A \"Primavera brasileira\": Sobre a possibilidade de uma cartografia das redes sociais

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A “PRIMAVERA BRASILEIRA”: SOBRE A POSSIBILIDADE DE UMA  CARTOGRAFIA DAS REDES SOCIAIS      Resumo:  Embora  não  haja  modelos  definitivos  para  a  análise  das  redes  e,  mais  especificamente  das  redes  sociais,  a  cartografia  parece  um  caminho  viável  para  compreender  as  formas  como  os  usuários  se  relacionam.  No  que  se  refere  às  mobilizações  sociais  nesta  segunda  década  do  século  XXI,  as  redes  sociais  desempenham  um  importante  papel  no  que  tange  à  esfera  pública.  O  presente  artigo  visa  articular  e  discutir  esta  questões  trazendo  para  isso  dados  da  chamada  “Primavera  Brasileira”,  ocorrida  em  junho  de  2013  e  representações  cartográficas  desenvolvidas  pelo  Laboratório  de  Estudos  sobre  Imagem  e  Cibercultura  (LABIC).    Palavras­chave:​  redes sociais, cartografia, primaveras, esfera pública.    Introdução    Metáforas  espaciais  são  aplicadas  aos  ambientes  digitais  desde  o  seu  surgimento.   Efetivamente,  organizar  o  ciberespaço  a  partir  de  parâmetros  físicos  ajuda  a  orientar  desenvolvedores,  usuários  e  mesmo  a  análise  teórica  dos  fenômenos  desencadeados  nos  espaços  virtuais.  É  neste  sentido  que  se  aplica  o  termo  navegação  às  formas  de circulação na  internet.  A  noção  geral  de  fluxo  multidirecional  é,  talvez,  uma  das  suas  características  mais  consolidadas.  Considerando­se  a  metáfora  espacial  como  válida,  é  possível  então  traçar  mapas,  indicações  dos  fluxo,  que   apontem  os  locais  por  onde  os usuários individualmente ou  usuários  conjuntamente   circulem.  Estes locais são, na verdade, conteúdos  digitais aos quais os  usuários têm acesso – em outras palavras, nós (no sentido de pontos nodais) da rede.  Castells  (1999,  p.  26),  ao  conceituar  sociedade  em  rede,  compara  a  estruturação  da  internet  às  táticas  maoístas  de  dispersão  das  forças  de  guerrilha  por  um  vasto  território.  A  arquitetura  em  rede faz com que conteúdos sejam distribuídos por diferentes dispositivos, sem  centralização  ou  orientação  dos  fluxos.  Isso  não  significa,  contudo,  que  não  haja  nós  na  rede  que  sejam  mais  relevantes  do  que  outros,  isto  é,  pontos  de  onde  mais  fluxos  de  informação  partem  e  para  onde  confluem  ou  mesmo  usuários  mais  relevantes  do  que  outros  em  determinado(s)  sistema(s)  de  rede(s).  As  geografias  físicas,  os  mapas  físicos  de   países  e  continentes,  perdem  relevância  ou  são  ressignificados  diante  destes  fluxos.  Identidades  e  interesses  se  reestruturam  na  lógica  da rede. A este respeito o próprio Castells indica que uma 

revolução  tecnológica  centrada  nas  tecnologias  da  informação  está  remodelando  a  base  material (Ibidem, p. 20). Mais de  dez anos depois do texto de Castells, esta revolução  pode ser  percebida  com  mais  clareza,  tanto  no  âmbito  da  produção  material,  quanto  no  da  produção  simbólica  e  nos  arranjos  das  sociedades  contemporâneas  conectadas  por dispositivos digitais,  por  assim  dizer.  Nas palavras do autor: “A comunicação simbólica entre  os seres humanos  e o  relacionamento  entre  esses  e  a  natureza  com  base  na  produção  (e  o  seu  complemento,  o  consumo), experiência e poder, cristalizam­se ao longo da história em territórios  específicos, e  assim geram culturas e identidades coletivas” (Ibidem, p. 33).     Castells  não  se  aprofunda  nestes  territórios,  contudo,  com  a  expansão  das  redes  digitais  eles  parecem  se  tornar  menos  físicos.  Produção,  experiência  e   poder  se  dão  em  espaços  cada  vez  mais  virtuais,  de  modo  que  culturas  e  identidades  coletivas  pertencem  e  se  relacionam  a  esses  “novos”1  territórios.  Mais  a  diante,  ele  afirma que as novas tecnologias da  informação  estão  integrando  o  mundo  em  redes  globais  instrumentalizadas  (Ibidem,  p.  38):   “A  comunicação  mediada  por computadores gera uma gama enorme de comunidades virtuais.  Mas  a  tendência  social  e  política,  característica  da  década de 90 é a construção da ação social  e  das políticas em torno das identidades primárias”. Note­se bem que, quando isto é escrito, as  relações  sociais  via   internet  ainda  estavam  distantes  da  forma  que  tomariam  com  as  redes  sociais  digitais.  De  fato,  a  vocação  para  o debate público aparece desde os primórdios da fase  comercial  da  web, isto é, da sua instalação em massa em empresas e residências. Primeiro isto  acontece  através  de  fóruns  e  listas  de  e­mails  e,  posteriormente,   nas  próprias  redes  sociais.  Sendo  identidade  entendida  como  o  processo  através  do  qual  o  ator  social  se  reconhece  e  constrói  significado  com  base  em  determinado  atributo  cultural  ou  conjunto  de  atributos  (Ibidem).  Neste  sentido,  as  identidades  culturais  deixam  de  se  relacionar  a  características  específicas  dos  locais  físicos,   como  por  exemplo  a  nacionalidade,  e   passa  a  se  relacionar  a  pertencimento 2. 

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Usamos a palavra novos aspeada, como forma de indicar que a novidade dos espaços virtuais é, de alguma  forma, relativa, relacionada muito mais à forma como os sujeitos lidam com estes espaços, do que com seu  tempo de existência efetivo.  Para esclarecer melhor este ponto, utilizaremos o caso das manifestações realizadas em na Internet contra a  legislação anti­gay na Rússia, em vigor desde o início de 2013. Há, na sociedade contemporânea um conceito  geral de que os interesses vinculados à identidade e adesão à causa gay sejam supranacionais, de modo que há  solidariedade e repúdio às leis russas, por exemplo, partindo­se do pressuposto de que as manifestações  individuais e coletivas realizadas na web e nas ruas poderiam pressionar uma tomada de posição de governos  que mantém relações diplomáticas com o país.   

