A Quinta do Prazer

June 15, 2017 | Autor: Claudia Faria | Categoria: Family history
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A Quinta do Prazer e os sócios da casa comercial Phelps Page & Co.


No seguimento de um estudo acerca da família Phelps e, em particular,
sobre a sua estada na Ilha da Madeira durante o século XIX[1], impõe-se, de
algum modo, nos debruçarmos sobre a Quinta do Prazer, propriedade situada
na freguesia do Monte, Funchal que se tornou a mais emblemática da família
e sobretudo a mais acarinhada e amada.
Não querendo, de modo algum, sermos exaustivos em termos de
contextualização histórica, urge, todavia, notar que o nome da família
Phelps surge num momento em que a Ilha apostava no cultivo da vinha e
exportação do vinho da Madeira. Sabemos que muitos foram os britânicos que
em busca de bons negócios se fixaram em território insular, sendo este o
caso da família de Joseph Phelps, comerciante, cujo nome faz parte ainda
hoje da toponímia da cidade do Funchal, uma vez que mandou abrir uma rua
nesta cidade, tendo o Administrador do Concelho do Funchal, dado ordem no
dia 6 de Abril de 1856 para que o letreiro com o nome do comerciante fosse
colocado na referida artéria[2].
A casa comercial Phelps Page & Co. funcionou durante o apogeu do
comércio vinícola insular, dedicando-se não apenas ao comércio do vinho mas
igualmente a todo o género de produtos, desde tecidos, alimentos, loiça,
mobiliário, entre outros, que importava do Reino Unido e deixava ficar na
praça funchalense, onde de facto, a quase totalidade da actividade
empresarial se concentrava nas mãos de estrangeiros, com particular
destaque para os mercadores britânicos.
Foi possível verificar que o volume de negócios da firma Phelps Page &
Co. permitiu não só uma vastíssima acumulação de riqueza mas igualmente a
aquisição de um património substancial e, em paralelo, um elevado prestígio
social quer da firma, em strictus sensi, quer da família, num sentido mais
lacto.
Em relação ao prestígio social da família, sem querer ser de modo
algum exaustivos, gostaríamos apenas de referir que a grande maioria dos
guias de viagens ou journals escritos por viajantes estrangeiros, com
particular incidência de cidadãos britânicos que durante o século XIX,
aportaram na Madeira, por razões várias, fazem referência a pelo menos um
dos membros da família Phelps ou à sua propriedade do Monte. Citando apenas
alguns, salientamos os casos de Ellen M. Taylor[3], Elisabeth Nicholls[4],
Edward Watkinson Wells[5], entre outros. Por outro lado, são referidos
casos em que os recém-chegados súbditos ingleses se faziam apresentar com
uma letter of introduction dirigida a Mr. Phelps, como nos relata Fanny
Anne Burney[6] no seu journal ou, ainda, aqueles que mal aportavam ao
Funchal recebiam a visita de Joseph Phelps tal como sucedeu na chegada de
Emily Shore e família[7].
O património empresarial da casa comercial Phelps Page & Co. assume
grande relevância comprovando-se assim a riqueza adquirida pela firma
durante o período oitocentista. Desmond Gregory confirma esta posição
dizendo que "Veitch told Shee of the Foreign Office in December 1831 that
the British residents in Madeira had become such landed proprietors that
one firm – that of Phelps Page & Co. – was the third largest landowner in
Funchal"[8].
Efectivamente a família possuía muitas casas, situadas sobretudo na
parte mais ribeirinha da cidade do Funchal, assim como lojas, armazéns e
estufas e todo o tipo de edifício ligado não apenas ao comércio de
artefactos mas essencialmente à actividade vinícola. No estudo a que nos
referimos, foi possível verificar que havia uma concentração de edifícios
na zona do Carmo e Ribeirinho, assim como na Rua do Cotife, Rua da
Laranjeira, Rua do Sabão e Rua da Conceição.
Contudo, a propriedade que assume maior relevância, é a Quinta do
Prazer, situada na freguesia do Monte que embora tendo sido adquirida pela
firma comercial era quase exclusivamente destinada ao usufruto familiar. A
Quinta assumirá durante a permanência dos Phelps na Madeira um grande
papel, destacando-se não só pela sua posição geográfica, como pela sua
beleza paisagística. Aliás, todos os membros da família nutriam especial
predilecção por esta Quinta, com especial destaque para Mary, filha de
Joseph e Elisabeth Phelps, assunto que mais adiante retomaremos.
Mas quem eram os Phelps? De onde vieram e que importância terão tido
para que o seu nome ficasse ligado para sempre à história da Madeira?
Tentaremos responder a estas questões, antes de nos debruçarmos sobre o
valor sentimental da Quinta do Prazer para os Phelps.
