A questão do desenvolvimento na regulação do investimento estrangeiro na América do Sul: o embate em torno da percepção de energia como um bem público ou commodity exportável.

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40º ENCONTRO ANUAL DA ANPOCS 24 A 28 DE OUTUBRO / 2016 Caxambu/MG

ST27 Relações Internacionais da América Latina

A questão do desenvolvimento na regulação do investimento estrangeiro na América do Sul: o embate em torno da percepção de energia como um bem público ou commodity exportável.

Edna Aparecida da Silva Olegário Franco dos Santos Neto

A questão do desenvolvimento na regulação do investimento estrangeiro na América do Sul: o embate em torno da percepção de energia como um bem público ou commodity exportável Edna Aparecida da Silva 1 Olegário Franco dos Santos Neto2

O objetivo do artigo é discutir, sobretudo com base na análise da experiência Argentina, as mudanças na orientação das estratégias de regulação do investimento estrangeiro nos países sulamericanos. Nesta região, o conflito político que decorreu da adoção dos princípios normativos do regime internacional de investimento em face das mudanças políticas que são próprias dos Estados democráticos permitiu construir uma nova agenda para o tema do investimento estrangeiro na região. Enquanto a nova perspectiva, em consonância com as mudanças de concepção e tratamento político do tema da energia e do desenvolvimento, recupera, na atual quadra histórica, a premissa da soberania sobre os recursos energéticos e a noção de interesse público, os princípios que orientaram a reforma liberal no setor estabeleciam um bloqueio à formulação de políticas públicas. O texto organiza-se em três partes. Primeiro, faz-se um debate sobre os princípios que nortearam as transformações promovidas na organização do setor de energia em sua relação com a promoção do desenvolvimento. Depois, na segunda parte, procedese a uma análise dos elementos normativos em conflito na disputa entre o governo da Argentina e os investidores estrangeiros. Na terceira parte, aponta-se a mudança de concepção e tratamento político do tema da energia e do desenvolvimento na região.

Introdução Na virada do século, os países do cone sul, quase que invariavelmente, debateram-se com crises econômicas. Uma das dimensões da crise foi aquela que decorria da complexa relação entre normas internas e normas internacionais de um regime de investimento definido a partir de uma perspectiva liberal. Reformado segundo

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Pesquisadora do INCT-INEU. Mestre em História/UNESP. A comunicação resulta de trabalho de pesquisa concluída sobre multilateralismo, soberania e investimento estrangeiro, como bolsista do CNPq, no programa de Doutorado em Ciência Política do IFCH/UNICAMP. [email protected] 2 Mestre em Desenvolvimento Econômico pelo IE/UNICAMP. A comunicação é parte do trabalho de pesquisa desenvolvido sobre o tema da integração energética regional e a regulação do investimento no setor de energia, como bolsista da Capes, no programa de Doutorado em Ciência Política do IFCH/UNICAMP. [email protected]

a mesma orientação, o setor de energia foi palco de conflitos que refletiam o contraste entre princípios desta ordem e aqueles do desenvolvimento, que historicamente caracterizaram o setor. Como consequência, no imediato pó-crise os Estados na região buscaram, por diversos caminhos, recuperar a capacidade estatal de estímulo ao desenvolvimento, com o reestabelecimento de funções estatais de planejamento, estratégias para absorção de fatia maior dos ganhos da exploração dos hidrocarbonetos e o ensaio de políticas industriais associadas à cadeia de energia. No percurso da discussão que será feita neste artigo, destaca-se o reconhecimento da importância da orientação política dos regimes internacionais. Considerando o debate sobre o regime internacional de investimento e mudanças políticas que são próprias dos Estados democráticos, o objetivo do artigo é discutir, sobretudo com base na análise da experiência Argentina, os conflitos em torno da regulação do investimento estrangeiro e o alcance da política de Estado. Argumentamos que, a partir de então, verificou-se a construção de uma nova agenda para o tema do investimento estrangeiro na região, em consonância com as mudanças de concepção e tratamento político do tema da energia e do desenvolvimento. Essa flexão no tratamento do tema de energia na América do Sul configura-se como parte do conjunto de transformações políticas que se deram, no âmbito doméstico, com a eleição de Kirchner, Lula da Silva, Evo Morales. Também na política externa dos países buscou-se trazer novamente a cena, depois dos processos de liberalização, um consenso acerca da defesa de espaço político para definição de seus objetivos de desenvolvimento. Essas mudanças implicaram, no caso do setor de energia, nosso objeto de discussão no paper, a afirmação de um approach normativo especificamente orientado para captura de benefícios do investimento externo direto para as economias hospedeiras. Nessa perspectiva, a contribuição para o desenvolvimento que o investimento externo pode aportar para o país hospedeiro depende da natureza das políticas e de regulações do Estado, nitidamente distante do sentido prevalecente nas reformas liberais. A opção por voltar nossa atenção, num primeiro momento, ao conflito entre Argentina e os investidores estrangeiros que operavam no setor de energia naquele país cumpre dois propósitos. Em primeiro lugar, destaca as posições divergentes em torno da regulação do investimento estrangeiro e o alcance da política de Estado num caso que se localiza no limite superior de um continuum em que se identificam as distintas

manifestações nacionais de reformas econômicas liberais. As medidas adotadas para o trato do investimento estrangeiro determinaram a sujeição dos contratos de Estado, ainda que formalmente submetidos ao direito doméstico, aos regimes internacionais de investimento, àquilo que um especialista denominou international energy investment Law3. Em função disto, temporalmente, retrocedemos ao início da década dos 2000, quando irrompeu a crise cambial argentina que detonou as medidas judiciais interpostas pelas empresas estrangeiras contra o Estado argentino. Em segundo lugar, a indicação da experiência argentina contribui para expor as limitações que tal comprometimento imporia à formulação de políticas de promoção industrial, como as que se insinuaram na segunda metade da década em alguns países da região. Enquanto a Argentina se confrontava com as demandas arbitrais, também em outros países da região se operava uma flexão na orientação política dos governos, com o que entrou em pauta a retomada do controle político sobre os recursos energéticos. No quadro maior do deslocamento verificável nas proposições de integração regional, o desdobramento da análise ocupa-se, portanto, dos instrumentos para a persecução de objetivos de desenvolvimento, introduzidos pelos países da região em escala desigual. O texto organiza-se em três partes. Primeiro, faz-se um debate sobre os princípios que nortearam as transformações promovidas na organização do setor de energia em sua relação com a promoção do desenvolvimento. Depois, na segunda parte, procede-se a uma análise dos elementos normativos em conflito na disputa entre o governo da Argentina e os investidores estrangeiros. Na terceira parte, aponta-se a mudança de concepção e tratamento político do tema da energia e do desenvolvimento na região.

I. Mudança política e estratégias de desenvolvimento: o debate contemporâneo sobre a reorganização do setor de energia

Na região, as políticas de liberalização do setor de energia tiveram como requisito inicial a desverticalização dos sistemas integrados, com o que se tornou possível delimitar as fronteiras do mercado de bens anteriormente compreendido na estrutura verticalizada da indústria, criando, assim, condições para a construção do entendimento 3

Krajewski (2012, p. 352) observa que o international energy investment Law não constitui um corpo distinto e coerente do Direito Internacional, trata-se de arranjo que se estabelece fundamentalmente a partir dos tratados bilaterais de investimentos e do conjunto dos contratos entre Estados e empresas, em particular, dos contratos de concessão.

da energia como simples commodity4. O contraste em relação ao tratamento que o tema da energia recebeu no passado tornou-se, então, gritante. Se, anteriormente, a relevância dos encadeamentos que ligam as atividades de energia ao setor de bens de capital justificava uma maior intervenção do Estado, assegurando relações cooperativas intraindústria, no contexto das reformas, a concorrência tornou-se o princípio ordenador. Na medida em que a constituição político-institucional do setor de energia precisou, historicamente, enfrentar o duplo desafio de estabelecer as regras acerca da exploração de recursos naturais sobre os quais se apregoava soberania e de assegurar a garantia de abastecimento dos serviços, haja vista sua caracterização de bem público5, ela esteve associada, então, a projetos de desenvolvimento nacional. Desta forma, a participação do Estado orientou-se pela construção de um arranjo normativo orientado para a captura de benefícios para a economia doméstica, o qual estabelecia a regulação das condições de entrada do investimento estrangeiro6. Sob a ótica liberal, por outro lado, a importância dos investimentos em infraestrutura não seria menor, mas deviam orientar-se pela busca de ganhos decorrentes da melhor inserção nos fluxos do comércio internacional. O desenvolvimento, nessa concepção, seria alcançado como um desdobramento natural do aumento da competitividade decorrente da presença de investidores estrangeiros, cujo know-how e tecnologia estimulariam o desenvolvimento setorial e, em sua esteira, o do conjunto da economia. Descortinava-se, assim, a possibilidade de participação de companhias estrangeiras naqueles mercados caracterizados tipicamente como de serviços públicos7 e, por isto, predominantemente controlados pelos Estados. 4