Em  função  disso,  aquilo  que  Habermas  (1984) chama de esfera pública se desloca dos  espaços  físicos  para  os  virtuais.  O  termo  físico  ou  material  é  muito importante aqui, uma vez  que  é  relativamente  comum  ver  o  virtual  ser  contraposto  com  o  real,  como  se  houvesse  irrealidade  no  virtual.  Pelo  contrário,  o  virtual  é  real  para  os  sujeitos  que  o  operam,  as  informações  que  nele  circulam  e  as  relações  nele estabelecidas existem efetivamente dentro e  fora  dos  suportes  digitais,  com  consequências  sentidas  na  vida  íntima  dos  sujeitos,  nas  dinâmicas sociais e produtivas das sociedades contemporâneas e na política.  A  esfera  pública  conforme  Habermas  a  define  faz  parte  de  uma  construção  histórico­social  na  qual  público  e  privado  são  tratados  em  termos  de  oposição,  sendo  o  primeiro  o que requer publicidade, ​ que necessita de um público para se constituir, e  o  segundo  o  que  é  íntimo,  secreto.  As  origens  desta  distinção  remontam  à  antiguidade  clássica.  Para  o  autor,  na  Grécia  antiga  esfera  privada  (​ oikos​ )  e  esfera  pública  (​ polis​ )  se  distinguem.  Note­se  que,  tomada  em  termos  literais,  esta  distinção  é  espacial.  A  esfera  pública  é  onde  se  ganha  notoriedade  ou  visibilidade  através  da  conversação  ou  antes  conversações.  Nas  palavras  do  autor  são  públicos  “certos  eventos  quando  eles, em contraposição às ​ sociedades fechadas, são  acessíveis  a  qualquer  um.”  (Ibidem,  p.  14).  Ora,  não  é  a  internet  espaço  onde certos eventos  se tornam acessíveis “a qualquer um”3?   No final do século XVIII, a esfera pública aparece eminentemente como esfera pública  literária.  A  família  burguesa  passa  a  abrir  espaço  para  a  discussão  no  âmbito  das  suas  residências  o  que  se   estende  aos  salões e cafés4. Neste momento as cortes vão deixando de ter  a  centralização  da  esfera  pública,  assumindo  a  cidade  (​ polis​ )  esta  função5.  Da  esfera  pública  literária  provém  a  esfera  pública  política  (Ibidem,  p.  46).  A   partir  do  século  XVIII  a  esfera  pública  se  torna  central no âmbito da política, contribuindo com a organização dos Estados de  direito  burgueses.  Na  sequência,  os  processos  eleitorais  ampliam  a  noção  de  participação  e 

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Há de se relativizar aqui o termo “qualquer um”. A internet permite que os conteúdos sejam tão acessíveis  quanto desejarem os usuários através das estratégias de divulgação e configurações de privacidade escolhidas  por eles. Contudo, isto não impede que outros usuários se apropriem destes conteúdos e os façam circular, daí  partirmos do pressuposto que há publicidade na rede.  Habermas (1984, p. 52) observa: “Não que se deva crer que, com os cafés, os salões e as associações tal  concepção de ‘público’ tenha sido efetivamente concretizada; mas, com eles, ela foi institucionalizada enquanto  idéia e, com isso, colocada como reivindicação objetiva e, nessa medida, ainda que não tenha se tornada  realidade foi, no entanto, eficaz”.  Ainda nas palavras do autor (Ibidem, p. 47­8): “a preponderância da ‘cidade’ é assegurada por aquelas novas  instituições que, em toda a sua diversidade, assumem na Inglaterra e na França funções sociais semelhantes: os  cafés... e os salões... são centros de uma crítica inicialmente literária e, depois, também política”. 

esfera  pública.  Contudo,  não   há  na  expansão  desta  participação  uma  superação  das  bases  da  sociedade de classes:  A  expansão  dos  direitos  de  igualdade política  para  todas  as  classes sociais ocorreu no  âmbito  desta  mesma   sociedade  de  classes.  A  esfera  pública  “ampliada”  não  levou  fundamentalmente  à   superação  daquela  base,   sobre  a  qual  o  público  das  pessoas  privadas  tinha  inicialmente  tencionado  algo  como   a  soberania  da  opinião  pública  (Ibidem, p. 155).  

 

O  público  cresce   através  da  imprensa  e  os conflitos, antes presentes na esfera privada,  passam  à  pública,  sendo  mediados  pelo  Estado.  Em  adição,  a  camada  culta  perde  a  sensação  de  “que  ela  tinha  uma  missão  a  cumprir  na  sociedade”  (Ibidem,  p.  206).   Com isso,  a minoria  de  especialistas  ou  bem  formados  que  a  camada  culta  representa  passa  a  se  sentir  “isolada  entre as camadas incultas da burguesia que dela não mais necessitava” (Ibidem, p. 158).  Não  cabe  aqui   entrar  com  profundidade  no  argumento  habermasiano,  mas  apenas  tentar  compreender  como  esta lógica se estende à internet. Em primeiro lugar há, na fase atual  da  web,  uma  indistinção   entre  público  e  privado.  Em  segundo,  lugar  os  especialistas  perdem  gradualmente  (tanto  em  função  desta  indistinção,  quanto  da  circulação  de  informações)  seu  espaço  tradicional  e,  grande  surpresa,  as  “camadas  incultas”  ganham  voz  de  uma  forma  que  nunca  tiveram,  nem  na  pólis, nem nos saraus literários e nem na mídia de massa. Outra crítica  do  autor  que parece se aplicar à internet contemporânea, por assim dizer, é a despolitização da  esfera pública na cultura de consumo:    No  âmbito  da  assim  chamada  cultura  do  consumo  é  que  a   ideologia  se  ajeita  e  preenche,  ao  mesmo  tempo,  nos  níveis  mais  profundos  da  consciência,  a  sua  antiga  função,  ou  seja,  a  coerção  ao   conformismo  com  as  relações  vigentes.   Essa  falta   de  consciência  não  consiste  mais,  como   ideologia  política  do  século  XIX,  num  sistema  em  si  coerente  de  concepções,  mas  um  sistema  de  modos de  comportamento (Ibidem,   p. 252). 

 

A  opinião  pública,  neste   argumento  tornada  acrítica,  configura­se  como  reação  desforme  da  massa,  eventualmente,  conduzida  por  interesses  que  não   se  pautem  ou  atendam  ao  bem  comum6  A  sensação  geral  de  despolitização  de  que  trata  Habermas  aparece  num  discurso  recorrente  sobre  a  despolitização  dos  usuários da web, em especial das redes sociais.  O  senso  comum  sobre  os  usuários  das redes parece reverberar a noção habermasiana de que a  esfera  pública  burguesa  se  fragiliza  diante  da  economia  capitalista  e  dos  meios  de 

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Cabe questionar o que é bem comum e se a esfera pública, conforme conceituada, atende ao bem comum.  Dentro desde mesmo questionamento cabe refletir sobre estes interesses e mesmo se há interesses de fato ou se  estes também pertencem, e isto fica mais evidente na internet, ao fluxo dos acontecimentos, diálogos e  informações que circulam e se cristalizam na e através da esfera pública​ . 