Os primeiros membros da família que aqui se fixaram foram William Phelps e
Elisabeth Peyton Phelps, estando o motivo da sua fixação em território
insular ainda envolvido em algum mistério. Até ao momento não foi possível
apurar porque se instalaram os Phelps na cidade do Funchal, nem tão pouco
se já exerciam alguma actividade comercial em Dursley[9], cidade de onde
são oriundos. No entanto, muitos foram os cidadãos britânicos que optaram
por sair de Inglaterra em busca de oportunidades de negócio. Imbuídos de
espírito de aventura e iniciativa e impulsionados pelas novas políticas
comerciais de cunho marcadamente liberal, muitos foram em busca de
prosperidade económica fixando-se em paragens distantes, por vezes exóticas
e hostis, mas sobretudo muito rentáveis.
William e Elisabeth Phelps chegaram à praça funchalense decorria o ano
de 1784 e aqui fixaram residência por largos anos. O casal teve 7 filhos,
Elisabeth, Mary, William, Abel Peyton, Anne, Charles e Joseph que nasceram
todos na cidade do Funchal na residência da Rua do Convento Novo do Carmo,
freguesia da Sé. Uma vez que, a esta data, a comunidade mercantil britânica
instalada na praça funchalense não dispunha ainda de um templo religioso
onde professar o seu credo nem de um reverendo para guiar o seu rebanho, os
baptizados foram realizados por pastores que aportavam à Madeira nas muitas
embarcações britânicas que faziam escala no porto do Funchal[10].
De todos estes, será Joseph, aquele cujo nome mais ficará ligado à
Madeira e aos madeirenses. Tal como seus pais, Joseph escolhe a Madeira
como seu lar, depois de ter completado os estudos em Inglaterra[11]. Porém,
regressa a Londres no dia 26 de Julho de 1819, com objectivos bem
definidos. Dirige-se de imediato a Montague Place[12], residência dos avós,
onde possivelmente ficou instalado e passados alguns dias, mais
concretamente, a 17 de Agosto de 1819 casa-se com Elisabeth Dickinson,
filha do Capitão Thomas Dickinson e de Francis de Brissac[13].
Já casados, Joseph e Elisabeth Phelps regressam à Madeira no dia 14 de
Outubro do mesmo ano, fixando residência no Funchal. Na totalidade, o casal
teve 11 filhos, a saber, Elisabeth, Mary, Anne, Frances, Harriet, Joseph,
Clara, Charles, William, Arthur e Jane. De entre estes, será Elisabeth,
conhecida por Bella, que tal como os progenitores ligará o seu nome à
história da Ilha da Madeira e, em particular, ao bordado da Madeira,
assunto sobre o qual não nos iremos debruçar neste momento, uma vez que
está fora do âmbito a que nos propusemos tratar.
No que diz respeito à casa comercial fundada pela família Phelps, o
estudo de Noel Cossart[14] acerca das casas comerciais estabelecidas na
Madeira, permite concluir que o nome Phelps surge na lista de firmas dos
anos de 1786 a 1790.
Uma vez que os dados do espólio familiar a que tivemos acesso
confirmam a chegada de William e Elisabeth à Madeira em 1784, consideramos
um período de dois anos razoável para William Phelps se estabelecer na
actividade comercial.
A sua casa comercial iniciou a actividade sob a designação Phelps &
Morissey[15], tendo depois mudado para Phelps & Co. Em 1790 assume a
designação de J. & W. Phelps & Co. e, por volta de 1800, muda para
Bisset[16] & Phelps. Passados cinco anos passa a designar-se Phelps Page &
Co., nome pela qual irá ser mais conhecida.
De entre os sócios da firma, aqueles que adquiriram maior relevância
foram, em primeiro lugar, Joseph Phelps e William Phelps, filhos do
fundador e em segundo lugar, Robert Page.
Quanto a este último, a sua ligação à família Phelps e à Ilha da
Madeira surge no seguimento do seu matrimónio com a filha mais velha do
casal William Phelps e Elisabeth Peyton Phelps. A cerimónia ocorrida no dia
22 de Março de 1803 teve lugar em St. Pancras, tendo o casal optado por se
instalar igualmente na Madeira. [17] O espólio familiar depositado em
Londres permite confirmar que as duas famílias eram oriundas do mesmo
condado, pelo que é admissível um relacionamento entre ambas. Por outro
lado, e dada a inexistência de qualquer referência ao sobrenome Page ou ao
nome de Robert Page em concreto, nos documentos que estudamos, somos
levados a concluir que a ligação deste último à Madeira se prende
unicamente com a sua inclusão na família de Elisabeth Phelps, sua esposa.
Em consequência, Robert Page acaba por se integrar na firma, tornando-
se sócio da mesma e ajudando o cunhado Joseph Phelps na crescente
actividade comercial da casa Phelps. Uma vez mais, o estudo de Noel Cossart
permite confirmar a alteração da denominação comercial ocorrida em 1805
para Phelps, Page & Co. Haviam passados três anos desde o casamento com
Elisabeth.
