Comércio da Franca, Franca, 10 jul. 1982. p. 7 Anexo 8 25 Comércio da Franca, 13 jul. 1982, p. 3. 26 Ofício de Mauro Ferreira endereçado ao DEC em 1983, cobrando providências para a reativação Conselho. Acervo Condephat – AHMF. 27 FERREIRA, op. cit. p. 3 23

Neste primeiro Conselho, constata-se que as dificuldades encontradas foram das mais diversas, principalmente, a falta de experiência dos conselheiros e a precipitação. Na lei de criação, já era prevista a representação do Condephaat, mas não havia este conselheiro. Talvez a experiência do Conselho estadual pudesse ter sido de grande valia.

3.2 Modificação na representação do Colegiado

Em 1987, o prefeito Ary Pedro Balieiro encaminha ao Presidente da Câmara um projeto de retirada do Instituto dos Arquitetos do Brasil, Departamento de São Paulo, Núcleo de Ribeirão Preto do Condephat. Justifica tal ação alegando as dificuldades de locomoção de um conselheiro residir em Ribeirão Preto 28. Mas o termo “Núcleo de Ribeirão Preto” refere-se à região, não circunscrevendo-se à cidade de Ribeirão Preto. Sebastião A. Pimenta Filho, vereador do PDS, apresenta uma emenda aditiva 29, incluindo a representação do Sindicato dos Arquitetos no Estado de São Paulo – Delegacia de Franca, alegando ser uma entidade credenciada a participar do Conselho. Além de completar o total de nove membros previstos para a composição do Condephat em sua lei de criação. A Câmara aprova a medida e a partir de 1987, o Sindicato dos Arquitetos de Franca entra na constituição do Condephat.

3.3 O Segundo Conselho (1992-1994)

A partir do primeiro semestre de 1991, a Secretaria de Educação e Cultura já cogitava a reativação do Condephat, pois há um ofício da Unesp datado de 22 de abril de 1991 30 indicando representantes para o Conselho, segundo solicitação da mesma. As demais instituições enviaram suas listas tríplices em 1992 e em 18 de agosto de 1992, Maurício

78

Franca, Projeto de lei n˚ 32/87 de 18 de maio de 1987. Modifica a redação do Artigo 4˚, da Lei n˚ 2.736/81 e dá outras providências. Arquivo da Câmara Municipal de Franca. 29 Ibid., f. 11 30 Processo n˙ 00394/92. Lista de nomeação do Conselho do Condephat, Secretaria de Educação. 8 jan. 1992. Acervo Condephat - AHMF f.27

Sandoval Ribeiro assina a portaria n˚ 16931 designando os membros para a composição do Condephat. São eles: Prof. Wanderley dos Santos, Arquiteta Neiva Ignácio Nigres (SEC), Profa. Dra. Aparecida da Glória Aissar (UNESP), Vereador Fábio Cândido da Silva, depois substituído por Gilmar Dominici (Câmara), Profa. Dra. Mildred Regina Gonçalves (Condephaat) - designada Presidente, Arquiteto Alexandre Sampaio (Unifran), Arquiteto Francisco Antonio Martins (Associação), Ademir Pedro de Souza (Cúria) e Profa. Arquiteta Linda Teresinha Saturi (Sindicato). Neste Conselho, observamos a tentativa de se restabelecer um órgão que estava dez anos desativado, com dificuldades de diversas naturezas, inclusive discussões antigas, como lembra a Presidente, Profa. Mildred: Na época, quando eu comecei, ainda existia aquele problema sério. Aquela história mal-resolvida do Hotel Francano. O que mais se discutia no Condephat, e que às vezes tínhamos que segurar, e falar „Não, o assunto não é esse, é outro‟. [...] Sabe, essa questão do Hotel Francano sempre ficou assim, parada na garganta das pessoas. O francano nunca aceitou a demolição do Hotel Francano. Porque era uma referência de uma época, a época áurea do café.32

Como também era conselheira do Condephaat do estado, a Presidente tentou passar sua experiência para o novo Conselho: [...] porque quando você vai estudar a importância de um bem, ele está todo relacionado com a parte externa, com... eles usavam um termo muito interessante, que era o entorno. Essa palavra era muita usada pelo Condephaat do estado. [...] Já que a gente tinha dificuldade em pedir o tombamento, em fazer o tombamento rapidinho, então eu tentei mostrar como fazer, essa metodologia de trabalhar com a importância do imóvel naquele contexto da cidade, no entorno [...] Tudo isso, eu ficava observando e anotando para depois, tentar aplicar aqui em Franca.33

Logo na primeira reunião, Profa. Mildred coloca a necessidade do Conselho de Franca contar com a mesma estrutura do conselho estadual: assessoria técnica, jurídica e um Serviço Técnico de Conservação e Restauro concedido pela Prefeitura 34. 31

Processo n˙ 00394/92. Lista de nomeação do Conselho do Condephat, Secretaria de Educação. 8 jan. 1992. f. 29 32 GONÇALVES, M. R. O segundo Conselho (1992-1994). Franca, 8 ago. 2008. Entrevista a Ligia Souza Guido. p. 3 33 Ibid., p. 1 34 Livro de atas n˙1. Condephat, Acervo do Condephat – AHMF. f. 9 e 9 verso.

Nas reuniões seguintes, em outubro e novembro de 1992, os conselheiros discutem profundamente a lei de criação e o decreto de 1981, adequando à realidade do Conselho de 1992 e já pensando na elaboração do Regimento Interno, pois “se o Regimento não for aprovado rapidamente, o Conselho corre o mesmo risco anterior quando, o Condephat foi desativado exatamente porque o Regimento Interno não havia sido aprovado.” 35 Convidam até o Coordenador Legislativo de Franca para auxiliar o Conselho na forma da elaboração e nos possíveis trâmites para aprovação do Regimento na Câmara. São colocadas como necessárias as seguintes modificações: criar suplentes 36 para substituir conselheiros; vinculação direta ao Gabinete do Prefeito para maior agilidade; acréscimo do termo „imóveis‟ no item III do artigo 3˚, bens móveis e imóveis; não apenas a comunicação, mas a comprovação de falta de recursos por parte do proprietário para a manutenção do bem (artigo 11 do Decreto n˙ 4.486); vínculo do Conselho com o Setor de Planejamento; participação no Plano Diretor do Município. O conselheiro Alexandre propõe a transferência da responsabilidade por projetar, conservar e restaurar passe do Conselho (como está posto no item V do artigo 5˚ do Decreto) para “arquitetos da cidade sob orientação do Conselho.” 37 Linda Saturi aponta o artigo 13 do Decreto de 1981, que regula a área envoltória de um bem tombado através de “padrões de ordem estética fixadas pela Prefeitura Municipal”. Segundo ela, esses padrões não existiam na Prefeitura. Mas o parágrafo primeiro do mesmo artigo, coloca que “a fixação dos padrões referidos neste artigo será objeto de decreto, por proposta do Conselho.”38 A Presidente reforça que além dos bens móveis e imóveis (como a conselheira Linda propôs acréscimo), o Condephat pode realizar o tombamento de ruas e de bairros. 39 Percebemos por estas colocações, que o Conselho estava atualizado na discussão da preservação patrimonial vigente no período. Mildred aponta a mentalidade preservacionista do período:

com a minha pouca experiência na época, queríamos fazer o tombamento, achando assim: o importante era tombar, registrar, colocar no papel e considerar o imóvel tombado. Todas as pessoas pensavam assim. Acho que algumas menos, outras mais. Mas o importante era registrar o tombamento. Quer dizer, estou passando pelo Condephat, como conselheira, ou como 35

