A Primeira Guerra do Paraguai - Artigo

July 15, 2017 | Autor: F. Barcellos Teix... | Categoria: History, Historia, História do Brasil, Guerra do Paraguai, História do Brasil Imperial, História Da Marinha
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A Primeira Guerra do Paraguai Documentos inéditos no Brasil indicam que o conflito não começou em 1864, mas dez anos antes, quando a marinha imperial planejou um ataque contra o país vizinho para impor a livre navegação na bacia do rio da Prata por Fabiano Barcellos Teixeira

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oi uma das ações militares mais polêmicas da história do Brasil. Em dezembro de 1854 uma esquadra formada por 36 navios de guerra partiu do Rio de Janeiro rumo ao Paraguai transportando de 2 a 3 mil soldados, com apoio de tropas nas províncias do Mato Grosso e do Rio Grande do Sul. A defesa paraguaia contava com apenas um navio de guerra e no máximo 6 mil soldados.

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Fabricada em 1851 na Inglaterra, a fragata Amazonas foi a nau capitânia da operação naval de 1854-1855 no rio da Prata. A embarcação tinha 50 metros de comprimento, capacidade de transportar mais de 400 tripulantes e 6 canhões, e também atuou na Batalha de Riachuelo, em 1865

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Em 20 de fevereiro de 1855 a esquadra imperial estava às portas do Paraguai, mas o ataque acabou não

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Nas páginas do jornal Em sua edição de 2 de dezembro de 1854 o jornal El Semanario, veículo oficial do governo de Carlos Antonio López, publicou um trecho de uma carta uma que revelava informações sobre os planos do Império em relação ao Paraguai: “O comerciante Italiano D.N. teve a bem referir-me que o Coronel Correa noticiou-lhe de sua chegada em São Borja, o fez chamar, e lhe perguntou si é verdade que o Governo do Paraguai está reunindo forças para mandar contra o Brasil, e que lhe contestou que sem dúvida tudo seria falso, porque não sabe que se ache nenhuma prevenção no Paraguai contra o Brasil: que então lhe disse o Coronel brasileiro que em poucos dias chegará ao ponto de São Borja uma força de dois mil homens que estavam aguardando, e que a esquadra brasileira está determinada para subir e invadir ao Paraguay pelo (rio) Paraná.”

exigindo a liberação da navegação no rio Paraguai. O episódio foi a desculpa que o Império precisava para atacar o país vizinho.

A expedição Em 10 de dezembro de 1854, uma poderosa esquadra comandada por Pedro Ferreira de Oliveira (1801-1860) partiu do Rio de Janeiro rumo ao Paraguai. Seus objetivos eram obter a livre navegação do rio Paraguai, em primeiro lugar, e fazer com que o governo paraguaio se desculpasse pelo “episódio Leal”. Se fosse necessário, o comandante deveria utilizar a força naval para atingir as metas. A esquadra imperial deveria partir em segredo para facilitar o ataque às

defesas paraguaias. No entanto, no Arquivo Nacional de Assunção há uma série de 11 manuscritos intitulada “Várias cartas a respeito da invasão brasileira de 1855” que mostra que López foi informado com antecedência dos planos do Império. O governo do Paraguai contava com informantes que lhe revelaram os preparativos da expedição antes mesmo de ela partir do Rio Janeiro. Em

O Paraguai, ao contrário da Argentina e do Uruguai, não se submetia ao Império Brasileiro

Quem avisa amigo é No dia 4 de dezembro de 1854 um comerciante da cidade de São Borja chamado Estanislada enviou a carta abaixo ao amigo Nemesio, que vivia na cidade de Encarnación, no Paraguai, para alertá-lo dos planos brasileiros. “A divisão teve ordens para se mobilizar e o Paraguai é o objetivo desses preparativos, dentro de muito poucos dias se te descuidar ficará encerrado, trate de trazer tudo o que possa. Não despreze este aviso, é bastante sigiloso e producente (...). Quisera eu ser mais meticuloso, mas me falta tempo, tampouco quero comprometer a quem me disse que lhe prevenisse (...). Volto-te a dizer que te apure”. Mensagem de um comerciante de São Borja a um amigo que vivia na cidade de Encarnación, no Paraguai, datada de 4 de dezembro de 1854

Fonte: Arquivo Nacional de Assunção. Varias cartas respecto a la invasión brasilera. Seção História, volume 315, número 11, folha 3 (frente e verso), 1855.

