A (RE) CONSTRUÇÃO DA MUDANCA: Viver em Diálise Peritoneal

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CURSO O DE MESTRADO EM ENFERMAG AGEM MÉDICO - CIRÚRGICA

A (RE) CONSTRUÇÃO DA MUDAN ANÇA Viver em Diálise Peritoneal

Maria Arminda da Silva Tavares

Coimbra, Janeiro de 2012

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CURSO O DE MESTRADO EM ENFERMAG AGEM MÉDICO - CIRÚRGICA

A (RE RE) CONSTRUÇÃO DA MUDANÇ ÇA Viver em Diálise Peritoneal

Maria Arminda da Silva Tavares

Orientador(a):: Professora P Doutora Maria Isabel Domingues es Fernandes E Escola Superior Enfermagem de Coimbra

Dissertação apresentada ap à Escola Superior de Enfermagem de e Coimbra para obtenção do grau de Mestre em Enfermagem Médico-Cirúrgica

Coimbra, Janeiro de 2012

“Tive muita ansiedade. Quase depressão. Lembrava-me da esposa e das minhas filhas, que ainda dependem mim, e chorei. Mas tive sempre o apoio carinhoso da equipa de enfermagem. Bem-haja!” Joaquim Mateus, Covões, 2011

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DEDICATÓRIA

Para ti Fernando que acompanhaste este difícil percurso, és para mim fonte de inspiração e motivo de grande orgulho!

Aos meus queridos pais e sobrinhos que sofreram silenciosamente com a minha ausência!

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AGRADECIMENTOS À Professora Doutora Isabel Fernandes, agradeço a sua orientação, as sugestões, as ideias, os conselhos e a ilimitada disponibilidade e compreensão. Agradeço-lhe por ter confiado que seria capaz de levar a bom rumo este desafio. Agradeço à instituição hospitalar do Centro Hospitalar de Coimbra e ao Serviço de Diálise por terem colaborado e facilitado o processo de recolha dos dados. A todos os participantes e demais pessoas insuficientes renais em diálise peritoneal que contactei durante este percurso, agradeço a sua vontade em participar e o terem compreendido o contributo que este trabalho possa fornecer para a compreensão da sua doença e do seu tratamento.

Aos meus colegas enfermeiros e a todos os profissionais de saúde que amavelmente sempre me deram força para concluir este percurso, agradeço a sua disponibilidade em ajudar-me sempre que necessário. À Professora Doutora Helena Sá pela sua leitura atenta e crítica, agradeço a sua disponibilidade. Ao Professor João Franco pela sua disponibilidade, amabilidade e correcções sempre pertinentes. A todos os que se cruzaram no meu caminho e que me apoiaram em momentos de descrença e quase abandono deste caminho, só facilitado pela vossa presença e apoio. A todos os enfermeiros estudantes do 4º Curso de Pós-Licenciatura de Enfermagem Médico-Cirúrgica, um muito obrigado por se terem cruzado no meu caminho.

A todos um muito sincero Obrigado!

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LISTA DE SIGLAS

CIE

Conselho Internacional de Enfermeiros

CIPE

Classificação Internacional para prática de Enfermagem

DP

Diálise peritoneal

DPA

Diálise peritoneal automática

DPCA

Diálise peritoneal contínua ambulatória

DRC

Doença renal crónica

IRCT

Insuficiência renal crónica terminal

K/DOQI

Kidney Disease Outcomes Quality Initiative

TFG

Taxa de filtração glomerular

TSFR

Técnica de substituição da função renal

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RESUMO

A doença renal crónica tem vindo a aumentar progressivamente no nosso país estimando-se que mais de 16 mil pessoas estejam em terapias de substituição da função renal. Uma das possíveis abordagens terapêuticas é a diálise peritoneal. No processo de transição a pessoa submetida a esta terapia, experiencia novas necessidades decorrentes das mudanças que a sua situação clínica lhe coloca, entre as quais, a necessidade de aprender a realizar uma técnica dialítica no domicílio (Meleis et al., 2000). Nestas mudanças o enfermeiro assume um papel decisivo na facilitação de todo o processo.

Esta investigação tem como objectivo principal compreender as vivências da pessoa insuficiente renal crónica terminal no período inicial do tratamento por diálise peritoneal (DP). Realizou-se uma pesquisa qualitativa de orientação fenomenológica. Para a colheita de dados recorreu-se à entrevista semi-estruturada junto de 12 participantes em diálise peritoneal. Os dados analisados obedeceram aos critérios propostos pela metodologia de Colaizzi (1978) e descrita por Streubert e Carpenter (2002). A partir da identificação das declarações significativas e da construção de significados emergiram como temas principais na compreensão das vivências da pessoa no período inicial da DP: as disposições individuais, as condições facilitadoras e/ou inibidoras, as repostas, as mudanças e a (re)construção do quotidiano. A rede de suporte familiar e social e a intervenção profissional integrada e individualizada do enfermeiro revelaram-se elementos essenciais ao facilitarem algumas das condições de transição da pessoa para a situação de DP. Ao conhecermos e interpretarmos o fenómeno da realização de DP, tal como é vivido, procuramos contribuir para, uma melhor compreensão da complexidade deste período de vida, a prática profissional dos enfermeiros e, o desenvolvimento do conhecimento científico em enfermagem. Neste sentido são sugestões a criação e implementação de uma consulta de enfermagem pré-diálise que integre a pessoa e família no processo de DP e a formação de grupos terapêuticos que fomentem a partilha de experiências.

Palavras-chave: Diálise Peritoneal; experiência de vida; transições; cuidados de Enfermagem;

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ABSTRACT

Chronic Kidney disease has been increasing progressively in our country and about sixteen thousand people are on dialysis or transplanted. One of the therapeutics approaches is peritoneal dialysis (PD). In the process of starting dialysis the renal patient experiences new transitions (Meleis et al, 2000) related to the changes of his clinic condition, namely, the need to learn how to do dialysis at home. The nurses have a prime role in those changes by facilitating al this process. The main objective of this study is to understand the patient’s perspective when initiating the PD treatment. A qualitative phenomenological study was held. The information was collected by doing a semi-structured interview to twelve patients undergoing PD. The analysis of the data was done in according with Colaizzi methodology (1978) which was described by Streubert and Carpenter (2002). The main point for the understanding of these people’s experiences emerged from their declarations, that is, their personal dispositions, the facilitating or inhibiting conditions, the answers, their changes, and the (re)construction of their daily life. The family and social support network together with the personalized professional intervention of the nurse appear to be essential elements which ease some of the transitional conditions in a peritoneal dialysis situation. Understanding how patients perceive peritoneal dialysis treatment allow us to be aware of the complexity of this stage in live, as well as contribute professionally to the development of scientific knowledge in nursing. Therefore the implementation of a predialysis nursing consultation to integrate the patient and family in the PD process would be advisable. Furthermore creating therapeutic groups to share experience and developing training programs for people in PD would also bring great advantages.

Key-words: Peritoneal Dialysis; life change events; transitions; nursing care

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SUMÁRIO Pág. INTRODUÇÃO..

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ESTRUTURA DA INVESTIGAÇÃO

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PROBLEMÁTICA E CONCEITOS CENTRAIS NA PESQUISA. 15 OBJECTIVOS E QUESTÃO DE INVESTIGAÇÃO.......... 24 CAPITULO 1 – ENQUADRAMENTO METODOLÓGICO.

27

1.1 - METODOLOGIA DA INVESTIGAÇÃO.

29

1.2 – QUESTÕES E OBJECTIVOS DO ESTUDO..

32

1.3 – PARTICIPANTES NA PESQUISA

34

1.4 - PROCEDIMENTOS E TÉCNICAS NA COLHEITA DE DADOS... 36 1.5 – ANÁLISE DOS DADOS..

40

1.6 – CONSIDERAÇÕES FORMAIS E ÉTICAS..

43

CAPITULO 2 – APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS...

47

2.1 – CARACTERIZAÇÃO DOS PARTICIPANTES...

49

2.2 – “SE TIVER QUE FAZER TENHO DE FAZER.”.

51

2.2.1 – Disposições Individuais para o início da diálise peritoneal...

52

2.3 – “CRIÁMOS ALGUM DRAMA À VOLTA DISTO”. 58 2.3.1 – Condições facilitadoras e/ou inibidoras da experiência de diálise peritoneal.

58

2.4 – “SINTO QUE ISTO CANSA MUITO”...

69

2.4.1 – Respostas à experiência de diálise peritoneal..

69

2.5 - “FAZER AS TROCAS À HORA CERTA”..

86

2.5.1 – Mudanças experienciadas na realização da diálise peritoneal 

86

2.6 – “FAZER UM PROGRAMA DE VIDA, ORGANIZAR O TEMPO”..

94

2.6.1 – (Re) construção do quotidiano... 94 2.7 - “O APOIO, A DEDICAÇÃO, A MANEIRA COMO ME EXPLICARAM”

98

2.7.1 – O Cuidar de Enfermagem no processo de transição da pessoa em diálise peritoneal

98

CAPITULO 3 – VIVÊNCIAS DA PESSOA EM DIÁLISE PERITONEAL: UM PROCESSO DE TRANSIÇÃO COMPLEXO E DE COMPROMISSO. 107 CONCLUSÕES.