Livro de atas n˙1. Condephat, f. 12. Ibid., f. 10 et. seq. 37 Ibid., f. 10. 38 Até o momento, não foi desenvolvido este decreto fixando padrões de ordem estética. 39 Livro de Atas, op. cit. f. 12 verso 36

presidente aqui nesse momento, mas o importante é tombar, registrar, mas não é. O importante não é só registrar, é acompanhar todo o processo de tombamento, toda a evolução, todo um histórico, porque esse histórico acompanha o desenvolvimento da cidade também, a evolução da cidade. O imóvel não está desarticulado da cidade, ele faz parte da cidade. 40

O Regimento Interno estava sendo elaborado pela Profa. Mildred baseado no documento estadual. Um importante ponto, para Profa. Mildred, é o trabalho de divulgação tanto do conselho, quanto do tema patrimônio histórico,

na época então, que eu estava na maior empolgação, querendo fazer, realizar, tombar, registrar e divulgar aquele imóvel como um bem tombado, só que nesse período, ainda tive que fazer um trabalho duplo. Um trabalho de conscientização junto aos meus colegas, conselheiros, discutir questões atinentes ao Condephat e a mesmo tempo ainda, sozinha, tentei divulgar na imprensa. Então, o que acontecia, eu fazia artigos, coisas simples, muito simples, chamando a atenção da população sobre a importância de se preservar um imóvel. 41

Pois

[...] é preciso ficar instigando também, conversando, publicando. As pessoas falam, elas dão opinião, em todas as camadas da sociedade. As pessoas lêem jornal. E é o veículo mais fácil da imprensa, porque todas as pessoas lêem, independentemente das classes sociais, elas lêem jornal. E quando se fala que está destruindo uma praça, está mexendo em uma praça, as pessoas têm interesse sim. Principalmente praças e monumentos, nomes de ruas.42

O Conselho aprova a idéia de realizar um curso sobre conservação e restauração com o Prof. Samuel Kruschin, uma proposta de levantamento de inventário do patrimônio de Franca (Linda Saturi), um concurso aberto à comunidade de fotografias, um projeto de roteiro fotográfico da Vila Ferroviária (Alexandre Sampaio). Mas para que esses projetos se efetivassem, a Prefeitura teria que disponibilizar verba. Uma vez estabelecidos os pontos importantes para melhor estruturação do Conselho, passa-se a buscar apoio, reunindo-se com o prefeito em exercício em 1992, Maurício Sandoval Ribeiro, chamando para participar das reuniões a Secretária de Educação e Cultura Profa. Luiza Ângela Marson Guidi43. Mas a resposta que o Condephat recebia da gestão de

40

GONÇALVES. op. cit. p. 2 Ibid., p. 2 42 Ibid, p. 9, 10. 43 Livro de Atas, op. cit. f. 22 verso 41

Ary P. Balieiro, no exemplo do curso com o Prof. Kruschin era: “[...] a arrecadação da Prefeitura está em baixa e necessita fazer um orçamento para o segundo trimestre.” 44 Sobre o funcionamento do Conselho e a disponibilização de recursos, Nós nos reuníamos no Champagnat, em uma das salas do Champagnat, pois o colégio ficava ocioso durante a tarde, mas nós não tínhamos nenhum apoio. Eu me lembro até que para fazer os ofícios, a gente precisava ir no, deixar para datilografar na agência do Ademir (Agência de Turismo Nena, propriedade do sr. Ademir Elias) que era ali perto, porque a gente não tinha nenhum recurso, mínimo que fosse de uma folha de papel sulfite. [...] pretendíamos fazer um inventário e partir do inventário, a traçar metas de tombamento e de preservação. Mas não foi efetivado. Nem para fazer registro fotográfico. E seria interessante, porque hoje nós teríamos um registro de 1992, de como era a cidade na época. Mas nós não conseguimos essa atenção. Isso não implicava muitos custos, pelo contrário, faltava uma vontade de fazer. 45

Porque a gente queria o quê... na época não se falava em computador, estava começando. Mas queria xérox de alguma coisa, para passar para os colegas. “Ah, nós discutimos um assunto [...] foi interessante em reunião. Então vamos xerocar? Vamos” Para que outros tomem conhecimento, aqueles que não estavam presentes. “Vamos distribuir? Vamos”. É preciso que todos tomem ciência do que está sendo discutido. Nem para isso nós tínhamos dinheiro. 46

Um exemplo de “despesa” que a Prefeitura arcaria com o Projeto de Roteiro Fotográfico da Vila Ferroviária, seriam: “quatro filmes preto e branco, cento e trinta e cinco milímetros, Asa Cem, com trinta e seis poses cada um.” 47 Profa. Mildred esclarece que

Ficava procurando os responsáveis para pedir socorro, pedir ajuda. Assim: „quem é que pode fazer isso, qual é o canal dentro da prefeitura que pode me dar acesso a tais coisas‟. Era isso. E às vezes, eu não encontrava e quando encontrava, a pessoa dizia assim „Ah, mas no momento não é prioridade, no momento nós não podemos realizar isso, no momento não é possível.‟ 48

Mas, Chegou uma hora, que não era mais entender a questão de preservar o bem, o imóvel, era questão de entender o mecanismo político. Isso que é pior.

44

Livro de Atas, op. cit. f. 26. SATURI, L. T. Condephat 1992-1994/ 2002-2004. Franca, 22 jul. 2008. Entrevista a Ligia Souza Guido. p. 1 -2 46 GONÇALVES. op. cit. p. 7 47 Livro de Atas, op. cit. f. 27 48 GONÇALVES. op. cit. p. 3 45

Quais eram os mecanismos políticos que nós tínhamos que acionar para obter ajuda. Por que gente boa não faltava. 49

Em 1993, o conselheiro Wanderley dos Santos, por trabalhar no Arquivo Histórico, inicia levantamentos históricos de prédios pertencentes à municipalidade: Colégio Champagnat, Estação Ferroviária e Museu Histórico. Também colaborou no histórico do processo do Colégio Nossa Senhora de Lurdes, atual Unesp em âmbito estadual, cuja comissão era formada por alunos e funcionários da faculdade e dirigida pela Profa. Mildred. O Conselho consegue aprovar seu Regimento Interno apenas em outubro de 1993, mês de sua última reunião. Em 1994, o Conselho reuniu-se mais três vezes (fevereiro, março e outubro), mas esses rascunhos de atas não foram aprovadas.

3.4 O terceiro Conselho (1997 – 1998) Em 11 de agosto de 199750, logo no início de seu mandato, Gilmar Dominici nomeia o conselho pela Portaria 145/97: Graziela Alves Corrêa e Maria Atalie Rodrigues Alves Ferreira, designada presidente (SEC), Teresa Maria Malatian (Unesp), Luis Carlos Fernandes (Câmara), Maurício Cerqueira Pucci (Unifran), Nielsen Mamede Duarte Raiz (Associação), Silvia Regina Barcelos Cardoso (Cúria) e Cláudio Barbosa Ferreira (Sindicato). O prefeito inicia a reunião assinando o decreto n˚. 7.420/97 tombando quatro edifícios: Colégio Champagnat (sede da Secretaria de Educação e Cultura), Estação Ferroviária ( abriga a biblioteca municipal), o Museu Histórico „José Chiachiri‟ e o Colégio Nossa Senhora de Lurdes, onde funciona a Faculdade de História, Direito e Serviço Social da Unesp. E solicita a abertura do guichê de tombamento do Relógio do Sol também em nível municipal e do edifício situado na esquina entre as ruas Monsenhor Rosa e Voluntários da Franca, onde funcionava a Agência “Serv Serv” do Banco do Estado de São Paulo, “Por não estar sendo usado para as atividades bancárias, o edifício corre riscos de descaracterização com sua eventual renda ou locação.” 51 Na segunda reunião, a Presidente delega funções aos conselheiros para os estudos do Banespa. E solicita mais dados para enriquecer o processo de tombamento da Unesp. Solicitação estranha, pois o prédio já estava tombado. Também apresenta a proposta de se 49