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exemplo, era uma rota fundamental para a comunicação fluvial entre o Rio de Janeiro e as províncias mais ocidentais do país, como o Mato Grosso, pois o deslocamento terrestre era inviável. O Paraguai, ao contrário da Argentina e do Uruguai, não se submeteu aos desígnios do Império. Questões referentes à demarcação de fronteiras na região do atual Mato Grosso do Sul e ao direito de navegação no rio Paraguai geraram desavenças entre os dois governos. Em agosto de 1853, o diplomata brasileiro em Assunção, Felipe José Pereira Leal, foi expulso do Paraguai depois de dar um ultimato ao presidente Carlos Antonio López (1790-1862)

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25 de outubro de 1854, possivelmente o cônsul paraguaio na capital do Brasil, Manuel Moreira de Castro, enviou uma carta a López, dando-lhe informações detalhadas sobre a operação (ver quadro na pág. XX). A carta, registrada como “confidencial”, descreveu os objetivos da expedição. O Império pretendia enviar uma frota ao Paraguai via rio Paraná, mas essa força não acompanharia o negociador brasileiro até Assunção, O chefe de esquadra Pedro Ferreira de Oliveira comandou a expedição e em 27 de abril de 1855 assinou um acordo que suspendeu o ataque planejado

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Pedro Ferreira de Oliveira, litografia, Sebastien Auguste Sisson, 1861

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permanecendo estacionada na fronteira do Paraguai. Ca

Carlos Antonio López, presidente do Paraguai entre 1844 e 1862, adotou uma política externa independente que contrariou o governo de D. Pedro II

Carlos Antonio López, ilustração, autor desconhecido, s/d

resultados da expedição de 1854-1855. No livro Um estadista do Império, de 1897, o historiador e político abolicionista Joaquim Nabuco afirmou que “a missão Pedro Ferreira foi (...) um desastre diplomático” . Em 1856 e 1858 novos acordos foram assinados por Brasil e Paraguai e descumpridos pelos dois governos, pois brasileiros continuavam a invadir o norte do Paraguai, e a livre navegação dos barcos imperiais era sempre barrada pelos regulamentos impostos pelo governo de Carlos Antonio López. Entre 1855 e 1864, os dois países se preparam para a guerra. O relativo êxito das tropas imperiais nos combates de 1864-1870 pode ter relação com os equívocos da operação naval de 18541855. Assim, em vez de um “desastre diplomático”, essa expedição pode ser entendida como um desastre militar que, no entanto, serviu de aprendizado para as tropas brasileiras que lutaram na região a partir de 1864.

Joaquim Nabuco afirmou que a missão liderada por Pedro Ferreira foi um “desastre diplomático” Tudo isso revela a importância da ofensiva de 1854-1855, mas o assunto foi praticamente ignorado por diversos historiadores que se dedicam aos estudos dos conflitos na bacia do rio da Prata no século XIX. A expedição naval de 1854-1855 não foi a causa principal da guerra de 1864-1870, e talvez nem tenha sido um “fiasco”, mas foi o começo de um catastrófico conflito que estouraria na década seguinte, deixando um saldo de dezenas de milhares de mortos. Foi uma guerra com os tiros adiados. Fabiano Barcellos Teixeira é mestre em história pela Universidade de Passo Fundo(RS) e professor da rede pública de Passo Fundo. www.historiaviva.com.br

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© Sammlung Rauch/Interfoto/Latinstock

paraguaio, o comandante Pedro Ferreira de Oliveira se dirigiu a Assunção em um só navio para negociar com o representante paraguaio, o general Francisco Solano López (1827-1870), ministro da Guerra nomeado plenipotenciário do Paraguai e filho do presidente Carlos Antonio López. Durante mais de dois meses a esquadra imperial ficou estacionada em Corrientes, à espera do retorno de seu comandante. Em 27 de abril de 1855 Pedro Ferreira de Oliveira e Francisco Solano López assinaram em Assunção um Tratado de Amizade, Comércio e Navegação entre Brasil e Paraguai. O documento reconhecia o pleno direito do governo paraguaio sobre a parte do rio Paraguai que atravessava o território do país e adiava a definição das fronteiras para o ano seguinte. O acordo de 27 de abril não resolveu as questões pendentes entre os dois Estados, pois ficou aquém das exigências imperiais. Em julho de 1856, após longa discussão parlamentar, o governo brasileiro desautorizou os acordos pactuados por seu representante, insistindo no direito pleno de navegação, tal como fora concedido pela Argentina e pelo Uruguai, e nas suas exigências territoriais. No acordo, o Paraguai não se opunha à navegação nos seus rios interiores, sob seu controle, contanto que as questões territoriais fossem redefinidas, em até um ano, com o que o Império concordava somente sob suas exigências. Pedro Ferreira de Oliveira, ao que parece, foi prudente ao não atacar o Paraguai. A esquadra enfrentava enormes dificuldades de deslocamento, os navios pesados encalhavam com frequência, e as embarcações com casco de madeira poderiam ser alvo fácil para as defesas paraguaias instaladas ao longo do rio Paraguai, como no forte de Humaitá. Historicamente, porém, a imagem do militar ficou arranhada pelas insuficientes análises dos

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