119

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.

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APÊNDICES Apêndice 1 – Guião de Entrevista Apêndice 2 – Consentimento Informado Apêndice 3 – Entrevista transcrita viii

Apêndice 4 – Entrevista sublinhada Apêndice 5 – Análise de Conteúdo Apêndice 6 – Estrutura do fenómeno Apêndice 7 – Pedido à instituição hospitalar Apêndice 8 – Símbolos ANEXOS Anexo 1 – Estrutura adaptada da Teoria da transição (Meleis et al., 2000) Anexo 2 – Deferimento da unidade hospitalar

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LISTA DE FIGURAS Pág. Figura 1 - Esquema da análise de conteúdo segundo a técnica de Colaizzi

41

(1978) Figura 2 - Disposições individuais para o inicio da diálise peritoneal

53

Figura 3 - Condições facilitadoras e/ou inibidoras da experiência de DP

59

Figura 4 - Respostas à experiência de Diálise Peritoneal

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Figura 5 - Mudanças experienciadas pela pessoa em DP

87

Figura 6 - (Re) Construção do quotidiano

95

Figura 7 - O cuidar de enfermagem no processo de transição da pessoa em

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diálise peritoneal Figura 8 - Estrutura do fenómeno da vivência da pessoa IRCT em DP

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ÍNDICE DE GRÁFICOS

Pág. Gráfico n.º 1 Gráfico nº. 2

Distribuição dos participantes por género

49

Distribuição da idade e do tempo em diálise

50

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INTRODUÇÃ ÇÃO

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A (Re)construção da mudança: Viver em Diálise Peritoneal

INTRODUÇÃO

A Diálise Peritoneal (DP) integra as intervenções terapêuticas de tratamento da doença renal crónica terminal. A sua expressão em Portugal tem vindo a aumentar e, segundo dados da Sociedade Portuguesa de Nefrologia, em 2010 encontravam-se em tratamento 660 pessoas. Em todo o mundo o aumento da doença renal crónica é uma realidade largamente documentada. Portugal segundo Macário et al., (2010) dados de 2009, estima-se que 10% da população sofra desta patologia, e 16 mil pessoas estejam a necessitar de uma terapêutica de substituição da função renal. De entre as terapêuticas, o número de pessoas em DP é menor quando comparado com as outras formas de tratamento. Enquanto Enfermeira a desempenhar funções no serviço de Nefrologia/Diálise interessada em desenvolver o conhecimento científico em Enfermagem nos processos que envolvem a pessoa, a doença crónica e o seu tratamento levaram ao desenvolvimento de um projecto de investigação sobre a temática da pessoa em diálise peritoneal. A escolha da investigação nesta área específica assumiu importância pelos motivos de organização, responsabilidade e coordenação de um programa de diálise peritoneal no quotidiano de trabalho na instituição hospitalar. Por seu lado, estas responsabilidades acrescidas possibilitaram um maior contacto com as pessoas em diálise peritoneal, traduzindo-se numa posição privilegiada para a implementação das acções de enfermagem.

A formação para a prática especializada obtida através da frequência do Curso de Pós-Licenciatura de Especialização de Enfermagem Médico-Cirúrgica possibilitou o aperfeiçoamento do projecto de investigação, através do conhecimento das metodologias de investigação necessárias para a sua concretização. A transição para o Curso de Mestrado em Enfermagem Médico-Cirúrgica facultou a implementação do projecto e a elaboração do presente relatório de investigação. A escolha da investigação qualitativa com abordagem fenomenológica centrou-se no objecto de estudo, as experiências vividas das pessoas em diálise peritoneal. Além disso, foi nosso objectivo compreender e interpretar o fenómeno, tal como nos foi apresentado,

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A (Re)construção da mudança: Viver em Diálise Peritoneal

ou seja, compreender as vivências das pessoas no seu quotidiano em relação ao período de início da diálise peritoneal.

ESTRUTURA DA INVESTIGAÇÃO O desenvolvimento do trabalho teve em consideração alguns conceitos centrais e a sua estrutura é composta por três capítulos. Na introdução é abordada a problemática em estudo: a doença renal crónica caracterizada pelas orientações internacionais e fundamentada na sua incidência e prevalência através do registo nacional da Sociedade Portuguesa de Nefrologia; a pessoa insuficiente renal crónica terminal (IRCT) em processo de transição para o início da diálise peritoneal integrada no conceito desenvolvido por Meleis et al., (2000); a justificação e finalidade do estudo com referência à questão de investigação. A nossa opção por apresentar os principais conceitos a partir da literatura no início do estudo baseou-se nas orientações de Creswel (2007, p.46) que refere “(H)é apresentada pelos pesquisadores no início do estudo como uma estrutura orientadora. Em estudos baseados em teoria, estudos de caso e estudos fenomenológicos, a literatura desempenha um papel menor para estabelecer o cenário para o estudo”. No primeiro capítulo é descrito o enquadramento metodológico da investigação. As orientações para o desenvolvimento da pesquisa qualitativa com abordagem fenomenológica sustentaram-se nas premissas desenvolvidas por Streubert e Carpenter (2002); Polit, Beck e Hungler (2004) e Flick (2004). O capítulo integra no seu desenvolvimento os objectivos, as questões, os participantes, os procedimentos na recolha de dados, e as considerações éticas e formais contempladas na investigação. Na análise dos dados foi utilizada a metodologia desenvolvida por Colaizzi (1978) e descrita por Streubert e Carpenter (2002). No segundo capítulo do trabalho são apresentados os resultados da investigação. Para o enriquecimento dos mesmos, foi utilizada a proposta de apresentação das “perspectivas descritas pelos sujeitos” defendida por Bogdan e Biklen (1994, p.223) e Flick (2004) proporcionando ao leitor o envolvimento necessário para a apreensão dos objectivos da investigação. Assim, as expressões “Se tiver que fazer tenho de fazer”; “Criámos algum drama à volta disto”; “Sinto que isto cansa muito”; “Fazer as trocas à hora certa”, “Fazer um programa de vida” e “O apoio, a dedicação, a maneira como me Página 14

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explicaram” espelham os temas que emergiram da análise respectivamente, as disposições para o início da diálise, as condições facilitadoras e/ou inibidoras do processo de realização do tratamento, as respostas experienciadas, as mudanças vivenciadas pelos participantes no seu quotidiano, a (re) construção dessa mesma mudança e o cuidar de enfermagem no processo de transição da pessoa em diálise peritoneal.

Por fim, no terceiro capítulo é realizada a discussão dos resultados. Os mesmos são confrontados com investigações na mesma área temática e em outros contextos de cuidados. Seguimos orientações defendidas por Creswell (2007, p.47) que considera que “a incorporação da literatura relacionada na secção final do estudo” é uma via recomendável quando é usada para “comparar e contrastar os resultados (ou temas ou categorias)” que emergiram do estudo. As limitações do estudo são descritas no último capítulo que denominámos também como conclusões onde também enumerámos algumas das implicações dos resultados obtidos para a enfermagem e para a nossa prática profissional enquanto enfermeira em exercício de funções junto de pessoas com doença renal crónica terminal em tratamento dialítico.

PROBLEMÁTICA E CONCEITOS CENTRAIS NA PESQUISA

Estudar e investigar pessoas é difícil e complexo, temos de nos saber transcender para conseguir entrar no domínio do outro, o que leva a que se procurem metodologias de pesquisa mais construtivistas e interpretativas possibilitando uma maior compreensão dos fenómenos. No entanto, na investigação qualitativa é defendido que o investigador realize uma fundamentação teórica aprofundada sobre o tema após a análise do conteúdo. Streubert (2002) defende que na investigação qualitativa o investigador deve estudar o fenómeno tal como ele se apresenta para não estabelecer noções pré-concebidas. O problema coloca-se quando o investigador conhece os participantes e estes são alvo das suas acções. Logo, é importante que o investigador estude os fenómenos tal como são vividos pelos participantes não invalidando o rigor que é preconizado pelo método fenomenológico. Loureiro (2006) diz-nos que a resposta a esta problemática é defendida com a realização apenas de um enquadramento contextual de como se definem e se relacionam os fenómenos e que os preconceitos e crenças que o Página 15

A (Re)construção da mudança: Viver em Diálise Peritoneal

investigador tem sobre o fenómeno sejam usados no processo de construção do método de colheita de dados. Assim, tendo por base estes saberes é abordada a problemática em estudo e os conceitos centrais utilizados na investigação.