GONÇALVES. op. cit. p. 6 Comércio da Franca. 12 ago. 1997. p. A-5. Interessante ressaltar que o Diário da Franca publica o mesmo texto, apenas o título diferente, no mesmo dia, p. 5. 51 Livro de Atas n˙2 Condephat. Acervo Condephat – AHMF. f. 1 verso 50

fazer um inventário da cidade, comunicando que as fotografias ficarão a cargo dos funcionários da Imprensa Municipal. 52 Prosseguem os estudos do Banespa e um levantamento das igrejas de Franca. Para divulgação, colocam a idéia de publicar quinzenalmente artigos educativos. Elaboram um concurso de restauração para a Estação Ferroviária e instalações para o Museu da Imagem do Som com dois conselheiros participando no júri, mas nenhum projeto estava nas normas exigidas. Colocam a necessidade do Conselho contar com estagiários do curso de história e arquitetura. Em fevereiro de 1998, o Conselho comenta a solicitação de destombamento que a diretoria da Unesp apresenta ao Prefeito, para que a faculdade “vendesse o prédio e com o montante pago iria construir um novo campus. Diante da negativa resposta de Gilmar Dominici até desistiram da reforma interna [...].” 53 Ferreira explica as circunstâncias:

Quando em 1997, a gente já estava com o estudo pronto do tombamento da Unesp, e o prefeito bancou e tombou, eles não reclamaram de imediato. Só que aí veio a história do prédio novo da Unesp. [...] E esse dinheiro para sair o campus novo é do BNDES, e ele empresta o dinheiro, mas tem que ter garantias que esse dinheiro vai voltar.[...] Qual é a garantia que a Unesp vai nos dar? Nós vamos dar o prédio do centro como garantia do empréstimo para construir o prédio novo. Só que aí o BNDES falou: „Mas o prédio está tombado. Nós precisamos de um prédio que nos dê rentabilidade depois. Porque se a Unesp não pagar, eu alugo, reformo, vendo, faço o prédio, e vira dinheiro e paga o empréstimo. Agora o prédio tombado, o que é que nós vamos fazer com isso?‟ [...] A Neide Lehlfeld procurou o prefeito, para destombar e facilitar o negócio com o BNDES. 54

Em agosto de 1998, exatamente um ano depois, após o Conselho desenvolver os estudos pertinentes e protocolar o processo de tombamento por solicitação do Prefeito, o mesmo veta o procedimento. Segundo Ferreira,

Foi pelo seguinte: quando o Banespa desativou, ele colocou à venda o imóvel, [...] E aí a prefeitura entrou no leilão, para comprar o prédio. Mas perdeu, foi outra pessoa que deu o lance mais alto. Daí também o Gilmar desinteressou, o pessoal comprou agora e eu vou tombar. Ele não quis comprar essa briga, não.55

52

Livro de Atas n˙2 Condephat. f. 3 Ibid., f. 6 54 FERREIRA. op. cit. p. 12 55 FERREIRA. op. cit. p. 16-17 53

Nesta gestão ainda foi iniciado o processo de tombamento da Cadeia Pública e efetivou-se o projeto Museu de Rua, projeto idealizado pelo segundo Conselho, 56 que consistia em uma exposição itinerante de cartazes com fotos de prédios históricos em praças, ruas. Apesar de o Condephat ficar inativo durante o ano de 1999, sendo apenas nomeado no mês de dezembro, o Prefeito assina dois tombamentos (processos desenvolvidos no terceiro Conselho) no mês de setembro: o prédio da Cadeia Pública (atual Delegacia) e o Relógio do Sol, Decreto N˚ 7.686 de 15/09/1999.

3.5 O quarto Conselho (1999 – 2000)

Dominici nomeia em 29 de dezembro de 199957 pela Portaria 223 de 25 de dezembro, o quarto Conselho para dar “continuidade aos trabalhos do Condephat em seu governo.”58 O Condephat é formado pela Presidente Maria Atalie Rodrigues Alves Ferreira e Norival Luiz Barbosa (SEC), Prof. Dr. Fernando Nogueira (Unesp), Vereador José Mercuri (Câmara), Prof. Arquiteto Marcelo Pini Prestes (Unifran), Arquiteta Romilda Mamede Duarte (Associação), Arquiteto Luciano Andrade Sousa (Cúria) e Arquiteto Cláudio Barbosa (Sindicato). O Conselho realizou apenas três reuniões. Podemos destacar as principais resoluções: opção por realizar tombamento apenas de bens públicos dada a dificuldade de se trabalhar com imóveis particulares; necessidade de desenvolver projetos de restauração de fachada de imóveis antigos59, necessidade de estagiários. 60

3.6 O quinto Conselho (2002 – 2004)

O Conselho foi empossado em fevereiro de 2002 também sob a gestão de Gilmar Dominici. Maria Zélia de Freitas e Tito Flávio Belini (SEC), Profa. Dra. Teresa Maria 56

GONÇALVES. op. cit. p. 5 Diário da Franca. 31 dez. 1999. p. 7. 58 Livro de Atas n˙2 Condephat. op. cit.f. 10 59 Ibid., f. 11 60 Ibid., f. 11 verso 57

Malatian substituída posteriormente pelo Prof. Dr. Moacir Gigante (Unesp), Profa. Arquiteta Linda Saturi (Unifran), Ismar Jacintho Júnior (Associação), Prof. Arquiteto Luciano Andrade Sousa (Cúria) e o Presidente Mauro Ferreira (Sindicato). Na segunda reunião, Ferreira propõe aos conselheiros a forma de se trabalhar individualmente os processos de tombamento, com parecerista. Então os processos já cadastrados na prefeitura são distribuídos entre os membros. Esta forma organizacional dinamizou os estudos e processos de tombamento. Em fevereiro, o Presidente distribui os processos do bebedouro de animais, remanescentes da Capela de Santa Cruz e residências da Vila Ferroviária. Em abril, já estão tombadas pelo Decreto N˚ 8.015 de 16/04/2002. O processo de tombamento dos bebedouros de animais localizados respectivamente na Estação e Bairro Cidade Nova destaca-se dos demais não apenas por seu objeto, um aparelho urbano, mas pela forma como a parecerista coletou e ordenou os estudos. A justificativa para o tombamento que o Presidente apresenta na abertura do guichê é de serem os últimos remanescentes de bebedouros de origem britânica e a necessidade de restauração para não prejudicar a saúde pública. O levantamento histórico através de depoimentos dos carroceiros revelou não apenas a importância dos bebedouros para delimitar as rotas dos carroceiros, mas todo o universo de trabalho destes trabalhadores, diretamente relacionado à ferrovia e à produção cafeeira. 61 Dentre os projetos propostos que se efetivam, tem-se a parceria com a Unifran para a criação de maquetes de prédios históricos, o desenvolvimento de uma cartilha e um CD-ROM (Museu Virtual) para educação patrimonial, discussão e aprovação do Regimento Interno e modificação dos representantes. São suprimidas as participações da Câmara Municipal de Franca e do Condephaat do Estado, devido a falta de disponibilidade destes para participarem do Colegiado. A Prefeitura idealizou um projeto de gestão integrada do centro em parceria com a USP, chamado Centro 100 %. Este projeto visava a recuperação das fachadas dos prédios do entorno da Praça Nossa Senhora da Conceição e obteve aprovação de verba pela Caixa Econômica Federal, mas não conseguiu o apoio dos comerciantes. Linda Saturi relembra:

Colocamos as fotos das fachadas que contorna a praça e o projeto de subtrair os letreiros, a comunicação urbana, limpar um pouco isso e colorir. Fizemos uma apresentação no Gabinete, uma audiência pública em que convidamos todos esses comerciantes. Para eles perceberem como que é e como que pode 61