A desverticalização da cadeia de energia significou a separação das atividades de produção, transmissão e distribuição de energia. Com isto, as transações tornaram-se mais horizontalizadas e contratualizadas, aumentando significativamente o número de players e de transações, tanto em seu interior quanto além das fronteiras nacionais. As transações envolvendo a compra e venda de energia (eletricidade e gás) passaram a ser efetivadas cada vez mais sob a perspectiva de uma operação com commodities. 5 Qualquer interrupção no abastecimento de combustíveis ou de eletricidade deve apresentar um custo muito alto pela paralisia total ou parcial que pode provocar na atividade econômica ou na condução das rotineiras atividades da vida urbana. 6 Os acordos de investimento, de modo geral, definem o tipo de propriedade a que se aplica o acordo, definição do investimento, o padrão de tratamento do investidor, as condições de entrada e operação, os padrões de proteção e as regras de compensação nos casos expropriação e os procedimentos de resolução de conflitos. (SORNARAJAH, 1994, p. 225-276) 7 Esquivando-nos de reproduzir, em toda sua extensão, o debate sobre as definições convencionalistas e essencialistas de serviço público, é mister reconhecer que, constitucionalmente, cabe ao legislador instituir determinada atividade como de serviço público, embora não possa fazê-lo em desrespeito a sua conceitualização essencial (a despeito de não haver plena convicção do que seja ‘essencialmente’ um

Neste mesmo quadro, vários países da região assinaram Tratados Bilaterais de Investimento (TBIs) com o propósito declarado de favorecer o “clima de investimentos”, ou seja, como estratégia para conquistar a credibilidade e a confiança de investidores internacionais. Esses acordos bilaterais, de um modo geral, são concebidos como instrumento de estímulo e proteção do investimento, conformando assim todos os elementos normativos. . De maneira geral, os TBIs caracterizaram-se por um significativo nível de convergência, principalmente em relação às normas mais difundidas internacionalmente, conforme o modelo do Banco Mundial, e adotando o seu Centro Internacional de Resolução de Controvérsias de Investimento (ICSID, na silga em inglês) como instância de arbitragem8. No trato dos investimentos externos, até o início dos anos 60, admitia-se o aspecto lacunar e, mesmo, contraditório do Direito Internacional aplicável à sua proteção, haja vista que este se assentava sobre normas costumeiras e certos outros princípios de ampla aceitação, como o da não-discriminação e do direito adquirido, os quais, todavia, se chocavam com outros princípios e cláusulas também amplamente difundidos, como o de submissão à jurisdição do estado hospedeiro até o esgotamento dos recursos locais, conforme as disposições da Cláusula Calvo, adotada nas Constituições dos Estados latino americanos. 9. Entretanto, desde então, verificou-se uma transformação de maior serviço público). A questão central aqui não é outra senão a definição do que se considera atividade (ou função) atribuível (ou exigível do) ao Estado. Sobre o debate jurídico acerca da regulação do serviço público. (MARQUES NETO, 200) (AGUILLAR, 1999). 8 Em 1992, o Banco elaborou as ‘Guidelines on Foreign Direct Investment”, publicado na revista do ICSID como “Legal Framework for the Treatment of Foreign Investment” cujo conteúdo, definido sob a perspectiva dos investidores, conferiu suporte substantivo às disposições normativas adotadas pelas reformas liberais, e às disposições jurídicas do que, a partir de então convencionou-se denominar “regime internacional de investimento” (SORNARAJAH, 1994). A ênfase dos acordos sobre a aceitação dos procedimentos de resolução de controvérsias nas relações investidor/estado por meio da arbitragem é um dos traços distintivos do BITs cujo objetivo mais geral é assegurar os investidores privados, em particular quanto ao que consideram ‘riscos políticos”: restrições cambiais, expropriação e/ou nacionalizações Historicamente, como revela os impasses negociações multilaterais de investimento, os Estados, reiterando a Cláusula Calvo, entendiam a arbitragem como expressão da negação da soberania, no sentido do exercício da jurisdição territorial. Por isso a assinatura desses acordos, ainda que alguns não tenham sido ratificados, constitui um momento sui generis na trajetória do tema, sensível, como explica Sornarajah (2000, p. 232), à “issues of sovereignty, exploitation of natural resources and internal economic policies”. Cabe destacar que o Banco Mundial, desde o segundo pós guerra, tinha atuado institucionalmente nas questões relativas ao investimento como: o International Finance Corporation (IFC), de 1956, que atuava nos projetos de financiamento para investimento privados nos países em desenvolvimento; o International Centre for Settlement of Investment Disputes (ICSID), de 1966, como instância de arbitragem nos casos de disputas entre investidores privados e governos e o Multilateral Investment Guarantee Agency (MIGA) de 1988, programa multilateral para securitização de investimentos, focalizando a mitigação dos riscos políticos (SHIHATA,1988). 9 A Cláusula Calvo estabelecia a recusa a proteção diplomática e a submissão das disputas aos tribunais locais pelos investidores estrangeiros. Fundada no conceito de soberania absoluta do jurista e diplomata

monta, com uma mudança do paradigma que foi da mera proteção dos investidores pelo Estado hospedeiro em direção a uma arquitetura legal orientada precipuamente para assegurar os direitos dos investidores em face das formulações de políticas dos países receptores de capital, uma verdadeira constitutional politics10. A Argentina, no cenário da região, destacou-se pela profundidade das reformas liberais que promoveu. A adoção de medidas que se orientavam para consolidação das expectativas de retorno dos investidores estrangeiros, em nenhum outro lugar revelou mais coerência e consistência, ideológica e política, do que a vista naquele país11. Tal orientação não custou a revelar suas limitações, afinal, no propósito de desenvolver determinados setores da economia, estratégias de intervenção nas áreas de comércio e investimento não podem ser descartadas. Da mesma maneira, alterações em políticas econômicas, mesmo que forçosas, que frustrassem as expectativas de ganho das firmas poderiam ser alçadas à condição de infração sob Direito Internacional. A experiência argentina pôs em relevo as consequências da celebração de acordos bilaterais que dispunham de cláusula de arbitragem para resolução de controvérsias e da adesão à jurisdição do ICSID. Como veremos, a definição de investimento inscrita nos TBIs revelou-se suficientemente ampla para abarcar as expectativas vinculadas à posse de “direitos econômicos”, os quais podiam emanar de um contrato, concessão ou o que quer tenha engendrado perspectivas de retorno. Embora se afirme que a qualificação jurídica dos State Contracts afasta-os das condições12 em que as próprias partes podem escolher o direito aplicável às suas relações jurídicas, a admissão do instituto da arbitragem pelas argentino Carlos Calvo (1824-1906) para quem o tratamento nacional concedido ao estrangeiro implica na submissão as cortes locais e a ao poder jurisdicional do Estado, recusando peremptoriamente o recurso à arbitragem pelos estrangeiros. A aceitação da Cláusula pelos tribunais internacionais consiste num dos elementos que explicam as proposições da Convenção de Washington de 1965, que criou o ICSID. A oposição dos Estados Unidos à Doutrina e Cláusula Calvo e o debate nas conferências interamericanas são analisados em SILVA (2015). 10 Segundo Gill (1988), acordos de comércio a tratados de investimento, condicionalidades de empréstimos além de outras regras que limitam as possibilidades de ação política dos Estados, afiguram-se a contraparte político-legal que disciplina as formas neoliberais de governance, das quais algumas criadas privadamente, e estão associados a formas de acumulação mais internacionalizadas. 11 Enquanto no setor de energia promovia-se ampla desestatização e desverticalização da cadeia produtiva, no plano financeiro operava-se uma abertura sem precedentes da conta de capital. A assinatura e ratificação de acordos de proteção e promoção de investimentos, cujos princípios coadunavam-se com as reformas liberais em andamento, ocorreram em profusão, em consonância com o realismo periférico da política externa de Menem. 12 Sobre os princípios do direito administrativo, que regem as relações entre poder concedente e concessionária, ver Mello (2006). A respeito da relação entre contratos do Estado e os acordos internacionais de investimento, conferir UNCTAD (2004).