A afirmação da enfermagem como disciplina científica necessita que os enfermeiros se interessem pela investigação do seu dia-a-dia. Benner (2005, p.18) diz-nos que “compreender o cuidar como uma prática, em vez de ser apenas um puro sentimento ou um conjunto de atitudes que estão para além da prática, revela o conhecimento e a competência que o cuidado excelente requer”. Para Apóstolo e Gameiro (2005, p.30) “uma disciplina para ser considerada científica tem que desenvolver conhecimento teórico”. Os autores referem que o objecto de estudo da ciência de enfermagem deverá situar-se nas respostas humanas e na sua experiência vivida devendo para tal utilizar os métodos mais adequados para o seu estudo, demonstrando-nos as diferenças das metodologias nos paradigmas positivistas e construtivistas. Abordando o metaparadigma da disciplina de enfermagem, ela inclui os conceitos de pessoa, ambiente, saúde e enfermagem (Abreu, 2011). Assim, e como os sistemas de saúde, as pessoas e o mundo estão em constante mudança, as respostas decorrentes dessa mutação devem ser alvo de pesquisa, porque ao estudar procuramos compreender, ao fazê-lo contribuímos com conhecimento para a profissão e para a ciência de enfermagem.

A Doença Renal Crónica A incidência e prevalência de doenças crónicas nas sociedades modernas é uma realidade e uma preocupação crescente dos sistemas de saúde, pelo seu carácter longo e progressivo, de necessitarem de elevados cuidados de saúde aumentado de forma proporcional os custos seja para as instituições como para o indivíduo e sua família. Healy e Monahan (2010) falam-nos que a prevenção e o tratamento de doenças crónicas são hoje grandes desafios com que os sistemas de saúde se deparam.

Há consciência de um aumento das necessidades não satisfeitas entre pessoas com problemas de saúde prolongados. Os indivíduos têm necessidades que vão para além das estritamente médicas. Os seus problemas exigem o uso de múltiplas fontes de ajuda e cuidados, uma vez que as capacidades de coping das pessoas com doenças Página 16

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crónicas são frequentemente reduzidas, devido à idade avançada, compromissos de funcionamento, incapacidades graves, e recursos pessoais, sociais e financeiros limitados. De acordo com Healy e Monahan (2010, p.140) “a doença crónica não é uma entidade em si própria”, mas um termo abrangente que inclui doenças prolongadas, que estão com frequência associadas a um determinado grau de incapacidade. Cada doença crónica é única e tem um impacto diferente na pessoa, família e comunidade, há um núcleo comum de problemas e complicações que o enfermeiro tem de compreender para cuidar de modo competente da pessoa com doença crónica. Nas várias funcionalidades do organismo, o sistema renal encarrega-se de controlar e regular a sua homeostasia, pela regulação do volume e da osmolalidade dos fluidos corporais, do balanço hidroeletrolítico, do equilíbrio ácido-base, pela excreção dos produtos tóxicos resultante do metabolismo proteico, pela regulação hormonal através da produção de renina e a eritropoietina e síntese da vitamina D (Thomé,1999; Weigel, Potter e Green, 2010).

Na doença renal crónica (DRC) existe uma falência progressiva das funções excretora, reguladora e hormonal do rim. A deterioração renal pode ocorrer durante muitos meses ou anos, resultando numa perda gradual de nefrónios, podendo manter-se assintomática durante um longo período de tempo. O dano causado pela DRC é irreversível e, a não ser que a pessoa seja adequadamente referenciada nos estádios mais precoces da doença, esta evolui para uma situação terminal sendo necessário a pessoa realizar uma técnica de substituição da função renal (TSFR) (Mahon e Jenkins, 2007).

O aumento da doença renal é transversal a todas as sociedades mundiais. A crescente preocupação na sua detecção precoce juntou entidades internacionais para a elaboração das K/DOQI (2002) (Kidney Disease Outcomes Quality Initiative). As international guidelines 1 caracterizam a DRC em 5 estádios, e a partir do estádio 4 recomendam que se inicie a preparação da pessoa para a TSFR. Este estádio é traduzido por uma severa diminuição da taxa de filtração glomerular (TFG) e o último é definido pela falência renal em que a sobrevivência da pessoa está dependente de uma técnica de substituição renal.

1

International guidelines – Orientações internacionais (tradução nossa)

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A (Re)construção da mudança: Viver em Diálise Peritoneal

As recomendações das K/DOQI (2002) no tratamento da DRC incluem a terapêutica específica de acordo com o diagnóstico, a avaliação e tratamento das comorbilidades, a prevenção da perda da função renal, da doença cardiovascular e das complicações provenientes da diminuição da TFG. Fornecem orientações para a preparação da pessoa para uma terapêutica substitutiva da função renal indicando quando se deve iniciar o tratamento, isto é, quando se tornam evidentes os sinais e sintomas de urémia. Destacando-se entre estas as náuseas, vómitos, prurido, podendo também surgir edemas, hipertensão e anemia (Healy e Monahan, 2010). A detecção precoce da doença renal crónica é fundamental para a possibilidade de poder actuar no avanço da doença e reduzir as suas complicações. O aumento da incidência é multifactorial e, em parte, está associado ao envelhecimento da população. As etiologias mais frequentes são segundo Mahon e Jenkins (2007) e Vinhas (2010) a diabetes mellitus, a hipertensão arterial, a doença poliquística de causa hereditária e as glomerulopatias de causa imune (ex: lúpus).

De acordo com Arduan e Riviera (2006, p.51) “o tratamento de substituição da função renal no contexto da insuficiência renal crónica em estado avançado engloba a diálise peritoneal, a hemodiálise e o transplante renal”.

As terapêuticas de substituição da função renal A Sociedade Portuguesa de Nefrologia analisa anualmente os dados das unidades de nefrologia, diálise e transplantação renal nacionais em relação à incidência, prevalência, etiologia, taxa de mortalidade e outros indicadores de mortalidade e comorbilidade da insuficiência renal. A mesma entidade refere que no ano de 2010 iniciaram em Portugal, 2312 pessoas hemodiálise, 190 diálise peritoneal e entre os que foram transplantados 17 foram submetidos a esta cirurgia antes de iniciarem diálise (Macário et al., 2011). As pessoas com insuficiência renal crónica terminal (IRCT) em que se prevê a possibilidade de iniciarem diálise têm o direito de receber informação sobre a sua doença e os diversos tratamentos que existem para que, e de acordo com Santos (2011), as suas características clínicas, sociais e psicológicas possam participar conjuntamente com a equipa na escolha da sua modalidade terapêutica. Refere também que os programas de tratamento de substituição da função renal devem ser

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A (Re)construção da mudança: Viver em Diálise Peritoneal

integrados, ou seja, devem ser incluídas as diversas técnicas de diálise, potencializando o transplante renal se a pessoa for uma candidata. A relação entre as diversas técnicas é fundamental para um equilíbrio positivo em benefício da pessoa. Os objectivos do programa de tratamento integrado de substituição da função renal passam pelo planeamento antecipado, para melhorar a adesão da pessoa ao programa, reduzir os níveis de ansiedade e melhorar a adaptação à doença e ao tratamento, melhorar a qualidade do processo formativo e fornecer conhecimentos que permitam a opção pelo tipo de diálise que melhor se adapte à sua vida quotidiana. O conceito de cuidados integrados no âmbito do tratamento do doente renal crónico terminal defende uma abordagem com ênfase na referência precoce, nos cuidados e educação pré-diálise. Segundo Rodrigues (2010, p.31), “A diálise é para a vida. Mas é um tratamento. Pode ter complicações. É possível que possa ter que mudar de tratamento durante o curso da sua vida. O desejável é que possa ser transplantado, preferencialmente com um rim de dador vivo. Pode ter que interromper a diálise peritoneal e nessa altura colherá benefícios da hemodiálise. Todas estas formas de substituição renal são permutáveis entre si. Em qualquer situação o plano será tratá-lo o melhor possível com cada uma das modalidades”.

A pessoa Insuficiente Renal Crónica em processo de transição para o início da Diálise Peritoneal A necessidade de informar as pessoas das vantagens e desvantagens de cada técnica e quais os benefícios e prejuízos que cada uma detém, permite que a escolha seja realizada de forma consciente. O Conselho Internacional de Enfermeiros vem por sua vez corroborar esta ideia, referindo que a essência do Modelo de Cuidados na Doença Crónica consiste na interacção entre uma pessoa informada, participante e uma equipa de profissionais preparada e proactiva (Ordem dos Enfermeiros, 2010), o que pressupõe competências que lhes permitam capacitar as pessoas da informação necessária antes do início do seu tratamento. Na tomada de decisão sobre o tratamento são equacionadas a opção da pessoa depois de informada sobre as técnicas mas também o seu estado físico, psicológico, social, profissional e familiar. Na opinião de Auer (2008, p.80) a fase pré-diálise é importante para o ajustamento psicológico que as pessoas necessitam para o seu início, refere que “os doentes que têm tempo para se adaptar à perspectiva de que a diálise e/ou transplante serão Página 19

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necessários ajustam-se melhor ao tratamento”. É destacado o benefício deste período de espera, como o tempo necessário para preparar a pessoa para a transição da IRCT para o início da diálise. A constituição de grupos de pessoas em pré-diálise facilita a compreensão das opções de tratamento. As pessoas que se sentem mais capacitadas demonstram-se menos dependentes e indefesas. De acordo com Auer (2008, p.84) “a adesão cega a regimes limitantes é provavelmente responsável por mais problemas e infelicidades”. A diálise peritoneal apresenta para a pessoa vantagens como a conservação da função renal residual, maior liberdade na organização do tempo pessoal, menor restrição dietética e preservação do “capital vascular”. No entanto, a execução rigorosa da técnica, as regras rígidas de higiene e as restrições impostas pelo tempo e frequência dos tratamentos são razões consideradas desvantajosas para a decisão final ( Arduan e Riviera, 2006; Weigel, Potter e Green, 2010; Rodrigues, 2010).

