A produção agrícola em plena Paris dos Trópicos: as atividades rurais nas ruas do Rio de Janeiro de Pereira Passos (1903-1906)

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40º Encontro Anual da Anpocs ST23 Pensar a cidade no Brasil: limitações, potencialidades e perspectivas

A produção agrícola em plena Paris dos Trópicos: as atividades rurais nas ruas do Rio de Janeiro de Pereira Passos (1903-1906) Leonardo Soares dos Santos Departamento de História ESR/UFF Programa de Mestrado NEPP/UFRJ

A convivência entre usos urbanos e rurais seria objeto de severa repressão por parte das posturas municipais criadas ao tempo do governo de Pereira Passos. As ações implementadas por tal governo no sentido de consolidar um modelo de civilização e modernidade na cidade do Rio de Janeiro já são suficientemente conhecidas. Contudo, isso não nos permite dizer que a remoção do rural do centro da cidade tenha sido exclusivamente resultado de medidas arbitrárias desse governo. Antes de tudo é preciso remontar o amplo sistema de produção e trocas econômicas que envolviam gêneros alimentícios gerados ali mesmo no espaço central da cidade. Visa-se com isso fazer emergir novamente uma dinâmica urbana que convivia sem grandes conflitos com atividades e emblemas rurais. Esse parecia ser o tom das ruas do centro carioca até fins do século XIX. Importante também é observar como tal convívio passa a ser um problema para as autoridades públicas, mas não apenas. Faz-se mister avaliar o grau de participação nessa arena de conflitos que então surge de setores como o da imprensa, de setores organizados da sociedade civil e de cidadãos e cidadãs de uma maneira geral.

A convivência entre usos urbanos e rurais seria objeto de severa repressão por parte das posturas municipais criadas ao tempo do governo de Pereira Passos. As ações implementadas por tal governo no sentido de consolidar um modelo de civilização e modernidade na cidade do Rio de Janeiro já são suficientemente conhecidas. Contudo, isso não nos permite dizer que a remoção do rural do centro da cidade tenha sido exclusivamente resultado de medidas arbitrárias desse governo. Antes de tudo é preciso remontar o amplo sistema de produção e trocas econômicas que envolviam gêneros alimentícios gerados ali mesmo no espaço central da cidade. Visa-se com isso fazer emergir novamente uma dinâmica urbana que convivia sem grandes conflitos com atividades e emblemas rurais. Esse parecia ser o tom das ruas do centro carioca até fins do século XIX. Importante também é observar como tal convívio passa a ser um problema para as autoridades públicas, mas não apenas. Faz-se mister avaliar o grau de participação nessa arena de conflitos que então surge de setores como o da imprensa, de setores organizados da sociedade civil e de cidadãos e cidadãs de uma maneira geral. Um dos maiores propagandistas das reformas de Pereira de Passos foi Luiz Edmundo. Em seus vários trabalhos memorialísticos sobre o Rio de Janeiro, ele buscou fundamentalmente celebrar as modificações encetadas por Passos. E o fazia mesmo se estivesse tratando da época dos Vice-reis, num momento bem anterior ao período das grandes reformas. Seu objetivo era caracterizar de tal forma o Rio de Janeiro colonial, com tons tão negativos, por momentos verdadeiramente caricatos, para que ninguém tivesse dúvida da redenção trazida pelas “obras de embellezamento” do início do século XX. Era foi sem dúvida uma das principais estratégias seguidas não só por Luiz Edmundo, como de vários outros propagandistas das reformas implementadas por Pereira Passos, marcar com tintas fortes os traços não-civilizados do período colonial. Uma das marcas dessa condição seria o constante ir e vir de animais no centro da cidade. Mas essa é uma visão que data da década de 1930 (época dos escritos de Luiz Edmundo), quando muitas das noções e valores que estavam em disputa no início do século XX, já estavam consolidados, cristalizados na perspectiva do senso comum. É necessário que se destaque que as reclamações contra a presença de animais, seja aqueles utilizados como meio de transporte ou a sua própria criação, já se faziam presentes em outro contexto. Jayme Benchimol já o identifica em textos de higienistas na década de 1850. Nessa época a cidade sofreria com duas grandes ondas de epidemias de Febre Amarela. A primeira atingiu a cidade no período compreendido entre dezembro de 1849 e

setembro de 1850. Numa população de 166.000 habitantes, a doença teria causado, segundo estimativas de Pereira Rego, um médico da época, 90.658 “amarelentos” e 4.160 mortos.

As fazendas, sítios e chácaras não apenas cercavam em profusão a cidade do Rio de Janeiro. Algumas delas faziam parte da cidade ainda em meados do século XIX. DESMOND, Iluchar. Panorama da cidade de Rio de Janeiro -1854

Uma ampla discussão se abriria entre higienistas e autoridades públicas sobre as condições de salubridade da cidade, assim como a definição de formas de prevenção e principais vetores da doença. Uma série de interdições eram por eles formuladas na medida em que se identificavam, na análise dos aspectos da estrutura material urbana e dos costumes e práticas tradicionais da cidade, possíveis causas dos mal que assolava a corte imperial. Porém, a presença de animais no centro ainda não era vista como principal causa de insalubridade, ao contrário dos pântanos e dos cortiços. Entre os engenheiros do Clube de Engenharia sobressaiam outras questões como abastecimento d‟água, os morros, especialmente o do Castelo. A largura das ruas também era vista por muitos um importante fator de insalubridade.

É só nos primeiros anos do século XX que passamos a verificar reclamações que estabelecem a permanência de usos rurais no centro da cidade como fator nocivo à salubridade pública.1 A partir do início do século XX o Rio de Janeiro passaria a testemunhar como que uma ofensiva contra as atividades e usos rurais no espaço da zona urbana da cidade. Fato importantíssimo, pois não se tratava apenas da restrição de usos obsoletos e arcaicos – como criação de porcos, perus, galinhas, bois; plantação de hortas, capim etc. – e, que, portanto não implicaria em grandes repercussões para seus habitantes. Muito pelo contrário, tratavam-se de usos que faziam parte do cotidiano de ampla parcela da população urbana e que tinham um grande papel a desempenhar numa cidade onde os mecanismos de abastecimento de gêneros, por exemplo, eram tributários da lógica de uma sociedade colonial escravista – ou seja, eles não eram satisfeitos num mercado capitalista consolidado. Mas como e por quê esses usos passaram a ser “perseguidos”? Melhor dizendo: por que eles não eram mais aceitos na zona urbana da cidade?

Bois e vacas eram personagens notórios do cenário urbano carioca. E assim foi por todo o século XIX. TAUNAY, Nicolas Antoine. Largo da Carioca (1816), Museu Nacional de Belas Artes, Rio de Janeiro 1

Recentemente foram produzidos excelentes trabalhos que se detiveram sobre a construção de um olhar que tomava como um problema de saúde pública a criação de animais no interior do espaço urbano das cidades. APROBATO FILHO, Nelson. O couro e o aço. Sob a mira do Moderno: a aventura dos “animais” pelos “jardins” da Paulicéia. Final do século XIX / Início do XX. Tese de Doutorado em História Social, Universidade do Estado São Paulo, São Paulo, 2006; OSÓRIO, Andrea. “A cidade e os animais: da modernização à posse responsável”, In: Teoria e Sociedade, n. 21, janeiro-junho/2013.

Sabe-se que o discurso higienista jogou um papel importante nesse processo: se não diretamente, os intelectuais-médicos certamente exerceram grande influência nos dispositivos legais elaborados pelos poderes públicos com o objetivo de proibir as práticas agrícolas no perímetro urbano. Isso porque uma das principais razões para tal proibição residia exatamente no teor insalubre de tais práticas. Nesta perspectiva, a “desruralização” da cidade do Rio se apresenta enquanto uma tentativa, tão em voga na época, de melhoria das condições de salubridade da então capital da República.

Jean-Baptiste Debret, Transporte da Carne de Corte, 1817.

Somos tentados a nos apoiar na “chave de leitura” explorada por Sidney Chalhoub em seu Cidade febril, obra em que analisa o papel do discurso higienista na promoção de políticas de saúde pública para a erradicação da febre amarela. Vemos aqui o esforço do autor em evidenciar no plano do “entrelaçamento de muitas histórias” as relações e tensões entre a consolidação daquele discurso, as teorias raciológicas da época (como a da “miscigenação”), as concepções populares sobre doença e cura e as práticas de segregação sócio-espacial. O princípio motor das “políticas públicas de saúde”, adotadas desde as últimas décadas do século XIX, podem muito bem serem entendidas como a manifestação cabal de um conjunto de ardis tramados pelos “doutores higienistas” contra as “classes populares cariocas”. Com muita propriedade o autor descreve como o avanço e a consolidação da ideologia higienista acabaria por alicerçar uma forma de “gestão” das diferenças sociais que, paradoxalmente, seria ela mesma um dos principais obstáculos à consolidação do exercício da cidadania no conjunto da sociedade. Essa chave certamente contribui para o esclarecimento da desruralização da cidade, na medida em que se trata aqui da segregação

de certos usos e práticas, ligadas a determinados grupos, num processo também fomentado por médicos higienistas.