comunicação  de   massa.  A  despolitização  percebida  nas  redes  sociais  seria  então  reflexo  do  esfacelamento   gradual  da  esfera  pública.  Sintoma  e,  pensando­se em termos de comunicação,  causa deste mesmo fenômeno.  Na  internet  esta  lógica  se  torna  mais  profunda,  considerando­se  que  Habermas  participa  da  discussão  proposta   por  Marcuse sobre a institucionalização da razão  instrumental  na  organização  do  Estado  burocrático.   ​ Habermas   destaca  o  argumento  de  Marcuse  sobre  a  perda  do  caráter  explorador  e  opressor  da  dominação  nas  sociedades  capitalistas  industriais  avançadas  (MARCUSE,  1982).  Este  argumento  condiz,  em  última  instância  com  uma  ideologia  de  fundo  tecnocrático,  na qual as questões políticas se resolvem através da técnica e  não  mais  através  do  diálogo,  distendido  na  forma  de  negociação  e  luta.  As   mídias  digitais  e,  mais  especificamente,  a  internet  aparecem   então  como  argumento  técnico  definitivo.  Tudo  é  possível  através  da  digitalização  e  tudo  circula  na  rede.  Na  defesa  futurista  utópica  isto  soa  mais  relevante  do  que  a  forma  como  os  conteúdos  são  apropriados  e  a  crítica  que  se  tece  a  partir  deles.  A  internet  se  torna  ao  mesmo  tempo  o  argumento  tecnocrático  e  mídia  por onde  este  mesmo  argumento   circula.  No  pensamento  habermasiano  não  se  deve   identificar  emancipação   humana  e  política  ao  progresso  técnico;  este,  por  si  só,  não  conduz  à  emancipação   humana.  A  técnica  que  liberta  da  natureza,  não  liberta da opressão, que aparece  na forma de controle tecnológico.  Noção  semelhante  aparece  em  Arendt  (2007)  quando  ela  fala  da  perda  do  espaço  público  como  local  privilegiado  da  prática  da  democracia  e  da  degeneração  (e  aqui  empregamos  este  termo  deliberadamente)  do  homem  de  criatura  política  para  ​ Homo  faber  e  depois  para  ​ Animal  laborans​ .  A  ação  se  exerce  entre  os  homens  sem  a  mediação  de  instrumentos,  é,  ​ lato  sensu​ ,  a  condição  política  (​ bios politikos​ ).  A liberdade dos indivíduos se  encontra  exatamente  aí.  É  nos  organismos  políticos  que  o  homem  cria  coisas  novas  e  se  imortaliza.  O  trabalho  é  ação  do  ​ Homo  faber  e  remete  ao  artificialismo  da  existência.  Substituem­se  os  ciclos  naturais  por  artefatos,  criando  um  mundo  distinto  e  mesmo  apartado  do  natural,  um  mundo  da  técnica,  para  retomar  ao  termo  utilizado  por  Habermas  e  Marcuse,  um  mundo  dos  artefatos  digitais  e  da   internet.  Cabe  questionar  se  a  internet  permite  que  a  condição política seja largamente exercida.  Tanto  o  argumento  de  Habermas  quanto  o  de  Arendt  parecem  convergir  para  o  fenômeno  contemporâneo  –  ou  que  se  torna  mais  visível  contemporaneamente  –  de  fusão  entre  vida  pública  e  privada  através  da  internet  e,  sendo  ainda  mais  específico,  através  das 

redes  sociais.  A  internet,  ainda  na  época  dos  fóruns  e  listas  de  discussões,  mantinha  um  caráter   mais  formal ou institucional. O texto de Habermas sobre os anos 90 indica isso. Há até  o  início  dos  anos 2000, uma distinção entre público e privado na internet, aqui grosseiramente  representada  pela  distinção  entre  os  fóruns,  listas  e  chats  de  caráter  institucional e aqueles de  caráter   pessoal.  Esta  divisão,  resquício  da  origem  militar  e  acadêmica  da  rede  (e  mesmo  esta  linha  divisória  que  estabelecemos  aqui  é, de certa maneira, arbitrária e imprecisa), esfacela­se  com  a  web  2.07,  com  as  ferramentas  de  autoração  e  publicação.  Esta  distinção  é  marcada  particularmente  a  partir  dos  blogs,  que  de  diários  pessoais se convertem em  relevantes nós na  rede,  e  das  das  redes  sociais,  casos  em  que  subverte­se a distinção inicial entre institucional e  pessoal na rede.    Primavera, origens e cartografia geral dos acontecimentos     Real  e  virtual  nos processos políticos se completam, aliás como em todas as esferas da  vida  dos  sujeitos  atualmente.  Nestas   primeiras  décadas  do  século  XXI  tem  havido  uma  ubiquação  entre  estes  espaços  antes  considerados  antagônicos.  Quando  as  mídias  digitais  começam  a  ser utilizados em larga escala entre finais dos anos 80 e ao longo dos anos 90, elas  são  apropriadas  pelos  sujeitos  como  um  “outro”,  dispositivos  alienígenas  recém  chegados  ao  cotidiano,  o  que  inaugura  o  discurso  do  antagonismo.  Em  pouco  tempo,  contudo,  estes  dispositivos  se  naturalizam  e  os  sujeitos  que  nasceram  da  última  década  em  diante,  pelo  menos  nas  metrópoles  do  mundo  ocidental,  não  terão  vivido  sem  alguma  forma  de  acesso  a  dispositivos  digitais  e,  por  extensão  à  web.  Não  há  então  como  separar  estas  mídias  das  experiências  dos  sujeitos,  de  modo  que  a  vivência  política  passa  cada  vez  mais  pelo  digital,  estando  ou  não  estruturada  por  ações  de ciberativismo, termo que implica  em ação consciente  e sistemática.  As  dimensões  desta  articulação  são  novas  e  no  mundo  inteiro  acontecem  fenômenos  semelhantes,  pelo  menos   desde  a  o  início  do  movimento  “Marcha  das  Vadias”  e  “Occupy  Wall  Street”,   depois  generalizado  como  “Occupy”,  que  saem   às  ruas  respectivamente  em  11  de  abril  de  2011,  em  Toronto,  e  em 17 de Setembro de 2011, em Nova Iorque. Ambas podem  ser  consideradas  as  primeiras  de  uma  série  de  ocupações  pontuais  em  espaços  públicos  ao  redor  do  mundo.  Em  comum  entre  estes  dois  movimentos está a articulação via redes sociais,  7

Segunda fase de uso da rede, marcada pelas ferramentas de busca e redes sociais. 

levada  às  ruas  por  organizadores  independentes  e  não  necessariamente  vinculados  a  partidos  políticos  (este  ponto  aparece  com  muita  clareza  em  determinado  momento  da  Primavera  Brasileira8).  Em  termos  de  temática,  o  descontentamento  com  o  regime  sócio­econômico  aparece em ambos: no primeiro, como oposição de mulheres e homens à heteronormatividade,  misoginia  e  opressão  contra  as   mulheres;  no  segundo  como  oposição  ao poder econômico do  capital.  Nos  dois  casos  aparece  o  apelo  à  cidadania  e  às  liberdades  civis  individuais  (o  que  remonta  os  movimentos  de  direitos  civis  nas  décadas  de  60  e  70,  evocados  em  termos  de  discurso  e  iconografia  tanto  na  rede  quanto  nas  ruas)  e  à  reordenação  de  um  sistema  político  econômico que provoca exclusão, violência e que parece insustentável.  Ambos  os  movimentos  se  tornaram  mundialmente  conhecidos  via  redes  sociais  digitais,  especialmente  a  Marcha  das  Vadias,  que  tem  recebido  menor  atenção  das  mídias  tradicionais9.  Facebook  e  Twitter  têm  sido  catalizadores  deste  movimentos.  Em  função  das  redes  sociais,  diversas  Marchas  das  Vadias  e  Occupy  foram  e  tem  sido  organizadas  ao  redor  do  mundo,  especialmente  via  Facebook,  plataforma  que  apresenta  mais  funcionalidades  em  relação a troca de conteúdos, discussão e agendamento de eventos.   A  Primavera  Árabe10  se  refere  diretamente  às  liberdades  individuais  e  ao  direto  à  comunicação,  mais  especificamente  ao  direito  de  uso  da  internet.  Neste  sentido  o  termo  Primavera  se  refere  às  liberdades  individuais.  Foi  a  proibição  de  acesso  aos  meios  de  comunicação  em  28  de  janeiro  de  2011  e  a  necessidade  de  buscar  informações  ​ vis  a  vis  (conforme  Habermas)  que  levou  muitos  egípcios  às ruas e mobilizou pessoas dentro e fora do  país.  Posteriormente,  em  Damasco,  situação  semelhante  aconteceu  em  03  junho  de  2011 