legislações locais13 tornou inequívoco o reconhecimento de que há sempre um campo de interesses patrimoniais que, a despeito de estarem intrinsecamente ligados a direitos fundamentais das populações, podem afastar-se da aplicação do direito administrativo, onde arbitragem não é aceitável14. Nosso recorte, aqui, é bem mais restrito. Cumpre considerar os efeitos políticos da evolução do regime internacional de investimento de tal forma que os direitos de investidores e consumidores passaram a se configurar como problemas eminentemente políticos no plano interestatal. Tal evolução do regime de investimentos esteve inscrita num movimento maior, pelo qual se processou uma verdadeira judicialização das relações internacionais15: La conséquence de ce mouvement est d’étendré l’encadrement de l’action de l’État aux prérogatives de réglementation: sans porter atteint à la propriété formelle d’un investisseur, l’État peut ruiner, par l’introduction ou la modification d’une réglementation (sur le travail, l’environnement, etc.), les espérances légitimes de gains qui y étaient originellement attachées – action qui peut être reconnue comme équivalant à une expropriation, sujette à indemnisation. Il s’agit là d’une inflexion majeure dans la définition de la responsabilité internationale de l’ État: non seulement il est responsable directement vis-à-vis de l’investisseur – évolution déjà notée – mais c’est du point de vue dês droits de celui-ci qu’est déterminé le champ ouvert à l’état pour l'exercice de ses prérogatives souveraines. La logique du rule of law l’emporte sur celle du droit international public. (Noel, s/d.)

No começo do século, as mudanças a que o tema da energia esteve sujeito, no que concerne à sua concepção e tratamento político, estiveram, portanto, atreladas ao embate 13

Na virada do século, treze países da América Latina aprovaram novas leis sobre arbitragem. Guatemala em 1992; México em 1993; Brasil e Peru em 1996; Argentina, Bolívia, Costa Rica e Equador em 1997; Colômbia e Venezuela em 1998; Panamá em 1999; Honduras em 2000; e Paraguai em 2002. 14 Por se tratar de contratos que envolvem interesses públicos indisponíveis sua sujeição à arbitragem poderia suscitar a alegação de inconstitucionalidade. 15 Judicialização refere-se ao processo crescente de institucionalização das relações internacionais através do estabelecimento de acordos em que questões que comportam conflitos políticos passam a ser progressivamente subordinadas a elementos normativos pelos quais as decisões políticas são orientadas por vias processuais que supostamente garantem a objetividade e eliminam a influência política excessiva. Em Goldstein et al. (2000) são discutidas as três dimensões do fenômeno da judicialização sob a perspectiva institucionalista, quais sejam, “obligation, accuracy, delegation”. Dezalay (1992) destaca o papel dos advogados, juízes e juristas na construção de órgãos normativos que compõem os mercados. Ku, Diehl e Simmons ( 2001) ressaltam o diálogo entre os campos do direito e da ciência política.

decorrente do posicionamento dos governos em defesa de seus espaços de policy making16. Se, nas décadas finais do século XX, as representações coletivas que estruturaram as expectativas e o comportamento dos agentes individuais17 autorizavam uma política laissez faire, no início do novo século estas passaram a conceber a questão energética em sua relação com os campos da segurança, do desenvolvimento e da cooperação internacional, nos quais o papel do Estado, embora diferente daquele do paradigma desenvolvimentista, voltava a ser relevante. Agora, o papel do Estado compreenderia a busca pela construção de meios de poder e sua utilização para o alcance de vantagens comparativas de natureza intangível, como a ciência, a tecnologia e a capacidade empresarial (CERVO, 2003, p: 22). Desta forma, a nova orientação assumida pelos países da região conectava a necessidade de proteção aos direitos dos investidores com a necessidade dos países periféricos por espaço político que lhes assegurasse campo para estabelecer seus objetivos de desenvolvimento. O fundamento normativo desta orientação encontra-se no chamado “Direito Internacional do Desenvolvimento”, que se orienta menos por seu âmbito de regulação, já que opera na confluência do direito internacional com o direito interno, do que pelo objetivo que persegue, qual seja, a promoção do desenvolvimento (PERRONE-MOISÉS, 1998; NASSER, 2005). Os países da região, então, buscaram fazer uso de instrumentos mais flexíveis18 assentados nas estruturas de um projeto regional em construção, onde passou a ter protagonismo a segurança energética enquanto soberania energética e segurança econômica. O espaço para o exercício da soberania, antes restringido, pôde, assim, ser “resgatado” no plano em que se estabelece, qual seja, no interestatal (VELASCO E CRUZ, 2004, p.205).

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O debate na OMC sobre a necessidade de preservação do policy space destaca as implicações dos compromissos de liberalização, como a limitação do autonomia do Estados para formulação de políticas domésticas e mudanças de objetivos de desenvolvimento, o que constitui um dos vetores do debate nos grupos de trabalho na OMC, notadamente no grupo de trabalho sobre as relações entre comércio e investimento (SILVA, 2006) 17 Tais representações coletivas, pela compatibilização de expectativas que produzem, permitem selecionar, hierarquizar e solucionar problemas de uma determinada maneira, segundo o conceito de convenção do desenvolvimento (ERBER, 2008). 18 Por ser um domínio de normatividade relativa, o direito internacional do desenvolvimento é um campo em que proliferam as soluções de compromisso, destacando-se, por esta razão, o soft law (resoluções, atas finais, comunicados conjuntos etc., produto da atividade diplomática) Tais mecanismos reúnem disposições genéricas que criam princípios e não propriamente obrigações jurídicas. Seu conteúdo não exigível, como exortações e recomendações, passou a ser um instrumento amplamente utilizado na promoção de princípios de desenvolvimento, conforme aponta Nasser (2005, p. 15).

Em suma, a reestruturação econômica mundial, em suas várias dimensões, refletiu-se nas transformações pelas quais passou a indústria de energia. Porém, outra dimensão deste processo foi aquela normativa, e a construção deste arcabouço não foi obra das empresas, mas dos Estados. Nas décadas finais do século XX, as instituições de governança global foram progressivamente assumindo funções de policymaker e o conteúdo de suas preconizações orientou-se para mudanças que visavam o alargamento das liberdades de acumulação em detrimento dos espaços públicos de tomada de decisão. Até os anos 80, o objetivo do regime internacional dos investimentos havia sido a proteção do investimento. Dali por diante, contudo, o mote passou a ser a constituição de uma moldura jurídica que, não apenas lhe desse suporte (CARREAU, JUILLARD, 1998), mas que assegurasse sua mobilidade (JUILLARD, 1994), numa clara correspondência ao processo de desregulamentação e abertura dos mercados de bens, capitais e serviços. Estavam implícitas, então, as noções autorizadas de modelos de regulação e projetos de desenvolvimento. Noções estas, por sua vez, de natureza política, logo sujeitas ao debate e à revisão.

II. Conflito normativo do regime internacional de investimento: análise da experiência argentina na disputa investidor/estado.

A constituição de mercados competitivos no setor de energia envolveu, principalmente, mudanças de titularidade das empresas. A atração do capital estrangeiro para os processos de privatização exigiu, em muitos casos, não apenas a revisão do marco regulatório das concessões de serviços públicos, bem como a assunção de acordos bilaterais de investimento, a maior parte dos quais contendo cláusula de arbitragem internacional como mecanismo de resolução de conflitos. Na Argentina, os contratos de concessão pactuados por ocasião das privatizações estipulavam que o cálculo das tarifas seria realizado em dólar e sua correção revista a cada seis meses de acordo com o Índice de Preços ao Produtor, dos Estados Unidos19.

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Ley sobre Reforma del Estado nº23.696 de 1989, Ley sobre Privatizatión del Gas, nº24.076, Decreto 1738/92 de 1992 sobre Aplicación de la Ley del Gas, Decreto 2255/92 sobre os Terminos y Condiciones de las Licencias. As reformas no setor elétrico, por sua vez, foram regidas pela Lei nº 24.065 (de 1992) e pelo Decreto nº 1.398/92, que a regulamentava.