Processo n˙2002002624. Tombamento de bebedouro de animais. 30 jan. 2002. Acervo Condephat – AHMF.

vir a ser se cada um incorporasse isso. E a gente havia conseguido um convênio com a Caixa Econômica e com as casas de tintas. Então, bastava o comerciante, se ele quisesse. Ele teria o orçamento, teria o arquiteto, teria a loja de tinta à disposição, teria a Caixa a financiar, tudo para ele. Só que muitos poucos comerciantes participaram. A Luizinha, do Magazine Luiza adorou a idéia na época, e ficou tão entusiasmada. E como convencer se os comerciantes não estavam ali presentes? 62

3.6.1 Estudos para o tombamento da Catedral Este processo63 tem início com a reclamação de fiéis sobre um acidente ocorrido com a Senhora Regina Célia Costa Junqueira, quando entrava na igreja, uma folha da palmeira se desprendeu e a acertou, ocasionando-lhe um ferimento. Essas cartas solicitando a retirada das palmeiras imperiais do entorno da Catedral são endereçadas ao padre e à Prefeitura Municipal. Mas também há um ofício do Senhor Eurípedes Vando Rodrigues Faria ao Condephat solicitando o tombamento das referidas árvores, pois segundo ele, “há rumores de serem cortadas.” 64 A Prefeitura procede então uma vistoria e laudo técnico por solicitação do pároco com o Engenheiro Agrônomo Célio Bertelli e o Engenheiro Agrônomo e de Segurança do Trabalho, Márcio Fernando Silveira Rodrigues. O parecer é contrário ao corte e/ou relocação, pois o “estado fitossanitário bom, plantas novas (15 anos) e fazem parte da paisagem urbana local.” 65 . Na reunião do outubro de 2002, todo o Conselho, inclusive o Representante da Cúria Diocesana aprova o tombamento da Catedral e das palmeiras. Assim, iniciaram os estudos e o Responsável pelo Patrimônio da Diocese de Franca foi notificado. De uma só vez, o Condephat anuncia o tombamento de três bens “públicos ou particulares que sejam de uso público”

66

, ou seja, Catedral, Ginásio Clube dos Bagres e

Estádio do Palmeiras. A partir de novembro, os jornais passam a publicar semanalmente o tema, criando até a designação “Polêmica da Catedral”

67

para as matérias relacionadas,

inclusive consultando especialistas, mesclando favoráveis e contrários à salvaguarda do templo.

62

SATURI. op. cit. p. 10 Processo n˙ 2002025627. Solicita o tombamento das palmeiras imperiais. 19 set. 2002. Acervo Condephat – AHMF. 64 Ibid., f. 2 65 Ibid., f. 11 66 Comércio da Franca. 12 nov. 2002. p. 4 67 Comércio da Franca. 24, 25 dez. 2002. p. A-8. 63

Em um livro de contos, Mauro Ferreira escreve sobre o episódio do tombamento da Catedral: Logo após a missa de domingo, o cura alucinado abriu o verbo, disse cobras e lagartos do prefeito e da prefeitura, que iriam tomar68 a Igreja Matriz, que iriam tombar a igreja (para um dos lados, como a torre de Pisa, pensaram as beatas desavisadas), que comunistas ateus e evangélicos iriam definir os destinos e o uso do prédio. Um frenesi e um murmúrio de indignação tomou conta das beatas, algo precisava ser feito, não podiam deixar que o demônio derrubasse a Matriz [...]

O debate em torno da preservação da Igreja reacendeu a problemática da instituição do tombamento enquanto medida legal, da legitimidade do Conselho e do Prefeito, do papel da Igreja e dos fiéis na conservação e administração do prédio. Algo que de início, lembrou as manifestações contrárias de 1982, mas que alcançou enorme repercussão, pois muitas pessoas/ grupos manifestaram-se publicamente nos jornais e em cartas, algumas anexas ao processo. Como Ferreira aponta em sua crônica, a Igreja montou sua contestação denominada Argumentação sobre o Não-Tombamento da Sé Catedral de Franca, constituído por um histórico e análise da edificação, elaborado pelo arquiteto José Luiz Silva; um Parecer sobre tombamento da Catedral, pelo advogado Ismael Rubens Merlino. Merlino utiliza a Lei n˚ 25 de 30/11/1937 (primeira legislação atinente ao tema no Brasil) do SPHAN 69 para compreender o processo administrativo em questão. Desconsiderando as legislações Estaduais (Condephaat), Federais (Constituição de 1988) e Municipais (Condephat) posteriores a 1937, sua constatação não poderia ser diferente: o CONDEPHAF (sic) é um “órgão desautorizado, pois não há documentos que comprove sua regularidade.” 70 Cita um possível requisito para tombamento “a) edificações destinadas às manifestações artísticos-culturais” e logo em seguida salienta: “(a Igreja não pode ser aí incluída, pois é casa de orações e não se destina às aludidas manifestações).” 71 Completa que “(a Igreja) [...] não se apresenta como participante em fatos memoráveis na História do Brasil, e nem que tenha excepcional valor arqueológico, etnográfico ou bibliográfico, pelo que, via de conseqüência, não há como se aceitar seja sua conservação de interesse público.”

68

72

FERREIRA, M. Onze janelas e uma crônica falta de assunto. Franca: Ribeirão Gráfica e Editora, 2004. p. 95 (grifo do autor) 69 Cf. p. 12 70 Argumentação sobre o Não-Tombamento da Sé Catedral de Franca. p. 59 71 Ibid., (grifo nosso) 72 Ibid., p. 60

Merlino ainda recorre à legislação sobre a liberdade de crenças: “É inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de cultos e suas liturgias.”

73

O tombamento é

“desnecessário, ilegítimo e inconstitucional.” 74 Seguem-se cartas apoiando o pároco e todas na mesma linha argumentativa: para quê tombar se a Igreja está tão bem conservada após a reforma, e um extenso abaixo-assinado. 75 Diante dessa situação, o processo foi arquivado, pois

o prefeito, politicamente não teve outra alternativa, ele ficou em uma situação insustentável, porque foi um rolo compressor. Porque por mais que você explicasse, „Olha, o tombamento não vai interferir em nada de horário de missa, não tem nada a ver com isso. Era apenas um controle sobre as eventuais modificações que forem necessárias.‟ 76

3.6.2 Estádio do Palmeiras

Este processo77 foi de iniciativa de Ferreira e os estudos a cargo da Professora Linda Saturi que novamente, realiza um primoroso trabalho de História Oral, levantando dados e histórias do clube com sócios e freqüentadores do estádio, especialmente os descendentes de imigrantes italianos. Em agosto de 2002, o Conselho aprova o relatório e o tombamento do Estádio “incluindo Campo de futebol, arquibancadas, cobertura das arquibancadas, todas as intervenções físicas ocorridas até o final da década de 1950, assim como as palmeiras da calçada da rua Santos Pereira.” 78 A contestação do Clube explicita a relação do clube com sua memória histórica: A entidade se sente USURPADA, de forma vilipendiosa, não só de seu patrimônio mas e principalmente em sua HISTÓRIA. Assim, exterioriza em toda plenitude sua repulsa pelo ato de TOMBAMENTO pela forma esdrúxula, descabida e baseada em razões insubsistentes, ora proposta, pelos motivos que passa a relatar: 1 - Se na avaliação dos membros do Condephat, este aspecto em si é infundado. A história de um clube a ele pertence. Faz parte de seus méritos. 73

Argumentação sobre o Não-Tombamento da Sé Catedral de Franca. p. 61 Ibid., p. 62 75 A primeira parte descrita neste tópico consiste em cem páginas. O abaixo-assinado conta com aproximadamente 12.320 assinaturas. 76 FERREIRA, 2008. op. cit. p. 14 77 Processo n˙ 2002007932. Preservação do Imóvel R. Santos Pereira. 27 mar. 2002. Acervo Condephat – AHMF. 78 Ibid., f. 72. 74