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Mais a frente se verá uma discussão sobre o termo. Contudo, tal movimento também é conhecido – numa  nomeclatura que julgamos mais adequada – como Jornadas de Junho.  No Brasil, a Marcha das Vadias foi alvo de cobertura midiática por ocasião de um protesto realizado durante a  visita do Papa Francisco ao Rio de Janeiro em julho de 2013, muito mais por manifestantes (segundo os  organizadores da Marcha estes não teriam nenhuma vinculação direta com o grupo, aparecendo  espontaneamente) que quebraram imagens sacras do que pelas causas do movimento em si.  O nome Primavera Árabe evoca a Primavera de Praga em 1968 e se refere ao conjunto de mobilizações  populares ocorridos no Oriente Médio e Norte da África a partir de Dezembro de 2010, quando um jovem  tunisiano ateou fogo ao próprio corpo como forma de protesto contra às condições de vida em seu país. Em  função deste ato, manifestações ocorreram na Tunísia, culminando com a fuga do presidente Zine El­Abdine  Ben Ali, para a Arábia Saudita. Com o sucesso da empreitada tunisiana, revoltas eclodiram na Argélia, Jordânia,  Egito, Iêmen, Líbia e Síria, entre outros países. Como resultados parciais, além da fuga do presidente tunisiano,  houve a renúncia do presidente do Egito, Hosni Mubarak em fevereiro de 2011 após 18 dias de protesto,  renúncia do governo da Jordância e a morte do presidente da líbia, Muammar al­Gaddafi, além de indicações do  presidente do Iêmem, Ali Abdullah Saleh, Sudão, Omar al­Bashir, e do premiê iraquiano, Nouri al­Maliki, de  que não concorreriam a reeleições. Em comum entre todas as manifestações está o papel da internet e, mais  especificamente, das redes sociais, em viabilizar as mobilizações e permitir a circulação de informações dentro e  fora destes países. 

quando  o  governo  Sírio  proibiu  acesso  à  internet  por  24h,  na  tentativa  de  coibir  as  manifestações me massa.  Especificamente  em  relação  ao  Egito,  Wael  Ghonim,  jovem  executivo  do  Google  preso  por  um  breve  período  durante  as  manifestações, proferiu a seguinte frase “Se você quer  uma  sociedade  livre,  basta  lhe  dar  acesso  à  internet”11.  Neste  país,  parte  do  levante  ou  sua  exacerbação  ocorreu  em  função  da  proibição   do   então  presidente  Hosni  Mubarak  de  interromper  as  comunicações  via  internet e redes de telefonia móvel12. A mobilização popular  ganhou  vulto  a  partir  deste  momento  e  a  ​ comunidade  internacional,  entendida  aqui  como  governos  e  pessoas  isoladamente,  reagiu  demonstrando  solidariedade  apoio,  criando   estratégias  de  disseminação  dos  conteúdos  produzidos  no  Egito  e  fora  dele.  Neste  momento  fica  claro  que  a  internet  começa  a  ser  percebida,  pelo  menos  no  senso  comum,  como  plataforma  privilegiada  de  disseminação  da  informação.  Se  antes o ciberativismo era acusado  de  ineficiência,  agora  as  ações  via  web  ganham  ares  de  relevância,  de  catalização  de  mudanças  sociais,  trazendo  à  tona  conteúdos  que  estavam  sendo  mantidos  ocultos em função  de interesses particulares e / ou escusos.  Houve,  em  relação  à  Primavera  Árabe,  o  estabelecimento  de  um  senso  de  identidade,  como  se  sujeitos  e  grupos  ao  redor do mundo – leia­se centros urbanos, com algum degrau de   ocidentalização,  conectados  via web – compartilhassem as  pautas e  objetivos dos movimentos  de  cada país, que iam desde questões pontuais –  como a defesa de direitos urbanos, manifesto  pelos  que  defendiam  o  parque  Gezi  na  Turquia  –,  ou  mais  genéricos  –  como  o  combate  ao  capitalismo,  corporificado  através  do  uso  das  máscaras  de  Guy  Fawkes,  personagem  do  HQ  “V  de  Vingança,”  imagem  que  aparece  desde  o  Ocuppy  Wall  Street.  Essa  noção  geral  de  interesses  comuns,  ou  antes  de  uma   luta  em  comum,  antecede  as  manifestações  desta  virada  da  primeira  para  a  segunda  década  do  século  XXI.  Ao  convocar  os  operários  do  mundo  à  união, Marx, sugere que há objetivos comuns nas lutas operárias de finais do século XIX. Esta  noção  de  união,  em  última  instância  perpassada  por  uma  ideia  de  humanismo  que  remonta  o  iluminismo  (outro  movimento,  a  seu  tempo,  de  caráter  global),  permeia,  grosso  modo,  os  movimentos  minoritários  ou  de  esquerda.  Sem  entrar  em  detalhes  sobre  como  este  senso  de  11

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Esta frase aparece em artigo de Navid Hassanpour para o Le Monde Diplomatique. Disponível em:  http://www.diplomatique.org.br/print.php?tipo=ar&id=1114   Na sequência dos acontecimentos, as próprias empresas de serviço de web criaram soluções de acesso burlando  as proibições. A Google, ofereceu uma forma de acesso ao Twitter pelo telefone e a SayNow, especializada em  plataformas de voz elaborou um mecanismo para que mensagens sonoras enviadas via celular fossem  convertidas em em mensagens de texto e postadas sob a hashtag #egypt.  