O rural no dia-a-dia urbano O início do século XX – quando se desenrolou a administração de Pereira Passos frente à Prefeitura do Rio - traria com ele uma série de medidas contra os usos rurais no centro da cidade. O que pode ser visto como um indício de que tais usos eram bastante presentes no cotidiano do espaço urbano propriamente dito. Mas antes que nos detenhamos na cidade do Rio é preciso antes esclarecer que a situação de indefinição entre usos urbano e rural no interior do perímetro urbano não é uma peculiaridade sua. Citaremos brevemente apenas dois exemplos, por sinal, exemplos de cidades de inegável feição urbana e que talvez sejam para seus respectivos países (no caso do primeiro, para o mundo) o maior referencial em termos de cultura urbana moderna. Um é Nova York. Nela até o alvorecer do século XIX ainda era possível flagrar manadas de porcos caminhando celeremente pelas ruas do seu centro histórico (Downtown). Também não era pra menos, extensa região da moderna Manhattan era até boa parte do século XIX ocupadas por várias fazendas dedicadas especialmente à criação de suínos – e que se concentravam numa área que hoje dista poucas quadras de alguns baluartes da sofisticação cultural nova-yorquina como o Carnegie Hall e o Rockefeller Center; além disso, não era nada absurdo que alguém se deparasse também com gansos e marrecos dividindo espaço com charretes, bondes e pessoas em Wall Street ou na Times Square. Em pleno século XX ainda era possível encontrar decretos que regulamentavam o uso de cabritos para o transporte de trenós no centro da cidade.2 2

Esses dados foram extraídos do estudo de MUHLSTEIN, Anka. A Ilha Prometida: a história de nova York do século XVII aos nossos dias. São Paulo: Companhia das Letras, 1991. Informações relevantes a esse respeito podem ser obtidas em New York. Guia Visual. São Paulo: Folha de São Paulo, 1997. Não seria demais lembrar que alguns desses aspectos são mostrados por Martin Scorcese em “Gangues de Nova York”. No filme, que se passa na década de 1860, vemos algumas cenas onde aparecem porcos caminhando nas ruas da área que seria anos mais tarde o maior centro financeiro do mundo. Outro importante documento que retrata o aspecto rural da cidade de Nova York, só que dos arredores da área central, são os quadros de Ralph Albert Blakelock (1847-1919). Destaque especial para LandscapewithFarm e FiftyNinthStandFifth Ave. É curioso observar que construções e fazendas estivessem ainda tão próximas do centro da cidade no final do século XIX. Na segunda obra citada é possível ver que a hoje altamente valorizada área de UpperEastSide abrigava inúmeras habitações rurais vulgarmente chamadas de choupanas. Esses e outros trabalhos do autor podem ser vistos no endereço: . Uma curiosidade: sabe-se que Wall Street deve a sua origem à construção de uma rua que ladeava o muro que servia de divisa do núcleo urbano ao norte (por isso o nome rua do muro). Esta rua fora feita pelos seus primeiros colonizadores, os holandeses, ao tempo em que ainda se chamava Nova Amsterdã.

A cidade organizada e dividida segundo funções e atividades, com critérios de ordenamento solidamente consolidados, é um fenômeno relativamente recente, que começa a se constituir a partir de 1910, com o movimento de planificação urbana. Podemos ver como algumas fronteiras hoje muito bem estabelecidas, ainda não passavam de pretensões ambicionadas por uns tantos especialistas do assunto. Em 1929, a falta dessas fronteiras era para os autores do Plano Regional de Nova York uma dos grandes problemas da cidade: (...) A ocupação do solo de acordo com os diversos usos parece ter sido obra do chapeleiro louco de „Alice no País das Maravilhas‟. Pessoas muito pobres vivem em cortiços situados em áreas centrais de preço elevado. (...) A poucos passos da Bolsa se sente o aroma do café torrado; a uns cem metros de Times Squares, o fedor dos matadouros. (...) A situação contraria todo o sentido de ordem. As coisas estão fora de seu lugar natural. É necessário corrigir essa confusão para que as atividades se realizem em lugares apropriados. 3

O outro exemplo é Buenos Aires. E quanto a isso possuímos várias indicações do excelente estudo de Norberto Ferreras sobre os principais aspetos da vida cotidiana da classe trabalhadora de Buenos Aires. Assim como as principais cidades do novo mundo, a cidade portenha era cercada de quintais e chácaras.3 A produção agrícola se desenvolvia colada à cidade. Esse era um fator, entre tantos outros, que tornavam plenamente possível a prática de usos rurais, mesmo que fosse no perímetro urbano. Mas a cidade sofria também com os precários mecanismos de abastecimento de gêneros: faltas de meios de transporte, excesso de intermediários, cujas repercussões só se agravaram com a explosão demográfica do ultimo quartel do XIX, impulsionada fundamentalmente pela onda imigratória. Acrescente-se que em tal contexto, o encarecimento dos gêneros era quase que umconseqüência natural, dificultando mais ainda a sua obtenção em níveis satisfatórios por parte das classes mais pobres. De modo a contornar tais problemas uma das medidas encontradas, assinala Ferreras, foi a realização da pequena agricultura para subsistência ou simples de complementação da alimentação. A forma mais freqüente era a criação e o cultivo em casa, ou em terreno baldio próximo à moradia. O autor destaca ainda que essa iniciativa era incentivada pelos higienistas da Segundo alguns, esse muro teria sido construído exatamente por iniciativa de fazendeiros para proteger as suas lavouras do ataque de porcos. Porém, esta versão – que pode ser lida na íntegra em: - parece ser mais anedótica do que verírica. Com base em documentos de época, Robert Shorto defende que as razões que levaram à construção do muro têm a ver com o temor que os holandeses tinham de possíveis ataques de ingleses para conquistar a ilha de Manhattan, o que acabou acontecendo em agosto de 1664. 3 Apud TOPALOV, Christian. “Da questão social aos problemas urbanos: os reformadores e a população das metrópoles em princípios do século XX”. RIBEIRO, Luiz César de Queiroz; PECHMAN, Robert Moses (orgs.). Cidade, povo e nação. Gênese do urbanismo moderno. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1996. p. 44. 3 FERRERAS, Norberto Osvaldo. Cidades inumanas: condições de vida dos trabalhadores de Buenos Aires e Rio de Janeiro (1930-1945). Niterói, Dissertação de Mestrado em História, UFF, 1995. p. 41.

época, já que “resultava numa elevação dos níveis de consumo de proteínas e vitaminas sem custo”. Provavelmente este tipo de prática era mais comum nos bairros periféricos, onde havia maior disponibilidade de terrenos com espaço adequado. Até por isso, “as autoridades na área social entendiam que a solução para a alimentação dependia em grande parte desse traslado [centro-periferia], por isso o incentivaram , quando possível, afirmando que os cultivos e criações ajudavam nos orçamentos familiares.”

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Sem contar

que a principal vantagem desses terrenos era serem justamente menos valorizados e, portanto, mais acessíveis. Entretanto, nem todos estavam dispostos, em que pese algumas vantagens, a ir morar em lugares distantes do lugar de trabalho e em condições, talvez, piores do que as encontradas no centro da cidade. Daí que não fossem poucos os que conseguissem encontrar maneiras de driblar a falta de espaço no centro. O autor observa que muitos imigrantes tinham condições de alugar um pátio, “mesmo quando partilhado”, para realizar pequenas produções. Algumas informações também indicam que a criação de animais no centro da cidade talvez não fosse algo incomum. O autor cita trechos de um informe de uma comissão que tinha como função vistoriar moradias de sua paróquia. Aqui trata-se do relato das condições de higiene de um cortiço (coventillo) localizado na paróquia de Concepción, “um bairro adjacente à Praça de Mayo”: (...) A casa da mesma rua no nº 427 é de propriedade de uma célebre curandeira que nela mora. Tem dois quartos com tetos de palha edificados num terreno de 8 varas de frente por 20 de fundo. Nesta pequena área de terra há uma coleção de animais, capaz de servir de base a um jardim zoológico. Parece inverossímil que estas casas estejam reunidas no centro de uma cidade populosa, assim como custa crer na existência de tais imundícies há tantos anos; simbolizando isto, o abandono por parte das autoridades 5 ou que o poder destas tem sido inócuo contra as inumanidades viciosas de que estas gentes gozam.

A criação de frangos e galinhas era uma criação muito encontrada junto às palafitas dos imigrantes genoveses que habitavam em La Boca. A sua grande incidência na região, a qual somavam-se os cultivos de tomate, legumes e frutas, era vista pelos reformadores da época como “práticas que representavam o descaso do imigrante por integrar-se na nova sociedade, ou eram apresentadas como símbolos do atraso daqueles que mantinham suas origens rurais, sem conseguir se incorporar ao meio urbano”. Ao invés disso, o panorama apresentado por La Boca se resumia a “alguns frangos raquíticos ciscando no lixo, ou entre legumes e tomates murchos.” Uma afronta para olhares imbuídos da visão que entendia a civilização baseada no modus vivendi europeu como meta suprema a ser alcançada. 4 5

Ibidem. p. 157. Ibidem. p. 72.