Auer (2008, p.86) fala-nos também no impacto psicológico que a técnica de substituição da função renal desperta na pessoa, referindo que a “criação de um acesso é uma experiência desfigurante para os doentes”. A mesma autora reconhece que as pessoas que iniciam diálise também elas experienciam respostas semelhantes às de luto, identificando no processo três fases, as quais podem sofrer na opinião da autora “flutuações” ou mesmo “sobreposições”, denominadas como a da “euforia”, da “reacção depressiva” e a “adaptação realista”. Na opinião de Hurst e Thomas (2008), a criação do acesso na diálise peritoneal pode ser considerado como um factor de opção pelo tratamento. A presença de um cateter na zona abdominal provoca uma alteração de imagem, para a qual a pessoa pode não estar preparada. A oferta de informação ou a demonstração através de meios audiovisuais podem ser úteis para desmistificar e diminuir a ansiedade da presença de um corpo estranho, o qual será alvo de cuidados diários. Actualmente existem duas grandes modalidades de diálise peritoneal. A diálise peritoneal continua ambulatória (DPCA), a chamada diálise peritoneal manual e a diálise peritoneal automática (DPA) que como o próprio nome refere é realizada com a ajuda de um mecanismo automático, a cicladora. Os objectivos da diálise peritoneal são a promoção da vida, diminuir os sintomas de urémia, manter as pessoas em Página 20

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equilíbrio hidroelectrolítico e potenciar ao máximo a sua qualidade de vida (Wild, 2008). A divulgação e a constante informação das opções terapêuticas numa fase precoce da doença levaram a que houvesse um aumento do número de pessoas em DP, embora ainda pouco significativo quando comparado com a hemodiálise. No entanto, o número crescente de pessoas na técnica despertou os profissionais para a investigação não só das taxas de infecção, mortalidade ou falência da técnica, mas para a investigação da sua prática clínica de cuidados, ou seja, para a pesquisa das vivências da pessoa neste tipo de tratamento. A diálise peritoneal atribui à pessoa uma nova realidade e rotina diária de vida. Restringindo e impondo limites, a necessidade de realização do tratamento implica muitas vezes a percepção de perda da liberdade. Barros (2010) refere que as doenças tornam-se um obstáculo na vida de quem está enfermo, e a condição sócio-cultural irá contribuir para a forma como as doenças são interpretadas. Na questão das doenças renais crónicas, o autor diz-nos que, “Há um oposto claro entre bem-estar e mal-estar, pois os doentes renais crónicos em muitos casos descobrem a doença nos rins quando estes estão em estágio de alerta, precisando de tratamento rigorosos; provocando uma mudança no seu ciclo social, as quais podem sinalizar perdas nos estudos, na profissão, limitando algumas actividades e provocando mudanças nas atribuições familiares” (Barros, 2010, p.2). Assim, verifica-se que as pessoas experienciam vivências de sofrimento numa questão de adaptação à doença e ao tratamento, que são reflectidas em todas as suas relações sociais, absorvendo a doença como uma condição fixa a qual exige uma modificação nas condições até então vividas. É fácil perceber que cada um entende e significa a sua experiência com a doença de forma diferente. No entanto, um ponto comum a todos, é que a doença renal crónica traz uma nova forma de encarar o quotidiano, transformando e (re) significando as formas de pensar a saúde e a doença fazendo emergir novas concepções. A pessoa no seu trajecto de doença e início de DP passará por vários processos de mudança e transições. São processos que a acompanham na mudança de um estado de saúde para outro, ou em qualquer momento da sua vida. Previsíveis como o casamento, nascimento de um filho, ou inesperadas como a doença ou a morte.

Página 21

A (Re)construção da mudança: Viver em Diálise Peritoneal

Enquanto conceito confere um sentido ou um conjunto de sentidos ao trajecto de vida, sendo os processos de desenvolvimento da pessoa e o seu decurso de vida, ao qual estão associadas experiências de saúde e de doença potenciais situações de transição pelas mudanças que suscitam nas pessoas e no meio que as rodeia, requerendo processos de adaptação e de coping (Petronilho, 2007; Abreu, 2011). O conceito de transição foi descrito por Meleis e seus colaboradores (1991;1994;2000 e 2010) referindo que este corresponde a ambos os processos e resultados de uma complexa interacção entre pessoa-ambiente. Alertam para o facto de que a enfermagem dever-se-á preocupar com os processos e as experiências das pessoas que passam por processos de transição. Os estudos desenvolvidos facultaram-nos uma estrutura (teoria formal de médio alcance) (Anexo 1) a qual permite sistematizar, descrever, compreender, interpretar e explicar fenómenos específicos da enfermagem que emergem da prática (Meleis et al., 2000). Assim, o processo de transição pode referir-se ao processo em si ou aos resultados numa interacção entre a pessoa e o ambiente que a rodeia. Pode encontrar-se transição na mudança do estado de saúde, no papel social, nas expectativas ou nas capacidades. O início da diálise peritoneal comporta um conjunto de experiências e respostas na pessoa que lhes confere mudanças e importantes adaptações a um novo projecto de vida. De acordo com o pressuposto que as pessoas em início de DP experienciam uma situação de transição, a teoria desenvolvida por Meleis et al., (2000) surgiu-nos como o modelo teórico de referência para a compreensão do processo de transição da pessoa insuficiente renal crónica no período inicial do tratamento. Na elaboração da teoria da transição Schumacher e Meleis (1994) identificaram tipos e padrões de transição. Para os autores são tipos de transições: de desenvolvimento, situacionais e de saúde/doença. Como padrões, referem que as transições poderão ser únicas, múltiplas, sequenciais, simultâneas, relacionais ou não-relacionais. Podem ser complexas e multidimensionais, e apresentam diversas propriedades e características. Como propriedades, as transições podem apresentar as dimensões de consciencialização,

investimento,

mudança

e

diferença,

temporalidade

e

acontecimentos ou momentos críticos. O modo como se operam é influenciado por factores como, os significados, as expectativas, o nível de conhecimento e capacidades, o ambiente, o nível de planeamento e o bem-estar físico e emocional (Meleis et al., 2000; Abreu, 2011). Página 22

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O modelo teórico de transição descrito é uma ferramenta essencial na compreensão de fenómenos que envolvam pessoas em processos de transição. A pessoa insuficiente renal crónica que na sua vivência de doença crónica já compreende mudanças no seu estado de saúde, necessita agora no período que antecede o início de DP e da própria experiência do tratamento, de integrar na sua vida as mudanças desenvolvimentais de carácter complexo e de padrões múltiplos de relações com o meio que o rodeia, condicionado por factores como os da própria pessoa, da comunidade e sociedade. As respostas que ocorrem do processo de mudança requerem que a pessoa desenvolva estratégias de adaptação exigindo por vezes que as próprias se submetam a uma redefinição de uma nova identidade completando o seu processo de transição. Para que este seja estável e sereno é essencial que os enfermeiros estejam dotados de competências que lhes permita cuidar de pessoas nestes períodos de mudança e que estejam dispostos a estudar mais profundamente os fenómenos e as respostas decorrentes desse processo.

O início da diálise e o realizar do tratamento no domicilio pressupõe escolhas, mudanças e experiências reflectindo-se no modo como a pessoa vivencia o seu quotidiano. As manifestações que são atribuídas a essas vivências, são o objecto do estudo que nos propomos a realizar, com o objectivo de compreender como a pessoa vivencia o fenómeno de realização de diálise peritoneal. Os estudos de fenómenos que compreendem transições revelam-se importantes, pois como refere VanStaa (2010) as pessoas que experienciam complexas transições requerem suaves mudanças, suporte adequado e profissionais dedicados. A complexidade que integra o processo de vivência saúde/doença (transição), torna fundamental a elaboração de estudos científicos que permitam explicar e descrever essa complexidade, tornando-a mais compreensível. É escassa a literatura que nos fale especificamente da transição de um doente na fase pré-diálise para o início da diálise e realização do seu tratamento. Mas a prática diznos que se trata de um grupo particularmente vulnerável, exigente, com grandes carências de apoio, pois a não-adesão a dietas, medicação ou tratamentos, de acordo com Bell (2007) pode levar a lesões irreversíveis no seu estado de saúde ou mesmo provocar a morte.