identidade  chega  aos  dias  de  hoje,  podemos  afirmar  que  na  rede  ele  ganha  velocidade  e  proporções  inéditas,  reforçado  pela  noção  de  Aldeia  Global  e  esta, por sua vez, embastada na  crença  que  ganha  notoriedade  a partir dos anos 90 com as discussões sobre meio ambiente, de  que  somos,  mesmo  em  diferentes  países,  responsáveis  uns  pelos  outros  e  pelos  biomas,  sistemas, econômicos e sociais que habitamos.  De  2012  até  os  protestos  acontecidos  em  julho  de  2013,  houve  uma  série  de  acontecimentos,   ainda  no  âmbito  estritamente  digital,  significativos  para  se  perceber  formas  mais  engajadas  de  uso  das  redes  sociais pelos brasileiros. Muito espontaneamente os usuários  passam  a  explorar   um  espaço  de  comunicação  privado  para  tratar  de  questões públicas, antes  pertencentes  à  ​ polis​ .  Estabelecendo  um  recorte,  de  certa  forma  arbitrário  para  os  eventos  sócio­políticos  que  ganharam  relevância  nas  redes  sociais,  temos  que  em  maio  2011,  um  agendamento  via  Facabook  levou  às  ruas  o  “Churrasco  de  Gente  Diferenciada”, uma ironia à  oposição  de  um  grupo  de  moradoras  do  bairro  de  Higienópolis em São Paulo à construção de  uma estação de metrô na avenida Angélica, uma das regiões mais valorizadas da capital.   Em  Janeiro  de  2012  circulara  no  Facebook  e  Twitter  (sob  a  hashtag  #somostodospinheirinho)  manifestações  de  apoio  e  cobranças  de  posicionamento  do  governo  de  São  Paulo  sobre  o  despejo  violento   de  moradores  da  favela  Pinheirinho,  localizada  na  capital  paulistana.   Em  novembro  do  mesmo  ano,  surge  no Facebook um movimento de apoio  ao  povo  Guarani­Kaiowá,  ocasião  em  que,  para  mostrar  adesão  e  identidade  (termo  que  insistiremos  em  utilizar  aqui),  usuários  da   rede  adicionam  ​ o  nome  do  povo  indígena  ao  seu  próprio  sobrenome  no  perfil  desta  rede.  Em  abril  de  2013  as  redes  sociais  brasileiras  são  invadidas  por  memes13  ironizando  o  elevado  preço  do tomate, indício do aumento da inflação  no  país.  Isso  sem  contar  com  o movimento “Feliciano não me representa”, iniciado em março  de  2013  quando  o  deputado  Marco  Feliciano  (PSC­SP),  conhecido  por  declarações  homofóbicas,  racistas  e  contra  religiões  de  origem africana, foi  eleito presidente da Comissão  de  Direitos  Humanos  e  Minorias  da  Câmara  dos  Deputados,  processo  que  culmina  (embora  não  se  encerre)  com  a  saída  do  Deputado  da  Comissão  em  agosto  de  2013,  catalizada  pela  Primavera Brasileira14.  13

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Unidade mínima de conteúdo (geralmente uma imagem ou ​ gif​  animado) passível de replicação na web. Costuma  ser associado à comicidade e ironia.  Também merece destaque a adesão de brasileiros à campanha contra o apedrejamento da iraniana Sakineh,  acusada de trair o marido, que envolveu ativistas de todo o mundo. Em 2010 criou­se a campanha “liga Lula”,  para que o então presidente intercedesse junto ao presidente iraniano Mohammed Armadinejad, Embora tenha  rejeitado à princípio, Lula acaba oferecendo asilo à mulher, proposta rejeitada pelo Irã. Contudo, em função da 

Logo  no  início  de  2013,  o  recém­empossado  prefeito  de São Paulo, Fernando Haddad  anunciou  o  aumento  das  tarifas  de  ônibus  na  cidade.  Em  maio,  o  Governo  Federal  publicou  uma  medida  provisória   que  isentava  o  transporte  público  de  PIS  e  COFINS  como  forma  de  segurar  a  inflação  provocada pelo reajuste das tarifas no país. Mesmo assim, Haddad manteve  o  aumento,  o  que  gerou  protestos  por  parte  do  Movimento  Passe  Livre15  paulistano  nos  dias  seis,  sete  e  onze  de  junho.  A  cada  dia,  a  causa  ganhava  mais  adeptos  dentro  e  fora  das  redes  sociais  em  função  da  notoriedade  que  alcançou  por  conta  das   críticas  uso  do  termo  “vandalismo”  feito  pela  grande  mídia,  com  o  qual  os  usuários  das  redes  sociais  tendiam  a  discordar, e da repressão policial violenta contra os manifestantes e membros da imprensa.  Pode­se  dizer  que  a  tensão  social  que  explode  após  a  repressão  policial  violenta  começa  a  se  traçar  –  embora  ganhe  outros  rumos  ao  ser  disseminada  em  massa  e  ganhar  as  ruas  –  especialmente  com  estes  dois  últimos  movimentos.  A  sensação  de  distanciamento  dos  políticos,  não  representação  e  o  descontentamento  geral  com  a  inflação  são  temas  retomados  nos  conteúdos  compartilhados  por  usuários  da   rede  durante  as  manifestações  do  Passe  Livre,  em  especial  as  provocadas  pelas  agressões  a  manifestantes   e  jornalistas  e,  como  decorrência  delas,  a  polêmica  instaurada  ao  porte  de  vinagre16.  Além  disso,  o  silêncio  sobre  os   acontecimentos  nas ruas  e emprego do termo “vândalo” pelas mídias tradicionais, considerado  inadequado  pelos  usuários  das  redes  sociais,  provocam  inquietação  e revolta. Neste contexto,  Twitter  e  Facebook  passam   a  ser  utilizados  explicitamente  para  “esclarecer  mal  entendidos”,  falar  de  questões   que  por  motivos   ideológicos  estavam  sendo  ignoradas  pelos  veículos  de  massa e “disseminar verdades”.   Além  dessas  funções  o  Facebook  passa  a  ser  utilizado para organizar as passeatas que  ocorreram  em  todo  o  país.   Quando  da  eclosão  do  movimentos  de  São  Paulo,  o  evento criado   no  Facebook  para  a  cidade  contou  com  mais  de  270  mil  adesões.  No  Rio  foram  mais  de  70  mil  confirmações.   O  mesmo  padrão  se  repetiu  nas  demais  capitais  brasileiras.  Além disso, o  registro  de  imagens  e  vídeos  postados  na  web  foi  fundamental  para  o  acompanhamento 

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pressão internacional, em janeiro de 2011, a pena de enforcamento (a pena de apedrejamento havia sido  substituída por enforcamento por conta das críticas da comunidade internacional) é suspensa, decisão avisada à  presidente Dilma Rousseff pela a deputada Zohre Elahian, presidente da Comissão de Direitos Humanos  iraniana. Deixamos este caso à parte, pois ao contrário dos acima listados, refere­se a assuntos internacionais.  Movimento que milita por isenção de tarifas e melhoria dos transportes públicos. Aparece em 2004 com a  Revolta da Catraca em Florianópolis, hoje conta com núcleos em diversas capitais do país.  Em São Paulo, a polícia chega a prender manifestantes que portavam vinagre, utilizado para combater os efeitos  do gás de pimenta. 