A política setorial esteve submetida, desta forma, às restrições de natureza macroeconômica decorrentes da abertura da conta de capital nas condições de inserção periférica, especialmente os limites impostos ao exercício da política cambial20. Com a crescente escassez de divisas e a formação de grupos de interesse associados ao valor externo da moeda, o governo argentino foi obrigado, finalmente, a abandonar a conversibilidade21. Diante da modificação no sistema de paridade cambial, com o que as regras de reajuste tarifário tornaram-se impraticáveis, as empresas concessionárias de serviços públicos alegaram violação das garantias de proteção a seus investimentos, recorrendo, pois, à arbitragem internacional. Da parte do governo argentino, a declaração do ministro da Fazenda do governo Kirchner, Roberto Lavagna, por ocasião do anúncio de decisão do tribunal, bem sintetiza sua posição em relação à submissão a decisões do ICSID: “none of the treaties that Argentina has signed gives an international tribunal the right to decide the economic policy that [it] will pursue”22. As controvérsias levadas ao ICSID expõem não apenas as posições divergentes em torno da regulação do investimento estrangeiro e o alcance da política de Estado, ou seja, sobre o conteúdo material do direito produzido, mas também dizem muito a respeito da importância dos espaços institucionais como recurso estratégico para a afirmação de políticas. Neste sentido, num quadro em que as condições para a construção de um projeto nacional ficaram, mais do que nunca, atreladas às exigências das grandes corporações globais, os tribunais de arbitragem do fórum do Banco Mundial tornaram-se palco privilegiado para a defesa dos princípios normativos que subjazem nas estratégias liberais. De sua parte, os países em desenvolvimento, pelas posições externadas nestes mesmos tribunais ou pela sua completa recusa ao fórum, demarcaram o espaço para a afirmação de políticas de desenvolvimento nacional. Como veremos, o embate com os 20

A genealogia de crise é conhecida e se repetiu em diversos países latino-americanos: “a partir de elevado influxo de capitais (decorrente da redução da taxa de juros americana e da securitização das dívidas latinoamericanas no início da década de 90) as políticas adotadas seguiram na maioria dos países uma estratégia pró-financeira; a valorização da taxa de câmbio real [no caso argentino, pelo extremo do regime (cambial) de Convertibilidad, estabelecido em 1991 pela Lei nº 23.928 que fixou 1 peso = 1 dólar] criou, por seu turno, sua própria demanda; com déficits crescentes de transações correntes, taxas reais elevadas de juros e contenção fiscal (gastos correntes e investimento público) levaram a uma situação de expansão dos passivos externos em relação ao crescimento da economia e das exportações. Com a reversão das condições externas motivada pela elevação da taxa de juros dos EUA em 1999/2000, este padrão de integração (...) entra em colapso. (...) Em todos os países, a ruptura do regime cambial foi precedida por elevada fuga de capitais por parte dos residentes nacionais” (MEDEIROS, 2007, p. 6). 21 Ley sobre Emergencia Pública y Reforma del Régimen Cambiario no. 25.561 de 2002, Decreto 71/2002 sobre Emergencia Pública y Decreto 214/2002 sobre Pesificación. 22

FinancialTimes, 2005.

investidores estrangeiros do setor energia em decorrência da crise econômica nos permite refletir sobre as implicações efetivas da extensão de conceitos do sistema multilateral de comércio, como Nação Mais Favorecida e tratamento nacional, sobre as políticas públicas. Os tratados bilaterais para promoção e proteção de investimento (TBIs), por suas características e implicações, adquiriram crescente importância ao final do século 23 Celebrados à exaustão, seu conteúdo refletia a guinada ideológica em curso e a profusão com que eram celebrados expressava a sujeição dos países endividados às condições para sua reinserção no ciclo internacional de capitais24. Particularmente relevantes nos TBIs, como em outros modernos tratados “sobre” investimento, eram os procedimentos de arbitragem e mediação privados, cujo objetivo declarado era assegurar aos investidores estrangeiros um processo de entendimento rápido, posto que fundado no moderno conceito de acesso direto, sem o esgotamento dos recursos nos tribunais locais. A profusão de demandas judiciais em que esteve envolvida fez da Argentina um caso paradigmático da literatura recente sobre o Direito Econômico Internacional. Em 2010, segundo Jiménez (2010, p. 194), a Argentina tinha contra si 34 casos pendentes, além de 12 já resolvidos25. Se não é demais afirmar que as disputas sob o ICSID foram 23

Em UNCTAD (2000) e Salacuse (1990), temos uma discussão acerca do aumento do número de BITs, sua natureza e seu impacto sobre a regulamentação do investimento estrangeiro por parte dos países em desenvolvimento. Parra (1997) discute as opções dos investidores para a resolução de litígios no âmbito do BITs, enquanto Peterson (2005) faz críticas às regras de procedimento de arbitragem entre investidor e Estado pela falta de transparência que implica. 24 Acordos bilaterais exclusivamente dedicados ao investimento existem desde o pós-Segunda Guerra quando o investimento ganha destaque nos tratados de amizade, comércio e navegação (FCN) entre Estados Unidos e a Europa, no âmbito dos esforços para facilitar a participação do investimento privado na reconstrução da Europa pós-guerra. Foram assinados, nas décadas de 40 e 50, entre os Estados Unidos e governos europeus, com disposições sobre direito de estabelecimento e proteção do investidor. (BREWER, 2000) 25 Alonso (2013, p. 60) apresenta suficiente sistematização dos casos envolvendo a Argentina para o período 2002-2010: “Reportou-se um claro predomínio de denúncias apresentadas por investidores no setor de energia (petróleo, gás e eletricidade), as quais passaram a representar pouco menos da metade do total de demandas acumuladas pelo país no período posterior à crise. Em números concretos e precisos, as queixas relacionadas ao setor de energia somaram vinte. (...) É de se salientar que se tratava de um setor que havia tido uma dinâmica importante em termos de litigiosidade com o Estado argentino durante a vigência do regime de convertibilidade”. Ainda o mesmo autor indica, mais claramente, os casos: “LG&E Energy Corp., LG&E Capital Corp. e LG&E Internacional INC. (ARB/02/1); Sempra Energy International (ARB/02/16); AES Corporation (ARB/02/17); Camuzzi International S.A. (ARB/03/2); Camuzzi International S.A. (ARB/03/7); Gas Natural SDG. S.A. (ARB/03/10); Pioneer Natural Resources Company, Pioneer Natural Resources (Argentina) S.A. e Pioneer Natural Resources (Tierra del Fuego) S.A. (ARB/03/12); Pan American Energy LLC e BP Argentina Exploration Company (ARB/03/13); El Paso Energy International Company (ARB/03/15); Enersis S.A. e outras (ARB/03/21); Electricidad Argentina S.A. e EDF International S.A. (ARB/03/22); EDF International S.A., SAUR International S.A. e León Participaciones Argentinas S.A. (ARB/03/23); BP America Production Company, Pan American Sur

desencadeadas por conflitos decorrentes das reformas econômicas liberais promovidas neste país na década de 90, nas condições em que foram realizadas, e seu posterior esgotamento (FUSER, 2015), isto tampouco diz tudo. Cabe problematizar os termos em que se processaram, o seu significado e suas implicações políticas. A questão crucial para esta análise é a que decorre de acordos que, de alguma maneira, buscaram disciplinar as políticas públicas naquilo que elas poderiam atingir as expectativas de ganhos dos investimentos estrangeiros26. Em especial, interessa-nos o prolongamento do processo de redução de barreiras ao comércio em direção aos temas sensíveis, serviços e contratos governamentais, sobre os quais, nos fóruns multilaterais, não foi produzido consenso27. Neste sentido, o primeiro ponto contencioso que emergiu das demandas interpostas sob os tribunais de arbitragem foi a respeito da definição de investimento. É comum que os Tratados sobre Investimentos incorporem cláusula que obrigue seu registro no país de acolhida. Esta foi a solução encontrada para que se buscasse dirimir dúvidas quanto a qualificação do termo, assegurando controle do país anfitrião. Foi o que dispôs o “Convenio entre la República Argentina y la Unión Económica BelgoLuxemburguesa para la Promoción y Protección Recíproca de las Inversiones” 28, em seu Artigo 1 (2), que afirmava “el contenido y el alcance de los derechos correspondientes a las diversas categorias de activos estarán determinadas por las leyes y reglamentaciones de la Parte Contratante en cuyo territorio esté situada la inversión”. Segundo