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A necessidade da detecção precoce da doença assume aqui um aspecto fundamental, porque permite que haja um planeamento e o processo de transição poderá ocorrer de forma mais tranquila. Segundo Fluck (2008) uma transição suave com uma prévia preparação e planeamento está associada a melhores resultados a curto e a longo prazo. Para Hutchinson (2005) ajudar a pessoa a lidar com essas mudanças e desafios é essencial para que este reconheça a sua qualidade de vida como um objectivo. Apesar das técnicas permitirem maior sobrevida, estas não conferem à pessoa a sua condição inicial de saúde. Assim, cada transição pode representar uma ameaça ao tratamento, tornando-se premente que os enfermeiros estudem os seus processos e assim possam intervir contribuindo para um amento da adesão terapêutica. Para Schumacher e Meleis (1994) o papel mais relevante do profissional de enfermagem é o de assistir pessoas em processos de transição, ou seja, os enfermeiros têm aqui o seu objectivo de cuidados, ao contribuírem como facilitadores nos processos de transição vivenciados pelas pessoas. As intervenções dos enfermeiros na opinião de Bell (2007) devem incidir num programa educativo que permita que a pessoa desenvolva capacidades no auto-cuidado, na comunicação, na tomada de decisões maximizando assim a sua capacidade funcional ao longo da sua vida. Para Wild (2008) os enfermeiros devem estar cientes de que quando se ensina, todos os objectivos de aprendizagem devem ser centrados na pessoa, determinando um programa de formação que inclua o funcionamento da DP, a medicação, as funções do rim, os procedimentos nas técnicas de DPCA e DPA, os cuidados com o cateter e local de inserção, dieta, infecções, fertilidade e sexualidade, trabalho, balanço hídrico, exercício físico e férias.

A descrição dos conceitos centrais da pesquisa com enfoque na pessoa com doença renal crónica e o seu processo de transição para o início da diálise peritoneal permitem uma orientação ao investigador na definição da questão e objectivos da investigação. OBJECTIVOS E QUESTÃO DE INVESTIGAÇÃO Este trabalho tem como objectivos apresentar de forma descritiva e interpretativa os dados obtidos da aplicação dos métodos de investigação científica ao estudo do fenómeno. Pretende contribuir para o desenvolvimento da disciplina científica de Página 24

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enfermagem através da aplicabilidade dos resultados na prática diária e influenciar outros profissionais de enfermagem a desenvolver investigação em enfermagem. Estamos perante um estudo qualitativo de abordagem fenomenológica. Como finalidade pretende, explorar o fenómeno das vivências da pessoa em diálise peritoneal. Ao investigar significados e vivências com o objectivo de interpretar os seus conceitos, entramos no campo da pesquisa qualitativa, pois como refere Flick (2004, p.21) aqui não reduzimos os dados a variáveis, estes são “estudados em sua complexidade e totalidade no seu contexto diário”. A abordagem é fenomenológica, porque e de acordo com Loureiro (2006) na investigação qualitativa dispomos de várias abordagens metodológicas para a pesquisa e compreensão do objecto de estudo, sendo fundamental que se adeqúe o método à problemática em estudo. O autor refere que “em determinado tipo de problemáticas, apenas a abordagem qualitativa ou mesmo a fenomenologia deve ser usada” sendo para isso importante a definição concreta do objecto de estudo.

A pesquisa qualitativa surge como uma “alternativa à pesquisa quantitativa”. Há necessidade de compreender e descrever as experiências sentidas pelas pessoas, conhecer o mundo que as rodeia e como vivenciam as mudanças no seu dia-a-dia. Evidenciam o “conhecimento estético” como sendo a arte de enfermagem, referindo ainda que a investigação qualitativa “apela mais ao reconhecimento dos padrões de um fenómeno do que à explicação de factos controlados e generalizados” (Streubert, 2002, p.5). De acordo com a natureza do problema o qual está relacionado com as vivências das pessoas, a opção recai no desenvolvimento de um estudo qualitativo de abordagem fenomenológica. A questão geral que envolve a problemática em estudo é: Quais as vivências da pessoa insuficiente renal crónica terminal no período inicial de tratamento por diálise peritoneal? Foi definido como objectivo geral: Compreender as vivências da pessoa insuficiente renal crónica terminal no período inicial de tratamento por diálise peritoneal. Para a concretização deste objectivo geral, definimos como objectivos específicos: •

Compreender que mudanças as pessoas integraram na sua vida quotidiana no período de transição para a diálise peritoneal; Página 25

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Perceber como foram vivenciadas as mudanças integradas na sua vida quotidiana no período de transição para a diálise peritoneal;



Compreender como foi percebida a intervenção do enfermeiro no processo formativo da pessoa no período de início do tratamento por diálise peritoneal;

A definição dos objectivos possibilitará a orientação da pesquisa de modo a desenvolver conceitos para ajudar a concretizar os mesmos. Considerámos que estes são os objectivos mais adequados para a interpretação e compreensão da pessoa e da sua experiência de realização de diálise peritoneal. A definição da questão e dos objectivos de investigação possibilitam a passagem à etapa seguinte, onde é apresentada e descrita a metodologia utilizada na compreensão do fenómeno em estudo.

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CAPÍTULO O 1 - ENQUADRAMENTO METODOLÓ LÓGICO

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CAPÍTULO 1 – ENQUADRAMENTO METODOLÓGICO

Neste capítulo procuramos descrever e fundamentar as opções tomadas ao longo do percurso da investigação relativamente aos métodos adoptados na colheita e análise dos dados tendo em linha de conta a natureza do problema em estudo.

1.1 - METODOLOGIA DA INVESTIGAÇÃO

A metodologia num trabalho de pesquisa é fundamental, esta fornece-nos as ferramentas necessárias e um conjunto de procedimentos que contribuem para a construção de conhecimento. Minayo (citado por Vilelas, 2009, p.17) define metodologia como “o caminho do pensamento e a prática exercida na abordagem da realidade”. Para Apóstolo e Gameiro (2005) o desenvolvimento de um processo de investigação que pretenda aceder ao significado da vivência da pessoa em determinados aspectos da sua saúde/doença ou do seu quotidiano não poderá ser assente numa lógica positivista, ou seja, a metodologia quantitativa poderá não ser a melhor abordagem quando se pretende compreender determinada experiência ou fenómeno. Sendo a enfermagem uma ciência com características das ciências humanas, é de certo modo necessário que haja um investimento por parte dos profissionais de enfermagem nas metodologias qualitativas. Referem que, as metodologias quantitativas dão os seus contributos na tentativa de “verificar a generalidade de um fenómeno”, através de métodos estatísticos explicam como ocorre determinado fenómeno. No entanto, centrando-se a ciência de enfermagem na “experiência humana de saúde e de doença” torna-se necessário que sejam utilizadas metodologias em que adeqúe o método ao objecto em estudo.

A investigação qualitativa tem algumas características que devem ser focadas. Os autores Bogdan e Biklen (1994), destacam cinco principais: o investigador como elemento fundamental da pesquisa; os dados são provenientes do ambiente natural da pesquisa; a investigação tende a ser descritiva, sendo que os seus investigadores têm mais interesse no desenvolver da pesquisa no que na obtenção de resultados; os Página 29

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dados obtidos são analisados de forma intuitiva e a atribuição do significado é de capital importância para o desenvolvimento da pesquisa qualitativa. De modo similar Fortin (1999) refere que, a utilização da investigação qualitativa como método de produção de conhecimento científico, permite descrever e interpretar um fenómeno mais do que avaliá-lo. Esclarece que o investigador preocupa-se com a compreensão absoluta e ampla do fenómeno, observando-o, descrevendo-o, interpretando-o e apreciando-o no seu modo natural como se apresenta sem o modificar.

O MÉTODO FENOMENOLÓGICO Merleau-Ponty (citado por Apóstolo e Gameiro, 2005, p.10) descreve que a fenomenologia procura “descrever a experiência tal como ela é vivida. É a busca das essências (H) Buscar a essência do mundo não é buscar aquilo que o mundo é em ideia, é antes buscar aquilo que de facto ele é para nós.” Para Fortin (1999, p.148), “o estudo fenomenológico visa compreender o fenómeno, para extrair a sua essência do ponto de vista daqueles ou daquelas que vivem ou viveram essa experiência”. O movimento fenomenológico surge no século XX, em 1960, com o filósofo Helbert Spiegelberg, que vem defender que se trata de uma filosofia em transformação e evolução. A sua evolução teve como contributos os pensamentos e estudos de grandes filósofos, onde se destaca a importância de Frank Bretano, Carl Strumf na fase preparatória da fenomenologia evolutiva. Edmund Husserl, o mentor da fase alemã, é considerado o fundador da fenomenologia como filosofia e ciência (Carpenter, 2002). A esta fase atribui-se o desenvolvimento de conceitos como a “essência” a “intuição” e a “redução fenomenológica”, importantes para a compreensão dos estudos que utilizam a fenomenologia como método. A contribuição de Marcel, Satre e Merleau-Ponty na qual defendiam a descrição da experiência humana como o fenómeno essencial, forneceu dados substanciais para a descrição da fase francesa (Carpenter, 2002).