No que diz respeito a William Phelps, é apenas possível adiantar que,
apesar de ter nascido na Madeira, como os seus irmãos, optou por se fixar
em Londres e era ele que mantinha a ligação da firma entre a capital
banhada pelo Tamisa e o Funchal. Aliás, estamos convencidos que a sua
presença na Madeira era, na verdade, pouco frequente. Uma vez mais, a
leitura do diário de Mary, sua sobrinha, permite assegurar que esteve
ausente da ilha cerca de 25 anos, tendo regressado para uma visita muito
esperada, a bordo do Belle Alliance, no dia 2 de Setembro de 1839.
Por último, Joseph Phelps, embora sendo o mais novo, vai assumir um
papel preponderante na liderança dos negócios, sobretudo na praça
funchalense. Aquando da morte de Robert Page, Joseph assume o comando da
parte pertencente a sua irmã, viúva de Page, e William continua com a
gerência em Londres. Por outro lado, a análise da correspondência familiar
permite concluir que os pais de Joseph, William e Elisabeth se haviam
retirado para Inglaterra, deixando assim os negócios do Funchal entregues a
Joseph. Acrescente-se que o facto dos avós passarem a residir em Londres se
tornou muito favorável ao casal Joseph e Elisabeth, uma vez que os avós
paternos prestavam assistência aos filhos do casal, que seguindo uma
tradição muito vincada da comunidade britânica sedeada na Madeira,
estudavam na capital inglesa. Após a retirada do fundador da casa comercial
da família Phelps serão os irmãos William e Joseph que irão projectar o
nome Phelps, tanto no comércio local madeirense e londrino como também no
comércio intercontinental durante a centúria de oitocentos.
Voltando à questão da Quinta do Prazer, tema a que nos propusemos
analisar, os primeiros dados sobre a referida propriedade e segundo
informação fornecida por João Adriano Ribeiro, demonstram que os terrenos
pertenceram aos jesuítas até ao ano de 1770[18].
Uma escritura datada de 1773 revela que Thomas Logham e esposa Philis
Logham compraram a referida propriedade pela quantia de três contos de
reis, que à data pertencia a outro cidadão britânico, Francis Theodor, que
havia adquirido os terrenos em hasta pública.
Ao longo dos anos o casal Logham foi adquirindo terrenos contíguos à
quinta, aumentando assim a propriedade que acabaram por vender a 16 de
Setembro de 1779, ao cônsul britânico, Charles Murray. Este, por seu turno,
e apesar da propriedade ser já muito extensa, procurou igualmente aumentá-
la continuando a compra dos terrenos circundantes. Além do mais, mandou
plantar mais árvores e, em simultâneo, tentou resolver o problema da água,
apresentando uma petição junto do Governador Civil, D. Diogo Forjaz
Coutinho, no sentido de construir um aqueduto de pedra e cal às suas
expensas.
Passados 19 anos o casal Charles Murray e Isabel Seat decidem vender a
sua propriedade a Luís Vicente Carvalhal Esmeraldo como se confirma pela
escritura de 7 de Agosto de 1798. Anos mais tarde, e por morte deste sem
descendência, é elaborado, a 17 de Setembro de 1803, um contrato de
partilha amigável entre a mãe de Luís Vicente, D. Isabel Maria da Câmara
Leme e a viúva, D. Ana Inácia de Freitas Correia que entretanto havia
casado com Nuno de Freitas da Silva. A propriedade foi dividida em duas
porções, ficando D. Isabel com a parte de cima e o casal Freitas da Silva
com a parte de baixo conhecida pelo nome de Quinta de Baixo.
No dia 13 de Maio de 1805[19], a firma Phelps Page & Co., representada
pelo sócio Robert Page, compra a Nuno de Freitas da Silva e esposa, Ana
Inácia de Freitas Correia, "…a Quinta de baixo, que agora se lhe fica
chamando a Quinta do Prazer dado pelos compradores asima nomeados..."[20].
Sabe-se que o casal havia decidido vender a propriedade uma vez que a
sua extensão implicava avultados gastos de manutenção, e ainda devido ao
facto, de terem, igualmente, outras dívidas acumuladas, tornado-se
impossível a sua sustentação por mais tempo. A venda fez-se pelo valor de
quinze contos de réis que receberam na totalidade da mão dos compradores,
no próprio dia.