S.R.L., Pan American Fueguina S.R.L. e Pan American Continental S.R.L. (ARB/04/8); Wintershall Aktiengesellschaft (ARB/04/14); Mobil Exploration e Development Inc. Suc. Argentina e Mobil Argentina S.A. (ARB/04/16); Compañía General de Electricidad S.A. e CGE Argentina S.A. (ARB/05/2); BG Group Plc (CNUDMI); National Grid plc (CNUDMI); United Utilities International Limited (UUIL) (CNUDMI)”. 26 A propósito desta questão, Silva (2008) considera as implicações da constituição da Organização Mundial de Comércio (OMC) que, embora tenha incorporado os acordos e os princípios do GATT, os transfere para as políticas e arranjos regulatórios nacionais. 27 Não há consenso acerca da classificação das atividades no setor de energia. Os serviços que emergem das mudanças estruturais na indústria da energia cabem, automaticamente, no guarda-chuva do GATS, o qual aplica-se, virtualmente, a todos os serviços providos sob bases comerciais. Por outro lado, segundo o Harmonized Commodity Description and Coding System (HS), desenvolvido pelo World Customs Organization (WCO), a energia elétrica é uma commodity. Até o momento, a maioria dos países concorda que a atividade de geração não constitui um serviço sujeito ao GATS, mas resulta em bens cujo comércio é regulado pelas regras do GATT. As discussões no WTO Committee on Specific Commitments (CSC) tem focalizado a questão se é ou não necessária a criação de uma categoria específica para os serviços em energia. Enquanto alguns países desenvolvidos clamam por um anexo sobre os serviços em energia similar ao aposto no Agreement on Basic Telecommunications, principalmente para desencorajar práticas tidas como não-competitivas, os países em desenvolvimento trabalham por um anexo que estabeleça um vínculo entre a abertura do setor e o alcance de objetivos de desenvolvimento. 28 Assinado em 28 de junho de 1990, ratificado pelas partes em 20 de abril de 1994 e vigente a partir de 20 de maio de 1994.

interpretação do governo argentino na disputa travada com a Camuzzi International S.A. (caso ICSID no. ARB/03/7)29, tal disposição asseguraria ao marco jurídico argentino a predominância em relação às demais regulamentações, entretanto, essa argumentação foi recusada pelo tribunal arbitral constituído30. O governo argentino fundou seu raciocínio na provisão geral da cláusula de definições no Tratado, em que se estabelece que os investimentos sejam efetivados conforme as leis e regulamentos do país anfitrião.

Logo, as leis domésticas e

regulamentos do país é que deveriam estabelecer a definição de investimento. Entretanto, o tribunal, a refletir prática costumeira, declarou que a referência feita no Tratado, de a que os investimentos fossem efetivados conforme as leis e regulamentos do país anfitrião, diz respeito à legalidade do investimento e não a sua definição. A jurisprudência emanada dos tribunais do ICSID, por sua vez, no que se refere ao entendimento do que seja investimento, repousa não apenas no que dispõem os TBIs que lhes são base, mas também na interpretação do Artigo 25 da Convenção de Washington, o qual, ao traçar os limites da competência do Centro, não se manifestou abertamente sobre a definição de investimento que abraçava, descortinando, assim, a possibilidade de se fazê-lo de forma mais abrangente. Ancorados, desta maneira, nas definições inscritas nos acordos de investimento, os tribunais do ICSID gradualmente construíram uma jurisprudência em torno de uma definição larga de investimento, ao sabor das transformações na economia e no próprio teor dos tratados. Neste sentido, o extremo com que as reformas econômicas foram realizadas em certos países, como o foi na Argentina, guardou relação com as modificações que se observou nos sucessivos tratados que foram assinados pelo país ao longo da década de 90, indicando seu movimento em direção a modelos mais liberais (GRANATO, 2005).

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A contenda se estabeleceu quando o governo da Argentina, em 2001, suspendeu o procedimento de reajuste das tarifas de distribuição de energia elétrica com que operavam a Empresa de Energia Rio Negro S.A. (EDERSA) e a Empresa Distribuidora de Energia Eléctrica S.A. (EdEA), empresas das quais a Camuzzi International S.A. era acionista. Invocando as disposições do TBI, a Camuzzi solicitou procedimento de arbitragem ao ICSID. 30 Camuzzi International S.A v. República Argentina (Caso ICSID no. ARB/03/7). Decisión sobre Jurisdición, de 10 de junho de 2005, § 20 sobre a posição da Argentina e § 27 sobre a decisão do Tribunal.

Desta forma, os investidores norte-americanos, como a CMS Gas Transmision Company31, que aplicaram seus recursos na Argentina mediante participações acionárias voltadas ao processo de privatização, encontraram amplo resguardo na letra do acordo firmado entre os dois países, que em seu Artigo I (I) (a) estipulava que inversão: means every kind of investment in the territory of one Party owned or controlled directly or indirectly by nationals or companies of the other Party, such as equity, debt, and service and investment contracts; and includes without limitation: (...) (ii) a company or shares of stock or other interests in a company or interests in the assets thereof 32.

A difusão dos acordos de investimento, e a inserção em seu interior da Cláusula da Nação Mais Favorecida (MFN), teria feito com que certos compromissos assumidos bilateralmente fossem estendidos para outras partes, como num acordo multilateral33. Paralelamente, os tribunais constituídos pelo Centro passaram a recorrer, como de costume, aos critérios que fundamentaram duas decisões em casos anteriores. Diante disso, a interpretação da definição de investimento foi ampliada, de modo a abranger atividades que se caracterizassem por certa duração de seu desempenho e que contivesse um elemento de risco. Adicionalmente, do preâmbulo da Convenção, os tribunais sacaram o critério de que o investimento devesse oferecer efetiva contribuição ao desenvolvimento econômico do país anfitrião, não obstante a ausência de precisão substantiva do conceito. Estava construído, pois, um consenso em torno do termo investimento34. Na esteira dessa interpretação, os tribunais constituídos sob o ICSID ampliaram o escopo da definição de investimento de modo a abranger atividades tradicionalmente

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CMS Gas Transmission Company é uma sociedade constituída nos Estados Unidos, acionista minoritário da TGN (Transportadora de Gas del Norte) que, por sua vez, era concessionária no transporte de gás natural na Argentina. A contenda se estabeleceu quando o governo da Argentina, em 2001, suspendeu o procedimento de reajuste das tarifas de transporte de gás com que operava TGN desde quando CMS aportara seus investimentos no país. 32 CMS Gas Transmision Company v. Republic of Argentina (Case no. ARB/01/8). Decision of the Tribunal on Objections to Jurisdiction. Date of decision: July 17, 2003, § 57. 33 Zerbini (2003: 141-143) realiza pertinente problematização acerca das diferentes posições a respeito da particularidade x universalidade dos TBIs, isto é, sobre seu caráter de lei entre as partes ou sobre a dimensão jus cogens do que estipula. 34 Conforme pontua Zerbini (2003: 133), “esse tratamento não tradicional para definição de investimento levou o ICSID a considerar-se competente em questões envolvendo um contrato de simples prestação de serviço, como no caso AtlanticTriton v. Guiné, e outro de licença técnica, no caso de Colt Industries v. Coréia”.

entendidas como prestação de serviços.35 Segundo o entendimento do Estado argentino, o contrato de prestação de serviço, constituído sob a lei doméstica, seria tão somente um compromisso para execução de serviços, não sendo, portanto, considerado investimento seja sob a Convenção do ICSID ou sob um Tratado de Investimento. Os tribunais, contudo, frequentemente consideraram que um contrato dessa natureza, por assegurar aos requerentes um direito sobre um valor econômico originado do desempenho contratual, podiam ser designados como investimento sob o Tratado (OBADIA, 2002). Reconhecendo competência na discussão de questões fiscais36, ambientais37 e comerciais que pudessem afetar as expectativas de retorno de um investimento, a jurisprudência do ICSID logrou ampliar o alcance da responsabilização internacional do Estado por atos considerados ilegais internacionalmente38. Outra dimensão do nosso problema diz respeito às condições em que se processou o aporte de investimento estrangeiro no marco dos programas de privatização. Pelo regime de concessões, determinava-se a constituição de sociedades locais que estariam sujeitas à regulação da prestação de serviços públicos. Assim, constituídas sob as leis domésticas, as concessionárias de serviços públicos firmaram seus contratos com o Estado geralmente através das autoridades regulatórias setoriais, no quadro legal maior da legislação doméstica pertinente ao investimento estrangeiro. Diante disto, o governo argentino alegou que as reivindicações de indenização por expropriação, supostamente decorrente das alterações na legislação, derivavam do não cumprimento de cláusulas contratuais e não das estipulações do TBI, com o que o tribunal do ICSID não teria jurisdição sobre o caso. O posicionamento dos tribunais acerca desse tema é bastante homogêneo, geralmente admitindo competência para examinar os conflitos sob contratos por serem