Suas conquistas mesmo elevando o nome de seu torrão, são louros daqueles que então defenderam com galhardia suas cores e não podem de forma simplista serem legados. Sua preservação, pelo seu valor histórico, é exclusiva dos que a herdaram e são estes seus legítimos guardiões.79

Citando o estudo de Saturi, critica a homenagem aos italianos através deste tombamento: O fato outro de a comissão como o tombamento prestar “uma homenagem” aos imigrantes italianos não nos parece, com todo o respeito aos italianos e descendentes aqui residentes, fato relevante que justifique tal ato. Há mais de três décadas não se vê suas participações. O Clube foi quase totalmente esquecido por eles e relegado às mãos de poucos abnegados que o defenderam a duras penas de pessoas sem escrúpulos que procuraram ali vantagens pessoais.80

Cita um caso aparte de atuação, o do Senhor Paschoal Humberto Ferraro e sugere que, “Se a Condephat quer também participar porque não resgata a história dos ilustres italianos que muito fizeram por nossa Franca? Ainda seria possível tombar o prédio da Sociedade Italiana, ali na Voluntários da Franca?”81 Anexa também um abaixo-assinado com cento e dois nomes. 82 Em 2003, dado o estado crítico do telhado da arquibancada, Ferreira solicita 83 o agendamento de uma visita conjunta de membros do clube e especialistas do Condephat para vistoria do local e elaboração de um novo laudo. Após o laudo, o Presidente do Clube intercede por verba diretamente ao Prefeito para restauração do telhado que está prestes a desabar. Diante da negativa, solicita autorização para a demolição. 84 O Conselho analisa a questão e autoriza a desmontagem do telhado, “mas de forma criteriosa”. 85 José Galvão Rosa, o Presidente escreve novamente a Dominici, alegando que o Conselho está equivocado, pois sua solicitação era para a demolição. O processo (em tombamento provisório) permanece sem uma resolução definitiva até 2005, quando o novo Presidente, Hélvio José de Paula pede o arquivamento do processo e o Conselho seguinte sugere a preservação apenas do frontão, configurando a área de sessenta e

79

Processo n˙ 2002007932. Preservação do Imóvel R. Santos Pereira. 27 mar. 2002. f. 80 Ibid. 81 Ibid. 82 Ibid. f. 85 - 86 83 Ibid., f. 97 84 Ibid. f. 109 85 Ibid, f. 114 – 115. 80

nove metros de comprimento. O Prefeito Sidnei Franco da Rocha assina o decreto de tombamento86 em agosto.

3.6.3 Ginásio Clube dos Bagres

Este processo87 foi iniciado da mesma forma dos outros dois, com a abertura de guichê e os estudos a cargo de Ferreira. No histórico, ressalta-se sua arquitetura modernista e o seu construtor, o engenheiro Ícaro de Castro Melo, autor de inúmeros estádios e complexos esportivos do país, como o Mané Garrincha em Brasília, Ginásio de Esportes do Ibirapuera, Sport Club Corinthians Paulista. 88 Relaciona o Clube ao basquete, pois teria sido o Clube dos Bagres o ginásio que abrigou o primeiro time profissional da cidade. O Conselho aprova o processo e em novembro de 2002, Victor de Andrade, o Presidente do Clube é notificado. Em sua manifestação, afirma que

[...] no meu entender, somente uma Assembléia Geral dos associados do Clube dos Bagres estaria à altura de opinar sobre o assunto [...] portanto, esta presidência não tem autoridade para concordar ou discordar com o tombamento, porque se assim não procedesse, estaria usurpando os direitos dos associados [...].89

Aponta os interesses no ato do tombamento, [...] lembro-lhe que o procedimento da Prefeitura tem sido ambivalente – quando há interesse para o município, desapropria-o sem qualquer consideração para com sua preservação e quando não há, tomba-o por pretenso valor histórico – pois não hesitou em seccioná-lo, mutilando-o, para dar continuidade à Av. Dr. Hélio Palermo. É irônico e paradoxal. 90

Adiante conclui:

Logicamente o tombamento por ser um ato unilateral da Prefeitura e do Condephat, que não se manifestou quando o Clube dos Bagres foi dividido em dois em função do progresso da cidade, seguirá seu curso inexorável e, 86

Franca, Decreto n˙ 8.729 de 28 de agosto de 2005. Dispõe sobre o Tombamento do “Frontão do Estádio Palmeiras Futebol Clube” e dá outras providências. Ibid., p. 174. 87 Processo n˙ 2002007934. Preservação do imóvel Rua Gal. Carneiro. 27 mar. 2002. Acervo Condephat – AHMF. 88 Ibid., f. 3 – 13. 89 Ibid. f. 42 90 Ibid.

muito provavelmente, acabará ocorrendo, e a concordância ou não do Clube dos Bagres será dispensável, pois não passa de um mero “pro-forma” legal que não alterará em nada o resultado final. 91

Dominici assina o tombamento92 em março de 2003. Dos três tombamentos anunciados, o Clube dos Bagres foi o primeiro a ter a resolução rapidamente, apesar do posicionamento rígido de seu Presidente.

3.7 Constatações

Em ambos os casos, a manifestação das pessoas e grupos pertencentes às entidades envolvidas (Igreja e Palmeiras) foi de vital importância nos desdobramentos dos processos de tombamento. Neste período em que tramitaram ambos os processos, a repercussão extravasou o perímetro das entidades e configurou-se debate constante nos jornais de circulação diária (pelo menos). Por mais complicadas que possam ser essas propostas de tombamento e a forma como se desenvolveram, de embate direto e sem contemporização muitas vezes de ambas as partes, a importância destes dois casos está em trazer à baila novamente a questão da preservação patrimonial. Sobre a principal forma de expressão dos órgãos alvo de tombamento, as contestações são sempre interessantes, porque buscam refutar o processo de tombamento, alegando a incapacidade do poder público, ou a falta de legitimidade do Conselho. Mas nestes dois casos analisados, os argumentos utilizados para negar a importância de suas edificações foi, no caso da Catedral, a diminuição do papel da Igreja enquanto instituição na história do Brasil e de uma postura egoísta, no caso do Palmeiras, de que a história do clube somente a ele lhe diz respeito. No caso do Clube dos Bagres, a contestação enviada ao Prefeito não questiona o propriamente os valores possíveis que o prédio teria, elencados pelo Conselho. Questiona sim, qual o intuito da política de preservação empreendida pela Prefeitura e Condephat. Mas em uma “Carta aberta à população”, publicada no Jornal Comércio da Franca 93 e distribuídas 60.000 cópias em forma de panfleto, o Presidente da Diretoria Administrativa, Victor de 91

Processo n˙ 2002007934. Preservação do imóvel Rua Gal. Carneiro. 27 mar. 2002. f. 43 Franca, Decreto n˙ 8.161, de 10 de março de 2003. Dispõe sobre o Tombamento do Ginásio de Esportes do Clube dos Bagres e dá outras providências. Comércio da Franca, Franca, 19 mar. 2003. p. D-9. 93 Comércio da Franca. 23/24 mar. 2002. p. A-5 92

Andrade coloca em dúvida a legitimidade do funcionamento do Conselho, além de criticar a administração do PT (Partido dos Trabalhadores) em Franca, classifica o edifício de “Projetopadrão do Dr. Ícaro de Castro”, que nada tem de histórico e questiona o porquê de só o seu Clube ser punido com o tombamento.