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A estes filósofos deve-se a definição de fenomenologia, que é considerada, uma filosofia cuja meta é descrever o fenómeno através da experiência humana, tal qual ela é vivida no seu contexto real e influenciada quer por factores internos quer externos. Desta forma é necessário dar primazia ao pensamento em detrimento de crenças e preconceitos. O conceito de experiência vivida ou “vivência” remeto-nos para “o modo como alguém vive ou se comporta; existência; experiência de vida” (Dicionário da Língua Portuguesa, 2010). Por seu lado Forghieri (2004, p.48) refere que vivência “consiste na percepção que o ser humano tem de suas experiências, atribuindo-lhes significado que sempre possuem, com maior ou menor intensidade, algum sentimento de agrado ou desagrado”. Também Amaral (2004, p.69) refere que “vivência é aquela experiência viva mais distintamente humana, pois o seu conteúdo é formado pela actuação da totalidade de nossas forças psíquicas”. Para Barreta (2010, p.53) que explora o conceito de vivência em Freud e Husserl escreve que “Freud emprega o termo vivência para se referir a uma experiência directa e pessoal de alguma coisa, mas que é também determinante, significativa, na vida de uma pessoa”.

A abordagem fenomenológica na Enfermagem A pesquisa fenomenológica na enfermagem centra o seu objecto de estudo em fenómenos como saúde/doença, vida/morte, relações enfermeiro/doente. Os mesmos não podem ser compreendidos isolados da pessoa que os vive, mas sim na totalidade da sua existência e no meio onde se insere. A atenção dos investigadores incide sobre a realidade tal como é percebida pelos indivíduos. É preciso compreender o fenómeno tal como é interpretado no ser que o vivencia (Carpenter, 2002). Assim, o objectivo da abordagem fenomenológica centra-se em conhecer uma realidade do ponto de vista das pessoas que a vivem. Descrever o universo perceptual de quem vive uma experiência de interesse para a prática clínica, é o trabalho do investigador, que consiste em aproximar-se desta experiência, descrevê-la nas palavras dos participantes na investigação, explicitá-la da forma mais fiel e comunicá-la.

A Enfermagem precisa da contínua construção do seu conhecimento. A investigação de determinados incidentes, situações, comportamentos ou práticas constituem bons objectos de pesquisa possibilitando a evolução do saber, a produção de teorias, importantes no alicerce do exercício profissional.

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A área de Nefrologia compreende um amplo campo de situações de grande interesse para os enfermeiros. Envolve pessoas que no decurso da sua vida são confrontadas com a doença crónica, com a necessidade de tratamentos complexos e a adesão a regimes terapêuticos exigentes. Partilhamos assim, da ideia defendida por Abreu (2011, p.106) de que “ a investigação é o suporte de uma enfermagem mais avançada” reconhecendo ser necessário investigar estas áreas de intervenção dos enfermeiros de modo à obtenção de dados que possibilitem o desenvolvimento de guias orientadores das boas práticas de cuidados de enfermagem, baseados na evidência científica. A investigação em enfermagem tem de valorizar o saber da pessoa em relação aos seus processos de vida, a forma como percebem transições e as potenciais mudanças. A compreensão da forma como as pessoas adequam os seus comportamentos face às situações de saúde/doença e a análise das estratégias que utilizam para a sua adaptação, são segundo Abreu (2011) focos de atenção na investigação em enfermagem. A pessoa no início de DP vive processos de transição do tipo “experiências de doença” que a podem tornar vulnerável (Meleis et al., 2000). A abordagem fenomenológica é de acordo com o fenómeno em estudo, a metodologia adequada, assumindo um carácter descritivo e interpretativo (Carpenter, 2002). Os conceitos descritos e partilhados no cuidado às pessoas em DP, fizeram emergir as questões e os objectivos do estudo.

1.2 – QUESTÕES E OBJECTIVOS DO ESTUDO A problemática em estudo e a abordagem metodológica estão intimamente ligadas aos objectivos do estudo. Para Loureiro (2006, p.24), a adequação da abordagem fenomenológica à pesquisa deve responder afirmativamente à seguinte questão: “Pretende-se estudar a experiência vivida, o seu significado do ponto de vista daqueles que a vivem ou viveram?”

Na investigação é imprescindível definir o que se pretende pesquisar. Na opinião de Bogdan e Biklen (1994), as questões de investigação têm um papel fundamental, pois a sua definição permitirá orientar e ajudar a organizar a recolha de dados no decorrer da investigação.

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Para Polit, Beck e Hungler (2004), a questão de investigação declara a pergunta específica que o pesquisador deseja responder para abordar o tema em pesquisa. Talbot (citado por Fortin, 1999, p.101) refere que “as questões de investigação são as premissas sobre as quais se apoiam os resultados de investigação”. São enunciados interrogativos precisos, escritos no presente, e que incluem habitualmente uma ou duas variáveis assim como a população estudada. Numa abordagem qualitativa, Fortin (1999) refere que o investigador enuncia questões de carácter mais geral, com o objectivo de abordar mais a essência do fenómeno em estudo. Na pretensão de conhecer as experiências que a pessoa IRCT evidencia no seu processo de vivencia em DP, surge a questão geral de investigação. Quais as vivências da pessoa insuficiente renal crónica terminal no período inicial de tratamento por diálise peritoneal?

Como complemento da questão geral foram também equacionadas as seguintes questões específicas que apoiaram a elaboração do guião de entrevista. Interessava assim saber, quais as mudanças que as pessoas tiveram que integrar na sua vida quotidiana no período de transição para a diálise peritoneal e de que forma foram vivenciadas essas mudanças. No processo formativo, importava perceber como as pessoas

percepcionariam

os

cuidados

de

enfermagem.

As

respostas

são

fundamentais para a compreensão sobre o modo como estas conseguem conciliar o seu dia-a-dia, com a doença e tratamento. O objectivo de uma investigação é segundo Fortin (1999, p.100) ”um enunciado declarativo que precisa as variáveis-chave, a população alvo e a orientação da investigação”, podendo estes alcançar vários níveis de diferenciação, de acordo com o grau de avanço dos conhecimentos perante o trabalho de pesquisa. Objectivo é sinónimo de meta, de fim, assim ao definirmos objectivos estamos a escrever o que pretendemos alcançar com a investigação. Vilelas (2009, p. 77) referenos que “durante o planeamento da investigação é necessário definir dois níveis de objectivos, o geral e os específicos”. De certa forma o objectivo geral é delineado de modo a incidir sobre a essência do problema, expressando por vezes a ideia central do título do projecto de investigação.

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Assim e de acordo com este princípio, o objectivo geral delineado para esta investigação é: Compreender as vivências da pessoa insuficiente renal crónica terminal no período inicial de tratamento por diálise peritoneal.

Já os objectivos específicos são definidos visando a concretização do objectivo geral. Como características estes devem ser claros, limitados e precisos (Vilelas, 2009). Assim, são objectivos específicos desta investigação: •

Compreender as mudanças que as pessoas integraram na sua vida quotidiana no período de transição para a diálise peritoneal;



Perceber como vivenciam as mudanças integradas na sua vida quotidiana no período de transição para a diálise peritoneal;



Compreender como foi percebida a intervenção do enfermeiro no processo formativo da pessoa no período de início do tratamento por diálise peritoneal;

A definição dos objectivos irá orientar a pesquisa de modo a desenvolver conceitos para ajudar a concretizar os mesmos. Considerámos que estes são os objectivos mais adequados para a interpretação e compreensão da pessoa e da sua experiência de realização de DP.

1.3 – PARTICIPANTES NA PESQUISA A postura da abordagem fenomenológica na investigação científica requer uma procura de participantes que partilhem entre si a vivência do mesmo fenómeno. A sua compreensão requer que o investigador procure os dados junto das pessoas que vivenciam determinado facto, dado que os significados só são revelados pelas próprias que os experienciam.

A escolha dos participantes de acordo com Fortin (1999, p.149) “realiza-se por meio de critérios de selecção que assegurem uma relação íntima dos participantes com a experiência que se quer descrever e analisar”. Na opinião de Streubert (2002) considera que na investigação de cariz qualitativo a selecção dos informantes para a participação deve ter em consideração a sua experiência, cultura, interacção social ou o fenómeno de interesse.

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Já Polit, Beck e Hungler (2004, p. 243) referem que, os pesquisadores qualitativos usam o tema de investigação para seleccionar participantes articulados e reflexivos, que partilhem a mesma experiência, para que o pesquisador consiga orientar a sua decisão para a definição da amostra. Na sua opinião “os pesquisadores qualitativos usam mais frequentemente a amostragem teórica ou intencional” para obter da fonte de dados, os que são mais ricos e assim maximizarem a sua pesquisa.