A propriedade assume a partir de então o nome de Quinta do Prazer,
nome que consta da bandeira hasteada de cor vermelha e branca e que se pode
ver numa aguarela que se encontra na Casa Museu Frederico de Freitas. A sua
dimensão destaca-se de entre as demais propriedades situadas nos arredores
do Funchal sendo disso prova a descrição inclusa num dos registos
notariais, que transcrevemos: "E disse o Vendedor por seu Procurador que
elle he Senhor e Possuidor em pacifica posse de hua Quinta amurada com
todas as suas benfeitorias, sendo a maior parte d'ellas rusticas e se
compoem de hua casa de sobrado, hua casinha de praser, hua cavalharia,
arvoredo frutifero, e agreste, portadas, muros que rodeão a terra e outras
no interior, pocas, assientas, paredes, casinha de banhos, tilheiro, um
palheiro, duas pequenas casas e outras mais benfeitorias, sua agua nativa,
e a mais que lhe pertence sita da freguesia de Nossa Senhora do Monte,
chamada Quinta do Prazer, contendo o terreno que ocupa a mesma Quinta cento
e trinta e dois alqueires e dez maquias, e confronta pelo Norte com o
Morgado João Agostinho d' Albuquerque e o Caminho que vao para o Curral dos
Romeiros, Sul com D. Maria Teyal e terra de Manoel José d'Oliveira, Lesta
com o Caminho que vai do Desterro para sima, e Oeste com o Caminho do
Monte, e o dito Morgado Albuquerque, e com as mais verdadeiras
confrontações com que deva de partir."[21].
Em relação à denominação de Quinta do Prazer, somos obrigados a
admitir que não temos, até à data, nenhum dado que permita tirar alguma
conclusão acerca desta escolha que, como referimos, foi feita no dia da
compra da mesma. De acordo com o estudo de Brígida Homem de Gouveia[22]
estas propriedades recebiam, regra geral, o nome do seu proprietário e
respectiva família, ou de alguma personagem que se destacava ou ainda o
nome do sítio onde se situava. São os casos da Quinta Wallas, Quinta do
Palheiro Ferreiro entre tantas outras. Não é o caso da Quinta do Prazer,
que embora tenha sido adquirida pela firma Phelps Page & Co. não assume o
nome de nenhum dos seus sócios, Joseph Phelps e Robert Page, nem tão pouco
de qualquer outro membro de família. Por outro lado, também não lhe foi
atribuído um nome ligado à sua localização geográfica.
Numa fase posterior ao arranjo da casa e respectiva decoração de modo
a instalar comodamente todos os membros desta numerosa família, Joseph
Phelps procedeu a obras na parte exterior da propriedade, mandando
construir muros de vedação numa extensão de cem braças de dez palmos tendo
para o efeito elaborado um contrato, em 1825, com os mestres Inácio
Fernandes Ferreira e António de Oliveira. Ficou acordado que as paredes
fossem "... feitas de boa alvenaria seca bem aprumadas, e com a melhor
segurança e perfeição possível, e os alicerces bem tirados..."[23] tendo
Joseph Phelps pago 5.500 réis por cada braça em carvão de pedra importado
de Inglaterra pela sua casa comercial.
Elisabeth Phelps, por seu turno, além de cuidar da manutenção da casa
e, sobretudo, da decoração da mesma, demonstrou, segundo Noel Cossart,
grande dedicação pela área verde circundante, tendo mesmo procedido a
importações de Londres de algumas espécies arbóreas. No entender deste
autor, Mrs Phelps terá sido a responsável pela introdução na Ilha da
Madeira de várias espécies como o pinheiro, o eucalipto, entre tantas
outras. Quer Noel Cossart, quer alguns dos autores dos guias de viagens
dedicados à Madeira fazem referência à realização de uns piqueniques
ocorridos nas propriedades da família e durante os quais era pedido aos
convidados que plantassem um arbusto ou uma árvore. De acordo com o autor
britânico estes eventos ficaram conhecidos pela designação de Mrs Phelps'
picnics. Embora não tendo como provar a realização de tais ocorrências,
podemos, todavia, assegurar que a jardinagem era efectivamente um grande
interesse de Elisabeth Phelps, sobretudo pelo número de livros dedicados a
este tema que encontramos no espólio familiar. Merece especial destaque,
uma obra intitulada "The Garden: or familiar instructions for the laying
out and manegement of a flower garden" que se encontra na Biblioteca
Municipal do Funchal.
Ponto assente é o facto de todos os membros da família Phelps nutrirem
por este espaço muito carinho e afecto e sobretudo muito orgulho na sua
vastidão e beleza paisagística. Vários são os exemplos demonstrativos desta
especial predilecção. Em 1817, aquando da passagem pelo Funchal da
Imperatriz Leopoldina do Brasil, sabe-se que Robert Page ofereceu um lanche
em sua homenagem na propriedade do Monte. Numa outra ocasião, aquando da
chegada da família Wood, Mrs Wood no seu registo de viagem confirma a ida
para a Quinta do Prazer logo de imediato, tanto mais que o vento de leste
tornava a permanência no Funchal praticamente impossível.