CONSIDERAÇÕES FINAIS Analisando como a questão da preservação do patrimônio foi se desenrolando na cidade de Franca, observa-se a sucessão de conceitos e práticas universais (os quais tratamos no primeiro capítulo) apropriados e adaptados à realidade francana. Completamente imersos na concepção historiográfica do século XIX, no que concerne aos „fatos memoráveis‟, temos a relação das quatro relíquias francanas, elencadas por José Chiachiri. O Serviço do Patrimônio Histórico atuando apenas e somente no que entendia por monumento: bustos e estátuas. O episódio da venda e demolição do Hotel Francano marca um importante estágio desta trajetória na cidade, apesar de seu desfecho. O Condephat foi criado a partir de uma mobilização, de uma reivindicação da sociedade civil, de forma legítima e muito inovadora, pois é apenas a Constituição de 1988 que passa a estabelecer ao município, a competência de preservar o seu patrimônio cultural. Mas analisando sua atuação, notamos sua fragilidade e dependência à figura do prefeito municipal e um grande isolamento em relação à outras instituições. Ressaltamos que é de crucial importância para qualquer Conselho contar com um intercâmbio, manter contato com profissionais de outras instituições. Temos o exemplo do Conselho de 1992, quando muito se avançou nas conceitualizações da área e quando procederam à análise da legislação existente. Tal salto se deu devido à experiência da Presidente no Condephaat e da formação da Arquiteta Linda Saturi em Campinas – SP.

Elencamos

algumas

conclusões

talvez

parciais,

percebidas

das

falas

dos

colaboradores, que condensam a experiência da prática de salvaguarda: Nenhum trabalho é perdido, se não der resultado imediatamente, se mostrará depois. (Mauro Ferreira e Mildred Gonçalves) Linda Saturi, ao comentar sobre a gestão de 1993, que o Conselho não tinha apoio da prefeitura porque não havia desta nenhum interesse político no Condephat. Tal reflexão extravasa o período comentado e claramente se encaixa para todas as gestões. As pessoas sentem a perda de prédios antigos, lamentam-se pela demolição, mas não conseguem relacionar à importância de um órgão atuando pela preservação. (Linda Saturi)

Portanto, conclui-se que o Conselho apenas funciona quando há interesse de alguma natureza em sua atuação, seja da administração municipal, seja de grupos políticos.

Preservação patrimonial nunca é estimulada por si só. Deve proporcionar uma contrapartida, seja ela econômica, política ou eleitoral. Muitas vezes o Conselho torna-se um mecanismo de pressão imobiliária e mais um órgão de gestão urbana, sobrecarregado de pendências que na maioria das vezes não são de sua alçada. Com um corpo de profissionais trabalhando de forma voluntária, auxiliando outras secretarias.

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Livro de Atas Livro de Atas n˚ 1 – Condephat Livro de Atas n˚ 2 - Condephat

Documentos diversos Ofício de Mauro Ferreira endereçado ao DEC em 1983, cobrando providências para a reativação Conselho. Argumentação sobre o Não-Tombamento da Sé Catedral de Franca. Arquivo Histórico Municipal „‟Capitão Hipólito Antônio Pinheiro‟‟

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Arquivo da Câmara Municipal de Franca Franca. Projeto de lei n˚ 14 de 01 de junho de 1981. Cria o Conselho de defesa do Patrimônio Histórico, Artístico e Turístico do Município de Franca. Franca, Projeto de lei n˚ 32/87 de 18 de maio de 1987. Modifica a redação do Artigo 4˚, da Lei n˚ 2.736/81 e dá outras providências.

Fontes Orais

Transcrições

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RIBEIRO, M. S. O prefeito e o Conselho. Franca, 11 jul. 2008.

SATURI, L. T. Condephat 1992-1994/ 2002-2004. Franca, 22 jul. 2008.

ANEXOS

Anexo A

Jornal Diário da Franca, 20 de junho de 1982, p. 3

Anexo B

Jornal Diário da Franca, 22 de junho de 1982. p. 9

Anexo C

Jornal Diário da Franca, 22 de junho de 1982. p. 5

Anexo D

Jornal Diário da Franca, 20 de junho de 1982. p. 5

Anexo E

Jornal Diário da Franca, 22 de junho de 1982. p. 6

Anexo F Câmara Municipal de Franca Estado de São Paulo

JOSÉ GRANZOTE, Presidente da Câmara Municipal de Franca, Estado de São Paulo, Faço saber que o Prefeito Municipal Sancionou nos têrmos do § 2˚ do artigo 30 e eu promulgo, nos têrmos do § 5˚ do artigo 30, ambos da Lei Orgânica dos Municípios, a seguinte Lei: - Lei N˚ 2.736, DE 03 DE AGOSTO DE 1981Cria o Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Artístico e Turístico do Município de Franca. Artigo 1˚ - Fica criado o Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Artístico e Turístico do Município de Franca. § único – O orgão ora criado fica subordinado ao Departamento de Educação e Cultura do Município. Artigo 2˚ - Compete ao Conselho a adoção de todas as medidas para a defesa do patrimônio histórico, artístico e turístico do Município, cuja conservação se imponha em razão de fato histórico, do seu valor folclórico, artístico, documental, turístico ou abiental (sic), bem como dos recantos paisagísticos e ecológicos que mereçam ser preservados. Artigo 3˚ - Caberá ao Conselho para a efetivação de suas finalidades: I – propor ao Prefeito Municipal o tombamento de móveis e imóveis previstos no artigo anterior, bem como solicitar a sua desapropriação quando tal medida se fizer necessária; II – celebrar convênios ou acordos com entidades, públicas ou particulares, visando à preservação do patrimônio municipal; III- propor a compra de bens móveis ou seu recebimento em doação; IV – sugerir a concessão de auxílio ou subvenção a entidades ou a particulares, que objetivem as mesmas finalidades do Conselho que conservam e protejam documentos, obras e locais de valor histórico, artístico ou turístico; V- ter a iniciativa de projetar e executar as obras de conservação e restauração de que necessitem os bens públicos ou particulares discriminados neste artigo; VI – cadastrar os bens tombados na forma da legislação vigente; VII – adotar outras providências previstas em regulamento. Artigo 4˚ - O Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Artístico e Turístico do Município compor-se-á de 9 (nove) membros de comprovada idoneidade moral e notórios conhecimentos relativos às finalidades do órgão, designados pelos seguintes orgãos: I – Departamento de Educação e Cultura, (dois membros); II- Curso de História, do Instituto de História e Serviço Social da UNESP, campus de Franca;

III – Câmara Municipal de Franca; IV – CONDEPHAAT de Estado de São Paulo; V – Faculdades de Arquitetura e Urbanismo da UNIFRAN; V - Instituto dos Arquitetos do Brasil, Departamento de São Paulo, núcleo de Ribeirão Preto; VII – Associação dos Engenheiros, Arquitetos e Agrônomos da Região de Franca; VIII – Cúria Diocesana de Franca. § 1˚ - O Presidente do Conselho será escolhido pelo Prefeito dentre os Conselheiros designados. § 2˚ - O Departamento de Educação e Cultura do Município e os orgãos e entidades discriminados neste artigo apresentarão ao Prefeito, sempre em lista tríplice, os nomes para escolha dos respectivos reperesentantes (sic). § 3˚ - Os membros do Conselho terão mandato de 2 (dois) anos, podendo ser reeleitos ou dispensados a qualquer momento, sendo suas atividades consideradas como relevantes serviços prestados ao município. § 4˚ - As deliberações do Conselho serão tomadas por maioria de votos, cabendo ao Presidente também o voto de desempate. Artigo 5˚ - O Departamento de Educação e Cultura do Município porá à disposição do Conselho o Pessoal Técnico e administrativo necessário ao seu funcionamento. Artigo 6˚ - O Conselho será sempre ouvido nos casos de alienabilidade e disponibilidade das obras Históricas ou Artística, bem como dos monumentos naturais, todos de propriedade do Município. § único – Aceito pela prefeitura Municipal o parecer do Conselho, toda e qualquer desapropriação deverá ser objeto de aprovação da Câmara Municipal, através de projeto de lei e iniciativa do Executivo. Artigo 7˚ - Os imóveis do Município, classificados como patrimônio artístico ou histórico, deverão abrigar, preferencialmente, museus da espécie, de caráter público. Artigo 8˚ - A organização e funcionamento do Conselho serão fixados em regulamento. Artigo 9˚ - O Poder Executivo expedirá o regulamento desta lei, dentro de 60 (sessenta) dias, contados a partir da data de sua publicação. Artigo 10˚ - Esta lei entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.