Também Carpenter (2002) refere que a amostra intencional é a mais frequente, e a mais utilizada na pesquisa fenomenológica. Os participantes são seleccionados por partilharem a vivência de um mesmo fenómeno. De acordo com o tema da pesquisa, os objectivos e a questão de investigação, os participantes no estudo serão pessoas que experienciam o mesmo fenómeno, ou seja, realização de diálise peritoneal. O início de diálise é sempre um momento crítico, neste período as pessoas são preparadas para o início do tratamento. A preparação passa por conhecerem as técnicas de diálise e o seu funcionamento, a medicação, as dietas e as potenciais alterações físicas, psicológicas e sócio-culturais (Hurst e Thomas, 2008). Estes são factores que podem influenciar de forma negativa a percepção das pessoas em relação ao tratamento e de algum modo condicionar a sua capacidade para descrever os sentimentos e a forma como os vivenciaram. Assim, ponderámos seleccionar participantes que pertencessem ao programa de diálise peritoneal, após o seu regresso ao domicílio com mais de 6 meses de início de diálise. Do mesmo modo, considerámos como provável que a pessoa ao fim de algum tempo, já realize o seu tratamento sem dificuldade e que acabe por desvanecer da memória os sentimentos que experienciou no início, pelo que incluímos como participantes no estudo pessoas com menos de 24 meses de tratamento. A opção recaiu nas pessoas seguidas na unidade hospitalar onde a pesquisadora exerce a sua actividade profissional por esta fornecer os dados da população em DP que necessita para a realização da pesquisa, assim como pela maior facilidade de aceder às pessoas a investigar com um menor dispêndio de tempo e recursos. A amostra correspondeu assim, ao número de pessoas pertencentes ao programa de DP de uma unidade hospitalar da região centro, que realizassem o tratamento de DP e que preenchessem os requisitos dos critérios de inclusão que foram definidos para uma “limitação bem fundamentada da amostragem” de acordo com Flick (2004, p.79).

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A unidade tinha a 31 de Dezembro de 2010 no seu programa 29 pessoas que realizavam DP. Das 29 pessoas em programa, prevíamos inicialmente que a amostra não fosse além dos 15 participantes que correspondessem aos critérios de inclusão. Definimos como critérios de inclusão: ser uma pessoa IRCT que iniciou DP no serviço de diálise de um Hospital Central da região Centro do País; que tenha um tempo de diálise superior ou igual a 6 meses e inferior ou igual a 24 meses; que aceite participar no estudo dando o seu consentimento; que seja autónoma na realização da DP e que não evidencie perturbação emocional ou cognitiva no momento do pedido de participação. Foi elaborada uma lista de 15 participantes, os quais foram contactados previamente através de contacto telefónico para averiguação da disponibilidade para a participação na investigação. Na opinião de Carpenter (2002) este contacto prévio, permite preparar as pessoas para o encontro. Aos que aceitaram participar, foram-lhes programados dias para a recolha de dados coincidindo com a consulta de revisão mensal de diálise peritoneal. No total participaram 12 pessoas com insuficiência renal crónica em diálise peritoneal.

1.4 - PROCEDIMENTOS E TÉCNICAS NA COLHEITA DE DADOS O investigador é “o instrumento para a colheita de dados e deve funcionar eficazmente para facilitar essa tarefa” (Carpenter, 2002, p.66). No desenvolvimento da investigação o pesquisador deve estar ciente das suas qualidades de comunicação e ter a consciência da capacidade de desenvolver a colheita de dados junto dos participantes. De certa forma o investigador deve também reconhecer qual o melhor método para a obtenção dos dados que necessita. Segundo Flick (2004), o método de observação foi durante muito tempo o método de eleição de colheita de dados para a pesquisa qualitativa. Os investigadores recorrem actualmente a outros métodos, entre os quais a utilização da entrevista semiestruturada. Este interesse está relacionado com a probabilidade de as pessoas expressarem melhor as suas emoções, atitudes, sentimentos numa entrevista de carácter mais aberto, do que numa entrevista estruturada ou em questionário.

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Na opinião Carpenter (2002, p.67) a entrevista “permite entrar no mundo da outra pessoa e é uma excelente fonte de dados”. A realização da entrevista requer que o investigador tenha em atenção alguns aspectos, de modo a não manipular os dados que está a recolher. O investigador tem de ter a capacidade de proporcionar ao entrevistado um espaço onde este descreva as suas experiências e sentimentos sobre o tema em pesquisa. Este pressuposto levou a que fosse inicialmente conduzida uma entrevista tipo com a colaboração da orientadora, a qual despertou para a leitura de algumas estratégias mais frequentemente utilizadas na condução das entrevistas. No momento da primeira entrevista e nas seguintes foram obtidos previamente o consentimento informado e autorização para a gravação em áudio. A opção pelo registo áudio permitir-nos-ia tal como refere Carpenter (2002, p.67) “a completa concentração e a participação rigorosa no processo de entrevista aumentam o rigor, a confiança e a autenticidade dos dados”. Para a marcação da entrevista com antecedência foi realizado um contacto prévio onde eram informados os objectivos da investigação, que decorreu no serviço de diálise, num gabinete cedido para o efeito pela enfermeira-chefe. No tipo de entrevista, utilizámos a entrevista semi-estruturada, para a qual foi elaborado um guião com a definição de algumas questões orientadoras (Apêndice 1). De acordo com Flick (2004) a utilização de um guião de entrevista permite que o investigador direccione o entrevistado para o fenómeno relevante sem que para isso interrompa a entrevista. As entrevistas coincidiram com os dias da consulta de diálise peritoneal realizadas à quinta e sexta-feira. Seguindo as recomendações de Poupart (2008, p.230) que propõe, “a escolha do momento mais propício à entrevista (H) encontrar o lugar mais favorável ao adequado desenvolvimento da entrevista”. Durante as entrevistas a orientação foi restringida ao guião de entrevista para estabelecer uma relação dinâmica mas que ao mesmo tempo não enviesasse a recolha de dados. Esta questão poderá colocar-se sendo que neste caso o investigador também poderá ser referenciado, isto é, ao questionar sobre a importância do enfermeiro no processo formativo no início da diálise, poderá haver alguma relutância por parte do entrevistado em revelar o que efectivamente sente. Para Polit, Beck e Hungler (2004, p.252) a utilização do guião dá possibilidade à pessoa de exprimir tudo o que sente, sem haver dispersão dos objectivos propostos,

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garantindo “que todas as áreas das questões são cobertas”. A sua utilização e o rigor na sua aplicação poderão ajudar no sentido de não influenciar a recolha de dados. Segundo Guerra (2010, p.22) o assumir de uma postura metodológica qualitativa e estando perante entrevistado e entrevistador, ambos dão sentido à acção e, de forma aberta são definidos os objectivos dessa mesma interacção. A autora refere que “um pretende colher informações sobre percursos e modos de vida sobre os quais o outro é um informador privilegiado pelo fenómeno que viveu”. Na pesquisa das vivências da pessoa IRCT no período inicial de realização da DP, a utilização do guião de entrevista facilitará a orientação na condução da entrevista. Inicialmente este foi avaliado por um perito com experiência em diálise peritoneal, procedendo-se à reformulação de algumas questões. Do mesmo modo, após a realização da primeira entrevista analisámos as situações em que houve necessidade de reformular as questões e concluímos que poderíamos manter o guião dada a compreensão que o entrevistado tinha demonstrado.

As entrevistas decorreram no período de Fevereiro a Abril de 2011 com a realização inicial de 9 entrevistas. No entanto, tivemos necessidade de voltar ao campo de pesquisa para confirmação dos dados analisados, e em simultâneo englobaram-se mais 3 participantes. Não atingimos a amostra previamente definida de 15 participantes pois verificaram-se desistências do programa de DP, condições psicológicas desfavoráveis e o não enquadramento nos critérios de inclusão definidos. No entanto, os 12 participantes intencionalmente seleccionados reportaram nas suas entrevistas casos únicos com experiências de vida diferentes.

No período temporal em que decorreram as entrevistas analisaram-se os dados recolhidos de modo a identificar a riqueza e pertinência da informação obtida e a comprovação da mesma. Deste modo, conseguimos assim complementar as entrevistas seguintes com uma ou outra questão ou explicitação que não estivesse tão bem documentada naquelas que íamos analisando. Das 12 entrevistas realizadas e pela transcrição das primeiras 9, apercebemo-nos de que as restantes confirmavam os testemunhos recolhidos, isto é, à medida que realizámos a transcrição das entrevistas fomo-nos apercebendo que os últimos testemunhos repetiam o seu conteúdo, não acrescentando novos dados à investigação. Para Carpenter (2002, p.67) “a colheita de dados continua até o investigador acreditar que a saturação dos dados foi alcançada, Página 38