A Quinta servia de local de convívio, sobretudo com a realização de
actividades ao ar livre, nomeadamente almoços, jantares, lanches ou
piqueniques. Os Phelps aproveitavam para convidar não apenas os seus amigos
mais chegados mas também figuras mais destacadas, não só da comunidade
madeirense, como todos os ilustres cidadãos estrangeiros que aportavam na
Madeira.
Nesses dias a azáfama era mais intensa e quer Mary quer as restantes
filhas do casal ajudavam nos trabalhos de preparação, nomeadamente, na
disposição das mesas e na elaboração de pudins, tartes e outras tantas
iguarias.
Salientamos igualmente o facto de ser hábito a ida para o Monte no dia
da festa de Nossa Senhora do Monte. Através da leitura do manuscrito de
Mary é possível confirmar que se tratava de um dia esperado com alguma
ansiedade e preparado igualmente com muito cuidado. No dia 15 de Agosto de
1839, eram esperados na Quinta do Prazer cerca de 45 convidados, destacando-
se Mr. Picken, Dr. Lippold, Dr. Oliveira, Mrs Perestrelo, os Haywards, os
Blackhalls, os Gordon, entre outros, e ainda, o Governador e esposa. O dia
iniciou-se com o pequeno-almoço no furado à medida que os convidados iam
chegando. Depois, a maioria foi visitar a Igreja indo de seguida descansar
para o Mirante, onde aproveitavam para ver as pessoas que passavam. A esta
altura foram servidos gelados. Logo de imediato seguiu-se música e dança
regional. A propósito de música e dança, refira-se que, regra geral, eram
os próprios súbditos britânicos que tocavam e cantavam, animando assim os
serões. Todavia, como estamos perante a celebração de um dia festivo
marcadamente madeirense, ouviu-se música local cantada pelo povo. Note-se
que, no entanto, Mary não conseguiu evitar um comentário pouco abonatório,
descrevendo a sessão musical de "horrid singing". O almoço foi servido às
três horas seguido de fruta e outras sobremesas. Entretanto Mary animou os
convidados ao som do piano, enquanto Júlia e as outras crianças cantaram.
Ao escurecer serviu-se o café e deu-se início ao baile. Por volta das dez
horas as salas começaram a descongestionar-se.
No ano seguinte, a tradição mantêm-se e os festejos do dia do Monte
são novamente cuidadosamente organizados. Ao despertar, às 6 horas da
manhã, seguiu-se a ida para o Mirante, onde Mary e as irmãs viram chegar os
convidados. Desta vez o Governador não pode estar presente mas, no entanto,
muitos foram os que aceitaram passar o dia na Quinta do Prazer, tanto
britânicos como madeirenses. Após a chegada de todos, dirigiram-se para o
adro da Igreja e passaram a manhã caminhando entre a mesma e a Quinta da
família Gordon. Nesse dia, Mary relata as celebrações do povo e em
particular os "...penitents on their knees, kissing of the image...[24]" .
No seu entender estavam cerca de 1500 pessoas à volta da Igreja,
acreditando nunca antes ter visto tanta gente no Monte, nem mesmo neste dia
festivo. O almoço foi servido à mesma hora mas, desta vez, as crianças
optaram por fazer um piquenique no furado. Em seguida, começou a música,
tocando-se machete e dançando-se. Saliente-se que, tal como relatou Mary no
ano transacto, uma vez mais, as portas da residência de Joseph Phelps se
abriram para os músicos madeirenses. A noite foi animada e os primeiros
convidados começaram a sair por volta das 10 horas.
Todavia importa notar que a Quinta do Prazer era acima de tudo um
espaço familiar muito querido por todos e, apesar de todos apreciarem os
convívios que lá se realizavam, não deixavam igualmente de gozar da
propriedade do Monte de uma forma mais familiar e intimista. Quase
diariamente algum deles se deslocava ao Monte e, mesmo que não pernoitasse,
passava largas horas desfrutando do seu sossego e beleza. "Mama spent the
day at Mount all by herself"[25].
Tanto Mrs Phelps como as crianças, com algum destaque para Bella e
Mary aproveitavam todos os motivos para subirem ao Monte, mesmo que tal
implicasse uma longa e penosa caminhada a pé, uma vez que segundo nos
relata Mary nem sempre os cavalos ou os palanquins estavam disponíveis. Nem
mesmo a chuva ou o frio os impedia de sair do Funchal em direcção à Quinta,
antes pelo contrário, tal como sucedeu no dia 28 de Fevereiro de 1840 em
que a neve desceu até ao Monte, pelo que Mrs Phelps e os filhos foram de
imediato passar o dia na Quinta, tendo o dia sido passado em brincadeiras
muito divertidas[26].