Ferreras destaca um aspecto importante que contribuía para a permanência de práticas rurais no perímetro urbano, especialmente por parte dos imigrantes - a sua origem rural: Eles mantinham um pequeno quintal para produzir os produtos do dia-a-dia e para manter alguns costumes trazidos das suas regiões natais. Onde os genoveses de La Boca poderiam conseguir um pouco de manjericão, senão na sua própria casa? Onde um sírio poderia conseguir umas folhas de hortelã, e o espanhol um pouco de orégano? Era tal a relação do imigrante com esses costumes que a existência do pequeno cultivo denotava 6 a origem do morador.

Mas não eram só os recém-chegados que praticavam pequenas criações e cultivos. Muitas famílias tradicionais, destaca Ferreras, “principalmente aquelas que moravam nos grandes casarões coloniais, mantinham um pequeno pomar, reminiscência da fazenda, quando não uma criação de galinhas e frangos, ou mesmo uma horta”. Com o cultivo de árvores frutíferas, como parreiras e figueiras, tinha-se vários benefícios, desde a providencial sombra em tardes de calor, passando pelo fato de servir de local ideal para se beber chimarrão e conversar com os amigos até o detalhe de que as uvas e figos serviam para complementar a alimentação, provavelmente sob a forma de sobremesa. O grande trânsito de vacas era outro grande exemplo da presença de práticas rurais no perímetro urbano da cidade argentina. Para satisfazer a demanda crescente de leite, os trabalhadores contavam não só com os serviços das grandes empresas, mas também com “os produtores que integravam todo o circuito [da produção até a comercialização], donos de uma única vaca, cansada e magra, com a qual iam de porta em porta, vendendo o leite colhido na hora”.7 Esse tipo de leite, acrescenta o autor, talvez fosse o único verdadeiramente puro numa época tão marcada pela adulteração desse produto (coma a adição de água, por exemplo). Mas havia, lembra o autor, o risco de o leite provir de vaca enferma ou cansada, além de não ser pasteurizado. Por último, o autor frisa que os traços rurais também se expressavam em várias formas de moradia existentes no centro e em seus arredores. Os coventillos da cidade eram seus maiores exemplares. Pelo que informa o autor, pode-se deduzir que eles tinham sido construídos pela elite agrária colonial desde o início do século XVIII. Além de oferecerem condições para se constituírem em bons cortiços a partir do fim do século XIX, era quase impossível que numa cidade que sofria intensamente com seus deficientes mecanismos de abastecimento de gêneros, e onde qualquer iniciativa que ajudasse a baratear o custos com

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Ibidem. pp. 157-158. Ibidem. p. 108.

alimentação era bem-vinda, as famílias que nele habitassem não se sentissem tentadas a transformar os seus dois ou três espaçosos pátios com quintal, um lugar para pequenas hortas ou tão somente um quintal onde pudesse deixar ciscar ali umas tantas galinhas de sua própria criação. Poderíamos citar ainda o exemplo de São Paulo, hoje centro da maior região metropolitana do Brasil. Talvez exemplo maior da cultura urbana no país, a cidade tinha até os primeiros anos do século XX numerosas chácaras espalhadas pelos seus centro histórico, mais precisamente na área que circunda o Largo da Sé. 8 O Vale do Anhangabaú, antes de se tornar um marco da modernização da cidade, era por exemplo, um vasto campo salpicado por chácaras até a década de 1910. Os próprios arrabaldes (Vila Buarque, Santa Cecília e Campos Elíseos) não eram mais do que uma faixa de terra ocupada por “antigas e aprazíveis chácaras” que foram a partir da década de 1880 loteadas para o estabelecimento de bairros residenciais voltados para a elite paulistana, como os de Higienópolis e Pacaembu. 9 Chegamos finalmente ao Rio de Janeiro, que é o que mais nos interessa. Vimos acima que era significativa a presença de traços rurais naquelas cidades e nos seus arredores (arrabaldes). Seja sob a forma de construções tradicionalmente associadas ao âmbito rural, pequenas criações e culturas, especialmente hortícolas, e, o trânsito de animais (vacas e porcos). Cabe perguntar então quais foram as condições históricas que permitiram que o centro do Rio assumisse tal tipo de configuração.

Jean Baptiste Debret

8

TOLEDO, Roberto Pompeu de. A capital da solidão: uma história de São Paulo das origens a 1900. Rio de Janeiro: Objetiva, 2003. p. 492. O Vale do Chá deve esse nome a cultura que ali era realizada desse gênero. Quanto a isso o Museu de Arte Contemporânea, localizado na Cidade Universitária (USP), possui um belíssimo acervo de fotos de época (início do século XX) sobre o centro da cidade de São Paulo. 9 MORAES, José Geraldo Vinci de. Cidade e cultura urbana na primeira república. São Paulo: Atual, 1994. p. 51.

A Produção agrícola na cidade do Rio – Século XIX Era plenamente compreensível que chegado o século XIX, a cidade do Rio de Janeiro, em seus aspectos mais urbanos, convive-se com aspectos que bem podiam estar presentes em vilarejos e povoados rurais: atividades agrícolas, como a criação de animais e cultivos de alimentos, eram parte integrante do mundo urbano carioca. Até essa época era muito difícil imaginar uma cidade bem desenvolvida e viável sem que nela pudesse haver o livre caminhar da agricultura. Esta se fazia não apenas necessária à cidade, não era apenas um dos seus pilares (para muitos cidadãos e cidadãs): a agricultura também tinha direito de cidadania, pois vivia em seu interior. Adolfo Morales de los Rios lembra que um dos maiores méritos do Dr. Antonio Salema, governador do Sul do Brasil a partir de 1753, foi exatamente “fomentar a agricultura”: Como homem prático, compreendeu necessitar a cidade de viver do campo. Para isso, suas vistas se voltaram para a zona sul, onde abundavam os terrenos altos e, por isso, enxutos, e água em abundancia: a da vasta lagoa de Sacopenapã e a de vários rios que a carreavam das montanhas, com despejo na lagoa. (...) Procura facilitar as comunicações com a zona rural ao derrubar matos e abrir caminhos. Entretanto, na dúbia expressão de Rocha Pombo, os caminhos foram abertos onde era menos difícil esse trabalho. 10

O peso e a influência do universo rural sobre a cidade do Rio de Janeiro seguiu sendo considerável nas décadas seguintes, mesmo entrando no século XIX. E isso se deixa transparecer nos nomes das ruas. A toponímica de várias localidades nos fornece um rico acervo. A força do rural se apresenta tanto em localidades cujos nomes fazem referência a aspectos eminentemente rurais: Campo Grande, Campinho, Rocinha, Laranjeiras, Mangueira, Caju,

Morro

dos

Cabritos,

Curral Falso,

Anil,

Bananal,

Dendê,

Pitangueiras, Caroba, Morro do Salgueiro; como nas denominações que fazem alusão às grandes propriedades (fazendas) da qual se originaram – e que são mais recorrentes. Quanto mais nos aproximamos da Zona Oeste: Jardim Piaí (Sepetiba), Cantagalo (Campo Grande), Caxamorra (Guaratiba), Realengo, Engenho Novo, Engenho da Rainha, Engenho de Dentro, Fazenda Botafogo, Vale do Curtume, Fazenda Coqueiro, Serra do Lameirão, Fazenda da Bica, Campo do Peixoto, Campo do Engenho de Fora, Serra do Viegas. E não esqueçamos o fato de que a hoje Tijuca fora por quase três séculos chamada de Engenho Velho. Por outro lado, encontramos alusões diretas aos próprios grandes proprietários – eis os casos de (Lourenço) Madureira, Leblon (de Charles Le Blond), 10

RIOS, Adolfo Morales de los. “Evolução urbana e arquitetônica do Rio de Janeiro nos séculos XVI e XVII (1567-1699)”, In: Revista do IHBG, vol. 288, julho-setembro-1970. p. 229.

Meiér (de Augusto Duque Estrada Meyer), (Barão da) Taquara, Botafogo (apelido do fazendeiro João Pereira de Sousa, já que fora chefe de artilharia do galeão de mesmo nome), Vitor Dumas e talvez o mais curioso exemplo: a Praça Seca, que seria uma corruptela de Visconde de Asseca, cujas terras iam ao que hoje conhecemos como Barra da Tijuca. Ainda poderíamos citar alguns logradouros cujos nomes não mais existem, casos de Mata-Porcos (Estácio) e Mata-Cavalos (Riachuelo).

Jean-Babtiste Debret. Arcos da Lapa, 1817.

Ainda em relação ao contexto do Rio de Janeiro no período colonial, os trabalhos de Vieira Fazenda e Vivaldo Coaracy, por exemplo, informam sobre um sem número de chácaras que ocupavam o núcleo urbano, destacando-se os das ordens religiosas como

os beneditinos (Morro de São Bento), jesuítas (Morro do Castelo) e

franciscanos (Morro de Santo Antônio). Paulo Berger nos conta que famosos logradouros existentes até hoje foram originalmente construídos para dar acesso a algumas dessas propriedades. A rua da Quitanda era antigamente o caminho que levava à chácara dos frades de São Bento. Já a rua da Alfândega fora o caminho que levava ao Engenho Pequeno dos Jesuítas. A própria legislação adota por D. João VI sobre Décimas Urbanas buscava preservar algumas atividades rurais. Inúmeras ruas do centro abrigassem estábulos com criação de vacas destinadas à para a produção de leite e fornecimento de carne; várias lavouras voltadas para a horticultura. O atual Campo de Santana era até praticamente fins do século XIX o principal ponto de venda de carnes da Corte.