Franca, 03 de agosto de 1981. José Granzote Presidente

Anexo G

DECRETO N˚ 4.486, DE 21/SETEMBRO/1981 Dispõe sobre a regulamentação da Lei n˙ 2.736, de 03 de agosto de 1981. MAURÍCIO SANDOVAL RIBEIRO, Prefeito Municipal de Franca, Estado de São Paulo, no uso de suas atribuições legais,

DECRETA: CAPÍTULO I DO CONSELHO DE DEFESA DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO, ARTÍSTICO E TURÍSTICO DE FRANCA: Artigo 1˚ - Constitui o patrimônio histórico, artístico e turístico do município o conjunto de bens existentes em seu território, que pelo valor etnológico, histórico, artístico e paisagístico, fica sob a proteção do Poder Público, nos termos do artigo 180 e parágrafo único da Constituição Federal e 129 da Constituição Estadual. Artigo 2˚ - O Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Artístico e Turístico de Franca, de que trata a Lei n˚ 2.736/81, subordinado ao Departamento de Educação e Cultura, é o orgão que tem por objetivo proteger e preservar o patrimônio histórico, artístico e turístico do Município. CAPÍTULO II DA ORGANIZAÇÃO DO CONSELHO: Artigo 3˚ - O Conselho será constituído de 9 (nove) membros, escolhidos na forma indicada pela Lei 2.736, de 03/08/1981. Artigo 4˚ - O Conselho reunir-se-á, ordinariamente, uma vez por mês independente de convocação e extraordinariamente, quando convocada pelo Presidente para debater assunto urgente e inadiável. §

1˚ - O Conselho não poderá reunir-se a não ser com a presença de 50% mais um de seus membros e suas deliberações serão tomadas por maioria de votos, cabendo ao Presidente também o voto de qualidade.

§

2˚ - O Conselheiro que faltar a 3 (três) sessões consecutivas, sem justificativa aceita pelo Conselho, incorrerá na perda de mandato.

Artigo 5˚ - O Conselho tem as seguintes atribuições:

I – Propor às autoridades competentes o tombamento dos bens nele referidos, bem como solicitar a sua desapropriação quando tal medida se fizer necessário; II – sugerir e manifestar-se sobre convênios e acordos com entidades públicas e particulares, visando a preservação do patrimônio de que trata este artigo; III – propor a compra de bens móveis ou seu recebimento em doação; IV – sugerir a concessão de auxílio ou subvenções a entidades que objetivem as mesmas finalidades do Conselho, ou a particulares que conservem e protejam documentos, honras e locais de valor histórico, artístico ou turístico; V – projetar as obras e conservação e restauração de que necessitem os bens públicos ou particulares, discriminados neste artigo; VI – cadastrar os bens tombados na forma de legislação vigente; VII – adotar outras providências previstas em regulamento; VIII – elaborar seu Regimento Interno, encaminhado à direção do Departamento de Educação e Cultura para aprovação. Artigo 6˚ - Ao Presidente do Conselho compete: I – convocar e presidir as reuniões do Conselho; II – cumprir e fazer o Regimento Interno do Conselho; III – constituir, por proposta de 2/3 (dois terços) dos membros do Conselho, Grupos de Trabalho, de caráter temporário, para desenvolver estudos de natureza específica. IV – designar relatores para os assuntos ou processos em exame no Conselho; V – delegar poderes; VI – solicitar as providências dos orgãos competentes nos casos de correição destinada à defesa do patrimônio histórico, cultural e turístico do Município. Artigo 7˚ - As propostas do Conselho serão enviadas ao Diretor do Departamento de Educação e Cultura que decidirá o que estiver no âmbito de competência do Departamento ou encaminhará, com parecer circunstanciado, o que for de competência do Prefeito Municipal. CAPÍTULO III DO PROCESSO DE TOMBAMENTO: Artigo 8˚ - Os bens que compõem o patrimônio histórico, artístico e turístico do Município serão defendidos e preservação pelo processo de tombamento nos termos da legislação federal pertinente e na forma deste Decreto.

Artigo 9˚ - Os bens tombados não poderão ser demolidos, destruídos, mutilados ou alterados, nem sem prévia autorização do Conselho, reparados, pintados ou restaurados, sob pena de multa a ser imposta pelo mesmo Conselho de até 20% (vinte por cento) do respectivo valor, neste incluído o terreno, e se for o caso, sem prejuízo das demais sanções aplicáveis ao infrator. §

1˚ - Na hipótese de alienação onerosa dos bens referidos neste artigo, de propriedade de pessoas naturais ou jurídicas de direito privado, a União, o Estado e o Município, terão, nesta ordem, direito de preferência para aquisição, obdecido o processo estabelecido para a espécie, pelo Decreto-Lei Federal n˚ 25, de 30 de novembro de 1937.

§

2˚ - A alienação gratuita, a cessão de uso, a locação ou remoção de qualquer bem tombado deverá ser comunicada ao Conselho com a antecedência mínima de 30 (trinta) dias.

§

3˚- Os bens tombados, pertencentes ao Município, só poderão, ser alienados, ou transferidos de uma para outra dessas entidades, comunicado o fato ao Conselho.

§

4˚ - No caso de transferência da propriedade de bem imóvel tombado, inclusive por cessão “causa-mortis”, competirá ao serventuário do Registro de Imóveis competentes, efetuar, “ex-officio”, as respectivas averbações, das quais dará ciência ao Conselho.

§

5˚ - Os bens tombados ficam sujeitos à inspeção periódica do Conselho.

§

6˚ - Na hipótese de extravio ou furto de qualquer bem tombado o respectivo proprietário deverá comunicar a ocorrência ao Conselho dentro de 15 (quinze) dias, sob pena de multa de 20% (vinte por cento) do valor do bem.

Artigo 10 – Não poderá ser tombadas as obras de origem estrangeira pertencentes a representações diplomáticas ou consulares empresas estrangeiras, casas de comércio ou que também vindo do exterior para exposição ou certames. Artigo 11 – O proprietário que não dispuser de recurso para proceder a obras de conservação e reparação de que o bem tombado necessite, deverá comunicar a circunstância ao Conselho, que manifestar-se-á sugerindo providências cabíveis. §

1˚ - Omitindo-se o Conselho quanto às providências necessárias referidas no artigo anterior, assistirá ao proprietário o direito de pleitear o cancelamento do tombamento.

§

2˚ - O Conselho poderá projetar e indicar a execução de obras de conservação de bens tombados independentemente de comunicação ou anuência do proprietário, uma vez que comprovada a urgência das mesmas.

Artigo 12 – Nenhuma obra poderá ser executada na área compreendida num raio de 300,00 metros (trezentos), em torno de qualquer edificação ou sítio tombado, sem que o

respectivo projeto seja previamente aprovado pelo Conselho, para evitar prejuízo à visibilidade ou destaque do referido sítio ou edificação. Artigo 13 – Nenhuma obra – construções ou loteamentos ou instalação, de propaganda, painéis, dísticos, cartazes ou semelhantes – poderá ser autorizada ou aprovada em zonas declaradas de interesse turístico municipal ou na vizinhança de bens tombados, desde que contraírem padrões de ordem estética fixadas pela Prefeitura Municipal. §

1˚ - a fixação dos padrões referidos neste artigo será objeto de decreto, por proposta do Conselho.