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No âmbito da discussão sobre a regulação internacional dos serviços em energia, tal como em outros setores, houve dissenso. Esteve em pauta a própria classificação das atividades e de seus produtos, em que a defesa de posições demarcava o alcance das estratégias de liberalização toleradas pelos países. Ausente o consenso na esfera de negociação multilateral, a regulação das atividades no setor de energia dependeu de processos de reforma domésticos e de acordos bilaterais. 36 Em Alcoa vs. Jamaica e Amco vs. Indonésia, o ICSID viu-se competente para julgar a natureza do comprometimento dos rendimentos por alterações nos impostos cobrados pelo governo anfitrião. (ZERBINI, 2003, p. 133) 37 Como no clássico caso Metalclad Corp. vs.United Mexican States, sob o NAFTA. Laudo de 2 de setembro de 2000. ( COSSIO, 2010). 38 Na virada do século, a Comissão de Direito Internacional da ONU divulgou seu ‘Draft articles on Responsibility of States for internationally wrongful acts’, em que buscava sistematizar as interpretações acerca da questão. Em Crawford (2002), seu último relator, tem-se uma profunda discussão do tema.

também não-cumprimentos sob o Tratado de Bilateral de Investimento. Não raro, porém, a assunção dessa competência obriga a que se recorra à chamada cláusula guarda-chuva. Esta cláusula estabelece que um tratamento mais favorável estipulado em outros acordos internacionais ou em obrigações entre as partes na própria legislação doméstica do Estado-parte não resulte sem efeito por conta das provisões do BIT. Nesse sentido, a cláusula guarda-chuva determina que tais compromissos, ainda que ausentes dos termos do tratado bilateral firmado, sejam considerados uma obrigação sob o tratado e que, por conseguinte, implique a responsabilização do Estado em caso de sua violação39. O setor de energia, pela natureza de seu objeto – tipicamente um bem público – e por seu aspecto estratégico, caracteriza-se pela profusão de contratos entre investidor e Estado, de forma que, conforme Krajewsky (2012: 353), the international energy investment law in a broader sense also includes the body of state-investor contracts, in particular concession agreements. (...) These contracts are governed by the domestic legal order of the host state or by a legal order the parties agreed upon. Consequently, they are national law instruments and are not considered part of public international law. There are, however, attempts to ‘internationalise’ these contracts. Este é o papel que tem sido atribuído à cláusula guarda-chuva: 1) transpor operações de outras áreas, como da economia, onde tomam forma as expectativas de ganhos, para a esfera do direito; e 2) conectar as expectativas a nível nacional às operações legais internacionais (MEREMINSKAYA, MASCAREÑO, 2010, p. 820). Nesse sentido, the “umbrella clause”, ou “cláusula sobre o cumprimento dos compromissos”, dava margem para que as demandas contratuais emergidas de contratos celebrados com o Estado fossem transformadas em demandas baseadas nos tratados que dispunham de cláusulas do recurso à arbitragem. Numa decisão a meio caminho de um posicionamento mais radical 40, o tribunal constituído para o caso El Paso Energy International Company v. The Argentine Republic (ICSID Case no. ARB/03/15)41 ponderou ser 39

Sobre o conceito de cláusula guarda-chuva e o debate em torno de sua aplicação, ver Mazzuoli (2011) e Naniwadekar (2010). 40 Como aquela defendida pela ILC (International Law Comission), e assumida por diversos tribunais constituídos sob o ICSID, segundo a qual a cláusula guarda-chuva não se limitaria à atuação do governo em suas atribuições de soberano, mas abrangeria também seus atos iure gestiones, como em desacordos sobre compras governamentais, por exemplo. 41 El Paso é uma companhia constituída sob as leis do Estado do Delaware (EUA). Ela é proprietária de 99,92% de participação indireta na holding Servicios El Paso SRL além de deter participações indiretas de escopo não controlador nas empresas Compañías Asociadas Petroleras SA, CAPEX SA, Central Costanera

Especially clear that the umbrella clause does not extend to any contract claims when such claims do not rely on a violation of the standards of protection of the BIT, namely, national treatment, MFN clause, fair and equitable treatment, full protection and security, protection against arbitrary and discriminatory measures, protection against expropriation or nationalization either directly or indirectly, unless some requirements are respected42. Fica evidenciado que a jurisprudência dos tribunais do ICSID lograva construir interpretações que permitiria aplicar os conceitos fundamentais do sistema multilateral de comércio, orientados para liberalização, aos chamados “Temas de Cingapura”, expressão que se refere nome dado aos temas discutidos nos Grupos de trabalho criados na OMC. Esses grupos discutiam: relação entre comércio e investimento, política de competição e comércio, compras governamentais e facilitação do comércio entre outros. O que se ressalta é que não se trata apenas de que matérias situadas no âmbito das políticas domésticas passam a figurar no campo de jurisdição das disciplinas comerciais, mas que as próprias políticas, sua formulação e intencionalidades ficariam condicionadas a uma densa rede de obrigações, estruturadas a partir dos princípios de liberalização (SILVA, 2008). A resposta do governo argentino, cuja orientação política deslocara-se para a esquerda no imediato pós-crise, deu-se nas frentes doméstica e internacional43. Internamente, uma das estratégias do governo argentino foi o recurso ao marco legal doméstico para se evitar o cumprimento das sentenças, constituindo-se tribunais de revisão sobre as disputas envolvendo os contratos de concessão de serviços públicos. Isto

SA (CAPSA) e Gasoducto del Pacífico. CAPSA está envolvida na exploração, desenvolvimento e produção de petróleo, enquanto CAPEX, na geração de energia elétrica. Segundo o El Paso, uma série de medidas tomadas pelo governo da Argentina desde dezembro de 2001 violaram os compromissos assumidos internacionalmente que a tinham induzido a investir no país. 42 El Paso Energy International Company v. The Argentine Republic (ICSID Case no. ARB/03/15), Decision on Jurisdiction, 27 April 2006, §84. 43 A Argentina estabeleceu três linhas de atuação para o enfrentamento das disputas sobre investimentos oriundas da crise do regime de conversibilidade, sendo que apenas uma delas afigurou-se mais produtiva. A primeira consistia em criar um novo foro nacional para administrar as disputas relativas a investimentos estrangeiros, denominado TASP (Tribunal Administrativo de los Servicios Públicos de Competencia Nacional). A segunda medida sujeita a controvérsias, consistia na intenção de declarar a inconstitucionalidade da Lei nº 24.353/94, pela qual se incorporou o Convênio de Washington ao direito positivo doméstico. A terceira via consistiu na renegociação dos contratos internacionais que pudessem produzir (ou tivessem produzido) demandas junto ao ICSID. Segundo Jiménez (2010, p. 203), descartada a segunda via, os resultados mais satisfatórios foram obtidos pela renegociação contratual com as empresas, de sorte que, ao final da década, metade das ações que envolvia o país no centro estava paralisada.

culminou em vários acordos com as empresas litigantes44. De outro lado, do ponto de vista da política externa, a posição do governo argentino articulou-se com os movimentos encetados pelos demais países da região, todos igualmente afetados, embora em graus diversos, pela crise liberal.

III. Investimento estrangeiro, institutos normativos e desenvolvimento: mudança de percepção e do tratamento político do tema da energia. A crise dos projetos liberais, em particular sua versão argentina, para além de demonstrar a inadequação das premissas sob as quais se assentava sua proposta de desenvolvimento, permitiu revelar as consequências da crescente interpenetração das esferas interna e externa, acentuando a crescente indistinção entre doméstico e internacional (MILANI; PINHEIRO, 2013, p.15). Tal fenômeno não só deu espaço para que questões essencialmente domésticas fossem afetadas mais fortemente por aspectos de natureza internacional, determinando que demandas de diversas origens passassem a igualmente buscar expressão como demandas de política externa45, como determinou que o juízo dos dirigentes acerca dos interesses nacionais – sociais, políticos, de segurança, econômicos, culturais – fosse afetado de forma mais acentuado pelos conflitos que decorrem da forma como o interno se relaciona ao externo46. Num quadro em que a persecução do desenvolvimento se recobria de desafios adicionais47, o restabelecimento do controle do Estado sobre as atividades econômicas em seu território carecia de instrumentos normativos que abarcassem tanto a esfera doméstica quanto a internacional, num retorno a algumas das premissas do direito internacional do desenvolvimento. 44

A Procuradoria do Tesouro Nacional, dependência encarregada de fazer a representação e a defesa do Estado em julgamentos tanto em foro doméstico quanto em internacional, estabeleceu, em 2007, que todos os investidores estrangeiros que obtiveram laudos favoráveis nos tribunais internacionais deveriam reivindicar a execução destes em tribunal doméstico. A despeito da contrariedade exibida por parte dos investidores, tratou-se de uma estratégia de confrontação com resultados palpáveis. Para uma descrição pormenorizada das tratativas que se seguiram aos laudos do ICSID. (ALONSO, 2013; JIMÉNEZ, 2010). 45 Neste sentido, conforme Milani e Pinheiro (2013), a política externa passou a se afigurar, mais que nunca, uma política pública, tendo sua agenda submetida à atuação de novos atores na esteira de processos sistêmicos ou, mesmo, de acordo com programas governamentais em marcha. 46 Em Cervo (2003: p. 7), considera-se que o estabelecimento do cálculo estratégico e a decisão em política externa não deixam de considerar o modo como, em diferentes momentos, o interno e o externo se relacionam. 47 Tradicionalmente, a complexidade do problema do desenvolvimento repousa, de maneira geral, em sua dimensão, a uma só vez, técnica e social, submetida a interesses divergentes e centrada no longo prazo.