Mas tal convivência (entre “rural” e “urbano”, podemos dizer assim) não era livre de tensões e rusgas. Conforme o século XIX ia avançando elas se tornavam mais evidentes. O caso da criação e comércio de porcos é bastante emblemático. Já no seu início, tal comércio passaria a ser seriamente restringido no âmbito urbano. Num Edital de 1819 a criação de porcos era terminantemente proibida nas áreas abarcadas pelas Décimas Urbanas. Ao lermos o “Projecto de postura para os chiqueiros e depositos de porcos” na cidade, nota-se que embora seja proibida a sua criação no interior da cidade, o seu comércio era ainda plenamente aceito: Art. 1º – São absolutamente prohibidas, da data da publicação desta postura em diante, os depositos de porcos, grandes ou pequenos, excepto nos matadouros licenciados pela Illma. Camara Municipal, no perimetro da cidade, comprehendido dentro de uma linha que abranja em seus limites extremos o campo de S. Christovão, a rua de S. Francisco Xavier do Engenho Velho, e a rua da Real Grandeza e largo dos Leões, na freguezia de S. João Baptista da Lagôa, inclusive os morros situados neste perimetro. [...] Art. 2º – São, porém, permittidos, com licença da Illma. Camara, esses depositos nos pontos limítrophes dos extremos indicados, nos fundos das grandes chacaras, sob condição de ser o sólo do logar onde existirem calçado, cimentado e nivelado de fórma a dar facil escoamento às aguas e outras immundicias para cisternas ou poços construidos com fundo e lados impermeaveis, a fim de se poderem retirar as materias nelles accumuladas depois de convenientemente desinfectadas.11

Mas já em 1823, o próprio comércio (trânsito) suíno sofria sério revés. Os poderes públicos passaram a frear a circulação de porcos no interior da cidade. Assim, Estevão Ribeiro, “Conselheiro do Império e Intendente Geral da Polícia da Corte”, baixava em 1823 um edital pelo qual ficava “proibido a matança de porcos no perímetro urbano.” Uma usança, conforme se depreende, bastante disseminada em plena capital do Império: Faço saber que sendo mui prejudicial à saúde Publica, e à conservação dos predios, ruas, e estradas desta Cidade, e seus suburbios, rocios, e Praias não só os porcos, que andão soltos, mas mesmo os que se conservão, ou sejão para criar, ou para cevar, feichados em chiqueiros, e nos quintaes; e cumprindo-me evitar estes dannos, e abuzos: Ordeno, que da publicação do prezente Edital em diante ninguem conserve porcos, debaixo de quaesquer cautelas que sejão, desde a ponte do Catete athe as pontes de S. Christovão, e Engenho Velho, com a pena de perdimento delles para os aprehensores, e de pagarem quatro mil réis por cada cabeça para a S. Caza de Mizericórdia, ficando somente exceptuadas as manadas de porcos, que entrão para os açougues, e que se devem conservar nos curraes e lugares designados no Edital de 27 de Março de 1819, que fica em todo o seo vigor. Os Cabos, e Patrulhas do Corpo da Guarda da Policia, e os Officiaes da Intendencia Geral da Policia ficão declarado, e authorizados para poderem dar buscas, havendo, certeza, e fazer aprehençoens em quaesquer quintaes onde existirem. E para que chegue à notícia de todos se affixará este nos lugares publicos, e do estilo.12

Mas a perseguição aos usos rurais não era linear, algo irresistível. Como se bastasse ao governo estipular normas e leis, e como num passe de mágica extirpar do cenário da

11 12

Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro. Códice: Matança de Suínos. Notação: 53-3-17. Idem.

cidade os usos indesejáveis. Muito pelo contrário. As resistências a tal processo foram constantes. Vários dos comerciantes envolvidos nesse tipo de comércio buscaram os tribunais ou recorreram diretamente ao governo municipal para sustar as leis que os prejudicavam. Veja-se este importante testemunho de janeiro de 1838. Trata-se de um requerimento dirigido à Câmara Municipal por um retalhista de carne que vivia no que é hoje Botafogo. Diz Matheus Ignacio, morador da rua de São Clemente, districto da Freguesia da Lagôa, com talho de carne de Vacca, e Porco, e como o Suppte. Todas as semanas consome [...] no seu talho, e nas da quella Freguesia, e lhe He bastante penozo hir todos os dias ao Campo da Acclamação para trazer dous porcos por ser bastante estençoso o caminho por isso que Pede a V.S. sejão servido conceder-lhe licença para ter no seu quintal todas 13 as semanas doze porcos [...].

Vale notar que desde essa época, os poderes públicos fundamentaram suas ações contra esse comércio alegando questões de “saúde pública”. A representação feita por um grupo de comerciantes, em protesto às proibições da municipalidade contra a criação de porcos no perímetro urbano, é bastante ilustrativa a esse respeito: Representão a VVSSª os Marchante de carne de porco com talhos estabelecidos em quasi todas as ruas desta cidade qual a razão, e justiça de que julgão apoiados contra a disposição da Veneranda Postura proximamente publicada na supposição de que os Porcos criados e sevados em Minas Geraes e S. Paulo, e que aqui nos trazem para o diario consumo são causadores de males contrarios á saude Publica, como se colhe da Postura Decima 1ª […] A disposição do §s 1 T Secção 1ª das Posturas de 4 de Abril (?) de 1831 he aplicavel ao caso de qualquer deposito de Porcos, que se haja de fazer, e que fica expressamente vedado em qualquer ponto dentro desta cidade, ainda mesmo que se [danificado] ser o deposito por poucos momentos. A Postura supra falando reverentemente he digna de ser reformada attentas as razoens que passaremos a expender fundadas na justiça, e utilidade publica, e que certamente serão tomadas na devida consideração à vista do Patriotismo, e zêlo de V.V.SS.ª He claro a todas as luzes, e ninguem certamente o poderá duvidar de que a Carne de porco he um dos principaes alimentos de que nutre a população do Rio de Janeiro, a qual tem necessariamente de ressentir=se se accaso um tal alimento deixa de existir, o que na verdade deverá suceder se accaso se puser em execução similhante (sic) Postura, sem igual sofrimento terão as Provincias de Minas, e S. Paulo vendose privadas deste principal ramo de seu commercio. A noticia de que pela Camara Municipal do Rio de Janeiro se havia promulgado uma Postura em que prohibia o deposito de Porcos dentro da Cidade tendo chegado ao conhecimento de varios Mineiros, Paulistas, que na bôa fé conduzião para esta Cidade manadas de porcos (producto este de suas Criaçoens) a fim de serem recolhidos nos depositos aqui existentes, os quaes sendo presentemente prohibidos e não existindo [danificado] em alguma outra parte, tem feito com que em grande parte daquelles que para aqui traziam manadas de porcos tenhão regressado com as suas fazenda.

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Importante destacar que a partir de certa época a pressão contra atividades tidas como insalubres, como era a que envolvia o gado suíno, não era feita exclusivamente pelos poderes públicos. Parcela expressiva da população encorpava o movimento contra tal 13

Idem. AGCJ - 47.4.57 Porcos (Depósitos de porcos no centro da cidade). Representação dos marchantes estabelecidos na cidade (sobre a liberdade de criarem suinos dentro da cidade), com referencia à postura da Camara, 1834. 14

comércio. E a atuação de segmentos da sociedade só cresceria ao longo do tempo. A imprensa foi se constituindo como um importante canal de expressão de tal comportamento, principalmente por meio das famosas seções de “Carta dos Leitores”. Semanalmente os vários jornais da capital recebiam correspondências de moradores denunciando e se queixando da insalubridade, pelas condições precárias ocasionadas pela falta de higiene praticada por alguns criadores em seus estabelecimentos comerciais. Uma parte desses moradores chegou a recorrer diretamente aos poderes públicos. Várias dessas denúncias chegavam às mãos de inspetores, fiscais, diretores de repartição etc. Vejamos essa representação coletiva de 1850. Vários moradores de uma localidade bem próxima ao centro do Rio denunciam um matadouro de porcos. Podemos ver ainda como os argumentos vão crescentemente se apoiando na noção de “saúde pública”. Os moradores da rua Formosa e do Sabão, vem respeitosamente suplicar de V.V.S.S., providencias respeito a um deposito aonde existem e se matão diariamente porcos, que tem sido para os moradores daquellas ruas um continuo flagello do máo cheiro que exhala em certas oras do dia, occasionado pelo sangue que fica estagnado, por não ter esgoto, o que é causa de costantes emcommodos de saude que por ali tem apparecido, e que agora se tornará sem duvida ainda mais pernicioso, tanto pela epedemia que grassa nesta cidade como pelo calor que está proximo, e q ha de sem duvida tornar mais pestilento aquelle lugar. Ora sendo prohibido pelas Posturas da Camara q se criem porcos nos quintaes, não deve ser tambem prohibido um curral como o q existe na rua formosa? Outro abuzo não menos escandalozo estamos continuadamente observando, que é ver se pelas outras freguesias aprehendidas os porcos q vagão pelas ruas entretanto q nestas as vemos sempre em manadas, e q nenhuma providencia se tem dado, quando hoje se publicão Editaes para a limpeza das ruas, conciderando-se(sic) nisso um meio de cortar a peste q tanto estrago tem produsido. Illmos. Snrs. nós não pretendemos culpar o Fiscal desta freguezia, porque sinceramente conhecemos, q se elle quizer cumprir com o seo dever dando cumprimento ao Art. das Posturas, se verá talvez sem emprego, e por isso sem ter pão para as suas filhas; assim os Suppes. esperão de VVSS as mais energicas providencias, tornando por si mesmo conhecimento do q levamos expendido, e pondo de parte qualquer condescendencias, fazer executar a Lei, para que assim sejão respeitadas outras deliberações de VVSS. Os supp. certos da justa pretensão (sic) que levão ao conhecimento de VVSS, certos de que VVSS não desejarão q uma parte do seo Municipio deixem de gosar aquellas garantias de que o geral gosa, em proveito somente de um interessado, quando tantos soffrem e de uma maneira Costante vexatoria, por isso q redunda em grave prejuiso da saude publica muito confião na imparcialidade de VVSS [...].15