Mrs Phelps demonstra efectivamente muito apego por este espaço e mesmo
que o motivo da sua deslocação ao Monte fosse trabalho, o despertar
madrugador não lhe fazia desanimar. "Then Mama went up to the Mount where
she had business to transact...[27]"
A leitura atenta do manuscrito de Mary Phelps permite-nos verificar
que era Joseph Phelps aquele que menos usufruía da beleza e descanso
proporcionados pela Quinta, factor que atribuímos acima de tudo à sua
exigente ocupação. Note-se que Mr. Phelps além de se dedicar à actividade
comercial propriamente dita, tendo a grande responsabilidade de liderar a
firma sedeada no Funchal, detinha igualmente muitas outras ocupações. Era
membro da Associação Comercial do Funchal, da Sociedade dos Amigos da
Ciências e das Artes e da Associação Agrícola da Madeira. Era ainda agente
de navegação da Penisular &Oriental Steam Navigation Company[28] , ocupação
que também lhe exigia muita dedicação e empenho. Por outro lado, liderava a
Escola Lancasteriana de rapazes, dando igualmente apoio à esposa na
direcção da Escola Lancasteriana do sexo feminino. Além do mais,
participava em todas as iniciativas de carácter filantropo que ocorriam no
Funchal destacando-se a sua participação quer no Asilo de Mendicidade do
Funchal quer na Santa Casa da Misericórdia. Joseph Phelps fazia ainda parte
da comissão instituída com o objectivo de prover a edificação de um
hospício para os doentes pulmonares seguindo a vontade expressa da
Imperatriz D. Amélia e integrou igualmente a comissão edificada para o
combate de uma epidemia de cólera que assolou a Ilha no ano de 1856. A
título de curiosidade, refira-se que o seu filho mais velho, Charles, fazia
igualmente parte do comité formado em Londres para ajudar as vítimas
Madeirenses. Destacando-se efectivamente pelo seu caracter filantropo,
Joseph Phelps acudia a todos os pedidos de ajuda, monetária ou não, dentro
ou fora do território insular, pelo que o nome da família surge sempre ao
lado de todos os que, também movidos pela solidariedade e filantropia, não
olhavam a esforços para prover o bem dos menos afortunados.
Regressando à Quinta do Prazer e à estima que os Phelps tinham pela
mesma, gostaríamos de referir que, quer Mary quer Mrs Phelps faziam com que
os seus instrumentos musicais preferidos, piano e harpa, respectivamente,
fossem do Monte para o Funchal e vice-versa. É notório um grande gosto pela
música, pelo canto e pela dança. Por todo o diário são inúmeras as
referências não só as aulas de canto, de piano e de machete mas também aos
ensaios de dança e acima de tudo às soirrées dançantes, uma das diversões
mais apreciadas pelos jovens britânicos que frequentavam diariamente a
residência dos Phelps.
Tal como referimos no início deste estudo, é possível concluir que
Mary é a filha do casal Joseph e Elisabeth Phelps que mais apego e estima
tem pela propriedade do Monte. Uma leitura atenta do seu registo manuscrito
permite mesmo confirmar uma total devoção por parte de Mary em relação à
Quinta do Prazer. Todas as razões justificavam a sua ida para o Monte,
fosse para passar o dia ou até mesmo apenas a tarde com as amigas. "Fanny
and I set off at 6 o'clock to walk up to the Mount to spend the day which I
had long been wishing to do[29]". Facto bem demonstrativo do apego que Mary
tinha pelo Monte reside numa advertência de sua mãe datada de 1844, ausente
em Londres com o propósito de encontrar uma escola adequada para os filhos
mais novos, em que Mrs Phelps lhe recomenda para cuidar devidamente dos
irmãos, tarefa que lhe havia sido incumbida e sobretudo para "… do not let
your indolence prevent you from going down the Quinta to look after
them…"[30]. É evidente que Mrs Phelps sabia que Mary passava mais tempo no
Monte do que no Funchal.
O orgulho de Mary não só na dimensão da propriedade mas sobretudo pela
sua beleza paisagística fica bem expresso quando diz que "after breakfast
we all walked round the Quinta with which all were in ecstasies as usual
especially Misses Southcote and Ross who had never been here before"[31].
Efectivamente estes reparos extraordinariamente positivos em relação à
Quinta surgem com frequência no seu diário. Mary não se cansa de demonstrar
como todos os que visitavam a propriedade da família ficavam completamente
deslumbrados com a mesma. "The Carters and Fanny and Mama Tripp came up to
tea and the former were much charmed with the beauty of the Quinta as who
would not be the saw it for the first time"[32]
Em contrapartida e tendo em conta que se trata de uma adolescente,
Mary não é capaz de admitir que existisse mais alguma propriedade tão ou
mais bonita e encantadora que a sua e, regra geral, os seus comentários em
relação às outras propriedades são pouco abonatórios, chegando mesmo, no
nosso entender, a ser um pouco rudes. "Their Quinta is not very nice, but
we walked about immensely[33]", referindo-se à Quinta da família Wallas.