No plano internacional, os entendimentos alcançados na I Cúpula Energética Sulamericana, ocorrida em abril de 2007 na Venezuela, afiguraram-se como uma reafirmação das aspirações nacionalistas, rejeitando uma visão de integração setorial inspirado nos princípios do livre comércio limitada à promoção dos fluxos de intercâmbio de energia48. Ratificando os princípios orientadores da integração energética regional que já haviam sido indicados na Declaração da I Reunião de Ministros de Energia da Comunidade Sul-Americana de Nações, realizada em 26 de setembro de 2005, em Caracas na Venezuela.

e na Declaração Presidencial sobre Integração

Energética Sul-Americana, assinada em 9 de dezembro de 2006, em Cochabamba na Bolívia, o encontro produziu mais do que declarações genéricas bem intencionadas, como as de que a integração energética “deve ser usada como um instrumento importante para promover o desenvolvimento econômico e social e erradicação da pobreza”, e deve também “envolver principalmente o Estado, a sociedade e as empresas relacionadas com o setor da energia”. A cúpula traduziu-se, mesmo, num esforço conjunto dos Estados em busca de graus maiores de autoridade no exercício de sua soberania, posto que institui como linhas mestras a preocupação com a segurança energética regional, mas sujeitando as prerrogativas do direito de propriedade àquelas da defesa do interesse público. A Declaração de Caracas, referência pretérita do encontro de Margarita, estipulava, a sua vez, “o direito soberano a estabelecer os critérios que assegurem o desenvolvimento sustentado na utilização dos recursos naturais renováveis e nãorenováveis, assim como a administrar a taxa de exploração dos recursos naturais nãorenováveis” e “o respeito às formas de propriedade que cada Estado adota para o desenvolvimento de seus recursos energéticos”. O encontro de cúpula de 2007 avançou substantivamente ao propor a criação do Conselho Energético da América do Sul, composto pelos Ministros da Energia dos países envolvidos. Sua atribuição abrangeria a elaboração de uma estratégia continental, um plano de ação e uma proposta concreta para o estabelecimento de um Tratado Energético Sul-Americano. Diante dos princípios declarados no encontro em que foi proposto, os termos deste tratado divergiriam daqueles

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O movimento de integração energética da América do Sul, levado a cabo nos idos de 1990, articulou-se proximamente com o processo de constituição de uma institucionalidade regional inspirada nos princípios do livre comércio. Os empreendimentos de interconexão energética estiveram fortemente atrelados aos instrumentos de cooperação econômica bilateral, firmados pelos países envolvidos, em sua interação com instâncias reguladoras domésticas.

que inspiraram o Tratado da Carta de Energia (TCE), modelo de integração energética europeia que tem sido utilizada, um tanto irrefletidamente, como padrão a ser replicado49. No mesmo contexto político ocorre a recusa pelo Equador e a saída da Bolívia do sistema representado pelo ICSID (Jiménez 2010). Em maio de 2007, o Banco Mundial recebeu documento boliviano informando a renúncia ao ICSID e a sua saída do acordo, ao qual havia aderido 1994. A saída do Equador do sistema do ICSID aconteceu em 4 de dezembro de 2007, ao enviar uma carta através de sua embaixada em Washington à secretaria geral do órgão. Pela carta, o país retirava seu consentimento em submeter ao Centro as controvérsias decorrentes de investimentos em atividades econômicas relativas ao aproveitamento de recursos naturais como petróleo, gás, minerais ou outros50. Domesticamente, a ampliação da margem de atuação dos Estados implicou o relançamento de estratégias de desenvolvimento voltadas à regulação do investimento. Desta forma, o resgate da autonomia na execução de políticas nacionais, como as que tiveram lugar no setor de energia, não pode ser compreendido senão como parte de um movimento maior de confrontação da ordem normativa liberal internacional51. Essa mudança evidencia-se na presença de institutos normativos que tinham sido construídos no longo processo de afirmação e reconhecimento do direito dos Estados de controlar a entrada de investimento estrangeiro.

Esse esforço dos países em

desenvolvimento, que ganha densidade e legitimidade a partir dos anos setenta com a Nova Ordem Econômica Internacional, constitui um approach normativo especificamente orientados para captura de benefícios do investimento externo direto para as economias hospedeiras. Estes elementos, como as exigências de conteúdo local, exigências de exportações, transferência de tecnologia entre outras, supõem que a contribuição que o investimento externo pode aportar para o desenvolvimento depende da natureza das 49

Tratado assinado em 17/10/1994 por 17 países, e estendendo-se até 2029, configura o típico acordo que recusa o padrão clássico daqueles de comércio internacional ao tornar os governos diretamente accountables a tribunais internacionais para importantes obrigações nele especificadas, estendendo, portanto, o conceito de responsabilidade estatal. Um de seus traços marcantes é estabelecer disposições que prevalecem sobre a lei interna dos Estados, impondo restrições à atuação dos parlamentos nacionais sobre questões, como por exemplo, a nacionalização. 50 Embora de baixo impacto em termos de montantes envolvidos em casos pendentes, diante da publicidade do gesto político, os meios de comunicação e organizações civis se envolveram na discussão das causas e consequências desta retirada, de forma que esse rompimento guardou conteúdo simbólico importante. 51 Neste sentido, conforme Silva (2006: p. 104), o fracasso, em 2003, da Conferência de Cancún da Organização Mundial de Comércio, em que os impasses da discussão sobre regulação multilateral de investimento gravitaram em torno da noção de “espaço político”, prenunciava a trincheira em que se consolidaria a defesa, pelos países em desenvolvimento, de suas prerrogativas na determinação de objetivos de desenvolvimento.

políticas e de regulações do Estado, não decorrem da mera presença do investidor. Essa regulação que normatiza as condições de entrada do investimento, diversa do foco sobre proteção do investidor que marca o modelo regulatório proposto pelos países desenvolvidos e organizações como a OCDE e Banco Mundial, enfatiza sua natureza política na esfera do exercício do poder soberano52. É neste quadro que se insere a nova legislação regulatória dos governos de esquerda de base popular, que, gradualmente, foram ascendendo ao poder na região. Como o caso da Bolívia, haja visto se tratar de exemplo representativo daquele conjunto de países que, detentores de importantes reservas de hidrocarbonetos, não lograram alcançar o desenvolvimento através da concessão para exploração em moldes tradicionais. Neste sentido, para esses países, era fundamental estabelecer o exercício pleno de direitos de propriedade sobre o patrimônio natural do subsolo. A reversão das políticas neoliberais cumpriu um script algo inédito na Bolívia. Tendo uma história marcada pela sucessão de golpes militares ao longo do período republicano, a Bolívia foi palco, no início dos 2000, de intensa sublevação social53. Após a derrubada dos presidentes Gonzalo Sánchez de Lozada e Carlos Mesa em 2003 e 2005, os movimentos sociais alçaram à presidência, em eleições realizadas neste último ano, o líder cocaleiro aimará Evo Morales. Cumprindo promessas eleitorais, em 1º de maio de 2006, o presidente Morales baixou o Decreto Supremo de Nacionalização dos Hidrocarbonetos (DS 28.701) que, entre outros dispositivos, estabelecia o controle estatal