Tanto foi a pressão que no próprio ano de 1850 a Municipalidade encaminharia um projeto restringindo não apenas o comércio como a própria criação de porcos na cidade: Art. 1º – São absolutamente prohibidas, da data da publicação desta postura em diante, os depositos de porcos, grandes ou pequenos, excepto nos matadouros licenciados pela Illma. Camara Municipal, no perimetro da cidade, comprehendido dentro de uma linha que abranja em seus limites extremos o campo de S. Christovão, a rua de S. Francisco Xavier do Engenho Velho, e a rua da Real Grandeza e largo dos Leões, na freguezia de S. João Baptista da Lagôa, inclusive os morros situados neste perimetro. Os infractores destas disposições serão multados em 30#000 pela 1ª vez e no dobro na reincidencia, e na perda dos porcos, que serão apprehendidos e vendidos em hasta publica para pagamento da referida multa,

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Idem.

entregando-se o excesso do producto da venda a seus donos, os quaes, no caso de não chegar o mesmo producto para pagamento do valor da multa, o completarão. Art. 2º – São, porém, permittidos, com licença da Illma. Camara, esses depositos nos pontos limítrophes dos extremos indicados, nos fundos das grandes chacaras, sob condição de ser o sólo do logar onde existirem calçado, cimentado e nivelado de fórma a dar facil escoamento às aguas e outras immundicias para cisternas ou poços construidos com fundo e lados impermeaveis, a fim de se poderem retirar as materias nelles accumuladas depois de convenientemente desinfectadas. § 1º – As disposições deste artigo vigorarão até os limites da Praia Pequena, estação do Engenho Novo, Caixa d'Água, na Tijuca, e Piassaba. § 2º – D'ahi para o interior não será preciso tirar licença da Illma. Camara para taes depositos ou chiqueiros; mas nunca serão estes estabelecidos à margem das estradas, nem nas proximidades das povoações. [...] Art.3º – É tambem prohibido criar ou conservar porcos dentro da cidade, nas áreas, pateos, quintaes das casas particulares, assim como nas cocheiras de animaes, cortiços, estalagens, ou quaesquer outros edificios. Os infractores incorrerão nas multas especificadas no artigo 1º. Art. 4º – Os porcos que forem encontrados vagando nas ruas, praças e outros logradouros publicos da cidade e seus arrabaldes, assim como nos povoados das freguezias extra-muros, serão apprehendidos e vendidos em hasta publica, revertendo o producto da venda em partes iguaes para o agente fiscal que os apprehender e para a bibliotheca municipal.16

A própria imprensa contribuia com esse movimento de reprovação da produção e do comércio de gêneros na cidade. A Revista Illustrada era uma das mais atuantes. Em vários editoriais ela se manifstava contra o estado degradante da higiene pública, advogando frequentemente por uma grande e profunda reforma da Capital: “O caso é que não podemos continuar a viver em tão porca e pestilenta capital”, afirma num editorial de 1891. Num outro número, do mesmo ano, a Revista comparava a cidade, que chamava de “Capital Fedorenta”, à Ilha de Sapucaia – uma ilhota localizada na Baía de Guanabara, destinada ao descarte e depósito de entulho e lixo, ou seja, a cidade era comparada a um gigantesco terreno baldio. Mas não eram só os porcos que sofriam com o assédio dos poderes públicos e da população. Anos depois, em fevereiro de 1866, o próprio Governo Imperial baixaria uma outra Postura, ampliando a probição de abate rezes para porcos, cabras e ovelhas: 1ª A disposição do ss 1º Tit. 14 Secç 1ª do Codigo das Posturas prohibindo matar, esquartejar rêzes para consumo publico sem ser nos matadouros publicos, ou particulares com licença da Camara, fica extendida aos porcos, cabras e ovelhas, designando a mesma Camara lugares especiaes para sua matança para o consumo publico. (...) 2º Todo aquelle que comerciar nestas carnes, ou em açougues, ou pelas ruas deverá apresentar, quando reclamado pela autoridade fiscal, uma guia para que aquella disposição não seja illudida, incorrendo o infractor na multa de 20#000. 3º Nenhum comerciante destes pode ter nos quintaes, pateos, ou qualquer outro lugar de suas casas de negocio, encurralados os mencionados animaes em qualquer numero que sejão, e debaixo de nenhum pretexto, visto como a matança dos mesmos so se deverá effeituar (sic) nos lugares designados pela Camara [...].17

16 17

Idem. Idem.

Décadas depois, em julho de 1899 a Prefeitura resolve regulamentar a forma e as condições em que os estábulos deveriam funcionar. Era uma iniciativa em favor da melhoria das condições sanitárias de criação do gado, segundo a Prefeitura. Como consequência: os custos aumentavam sobremaneira. E logicamente também, os criadores e comerciantes consideravam ser exatamente essa a principal motivação da lei. Esse sentimento seria exacerbado durante o mandado de Pereira Passos, em especial por parte do comércio envolvendo gêneros e criação animal que ainda tinha sobrevivido a um verdadeiro arsenal de legislação francamente hostil às suas atividades. Os negociantes e criadores ligados ao comércio de leite foram os mais destacados em termos de embates com o referido governo. *** Quando se iniciou a administração de Pereira Passos junto a Prefeitura do Rio de Janeiro, já havia um enorme acúmulo de normas e leis, dispostas por meio e Posturas, Editais e Decretos, que visavam coibir o tradicional comercio de gêneros, tal como ele se desenvolvia por quase todo o século XIX, e extinguir também a criação de animais envolvidos com esse comércio. O historiador Rafael Mattoso nota que a partir da década de 1880 até o período do Governo Passos podemos observar uma grande concentração de leis restringindo o a produção e comércio de gêneros na cidade do Rio. Temos assim a seguinte listagem:18  22/10/1885 – Postura proibe a cultura de agrião nas freguesias de Sacramento, Candelária, São José, Glória, Sant‟Anna, Santo Antonio, Santa Rita, Espírito Santo, Engenho Velho e São Cristóvão.  09/04/1886 – Postura que proíbe hortaliças nos terrenos marginais das ruas da cidade e subúrbios que tiveram calçamento.  30/04/1887 – Postura que proíbe albergarias de vacas em área central, exceto nos morros do Castelo, Santa Tereza, Paula Mattos e Livramento.  1889 – Código de Posturas sobre cortiços ou casas para operários e classes pouco favorecidas:  Art. 1º - determina o número máximo de casas (5);  Art. 2º - permite aviário no local;  Art. 3º - proíbe a criação de outros animais no perímetro das casas; 18

MATTOSO, Rafael. A estética do Subúrbio. Trabalho de Conclusão de Curso em História, Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2006. pp. 300-03.

 01/12/1890 – Postura que proíbe chiqueiros e depósitos de porcos nas paroquias do Sacramento, São José, Candelária, Santa Rita, Sant‟Anna, Santo Antonio, Espírito Santo, Glória, Lagoa, São Cristovão, Engenho Velho e Engenho Novo.  28/01/1891 – Postura que proíbe hortas para comércio e capinzais nas freguesias, exceto Gávea e Engenho Novo.  15/07/1899 – regulamenta a construção e condições de funcionamento dos estábulos da cidade. Ou seja, Pereira Passos não perseguiu mais os usos rurais, a criação de animais no perímetro urbano mais que os seus antecessores. Não parece ter sido exatamente isso o que o diferenciou seu mandato dos anteriores. Parece certo afirmar que quando Passos inicia o seu governo muito do que havia sido esse comércio de gêneros já tinha sido bem descaracterizado. A criação e comércio de porcos já haviam sido plenamente regulamentados. A criação desse tipo de gado se dava em áreas bem distantes da zona urbana, bem lá pelas bandas de Santa Cruz, Campo Grande e Jacarepaguá. Mas alguns aspectos desse comércio persistiam. E ainda causavam bastante incômodo a quem espera fazer do Rio um espelho de Paris nos trópicos. Tal era o empenho que Pereira Passos fez questão de enaltecer, ele mesmo, algumas medidas que estabeleceu pra extinguir tal comércio no centro da cidade. O mais visado por ele seria o comércio de leite: Comecei por impedir a venda pelas ruas de visceras de rezes expostas em taboleiros, cercados pelo vôo continuo de insectos, o que constituia espetáculo repugnante. Aboli, igualmente, a pratica rustica de se ordenharem vaccas leiteiras na via pública, que iam cobrindo com os seus dejectos, scenas estas que ninguem, certamente, achará digna de uma cidade civilisada. Apezar das serias difficuldades financeiras do D.F., julguei não dever preoccupar-me com a diminuição de suas rendas proveniente desses dous actos, por importarem elles na satisfação de necessidade urgentissima e por isso compensarem de sobejo quaesquer 19 sacrificios.