remoto  das  manifestações  assim  como para o monitoramento da segurança dos participantes e  controle dos abusos policiais.  O  uso  do  Facebook  por  si  só  evidencia   a  fragilidade do termo “Primavera Brasileira”.  Uma  das  críticas  que  se  faz  ao  seu  emprego  é  que no país não houve de forma mais evidente,  como  no  Oriente  Médio,  disputa   por  liberdades  individuais  e  de  comunicação.  Também  não  havia  regimes  ou  ditadores  contra  os  quais  se  lutar.  Em  março  de  2013  eram  73  milhões   de  usuários  brasileiros  no  Facebook  e  32  milhões  no  Twitter17,  nem  um  deles  foi  privado  desta  ou  de quaisquer outras ferramentas de acesso e circulação de conteúdo na web. Pelo contrário,  pode­se  supor  que  durante  o  mês  de julho, muitos usuários pela primeira vez experimentaram  a  esfera  pública  virtual.  Diz­se  isso  sem  questionar  o  componente  crítico  de  que  fala  Habermas.  Não   é  possível,  e  nem  é  o  objetivo  deste  trabalho,  analisar  a  criticidade  dos  usuários, mas apenas como fizeram os conteúdos circularem.    Cartografia como metodologia possível na rede     A  metáfora  do  mapa,  explorada  na  abertura  deste   artigo  tem  sido   sistematicamente  aplicada,  em  termos  teóricos­metodológicos,  para  a  compreensão  dos  fenômenos  do  ciberespaço.   Para  melhor  abordá­la,  tratamos  da  noção  de  rizoma  de  Deleuze  e  Guatarri.   O  rizoma  opõe­se  à  compartimentalização  do  conhecimento,  conforme  foi  estabelecido  no  ocidente  desde  a  antiguidade  clássica, e, como decorrência a uma estruturação do pensamento  em forma de árvore, isto é, à organização do saber em que há uma hierarquização do conteúdo  que  se  origina  em  raízes,  sobe  pelo  tronco  e  se esgalha. Esta forma  se pensar o conhecimento  é  mecânica   e,  de  certo  modo  arbitrária,  uma  vez   que  pressupõe  a  predominância  de  certos  saberes  –  ou temas, termo que utilizamos  neste trabalho – sobre outros. Para os autores não há   um  “tronco”  que  sustente  o  conhecimento,  mas  uma  estrutura  rizomática,  horizontal  em  que  os pontos se originam em qualquer parte e se dirigem para qualquer parte.  Segundo eles:   Falamos  exclusivamente  disto:  multiplicidade,  linhas,  estratos  e  segmentaridades,  linhas  de  fuga  e  intensidades,  agenciamentos  maquínicos  e  seus  diferentes  tipos,  os  corpos  sem  órgãos  e  sua  construção, sua seleção, o plano de consistência, as unidades  de  medida   em  cada  caso.   Os  Estratômetros,  os  deleômetros,  as  unidades  CsQ18  de  densidade,  as  unidades  CsQ  de  convergência não formam somente uma  quantificação   da  escrita,  mas  a  definem  como sendo  sempre a medida  de outra  coisa. Escrever nada  tem  a  ver  com  significar,  mas  com agrimensar,  cartografar, mesmo que sejam regiões  ainda por vir (DELEUZE; GUATTARI, 1997, p.12­3).  17 18

Dados oferecidos pelas empresas e disponíveis nos seus sites.   CsQ, é a abreviatura de Corpos sem Órgãos, termo utilizado pelos autores. 

 

Deleuze  (1980)  esclarece  ainda  mais  sua  proposição  com  Guattari  ao  afirmar  que  o  rizoma  é  “precisamente  um  caso  de  sistema  aberto”  e  que  um  sistema  é  aberto  “quando  os  conceitos  são  relacionados  a  circunstâncias  e  não  mais  a  essências”.  A  partir  destas  noções é  possível  nos  apropriarmos  do  conceito  de  rizoma  metodologicamente.  A  forma  como  a  apropriação   do   rizoma  se  dará  será  cartográfica,  a  imagem  construída,  no  modelo  de  análise  que  aqui  propomos,  é  criada  pelo  estabelecimento  de  vetores  entre  um  conceito  e  outro  –  ou  entre  conjuntos  de  conceitos.  Isso  porque, segundo os  autores, diferentemente da árvore ou da  raiz  “que  fixa  um   ponto,  uma  ordem”,  “qualquer  ponto  de  um  rizoma  pode  ser  conectado  a  qualquer outro e deve sê­lo” (DELEUZE; GUATTARI, 1997, p.15).  A  utilização  da  cartografia  tem  sido muito recorrente nos estudos sobre o ciberespaço.  Este  apresenta  por  definição  (a  própria  arquitetura  das  redes)  uma  estrutura  rizomática.  Tal   noção  se  amplia  com  a  teoria  ator­rede  de  Callon  e  Latour  usada  amplamente  nos  últimos  anos  para  tratar  dos  fenômenos  de  interação  social e/ou interação homem­máquina no escopo  da  digitalização.  Latour  argumenta  que  as  redes  não  são  amorfas,  mas  altamente  diferenciadas.  A  ciência  definida  através  do  conceito  de  rede  não  se  caracteriza  por  racionalidade,  objetividade  e  veracidade  dos  fatos,  como   no   paradigma  tradicional,  mas  são  efeitos,  atingidos  através  das  tensões  –  e  não  de parâmetros externos – próprias à rede. Sendo  nela  as  conexões   entre  os  atores  performativas,  de  modo  que  suas  propriedades  mudam  conforme novos atores sejam implicados ou outros deixem de atuar.   Em  texto  proferido  num  seminário  sobre  a  teoria das redes, o próprio Latour (2011, p.  796)  admite  que  a  noção  de  redes  é  imensa  e  tem  uma  extensão  hegemônica.  Ele  continua  afirmando  que  no  sentido  mais  simples  e  mais   profundo  a  noção  de  rede  é  útil  sempre  que  a  ação  é  redistribuída  e  que  a  habilidade  do  conceito  de   rede  está  em  seguir  o  estranho  movimento  que  vai  das  substâncias  aos  atributos  e  retorna  num  movimento  contínuo.  São  justamente  os  vetores  desenhados   em  um  mapa  que  indicam  este  movimento  contínuo  (Ibidem, p. 797).  As  teorias  de  Deleuze  e  Guatarri  e Latour tem sido utilizadas naquilo que se  chama de  análise  da  controvérsia.  A  lógica  do  rizoma  condiz com conhecimentos que não são passíveis  de  hierarquização.  Em  “Cartography  and  War  Machines”,  Sguiglia  e  ​ Toret  (2010)  compreendem  a  cartografia  como  um  protótipo  abstrato  para  a  análise  de  um  problema  na  forma  de  mapa  ou,  como   preferimos  pensar,  diagramar  problemas  por  meio  de  estruturas 