Todavia, Mary não subia ao Monte para conviver apenas com os amigos e
convidados. Bem pelo contrário. Através da leitura do seu diário não
descuramos o facto de Mary apreciar acima de tudo o sossego, a paz e a
tranquilidade que a Quinta lhe proporcionava pelo que muito frequentemente
se deslocava para lá, só, isolando-se um pouco da agitada vida social da
família Phelps. Efectivamente, é possível notar que Mary, embora gostasse
de conviver e estar com as amigas, sobretudo Arabella Shore, Marion Wallas
e Sophia Sheppard, tinha uma necessidade premente de se afastar e reflectir
durante largas horas, sobre o seu carácter, sobre a sua irmã mais velha e
os seus pais, sobre os familiares que deixara em Inglaterra e ainda sobre o
seu quotidiano na Madeira. Uma vez que tal introspecção não se podia de
modo algum realizar com constantes entradas e saídas de pessoas tal como
acontecia na residência do Funchal, nem tão pouco com a intensidade e
variedade das suas tarefas diárias, Mary retirava-se para o Monte, sempre
que possível, tanto mais que ali o ambiente mais leve e saudável permitia-
lhe melhores e mais profundas reflexões e, acima de tudo, firmes tomadas de
decisões. "The weather is most exquisitely delicious, blue sky, warm sun
and a cool breeze, and the trees and flowers are so sweet. It would be
impossible I think to be unhappy here, I always feel so much more innocent
and happy up here than in town, and make such good resolutions to remain
so…"[34]
Neste sentido somos levados a concluir que a venda da Quinta, ocorrida
no dia 10 de Fevereiro de 1847, terá sido, sobretudo, para Mary uma grande
perda. Uma vez que o seu manuscrito se reporta apenas aos anos de 1839 e
1840, não temos registo nem da sua opinião nem dos seus sentimentos em
relação a esta decisão. No entanto, estamos convencidos de que Mary se terá
eventualmente oposto a esta medida e que acima de tudo terá sentido muito a
perda do seu espaço de eleição. Note-se que Joseph e Elisabeth Phelps e
restante família ainda permaneceram na Madeira por mais treze anos, ficando
Mary durante este tempo privada do seu refúgio.
Um contrato de dissolução e partilha elaborado em Londres no
escritório do Tabelião C. Deane, datado de 11 de Dezembro de 1845,
demonstra que a propriedade do Monte fora atribuída a William Phelps, sócio
e irmão de Joseph Phelps residente em Londres. Nesse sentido, não
descuramos o facto de William, que já não vivia na Madeira há muito tempo,
ter tratado da venda da Quinta como mais uma transacção comercial. Estamos
convencidos que este não nutria nem o carinho nem a devoção que Elisabeth
Phelps e suas filhas, em especial Mary, mostravam sentir pela propriedade.
Além do mais, e tratando-se de homens de negócio, como o eram, quer William
quer Joseph, jamais recusariam um boa venda. Consequentemente e perante a
oferta de Joaquim Roque da Silva, a Quinta do Prazer foi vendida pelo valor
de vinte contos de réis pago na totalidade em vinho velho.
Mais tarde, instalou-se nesta propriedade o Monte Palace Hotel, tendo
o seu proprietário, Alfredo Guilherme Rodrigues, demolido a antiga casa
para reedificar uma infra-estrutura inspirada nas construções
características das margens do Reno. Perdeu-se, deste modo, a tão sublimada
residência do Monte da família Phelps.
-----------------------
[1] Tese de Mestrado intitulada "Phelps-Percursos de uma família britânica
na Madeira de Oitocentos" orientada pelo Professor Doutor João Adriano
Ribeiro e apresentada publicamente no dia 15 de Julho de 2005 na
Universidade da Madeira
[2] Ver ARM, AF, Lº. 319, Correspondência Expedida, Renomeação da nova rua
do Phelps, 6 de Abril de 1856, fl.790.
[3] Ver Ellen M. Taylor, Madeira, Its Scenery and how to see it, London,
1882.
[4] Ver Elisabeth Nicholls, Madeira and the Canaries: A traveller's note
book, Hamish Hamilton, London, 1953.
[5] Ver Edward Watkinson Wells, A Trip to Madeira: October 28, 1836 to June
25, 1837, presented to the English Rooms by Mr James Hayden Wells, October
14, 1967.
[6] Notas extraídas de uma conferência "Introduction to British Women
Diarists in Madeira during the 19th century" proferida pelo Professor J.
Donald Silva no Museu Frederico de Freitas, no Funchal a 21 de Janeiro de
2004.
[7] Ver Barbara Timm Gates, Journal of Emily Shore, Charlottsville and
London, University Press of Virginia, 1991.