Ao promulgar a Consolidação das Posturas Municipais em 1906, Passos ratificava antigas leis que coibiam a produção e comercialização de gêneros e animais, como atualizava outros. Sobre o “commércio de aves ou outros animaes tocados em bando”, o Art. 740 determinava: “Fica proibido, em todo o D.F., o commercio de aves ou quaesquer outros

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BRENNA, Giovanna Rosso Del. O Rio de Janeiro de Pereira Passos. Uma cidade em questão.

animais tocados em bandos pelas ruas e praças públicas, conduzidos suspensos, ou de azas ou pernas atadas.” Sobre as hortas e capinzais, o Governo Passos confirma as posturas de 1886 e 1891, que proibiam terminantemente o respectivo cultivo nas freguesias urbanas e mesmo nas ruas dos subúrbios que estivessem calçadas. Mas acrescentava por meio do artigo 2.894: Ficam prohibidos a plantação e o cultivo de capinzaes e hortas para o commercio no perimetro da zona urbana do D.F., fixado no art. 2.856; devendo ser extinctos os que existirem na zona prohibida, dentro do prazo determinado no art. 2.857. Parágrafo um. O infractor incorrerá na multa de 100$, dobrado na reincidencia. Art. 2847. É expressamente prohibido empregar nos cultivos feitos na zona urbana do D.F., esterco de qualquer animal ou de origem vegetal, antes que estejam completamente humificados, de accordo com as disposições da lei.20

Mas caso houvesse infração desse ponto, a Postura elaborada pela Polícia Administrativa de Passos previa penas bem duras. Que não se limitavam a multas. Quem desrespeitasse o estabelecido na postura poderia ser preso. Parágrafo único. A infração deste artigo importará na multa de 100$, prisão do infractor por 5 dias, cremação immediata do esterco; se este já estiver espalhado, pagará o infractor mais 100$ de multa.

Interessante notar que com Passos, a proibição de certos usos não é a única modalidade utilizada para coibir determinadas práticas. A Prefeitura passa a regulamentar detalhes mínimos desse tipo de comércio. A criação de vacas leiteiras é um exemplo. E era esse comércio, aquele envolvendo vacas que mais chamava a atenção dos poderes públicos e da imprensa em geral. E foi ela que acabou sendo a mais visada pelo furor modernizante pelo Prefeito do “Bota-Abaixo”. Passos se apropriou de uma série de dispositivos que vinham sendo implementados ao longo das últimas três décadas. Além de confirma-los e atualizá-los, as multas por descumprimento foram intensificadas. A regulamentação sobre esse comércio não deixava passar praticamente nada. Tudo que dissesse respeito à criação de vacas destinadas ao comércio de leite e carne passava por uma rigorosa regulamentação ou até mesmo proibição: vacinação (principalmente a tuberculina), alimentação, registro de cada animal, pagamento de licenças e impostos, construção de estábulos, reforma dos mesmos; e proibição do uso de sinetas para anunciar a venda de leite. Todo esse conjunto de interdições já existiam com a chegada de Passos ao poder municipal. A única medida que

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RIO DE JANEIRO. Consolidação de Posturas de 1906.....

foi realmente de autoria dele foi a proibição da ordenha de vacas pelas ruas do centro da cidade. O curioso é que Passos voltaria atrás na proibição do uso das sinetas nas carrocinhas. E logo que fez isso, houve considerável protesto. Uma carta de protesto assinado por vários “munícipes” dá bem a dimensão de que o processo autoritário de modernização tinha raízes mais profundas, que não se limitavam aos gabinetes dos chefões do executivo e nem às escrivaninhas da elite tecnocrática da época. Os pruridos modernizantes eram mais socialmente compartilhados do que supunham estudiosos do tema de décadas atrás. Mas vamos a carta, datada de 23 de março de 1903: Se não nos falha a memória, há um aviso ou Decreto, promulgado por um antecessor de V. Exa., a um anno, mais ou menos, que prohibe os vendedores de leite, em carrocinhas, de tocarem as campainhas das mesmas, antes das 9 horas da manhã, ou cousa que se pareça com isso. Essa Lei, Exm. Snr., foi respeitada alguns dias, porem, depois, continuou a enfermeira dos taes toques desde as 4 horas da manhã, que é um verdadeiro martírio, mormente para aquelles que passam mal as noites, por moléstia, que muitas vezes, no melhor do sonno, são despertados pelos taes toques, perfeitamente dispensáveis. Sendo Lei, pedimos a V.Exa. prestaria, se promulgasse uma, que acabasse com tal abuso[...]. 21

Mas como nos governos anteriores, a resistência a essas medidas da Prefeitura se fizeram sentir. Essa faceta das reformas urbanas que tomaram conta do Rio de Janeiro entre o fim do século XIX e início do XX - e que por décadas foi ignorado pela historiografia dedicada ao tema, tem sido – vem sido mais recentemente desvendada por minuciosas pesquisas, servindo-se de documentação e época tradicionalmente ignoradas como processos criminais e cíveis, documentos administrativos e relatórios oficiais. É o caso dos excelentes trabalhos de Eneida Queiroz e Cristiane Miyasaka.22 Cristiane, por exemplo, analisa um amplo conjunto de abaixo-assinados e requerimentos, e acaba demostrando que o caminho que levou da criação dos projetos e das leis pelos governos até a sua efetiva aplicação, isto é, à vitória do projeto civilizador

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ACGRJ, Comércio e Leite.... QUEIROZ, Eneida Quadros. Cidadãos e Judiciário nas reformas urbana e sanitária – Rio de Janeiro (1904-1914). Dissertação de Mestrado em História Social, Universidade Federal Fluminense, 2008; MIYASAKA, Cristiane Regina. “Na mira dos funcionários municipais: considerações acerca das infrações de postura nos distritos suburbanos do Rio de Janeiro no início do século XX”, In: Revista Mundos do Trabalho, vol.5, nº 9, janeiro-junho de 2013, p. 75-100. Ainda sobre a temática das resistências aos projetos de modernização da cidade destaco também o trabalho de POPINIGIS, Fabiane. “As Sociedades Caixeirais e o „fechamento das portas‟ no Rio de Janeiro (1850-1912). RIO DE JANEIRO (1850-1912). Cad. AEL, v.6, n.10/11, 1999; Ler também a tese da autora - Operários de casaca? Relações de trabalho e lazer no comercio carioca na virada dos séculos XIX e XX. Tese de doutorado em História, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2003. 22

das elites cariocas, foi extremamente tortuoso, tenso e imprevisível em diversos momentos. A vitória – e ela acabou ocorrendo - não foi nada tranquila. As perseguições da Prefeitura motivaram uma série de organizações de classe a se lançarem ao debate público, difundindo por meio da imprensa e de memoriais e abaixoassinados enviados a Municipalidade a sua posição sobre o processo de higienização que se visava implantar na cidade. Essas manifstações evidenciam também que não foram apenas as “classes perigosas” a serem prejudicadas pelo ardor civilizatório dos governos municipais, em especial a de Pereira Passos. Diversos agentes ligados ao comércio de gênero - provavelmente a maior parte deles pertencendo ao que chamaríamos de pequena e média burguesia – demonstraram profunda contrariedade com os rumos que as tentativas de domesticação e higienização da cidade estavam tomando. Não era nada agradável o sentimento que eles nutriam com a modernização do Rio de Janeiro. Muito pelo contrário: a constatação é de que tal processo ameaçava em muito os seus negócios. Ou seja, nem todos que pertenciam às “classes abastadas” estavam achando divertida a ideia de copiar Paris.

A perseguição de Pereira Passos ao comércio de leite renderia uma série de charges, principalmente da parte d‟O Malho, nº 21, 1903.

Em 7 de abril de 1905, dezenas de “proprietários de estábulos sitos na zona urbana” resolveram queixar-se diretamente ao “Illmo. Exmo. Snr. Dr. Prefeito do Distrito Federal”.