vetoriais.  Sendo  que  o  termo   problema  deve  ser  entendido aqui como questão pontuada  pelos  usuários  de  determinado  sistema.  A  cartografia,  prosseguem  os  autores,  permite a construção  de  mapas  abertos  de  orientação,  conectáveis  em  todas  as  suas  dimensões,  destacáveis,  reversíveis e suscetíveis a modificações constantes​ (Ibidem, p. 2). Para  explicar  melhor  seu  argumento, Sguiglia ​ e ​ Toret (Ibidem) falam  de “máquinas de  guerra”  (war  machines).  Os  autores  entendem  máquinas  de  guerra  como  processos  organizatórios  capazes  de  transformar  pontos  em  vetores  (Ibidem,  p.  2).  Não  nos  parece  o  caso  de  explorar  o  conceito  de  máquinas  de  guerra  –  que   parece  específico  ao  arcabouço  explorado  por  Sguiglia  ​ e  Toret  –  contudo,  o  que  é  relevante  para  esta  análise  é  a noção geral  de  que  a  não  se  trata  de  interpretar  para  organizar,  mas  de  detectar  os  pontos  capazes  de  compor  um  plano  comum, um vôo coletivo (Ibidem). Contudo, esta noção pressupõe, de certa  forma,  que  o  vôo  está  adequadamente  orientado.  Pelo  contrário,  os  mapas  indicam  possibilidades  de  planos,  apontados  pelos  fluxos  e  pelos  nós  que  se  tornam  evidentes em sua  estrutura.  Se  o  plano  será orientado para a ação e, mais do que isso, para  a ação consciente, só  as  formas  de  apropriação  social  dos  conteúdos  que  circulam  no  mapa   serão  capazes  de  evidenciar.  Para  Sguiglia  ​ e  ​ Toret   a  cartografia  permite  identificar   os  pontos  quentes  (​ hot  spots​ )  dos  conflitos  contemporâneos,  suas  dinâmicas  e  atores  (Ibidem).  Indo  mais  além,  permite  identificar  as  tendências  presentes  nestas  dinâmicas,  observar  movimentos  de  divergência  e  convergência,  surgimento,  crescimento  e  atrofia  dos  nós,  enfim,  o  movimento  mesmo  dos  fluxos  sociais  e  dos  indivíduos  em  suas  relações,  tensões  e  distensões.  A  produção  de  novos  termos  e  conceitos,  não  é  tarefa  do  militante,  explicam  os  autores,  mas  sempre  será  um  exercício  coletivo  de  enunciação.  Os  autores  consideram  a  cartografia  (em  conjunto  com  a  noção  de  máquina  de   guerra)  um  conceito  fundamental  para  compreender  as  limitações  da  pesquisa  militante.  A  cartografia,  entendida  como  a  capacidade  dos  movimentos  de  investigarem  e  mapearam  o  real,  funciona  como  atividade   artesanal  para  detectar   e  dar  aparência  às  interferências  nas  sociedades onde o consenso ressoa (Ibidem). São as interações  suas  dinâmicas  que  subsidiam  os  mapas   e  olhar  para  eles  atentamente  significa  olhar  para  instantes  das  dinâmicas  criadas.  São  como  instantâneos  de  processos  sociais  que  acontecem  nos  fluxos,  manifestos na forma de termos  –  no  caso da presente proposta – empregados pelos   usuários  nas  suas  relações.  Neste  sentido,  o  mapa  pode  ser  utilizado  de  modo  minucioso,  permitindo  ao  pesquisador  se  aproximar  dos  micropoderes. De certo modo dá materialidade a 

eles,  embora  não  os  esgote.  A  comunicação  direta  entre  os  sujeitos  ganha visibilidade e  pode  ser  estudada  com  mais  clareza,  além  de,  como  impacto,  os  fluxos  identificados  nos  mapas  serem  capazes  de  eventualmente  impor  novos  termos  ao  poder  vigente  e  à  mídia  de  massa,  como aconteceu no Brasil.    Imagens de uma cartografia: desenho de fluxos nos protestos brasileiros    Explorada  a  possibilidade  de  uso  da  cartografia  para  a  análise  do  ciberespaço,  em  especial  das  redes  sociais,  tomaremos  como  ilustração  o  caso  dos  protestos  brasileiros.  Os  mapas  aqui  utilizados  foram  retirados  do  site  do  Laboratório  de  Estudos  sobre  Imagem  e   Cibercultura  (Labic)  que  estuda  “o  impacto  da  cultura  digital  nos  processos   e  práticas  de  comunicação  contemporânea”19.  Embora  tenhamos  utilizados  mapas  já  prontos,  há  diversas  ferramentas   que  produzem  mapas.  Um  dos  motivos  de  termos  escolhido  utilizar  os mapas do  Labic  é  que  a  coleta foi feita praticamente em tempo real. Tomamos então dados do artigo “A  Batalha  do  Vinagre:  por  que  o  #protestoSP  não  teve  uma,  mas  muitas  hashtags”  de  Fabio  Malini  sobre  os  acontecimentos  do  dia  13  de  junho  em São Paulo, publicado no site do Labic  já  no  dia  seguinte.  Embora  reconheça o papel mobilizador do Facebook através da ferramenta  eventos  (28  mil  usuários  confirmaram  presença  no  evento  intitulado  “Terceiro  Grande  Ato  Contra  o  Aumento  da  Passagem”)  a  ênfase  do  autor  recaí  sobre  o  uso  de  hashtags  e  palavras­chave  que  circularam  no  twitter  nesta  data.  As   principais  foram:  #passelivre  #contraoaumento  #vemprarua  #changebrazil  #tarifazero  #indignação  #occupySP  #protestoSP  #13jSP.  O  que  segundo  Malini  (2013)  indica  uma  multiplicidade  de  movimentos  dentro  do  movimento.  Analisando­se  o  uso  de  termos  sem  hashtag,  tem­se  que  “tarifa”  dominou  o  Twitter  na  ocasião,  sendo   que  entre  17h  e  23h50,  mais  de  17  mil  tweets  contendo  a  palavra  eclodiram  na  rede.  Outras  palavras  recorrentes  foram:  protesto,  jornalista,  ônibus,  rua,  manifestantes,  vinagre,  bomba.  Termos  (com  e  sem  hashtag)  que  foram  replicados  pelos  usuários20.   

19 20

Descrição disponível no site do Labic.  No caso do Twitter esta ação é feita utilizando­se a ferramenta retweet, identificada pela sigla RT 

Figura 1: Rede de Rts contendo a palavra “tarifa” no Twitter, coletados entre 17h às 23h50 (MALINI, 2013) 21. 

 

Considerando­se  a lógica da rede percebida na figura, temos que os termos emanam de  focos  do  centro (nós mais visitados), para a periferia. No caso das manifestações de São Paulo  (padrão  percebido  em  muitas  outras  circunstâncias),  temos  que  os  nós  de  onde  emanam  a  maioria  dos  fluxos  (o  que  não  significa, contudo que eles tenham os iniciado) se relacionam a  formadores  de  opinião,  daí   que  haja  uma  assimetria  no  volume  de  informações  que  circula  entre os nós.     

21

No original todas as imagens estão coloridas indicando­se o fluxo de informações. 

Figura 2: Fluxo de retweets de perfis mais centrais para os periféricos (MALINI, 2013). 