[8] Desmond Gregory, The Beneficient Usurpers, Associated University Press,
1988, p.46.
[9] Trata-se de uma cidade situada no condado de Gloucestershire conhecida
pela actividade industrial.
[10] Conforme documentos consultados na British Library.
[11] Estudou no Winchester College, uma das mais famosas Public Schools
fundada em 1382 por William of Wykeham, Bispo de Winchester.
[12] Rua situada perto de Russel Square e do British Museum, construída ao
longo do século XIX em terrenos que pertenciam ao Duque de Bedford.
[13] O capitão Thomas Dickinson sucedeu a seu pai como superintendente da
Ordenance Transport de Woolwich sediada na Torre de Londres. Quando se
mudaram para este novo espaço adquiriram uma propriedade à qual deram o
nome de Brambleburry. O casal teve nove filhos, cinco rapazes e quatro
raparigas, destacando-se o primogénito, John Dickinson, fundador da firma
John Dickinson & Co, uma das primeira fábricas de papel inglesas.
[14] Ver Noel Cossart, The Island Vineyard, Christie's Wine Publications,
1984.
[15] No que diz respeito a Morissey foi possível apurar que no ano de 1801,
John Lewis e Diogo Goodall , na qualidade de administradores dos bens de
Diogo Morissey, falecido, em conjunto com José Alexandre Condell e Diogo
Denyer exercendo as funções de tutores dos filhos menores de Diogo Morrisey
procedem a uma ajuste de contas relativo ao dinheiro gasto por Joseph e
William Phelps na subsistência dos filhos de Diogo. Uma cláusula inserta no
documento de constituição da sociedade fixava que na morte de um dos sócios
seria entregue a quantia de vinte e sete contos de réis aos herdeiros e que
os lucros e fundos da dita sociedade seriam igualmente repartidos mas que
tal pagamento se deveria fazer em três vezes.
[16] Quanto a Bisset e, de acordo com o estudo de Jorge Martins Ribeiro, o
nome surge associado à firma Lamar Hill Bisset & Co. com interesses em
Londres , Filadélfia e Funchal. Os seus sócios eram Thomas Lamar, Richard
Hill, Robert Hill e Robert Bisset. Foram os sócios Robert Bisset e Richard
Lamar Bisset aqueles que asseguram o funcionamento da firma na Ilha da
Madeira que apesar de ter sido uma das mais notáveis acabou por ser
dissolvida.
[17] Robert Page nasceu a 25 de Março de 1775 e era filho do reverendo
Charles Page de Northleach, Gloucestershire.
[18] João Adriano Ribeiro, Monte- Breve Resenha Histórica da Freguesia de
Nossa Senhora do Monte, Funchal, Fundação Berardo, 1991.
[19] Refira-se que se trata do mesmo ano em que a denominação da firma
sofreu alteração para Phelps Page & Co.
[20] ARM, RN, Livro 41, nº.1108, fls.1-4, Tab. Januário Francico da Costa.
[21] ARM, RN, Livro 3, nº. 2284. fls. 37v-42v, Tab. Cândido Leal e Lacerda.
[22] Ver Maria Brígida Homem de Gouveia, As Quintas da Madeira na projecção
do Século XIX Europeu, Funchal. (texto policopiado)
[23] Idem, Ibidem.
[24] Lambeth Archives, Phelps family diaries, correspondence and papers,
NRA 31698, Mary Phelps Diary, Vol IV.
[25] Idem, Ibidem, Vol IV.
[26] Idem, Ibidem, Vol. II.
[27] Idem, Ibidem, Vol. I.
[28] Companhia constituída em 1822 por Brodie McGhie Wilcox e Arthur
Anderson aos quais se juntou em 1835 o capitão Richard Bourne. A partir
daqui iniciou-se um serviço regular entre Londres, Espanha e Portugal.
[29] L.A, Phelps family diaries, correspondence and papers, NRA 31698, Mary
Phelps Diary, Vol. I.
[30] Carta de Elisabeth para suas filhas, Mary e Elisabeth, Bramblebury ,1
Julho de 1844 ( cedida pela família).
[31] L.A, Phelps family diaries, correspondence and papers, NRA 31698,Mary
Phelps Diary, Vol. IV.
[32] Idem, Ibidem, Vol IV.
[33] Idem, Ibidem, Vol III.
[34] Idem, Ibidem, Vol III.

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Fig.3 – O casal Joseph e Elisabeth Phelps, foto publicada por Noel Cossart
in The Island Vineyard.



Fig. 1 - William Phelps (colecção particular de James Phelps).



Fig. 2 - Elisabeth Peyton Phelps (colecção particular de James Phelps).



Fig.4 – A Quinta do Prazer, foto publicada por João Adriano Ribeiro in
Monte –Breve Resenha Histórica da Freguesia de Nossa Senhora do Monte.
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