Num texto bastante direto, os autores argumentavam estar “em serios ambaraços e difficuldades em manter seu negócio, não só pelos elevados impostos que pagam, como também, e precipalmente, pela concorrencia qye lhes faz a venda de leite vindo do interior, que entretanto paga impostos menor [...].” Por tudo isso reivindicavam uma espécie de concessão ao prefeito: que eles ganhassem uma licença para a “venda de leite com a vacca pela rua”. Pedido esse que é mais tarde indeferido pelo próprio. Com argumento diferente, a Sociedade União dos Estábulos solicitaria em novembro de 1906 a anistia de multas aplicadas pela Prefeitura contra os seus associados que Se compõem, quase na sua totalidade, de Açorianos, homens de trabalho, sendo que uma maioria assombroza não sabe ler nem escrever. Em taes condições descunhecem por completo as leis a que estão sujeitos e, V.Exa. sabe, que são elles tementes a justiça e a violação ou infracção dos regulamentos, tendo a plena certeza de o estarem fazendo. A infracção que commeteram os associados da requerente tem o grao de desculpa no que vem expor e é explicavel pelo mesmo motivo a relevação das multas em que incorreram [...]. 23

Curiosamente o mesmo argumento utlizado por essa associção seria replicado por diversos associados em requerimentos de isenção de licenças ou de anistia de multas. O que mostra que muito provavelmente a referida Sociedade atuasse no sentido da unificação de uma certa narrativa que os proprietários de estábulos passariam a fazer uso para legitimar as suas pretensões junto ao governo municipal.

O Malho

Em outubro de 1906, um mês antes da carta-protesto da Sociedade União dos Estábulos Domingos de Gusmão Gil, provavelmente um proprietário de estábulo e de 23

ACGRJ, Comércio e Leite....

algumas vacas e membro daquela entidade, voltava a bater na tecla do enorme peso dos impostos sobre ele e seus colegas, comerciantes de leite. E insistia também na questão da “ignorancia crassa” dos “associados” É o commercio do leite, no Distrito Federal um dos ramos mais sacrificados e sobre o qual peza maior somma de encargos. A licença para o funcionamento dos estábulos que era de 50$000 foi elevado a 80$000; o cultivo e commercio de capim, matéria prima do negocio dos associados da requerente, foi extinto na zona urbana pelos decretos nº 974 – de 3 de agosto de 1904 e de 20 de novembro de 1903, elevando-se hoje ao dobro do preço porque era vendido; o decreto nº 1063 – de 30 de dezembro de 1905, que orça a receita para o corrente anno, manda cobrar 10$000 de referida numeração e matricula de cada vacca, pagando ainda 4$000 annuaes de taxa sanitária; 40$000 annuaes, por metro cubico, de remoções de extrume e ainda 3,500 de impostos de aferição afóra os encargos naturaes de aluguel de casa, empregados, alimentação do gado etc. Como vimos, cresceram os anus sobre a classe dos associados da requerente [Associação dos Proprietários de Estábulos do Distrito Federal] e, ao contrário dos encargos, a matéria prima – o “leite” – tem depreciado em seu valor. O leite, como V.Exª não ignora antes de 1902 era vendido a 500 reis a garrafa sendo seu preço, hoje 400 reis a garrafa (...). O negócio dos associados da requerente tem como concorrente o leite mineiro, que não paga imposto de aferição; que seu gado não paga matricula, que não paga remoção de extrume; que não sofre injecção de tuberculina o seu gado; que escapa o exame sanitário a sua fonte productora e que, ainda para prejudicar o commércio de seus associados, gosa[sic] na Estrada de Ferro, de uma tarifa tão que quase nada paga pelo transporte a aquella via-ferrea. 24

E, de certa forma, foi com manifestações e mobilizações como essas, que conseguiam chegar aos olhos e ouvidos do poder representado pelo Governo Passos, que não só medidas contra o comércio foram freadas, como a própria aplicação das leis ou ainda da fiscalização delas. Conforme alguns estudos já demonstraram, não bastava o Prefeito da cidade outorgar leis. Era preciso que os agentes responsáveis pela fiscalização de tais leis estivessem igualmente imbuídos do “espírito civilizador” do mandatário municipal. E esse não parecei ser o caso de muitos desses agentes. Tal como Cristiane Miyasaka notou em sua pesquisa, quase na mesma época, podemos ver em diversos momentos as queixas da Prefeitura ou do Diretor de Higiene com os fiscais encarregados da fiscalização das posturas na cidade.

24

Idem.

A vaca esfolada retrata bem a política de Passos para com o comércio. O Malho, nº 26, 1903.

E a situação se tornava mais complexa com a frequente tentativa dos proprietários de estábulos buscarem brechas nos regulamentos e leis municipais. Logo abaixo temos um relatório do chefe da Diretoria de Higiene, já em 1907, ou seja, passado o Governo Passos, que dá conta desse tipo de prática. S.D.Pref. DF

A lei nº 688 de 15 de julho de 1899, reforçada pelo q dispõem as de n. 383 de 31-1-903, 376 de 17-1-3 e 391 de 10-2-03, estabeleceu de modo claro e positivo as condições que devem ter os estabulos. De accordo com estas leis tem, esta Directoria, por intermedio do Commissario, encarregado do serviço especial de exame de vaccas leiteiras e commercio do leite, cuidado da transformação radical dos antigos estabelecimentos, havendo já conseguido a remodelação de cerca de duzentas. Acontece, porém, que esse serviço tende a ficar annullado, com as modificações e adaptações que estão sendo feitas em varios estabelecimentos d'aquelle genero, de modo a transformar por inteiro as suas condições anteriores, tornando-os improprios ao fim destinado. Commercio de genero differente está sendo feito no recinto de alguns estabulos e a sua adaptação tem ido até o ponto de prejudicar-lhes as condições de ar e luz. Mais de uma vez tem esta Directoria solicitado que nenhuma licença para estabulos, nova ou reformada, seja concedida, antes de seu parecer, que é ministrado sempre após a informação do funcionário respectivo e, infelizmente, não tem visto attendida sua solcitação. Estas ponderações vos são feitas, a propósito da transformação por que está passando o estabulo da rua Haddock Lobo, canto da de S. Luiz, com o intuito de ser ahi estabelecido um açougue, aproveitandose para isso a sala da frente. Não preciza demonstrar o inconveniente que provirá, tanto para a saude publica, como para o fisco, do funccionamento, em commum, de um estabulo nos fundos e de um açougue na frente de um mesmo predio, mas sou forçado a dar-vos conhecimento do que ocorre para que ordeneis as providencias que se tornarem necessarias a bem dos interesses do serviço público.25

Mas não foram apenas as resistências dos “capitalistas do comercio de gênero” e as interpretações de alguns agentes públicos que obstaculizaram o processo de remoção dos “vestígios rurais” da área central da cidade do Rio de Janeiro. Havia algo mais profundo e

25

Idem.

arraigado no cotidiano do lugar. E isso envolvia hábitos, costumes e práticas de segmentos das classes populares do território. *** Por mais que a polícia sanitária organizada durante a gestão municipal de Passos dificultasse em muito o curso das atividades do comércio de gênero tradicional na cidade, o mercado ambulante (outro segmento duramente reprimido pelo governo Pereira Passos) seguia sobrevivendo com a venda de aves, porcos e ovos. Cada vez mais fragilizado, por certo. Não é demais lembrar que a área central do Rio, especialmente antes das reformas urbanas encetadas na cidade nas três primeiras décadas do novecentos, era de forte presença negra. Esta se concentrava nas freguesias de Santa Rita, Santana, São José, principalmente as franjas do morro do Castelo. Eram áreas de grande circulação de pessoas, servindo, por isso, ao comércio ambulante e as áreas próximas aos morros se prestavam, desde os tempos da escravidão, “para esconderijo, disfarce, ocultamento dos olhares preconceituosos e repressivos”.

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E o detalhe importante é que entre os negros

havia o predomínio do segmento nagô/ioruba, com seus ritos e comidas de santo, tão bem descritas por João do Rio e atestadas por estudos como o de Roberto Moura, e que se serviam fartamente de animais como galinhas e cabritos. 27 Dissemos a instantes que foram certas necessidades, mormente a de abastecimento, que contribuíram para a manutenção de hábitos rurais no centro da capital. As atividades a eles ligados faziam parte de um substancioso comércio, haja visto que a cidade via aumentar expressivamente a sua população desde a década de 1870. A demanda por gêneros agrícola, portanto, só fazia aumentar. Entretanto, nem todas essas necessidades eram estritamente de ordem econômica, ou para o provimento de necessidades elementares de subsistência das pessoas. Algumas observações colhidas nos escritos do famoso cronista João do Rio nos fazem pensar sobre a possibilidade da continuação de hábitos agrícolas ter se dado em razão da realização de práticas culturais de determinados grupos sociais que habitavam aquela área. É possível que algumas práticas rurais estivessem ligadas, também, a necessidades espirituais. 26

FARIAS, Juliana; SOARES, Carlos Eugenio; GOMES, Flávio dos Santos. No labirinto das nações: africanos e identidades no Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 2005. pp. 159-160. 27 MOURA, Roberto. Tia Ciata e a Pequena África no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Secretaria Municipal de Cultura. Depto. Geral de Doc. E Inf. Cultural. Divisão de Editoração, 1995. pp. 57, 87 e 103.