§

2˚ - o estabelecimento de zonas de interesse turístico municipal far-se-á por decreto, na forma prevista no parágrafo anterior.

Artigo 14 – O Tombamento se efetiva por resolução do Prefeito Municipal, e posterior inscrição do bem tombado no livro próprio. Artigo 15 – Para o tombamento de bens móveis e imóveis, o Conselho manterá os seguintes Livros de Tombo: I – Livro do Tombo Etnográfico e Paisagístico; II – Livro do Tombo das Artes Aplicadas; III – Livro do Tombo das Artes; IV – Livro do Tombo das Artes Populares; V – Livro do Tombo Histórico; §

1˚ - No Livro do Tombo Etnográfico e Paisagístico serão inscritos os bens de valor etnográfico e os monumentos naturais paisagísticos;

§

2˚ - No Livro do Tombo das Artes Aplicadas as obras que se incluírem na categoria de Artes Aplicadas, nacionais ou estrangeiras de valor pictórico, escultórico e arquitetônico;

§

3˚ - No Livro do Tombo das Artes, as obras nacionais e estrangeiras;

§

4º - No Livro do Tombo das Artes Populares, os bens relacionados com as manifestações folclóricas, características de épocas e regiões do Município;

§

5˚ - No Livro do Tombo Histórico, os objetos de interesse histórico e as obras de arte histórica.

Artigo 16 – O Tombamento de bens pertencentes a pessoas naturais ou jurídicas de direito privado, inclusive ordens de instituições religiosas far-se-á voluntária ou compulsóriamente, e, no caso de bem imóvel, os atos respectivos serão averbados no Registro de Títulos e Documentos. Artigo 17 – O Tombamento de bens se inicia pela abertura do processo respectivo, por solicitação do interessado ou por deliberação do Conselho tomada “ex-pfficio”.

Parágrafo Único – a deliberação do Conselho ordenando o tombamento ou a simples abertura do processo, assegura a preservação do bem até a decisão final da autoridade, pelo que o fato será imediatamente comunicado à autoridade policial sob cuja jurisdição se encontra o bem em causa, para os devidos fins. Artigo 18 – Quando a iniciativa do tombamento de bens não partir de seus proprietários, serão estes notificados, para, se o quiserem, contestar a medida no prazo de 15 (quinze) dias. §

1˚ - Não ocorrendo contestação, será o tombamento submetido à aprovação do Prefeito Municipal, e uma vez publicada a resolução, imediatamente inscrito no Livro do Tombo;

§

2˚ - Contestada a proposta, o Conselho se manifestará encaminhando o processo à apreciação final do Prefeito.

§

3˚ - Da decisão do tombamento em que houve impugnação caberá recurso ao Prefeito Municipal.

Artigo 19 – O tombamento de bens pertencentes ao Estado ou a Município se fará compulsoriamente, comunicada, obrigatoriamente, a iniciativa da medida ao órgão interessado. Artigo 20 – Serão sumariamente arquivadas as propostas de tombamento que não sejam devidamente instruídas e justificadas. Artigo 21 – A abertura de processo de tombamento, quando da iniciativa do proprietário, ou a notificação deste nos demais casos, susta, desde logo, qualquer projeto ou obra que importe em mutilação, modificação ou destruição dos bens em exame. Artigo 22 – Para as transformações das obrigações impostas por este decreto, para as quais não será prevista penalidade específica, o Conselho poderá aplicar multas no valor de 01 (um) a 20% (vinte por cento) do bem tombado, sem prejuízo de eventual apuração de responsabilidade funcional, criminal ou civil. Artigo 23 – O Conselho divulgará, anualmente atualizada, a relação dos bens tombados do Município. Artigo 24 – Os bens tombados na área do Município pela Diretoria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, e pelo Conselho de Preservação do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado serão inscritos nos Livros do Tombo respectivos, a fim de se beneficiarem com obras e iniciativas do Conselho, respeitada a legislação Federal aplicável á espécie. CAPÍTULO IV DAS DISPOSIÇÕES GERAIS: Artigo 25 – O Conselho poderá articular, mediante convênios, se for o caso, com a Diretoria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional e do CONDEPHAAT do Estado, visando a:

I – Atividade conjunta na consecução dos objetivos do Conselho; II – Formação de profissionais especializados em conservação e técnicas de proteção a obras de pinturas, restauração e torêutica, reparação e restauração de obras de arquitetura, pesquisa e organização de monumentos e outras técnicas necessárias ao exercício de suas atribuições; III – Controle do comércio de obras de arte antiga e uniformização de taxas e multas. Artigo 26 – Poderá o Conselho organizar cursos de assistência técnica, seminários, conferencias, bem como emitir pareceres, e laudos a requerimento do interessado, cobrando taxas e emolumentos, anualmente fixados em decreto. Artigo 27 – O Departamento de Educação e Cultura, na forma da lei, providenciará os serviços de apoio técnico-administrativos necessários ao funcionamento do Conselho. Artigo 28 – Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.

PREFEITURA MUNICIPAL DE FRANCA Em 21 de setembro de 1981. O PREFEITO MUNICIPAL MAURÍCIO SANDOVAL RIBEIRO

Anexo H

Fonte: Jornal Comércio da Franca, 10 de julho de 1982. p.7

Anexo I

Jornal Diário da Franca, 1 de julho de 1982, p. 1

Anexo J

Jornal Comércio da Franca, 8 de julho de 1982. p. 1

Anexo K Relação dos bens tombados pelo Condephat-Franca 1- Estação elevatória de água bruta do Sistema São João. Lei Complentar n˚ 09/1996. 2- Fossas Sépticas. Lei Complentar n˚ 09/1996. 3- Antigo Colégio Champagnat. Decreto n˚ 7.420 de 11/08/1997. 4- Antiga Estação Ferroviária. Decreto n˚ 7.420 de 11/08/1997. 5- Museu Histórico “José Chiachiri”. Decreto n˚ 7.420 de 11/08/1997. 6- Antigo Colégio N. S. de Lourdes. Decreto n˚ 7.420 de 11/08/1997. 7- Jardim Zoobotânico. Decreto n˚ 7.509 de 20/03/1998 8- Cadeia Pública. Decreto n˚ 7.686 de 15/09/1999. 9- Relógio do Sol. Decreto n˚ 7.686 de 15/09/1999. 10- Dois bebedouros de animais. Decreto n˚ 8.015 de 16/04/2002. 11- Remanescente da Capela de Santa Cruz. Decreto n˚ 8.015 de 16/04/2002. 12- Duas residências geminadas da Cia. Mogiana. Decreto n˚ 8.015 de 16/04/2002. 13- Escola Estadual de 1˚ grau “Coronel Francisco Martins”. Decreto Estadual n˚ 13.426 de 16/03/1979 e Notificação de 07/08/2002. 14- Ginásio Clube dos Bagres. Decreto n˚ 8.161 de 10/03/2003. 15- Frontão do Estádio “Coronel Nhô Chico”. Decreto n˚ 8.182 de 12/05/2003. 16- Postes da antiga CPFL (atrás Igreja Sto. Antonio). Decreto n˚ 8.021 de 2004 17- Acervo do Arquivo Histórico Municipal “Capitão Hipólito Antonio Pinheiro”. Decreto n˚ 8.563 de 25/10/2005. 18- Banco Commercial de Franca. Decreto n˚ 8.726 de 22/08/2006. 19- Frontão do Estádio Palmeiras Futebol Clube. Decreto n˚ 8.729 de 28/08/2006. 20- Casa do Pintor Bonaventura Cariolato. Decreto n˚ 8.783 de 18/12/2006. 21- Coreto da Praça Sabino Loureiro. Decreto n˚ 9.133 de 26/08/2008.

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