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Dentre os aspectos normativos, tanto dos acordos bilaterais quanto dos compromissos multilaterais, cabe destacar que o direito de entrada. Sornarajah (1994) observa que a entrada, a autorização de ingresso e desenvolvimento de atividades no território constitui um dos atributos da soberania. O direito de entrada pré-estabelecimento um dos tópicos conflitos no debate. Não só países em desenvolvimento, mas também europeus, tem posição de resistência a aceitação dessa disposição. 53 Entre 2000 e 2005, diante da dissonância entre o discurso liberal e seus resultados, movimentos sociais, em cuja vanguarda estavam grupos étnicos e de culturas tradicionais, protagonizaram conflitos políticos de grandes dimensões, produzindo eventos marcantes denominados “Guerra da Água” e “Guerra do Gás”. No contexto das intensas manifestações que tomaram a Bolívia, o breve governo de Carlos Mesa empreendeu a reversão, ainda que parcial, das reformas antes instituídas. A empresa estatal do setor, que havia sido esvaziada de suas funções, é então refundada. Destacamos-se, in verbis, o artigo da Lei 3.058/2005 que explicita a recuperação da participação do Estado boliviano na cadeia produtiva da energia: “Artículo 6º (refundación de Yacimientos Petrolíferos Fiscales Bolivianos – YPFB). Se refunda Yacimientos Petrolíferos Fiscales Bolivianos (YPFB), recuperando la propiedad estatal de las acciones de los bolivianos en las empresas petroleras capitalizadas, de manera que esta Empresa Estatal pueda participar en toda la cadena productiva de los hidrocarburos, reestructurando los Fondos de Capitalización colectiva y garantizando el financiamiento del Bonosol”.

sobre refinarias de hidrocarbonetos além de alterar as condições de exploração e produção de gás e a tributação sobre ela incidente54. Para os países em desenvolvimento, mas importadores de petróleo, como o Brasil, o recurso aos institutos normativos para promoção do desenvolvimento afigurar-se-ia um verdadeiro mecanismo indutor de investimentos privados em setores que compunham a cadeia produtiva do petróleo e gás, firmando-se, igualmente, como um instrumento de negociação e barganha com as empresas transnacionais do setor, em particular no que se refere à questão da difusão tecnológica e compras locais, de modo que a aquisição serviços e produtos tivessem efeitos locais na cadeia produtiva. No Brasil, a Lei nº12.351, sancionada em dezembro de 2010, ao final do governo Lula, estabeleceu as regras orientadas exclusivamente para a exploração das reservas da camada pré-sal55. A nova legislação além de determinar ganhos adicionais ao Estado brasileiro pelos recursos naturais explorados, também reintroduziu a possibilidade de se estabelecer nos editais de licitação os clássicos institutos normativos voltados à promoção da atividade industrial, como requisitos de conteúdo local aos consórcios vencedores das licitações promovidas pela Agência Nacional do Petróleo (SILVA, 2014). Desta forma, as orientações do novo regime de exploração impactavam frontalmente os princípios que nortearam o processo de liberalização anterior ao estabelecer condições para a promoção de políticas de estímulo setorial de corte discricionário, afetando fortemente as firmas estrangeiras em operação no país: Reaction by Rio de Janeiro-based representatives of American oil companies to the possibility of Petrobras as the sole operator is mixed. Exxon Mobile's External Relations Director Carla Lacerda, told Rio FCS officer on August 10 the proposed model constituted a reversion to Brazil's former monopoly system. As the sole operator, she explained, Petrobras would have more control over equipment purchases, personnel, and technology selection, which, in turn, could adversely affect U.S. equipment and service supply to Brazil. Chevron's 54

Sustentando-se no que prescrevia o Art. 139 da Constituição Política do Estado Boliviano, o decreto 28.701 determinou: a) que as empresas concessionárias entregassem sua produção de hidrocarbonetos à YPFB, que a comercializaria; b) que novos contratos haveriam de ser firmados em um prazo de cento e oitenta dias, a partir da edição do decreto; e c) que os campos cuja produção alcançasse mais de 100 milhões de pés cúbicos diários de gás contribuiriam com um somatório de impostos e outros direitos da ordem de 82%. 55 As demais áreas permaneceram sujeitas ao regime de concessão estabelecido pela Lei nº 9478, a Lei do Petróleo, de 1997.

Director for Business Development and Government Relations Patricia Pradal told Rio Econ off on August 21 that she had doubts over the legality of such a provision. "The Brazilian government will have to fight this out in the courts or change the shareholder composition of Petrobras to give the government a greater share," she explained.56 57 (grifo nosso)

Apesar dos ganhos das firmas manterem-se, sob o novo regime, potencialmente elevados, a expectativa das empresas estrangeiras no setor era de que a mudança provocaria queda em seu fluxo de caixa, o que justificava a certa contrariedade que exibiam: Although industry is opposed to the likely shift from concession to production sharing contracts (PSCs) under the new regime, PSC provisions could potentially carry fiscally advantageous terms for investors. IBP's Teixeira and Chevron's Pradal praised the concession model under the existing regime, calling it "strong and stable." Pradal said the shift from such a model to a PSC was a political move (…) USB Pactual's Gattas offered a more favorable view on PSCs, however, explaining the new model could erase the upfront cash payments associated with current concession contracts.58 (grifo nosso)

Destaca-se, para os nossos propósitos, que o estabelecimento de uma orientação política desta natureza encontraria restrições diante da assunção de compromissos de preservação de “expectativas econômicas” a título de garantias sobre investimento, como fez a Argentina na década de 90.

No percurso até aqui, vimos que a adesão a regimes econômicos internacionais, aspecto normativo do processo de globalização neoliberal promovido no fim de século, conduziu a uma politização interna da política externa, haja vista os efeitos desta, como consequência do conteúdo dos regimes a que se aderiu, sobre os diversos grupos sociais (LIMA, 2005, p. 7). Como resultado do conflito que despontou, processou-se uma mudança de percepção quanto à necessária regulação do investimento em energia, reconhecendo seu caráter estratégico. Paralelamente à revisão do regime de 56

Telegrama 09RIODEJANEIRO288, de 27/08/2009, do consulado norte-americano no Rio de Janeiro endereçado a diversas instâncias do governo americano, disponivel no site www.wikileaks.com 57 Em fevereiro do corrente ano, o Senado Federal aprovou o PL 131/2015, de autoria do Senador José Serra, que retira da Petrobrás a obrigatoriedade de participar da exploração dos campos do pré-sal. 58 Telegrama 09RIODEJANEIRO288, de 27/08/2009, do consulado norte-americano no Rio de Janeiro endereçado a diversas instâncias do governo americano, disponibilizado pelo site www.wikileaks.com

investimentos, encetou-se uma nova orientação externa que conectava a necessidade de proteção aos direitos dos investidores e a necessidade dos países em desenvolvimento por espaço político que lhes assegure o desenvolvimento. Donde a maior liberdade para administrar as regras nacionais dependeu, resta claro, do bloqueio, ainda que parcial, da influência emanada dos centros de poder do sistema internacional (STRANGE, 1997, p 184-189).

Considerações Finais Procuramos neste trabalho oferecer uma análise da reintrodução, pelos países sulamericanos, de institutos normativos clássicos na persecução de políticas de desenvolvimento, assumindo que o alcance dessas políticas apoia-se na legitimidade obtida nas arenas internacionais, particularmente, no quadro regional. Esse esforço dos países periféricos em afirmar seu direito de controlar a entrada de investimento estrangeiro, assenta-se no entendimento de que a contribuição que este pode aportar para o desenvolvimento depende da natureza das políticas e de regulações do Estado, não decorrem da mera presença do investidor. Essa regulação que normatiza as condições de entrada do investimento confronta o modelo regulatório proposto pelos países desenvolvidos e organizações como a OCDE e Banco Mundial, cujas proposições normativas são precipuamente orientadas pela perspectiva da proteção do investidor. O desenlace dos conflitos envolvendo as empresas estrangeiras e o governo argentino no âmbito do ICSID, as decisões de ruptura de Equador e Bolívia em relação a este órgão, bem como a posição do Brasil quando da nacionalização dos hidrocarbonetos bolivianos, demonstram que, na contramão da perspectiva de judicialização (SHIHATA, 1994), a solução diplomática passava a prevalecer. O apoio demonstrado nos marcos do processo de integração via UNASUL à prática da democracia, à soberania sobre os recursos energéticos e à defesa do interesse público, a despeito dos efeitos que possam ter sobre os direitos de propriedade, é também um reflexo desta nova orientação. Se nos anos 90 houve crescimento no uso de tratados bilaterais de investimento, com ênfase na segurança e procedimentos de resolução de disputas, atualmente, tal gesto demarcaria uma inflexão na regulação de investimento. Refletiria, enfim, o repúdio ao

viés pró-business do órgão, indicando a necessidade de um caminho alternativo no tratamento do tema do investimento estrangeiro.

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