 

Embora  a  lógica  das  redes  seja  notadamente  horizontal,  isso  não  evita   que  perfis  de  grupos  e  pessoas  públicas  se  tornem   pontos  nodais  da  rede,  de  onde  parte  um maior fluxo de  informações.  Na  figura  acima,  temos  que  são  os  perfis  do  Estadão  (@estadao),  da  jornalista  Silvana  Bittencourt  (@SilvanaBit),  do  deputado  Jean  Wyllys  (@jeanwyllys_real),  do  VJ  da  MTV  PC  Siqueira  (@pcesiqueira)  e  do escritor Marcelo Rubens Paiva (@marcelorubens) são   os  que  recebem   maior  atenção  dos  usuários.  Cabe,  na  medida  em  que  os  estudos  sobre  a  cartografia  do  ciberespaço  avençam  explorar  melhor  as  caracteristicas  comportamentais  dos  usuários.  Todo  modo,  o  mapa  indica  que  os  usuários  recorrem  a  diferentes  fontes  e  emitem  conteúdos  para  pontos  diversos.  Daí   decorre  uma  característica  que  temos repetido: os mapas  indicam  estágios  de  um  determinado  fluxo,  são  instantâneos  de  dinâmicas  diversas.  No  caso  das  manifestações  de  São  Paulo,  não só os agentes são relevantes, mas os acontecimentos têm  impacto  sobre  os  fluxos.  Vejamos  mais   dois  mapas  produzidos,  o  primeiro  indica  o  fluxo  de  tweets durante a passeata do dia 13, antes do confronto com a PM:     

Figura 3: Fluxos de tweets sobre a passeata antes do confronto com a Polícia Militar (MALINI, 2013). 

 

O  segundo  mapa  mostra  a  intensificação  dos  fluxos  com  a  eclosão  da  violência  policial. A reação dos usuários da rede aos acontecimentos nas ruas foi imediata.      

Figura 3: Fluxos de tweets sobre a passeata durante o confronto com a Polícia Militar (MALINI, 2013). 

 

Fato  a  se  notar  é  que  a  maioria  dos  usuários  não  estava  fisicamente  presente  na  manifestação  (a  assimetria  entre  o  número  de  tweets e os manifestantes nas ruas mostra isso),  porém,  pode­se  pressupor,  considerando­se  o uso de pacotes de dados em dispositivos móveis  e  a atualização dos acontecimentos em tempo real – leia­se antes das midias tradicionais – que  muitos tweetaram diretamente do protesto.    Considerações finais    A  análise  cartográfica  dos  incidentes  de  junho  de  2013  (e  não  apenas  destes  mapas,  mas  da  multiplicidade  de  mapas que podem ser construídos com o uso de diferentes termos) é  relevante  para  se  compreender  as  formas de utilização das redes sociais na construção de uma  esfera  pública  virtual.  Neste sentido é válido mesmo revisitar – quantas vezes for  necessário –  a  noção  de  esfera  pública  e  além  dela,  como  insistimos  neste  texto  ainda   que  sem  nos  aprofundarmos,  sobre   a  crítica  presente  no  comportamento  dos  agentes.   Há  aí  um  grande 

problema  para  as  pesquisas  futuras:  é  possível  medir  a crítica dos agentes? Passada a  onda de  protestos  –  físicos  e  virtuais,  nas  suas  mais  diversas  manifestações  –  paira  sobre  os  usuários  da  rede  uma  sensação  de  que  nada mudou. Ditadores não foram depostos, como na primavera  árabe  (não  que  a  deposição  implique  mudança;  o  Egito  Mubarak  foi  substituído na sequência  dos fatos por uma junta militar).   O  ativismo  de  sofá  e  de  rua,  teve,  contudo,  alguns  ganhos  (ou  resultou  em  paliativos  para  as  tensões  sociais?).  Porém,  estes  foram  mais  lentos  do  que  os  descontentes  queriam,  o  passe  livre  ou  a  redução  de  passagens  entrou  na  pauta  de  algumas gestões municipais, a PEC  37  foi  rejeitada  e  Feliciano  deixou  o  cargo.  É  possível  que  esta  sensação  de  insucesso  seja  fruto  das  pautas  difusas  que  apareceram  ao  longo  do  período  mais  acalorado  das  manifestações.  É  possível  que  seja  fruto  de  uma  imaturidade  da  esfera  pública  virtual  no  Brasil  e  que  o  passo  seguinte  seja  converter  esta  energia  em  mecanismos  de  ação. É possível  que  seja  resultado  do  comportamento  acrítico  dos  usuários  –  ou  de  uma  parcela  significativa  deles  –  convertido  em  comportamento  de  manada (eu faço porque  todos fazem). Sobretudo, é  possível que seja conjunto destes múltiplos fatores.  Sguiglia  ​ e  ​ Toret  (2010,  p.  2)  acreditam  na  habilidade  dos  sujeitos  políticos  nos  movimentos  de  construírem  máquinas  coletivas  grandes  e  potentes.  Não  obstante,  acreditam  que  isso  não  acontecerá  sem  que  a  dinâmica  da  pesquisa  participativa  seja  combinada  com  dispositivos  de organização que deem conta do real. Além disso, defendem que a potência dos  movimentos  está  justamente  na  capacidade  de  ligar  conhecimentos  singulares  e  de  fazê­los  funcionar  como  uma  máquina  de  guerra  vetorizada.  Estas  máquinas  devem  ser  capazes  de  construir  processos  de  empoderamento  ganhando  batalhas  concretas  e  transformando  problemas sociais a partir de relações horizontais.  Os  fluxos  e  implicações  dos  movimentos  acontecidos  em  junho  de  2013  são  complexos  e  a  respeito  deles  ainda  há  muito  a  ser  explorado,  mas  é  possível  antever  que  a  internet  brasileira  não  será  mais  vista  de  forma  jocosa  ou  secundária  pela  mídia  tradicional.  Aliás,  a  forma  como  ela  é  vista  pela  mídia  tradicional  tenderá  a  perder  importância.  Embora  nos  mapas  analisados  o  @estadão  ainda  tenha  sido  um  ponto  nodal,  há  outros  fluxos  relevantes  e,  sobretudo vida própria na periferia: usuários produzindo conteúdos para si e seus  pares  de  forma  dispersa  mas  significativa  quando  consideramos  o  volume  desta  produção.  Não  estamos  mais  no  limiar  de  uma  mudança.  A mudança está em curso. De forma acelerada  os  usuários  evidenciam  seu  desejo   de  protagonismo  nessa  fase  da  rede,  dentro  e for a dela. A 

nós,  pesquisadores,  cabe  acompanhar  estas  mudanças  sem  afetações  e,  como  propõem  Sguiglia​  ​ e​  ​ Toret, sem que seja necessário nos privarmos de participar delas.     Bibliografia    ARENDT, Hannah. ​ A condição humana​ . 10. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007.  CASTELLS, Manuel. ​ A sociedade em rede​ . São Paulo: Paz e Terra,1999. v. 1.  DELEUZE,  Giles.  ​ Mil  platôs  não  formam  uma  montanha.​ :  depoiment.  Debate com Christian  Descamps,  Didier  Eribon  e  Roberto  Maggiori,  publicado  no  jornal  Liberación  em  23  de  outubro  de  1980.  Disponível  em:  . Acessado em 10 de set de 2013.   HABERMAS, Jürgen. ​ Mudança estrutural da Esfera Pública​ . Rio de Jnairo:Tempo  Brasileiro, 1984.  LATOUR, Bruno. Reflections of an Actor­Network Theorist. ​ International Journal of  Communication​ , v.5, 2011. Disponível em:  .  Acessado em 10 de set de 2013.   MALINI, Fábio. A​  Batalha do Vinagre: por que o #protestoSP não teve uma, mas muitas  hashtags​ . 2013. Disponível em:  . Acessado em 10 de set de 2013.  MARCUSE, Herbert. ​ A ideologia da sociedade industrial​ . Rio de Janeiro: Zahar, 1982.   

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