Em As Religiões do Rio, o conhecido flaneur (como se auto-intitulava) se dedica a revelar as características das religiões, que não a católica, que povoavam as almas de muitos habitantes da cidade. Entre elas há grande destaque (praticamente metade do livro) para as religiões de origem africana. João do Rio escrevia que a população negra, que habitava maciçamente vários redutos do centro nessa época, notadamente os bairros de Gamboa e Saúde, se dividia em “duas grandes crenças: a orixá (dos minas) e a alufá (dos malês)”. Os adeptos da primeira cultuariam o candomblé e os da segunda eram os seguidores do Alcorão. Em relação ao nosso tema em particular, há vários detalhes interessantes apontados nas descrições que o cronista faz sobre os rituais de candomblé dos minas. Em primeiro lugar, a utilização de animais para realização daquelas é uma constante. Os animais mais utilizados são galinhas, galos, cabritos, bodes, carneiros, jabotys e porcos. Um segundo aspecto é que todos os representantes (os “pais-de-santo”) dessas religiões entrevistados por João do Rio habitavam o centro da cidade, era ali mesmo que faziam os seus rituais. Uma das que ele teria testemunhado foi uma “cerimônia de evocação de almas”, levada a efeito na praia de Santa Luzia. Assim ele descreve o seu clímax: Quando a cerimônia attingia ao desvario e já os espíritos tinham pastosidades na voz, cahiu um bendegó Inhansam, um negro fingindo de santo materialisado, em meio do pavor gera, ao som das cantigas, esticou a mão sinistra, foi pedindo a cada creatura 16 obis, 16 orobôs, 16 gallos, 16 gallinhas, 16 pimentas da Costa, 16 mil réis, um cabrito, um carneiro. Ao chegar às meretrizes brancas inhansam ferozmente exigia peças de 28 chita, fazendas e objectos caros.

Ao buscar informações com um homem de nome Antonio sobre o que é preciso para alguém se tornar um babalaô, o cronista ouve o seguinte: Para ser babalaô é preciso muita cousa. Só de noviciado, leva-se muito tempo, annnos a ser babalaô, tem que levar ao babalaô que o sagra dous cabritos pretos, duas gallinhas d‟Angola, duas galinhas da terra, dous patos, dous pombos, dous bagres, duas preás, um kilo de limo, um ori, um pedaço de ossum, um pedaço de giz, dous gansos, dous gallos, uma esteira, dous caramujos e uma porção de pennas de papagaio 29 encarnadas.

É claro que isso não comprova por si só que por haver tantos rituais com animais houvesse a criação dos mesmos na área do centro da cidade. Contudo, o autor apresenta algumas informações que permitem pensar que tal associação seja possível. Numa tarde, em visita à casa de um certo Oloô-Teté, perto da Praça da Aclamação (Praça da República), nosso autor procura ver pela primeira vez como é o interior da casa de um pai-

28 29

RIO, João do. As Religiões no Rio. Rio de Janeiro: Gazeta de notícias, 1904. p. 52. Ibidem. p. 57.

de-santo, até para ver como ela se comporta num horário em que nenhum ritual é realizado. Leiamos seu relato. Ao final observe que ele também descreve o quintal da residência: “As casas dos minas conservam a sua apparencia de outr‟ora, mas estão cheias de negros bahianos e de mulatos. São quase sempre rotulas lôbregas, onde vivem com o personagem principal cinco seis e mais pessoas. Nas salas, moveis quebrados e sujos, esteirinhas, bancos; por cima das mesas terrinas, pucarinhos de água, chapéos de palha, hervas, pastas de oleado onde se guarda o obelé; nas paredes atabaques, vestuários, esquisitos, vidros; e no quintal quase sempre jabotys, gallinhas pretas, gallos e cabritos”. 30

Marc Ferrez (século XIX). As mulheres negras representavam uma importante face do comércio de gêneros no Rio.

João continua em sua empreitada de observador atento que era e faz a Oloô-Teté uma pergunta aparentemente sem grandes conseqüências: “- O jaboty é um animal sagrado?”. Porém, a resposta do “feiticeiro” acaba trazendo úteis indícios para o esclarecimento de algumas questões: por que criar exatamente aqueles animais? Por qual motivo os criava, não os comprando por exemplo: Cada santo gosta do seu animal. Xango por exemplo come jaboty, gallo e carneiro. Obaluaié, pai da varíola, só gosta de cabrito. Os pais de santos são obrigados pela qualidade a fazer criação de bichos para vender e 31 tel-os sempre a disposição quando precisam de sacrifico .

Observe que se a escolha dos animais para criação no quintal parecia seguir critérios “sobrenaturais”, as razões para realizar a criação em si parecem estar ligadas a limitações de ordem terrena. Pelo que diz Oloô-Teté, a demanda por animais, tanto a variedade como a própria quantidade deles, era grande. É possível que para não comprometer o seu bolso e, conforme ele mesmo diz, a sua “qualidade” (posição e autoridade), ele preferisse criá-los 30 31

Ibidem. p . 13. Ibidem. p. 15

diretamente. Mas uma outra sugestão é sutilmente sinalizada pelo orixá: ele diz que também vendia parte de sua criação. Junto a questão rituais, a criação de animais talvez se constituísse ela mesma numa forma de complementação econômica. Outros pais-de-santo, sem a felicidade de ter o mesmo espaço disponível, simples adeptos do candomblé ou granjas podiam estar no rol de seus compradores. O certo é que Oloô-teté, e provavelmente muitos outros, tinha uma dupla razão, espiritual e material, para contribuir para permanência de usos rurais no espaço da cidade. Público consumidor é o que não faltava. No caso específico da criação de galinhas a historiadora Lúcia Silva chama atenção para um aspecto realmente interessante: junto à criação de galinhas (dirigidas ao fornecimento de ovos e carne) é bem possível que fosse realizado também a criação de galos. E Lúcia observa que - com base em testemunhos de Luis Edmundo, fotos de Augusto Malta e em próprios registros policiais – muitas pessoas das classes populares criavam galos, com cuidado e desvelo comparáveis ao que Geertz observou no caso balinês, para a disputa de rinhas. Este era um dos maiores lazeres daqueles segmentos na cidade.32 Considerações finais As imagens e expectativas que Passos e seus diversos partidários (na imprensa, na literatura etc.) consolidaram em torno da imagem da cidade, por meio da imposição de um modelo de civilização e modernidade, seja através da repressão (posturas municipais) seja através da criação de um consenso em torno dos significados, das maneiras e formas de inserção naquele espaço (etiqueta, moda, arquitetura, literatura) impunham uma rejeição radical às práticas rurais no centro da Capital Federal, posto que não convinham à imagem de uma cidade civilizada. Mas não pelo valor intrínseco do rural. O rural naquele contexto queria dizer muito mais, ele estava associado a práticas culturais e mesmo de subsistência de grupos os quais se desejava ver bem longe do centro do Rio. O rural, em boa medida, era expressão de outras formas possíveis de urbanidade, mas que não eram aceitas no modelo imposto pela elite carioca da Belle Époque. Naquele momento ele era visto como insalubre, mas, talvez muito mais por estar associado às camadas populares - aos negros principalmente - que por suas práticas e formas de sociabilidade eram vistos como duplamente perigosos, tanto em termos de saúde como em termos social e moral. Além 32

SILVA, Lúcia. Luzes e sombras na cidade: no rastro do castelo e da praça onze 1920- 1945. Rio de Janeiro: Secretaria Municipal das Culturas, Divisão de Editoração, 2006. p. 77.

disso, o rural que se expressava no centro da cidade era expressão de um arranjo político que datava do Império, o qual tinha na cidade de raízes coloniais a sua expressão urbana. E era exatamente isso que se desejava por abaixo. Do contrário a cidade continuaria mais parecendo um “povoado africano”, como diria Luiz Edmundo, do que com suas congêneres Buenos Aires e Paris. Até mais ou menos os meados da década de 1910, o interesse dos poderes públicos não era definir um lugar específico para os usos rurais. A preocupação primordial é definir e impor a noção de que o centro da cidade não é o seu lugar. Por tudo isso, o subúrbio, enquanto conceito, era quase que automaticamente associado a um espaço agrícola. Seria preciso a interferência de fatores materiais e ideológicos para que a necessidade de delimitação e desenvolvimento de uma zona rural fosse colocada como um problema para alguns agentes da época. Mas até que esse tempo chegasse, era preciso “expulsar” o rural da zona urbana, da área inteiramente “civilizada” da cidade, por dois motivos, inteiramente interligados na conjuntura da virada do século XIX para o XX: o rural deveria ser expurgado da cidade. Mas naquele momento o cenário da capital carioca “reluzia em abafeira escura”, talvez assim sintetizasse Coelho Netto. Ou seja, a “desordem” daquele arranjo foi vivenciada enquanto problema estético.32 Por isso, as obras de “embellezamento” encetadas por Passos são uma dimensão obrigatória desse esforço de saneamento da cidade, que é um esforço a um só tempo de sanear a cidade em seus aspectos social, higiênico, moral e estético. Nesse cenário imaginado, as atividades de cunho rural tinham perdido o sentido e o lugar. Ao menos no centro da cidade. Surgia, assim, efetivamente a noção de zona rural.

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32

A esse respeito ver MARINS, Paulo César Garcez. “Habitação e vizinhança: limites da privacidade no surgimento das metrópoles brasileiras”. In: SEVCENKO, Nicolau (org.). História da Vida Privada no Brasil. República: da Belle Époque à Era Moderna. São Paulo: Companhia das Letras, 1998.

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