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isto é, quando não emergem novos temas ou essências dos participantes e os dados se repetem”. A saturação dos dados está intimamente ligada com a escolha da amostra. Morse (citado por Streubert, 2002, p.26) escreve que “a saturação refere-se à repetição de informação descoberta e confirmação de dados previamente recolhidos”, ou seja, mais do que a amostra ser um número específico de indivíduos para obter significado em alguma manipulação estatística, o investigador qualitativo procura a repetição e confirmação de dados previamente recolhidos. Na investigação fenomenológica quando o investigador reconhecer no decurso da investigação e na análise dos dados que já não obtém novos dados para a sua investigação atingiu a saturação, este conceito é para Loureiro (2006, p.26) “aquele momento em que os dados deixam de trazer coisas novas”. O processo da recolha de dados foi conduzido a partir da marcação prévia da entrevista com os participantes. No dia em que se deslocavam à consulta de DP, eralhes solicitada a participação na investigação através da explicação do trabalho expresso no consentimento informado (Apêndice 2). Após a sua leitura e aprovação da gravação da entrevista iniciava-se o processo num gabinete cedido para o efeito, que possibilitava um encontro livre de interrupções, isto é, como refere Poupart (2008, p.231) em que “os riscos de que os elementos externos venham a prejudicar o andamento da entrevista sejam menores”. O registo da entrevista foi através da utilização de um gravador digital o qual permite a transcrição real do que foi proferido pelo entrevistado. As entrevistas demoraram em média 30 minutos, com um tempo mínimo de 23 minutos e um tempo máximo de 43 minutos. A validação da informação pelos entrevistados decorreu entre os meses de Maio a Junho de 2011, ou seja, após a entrevista foi efectuada a transcrição para texto e este fornecido ao participante para validar a sua informação e dar oportunidade de acrescentar ou alterar a informação contida na entrevista (Apêndice 3). Na opinião de Carpenter (2002, p.68) os investigadores podem manusear o tratamento de dados de diferentes modos. O uso de técnicas abertas de entrevista, a gravação e a transcrição tipo verbatim vai aumentar o rigor. Expõem também que após a entrevista deverá ser ouvida a gravação e que “quando a colheita de dados começa, inicia-se igualmente a análise de dados”. Página 39

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1.5 – ANÁLISE DOS DADOS À medida que a experiência vivida se torna descrição de um fenómeno específico, o investigador assume responsabilidades específicas na transformação da informação (Carpenter, 2002). Deste modo pretende-se com a análise dos dados recolhidos a interpretação de como as pessoas experienciam o fenómeno em estudo. Assim, a análise dos dados procede das etapas de gravação, transcrição, leitura e releitura dos dados fornecidos pelos entrevistados, para que deste modo o investigador os interprete. A interpretação dos textos permite desenvolver a teoria e fundamentá-la, permitindo ao investigador a identificação das “declarações significantes”, os quais procederá à sua organização em “significados agregados” (Carpenter, 2002, p.65). A análise dos dados, para Bogdan e Biklen (1994, p.205) consiste no “processo de busca e organização sistemática de transcrições de entrevistas (H) com o objectivo de aumentar a sua própria compreensão desses mesmos materiais e de lhe permitir apresentar aos outros aquilo que encontrou”. Na investigação qualitativa a análise dos dados necessariamente deverá ocorrer em simultâneo com a sua recolha para possibilitar ao investigador a imersão no fenómeno em pesquisa (Carpenter, 2002). Para tal o investigador necessita de fazer leituras e releituras dos mesmos de modo a que cuidadosamente vá descobrindo os seus significados. Na opinião de Bogdan e Biklen (1994, p.205) para investigadores qualitativos inexperientes “a tarefa analítica, ou seja, a tarefa de interpretar e tornar compreensíveis os materiais recolhidos” poderá tornar-se monumental e penosa. Bogdan e Biklen (1994, p.206) lembram-nos que existem “muitos estilos diferentes de investigação qualitativa e uma variedade de maneiras de trabalhar e analisar os dados”. Para esta investigação considerámos a que foi proposta por Colaizzi (citado por Carpenter, 2002, p.57), a qual utiliza sete “etapas processuais” na abordagem fenomenológica dos seus trabalhos (Saunders, 2003). A técnica de Colaizzi formulada em 1978 supõe que as descrições das experiências vividas sejam obtidas através dos relatos dos mesmos por meio de entrevista. Na análise dos dados o autor defende que em sete etapas o investigador poderá descrever o fenómeno em estudo: 1º ler todos os relatos dos participantes, de forma a adquirir uma visão geral; 2º retornar a todas as entrevistas e extrair delas as declarações significativas relacionadas com o fenómeno em estudo; 3º a cada Página 40

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declaração significativ ificativa o pesquisador realiza uma formulação lação de significados; 4º depois de uma form formulação de significados, deverá existir tir um uma organização da formulação de signific ificados em significados agregados (clusters ters of themes)2; 5º faz uma descrição exaus exaustiva do fenómeno em investigação atra através dos resultados obtidos; 6º reduzz a de descrição exaustiva a uma estrutura essenci sencial que caracterize o fenómeno em pesquis esquisa; 7º a estrutura e os resultados obtidos idos d devem ser validados pelo retorno aoss part participantes e, em entrevista individual ou e em grupo validar os resultados obtidoss junt junto dos participantes (Carpenter, 2002; Saunders, Saund 2003). Para Flick (2004), ), “a interpretação de dados é o cerne da a pes pesquisa qualitativa.” A quantidade de texto xto q que dispomos após a transcrição das entrev entrevistas, são os dados que precisamos de ttrabalhar para extrair o significado dos os m mesmos, para assim conseguir explicarr o fe fenómeno que nos propusemos a investigar. tigar. Após as entrevistas transcritas e de acordo com os objectivos do trabalho para o estu estudo do fenómeno e a técnica descrita por Colaizzi Co em 1978 (Carpenter,2002; Saunders, ders,2003), identificaramse “declarações sign significativas” nas diferentes entrevistas, sendo-lhes se atribuídos “significados” (Apênd pêndice 4). Posteriormente organizámoss os “significados” em “significados agregado gados” e estes em “temas” (Apêndice 5), até à representação final como demonstra a figura figu seguinte.

Figura 1 – Esquem squema da análise de conteúdo segundo a técnica ica de Colaizzi (1978)

A origem dos temas reflecte as essências da experiência cia d dos participantes na realização do seu eu tra tratamento. O processo revelou-se demora morado e exigente pela inexperiência do inves investigador em investigação qualitativa, sendo necessário recorrer a várias entrevistass de orientação de forma a melhor organiz rganizar a descrição do fenómeno. Após a va validação inicial da análise de conteúdo, do, e de acordo com a proposta de Collaizi laizi (1 (1978) procedeu-se à elaboração da estrutur strutura do fenómeno que foi explicada e valida validada junto dos participantes individualmente lmente (Apêndice 6). Os resultados foram também tam discutidos através da apresentaçã ntação da estrutura do 2

clusters of themes – Significa ificados agregados (tradução nossa)

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fenómeno a uma pessoa com experiência em investigação qualitativa, quatro pessoas com experiência em diálise peritoneal e uma pessoa com experiência profissional no tratamento a pessoas com IRCT e em DP. A confiança na investigação qualitativa tem sido uma preocupação dos investigadores comprometidos com estes métodos, sendo o rigor nesta investigação para Carpenter (2002, p.70) “essencial para a prática de boa ciência”. Colaizzi (citado por Carpenter, 2002) defende que para assegurar a confiança na análise dos dados, os investigadores regressam a cada participante e perguntam se a descrição reflecte as suas experiências. Este foi o nosso procedimento pois no decurso do processo e após a transcrição das entrevistas, estas retornaram aos participantes que as leram e aprovaram com pequenas alterações que foram efectuadas ao conteúdo das mesmas. Seguiu-se depois desta leitura uma discussão sobre a experiência descrita e a evidência

nas

entrevistas

dessa

experiência

vivida,

confirmando-se

essa

particularidade. Loureiro (2006, p.26) refere que é necessário “saber até que ponto os achados são rigorosos e correspondem à realidade tal como ela é vivida (H)” Assim, é necessário que a elaboração de uma investigação atenda aos critérios de credibilidade, transferibilidade, dependência e confirmabilidade. O mesmo autor fala-nos que para o critério da credibilidade procura-se a “realidade tal como ela é vivida pelos participantes”. A utilização da entrevista como método permitiu obter a “história do outro” e à medida que vamos analisando os dados existe a possibilidade de identificar o momento que não serão necessários mais participantes pela repetição da informação. Na opinião de Streubert (2002, p. 33) “o rigor na investigação qualitativa é demonstrado através da atenção que o investigador dá à confirmação da informação descoberta”. No percurso desta investigação consideramos que a confirmação da sua credibilidade ocorreu através da transcrição rigorosa das entrevistas, seguida da possibilidade que os participantes tiveram de a lerem e realizarem as suas alterações. O contacto diário com os participantes e outros que partilham o mesmo fenómeno possibilitou confirmar a importância do estudo e os resultados iniciais. O critério de transferibilidade tem como objectivo apurar a sua aplicabilidade, nomeadamente para a enfermagem, ou seja, se os resultados do estudo possuem significado em outras situações em contextos semelhantes. Página 42

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No entanto Streubert (2002); Loureiro (2006) e Cabral (2010) referem que este critério é realizado pelos leitores da pesquisa e não pelos investigadores, referindo ainda que a função do investigador qualitativo não é fazer generalizações ou fornecer um índice de transferibilidade, mas sim conhecer e compreender o fenómeno em profundidade tal como é apresentado pelos participantes. Os critérios de dependência e confirmabilidade, também referenciados na bibliografia, para atestar o rigor da investigação qualitativa, referem-se ao método de investigação, preconizando que seja realizada uma descrição detalhada de todos os passos envolvidos e das decisões tomadas para que estas sejam seguidas por outros investigadores. Assim, a confirmabilidade diz respeito à objectividade dos resultados dos estudos, ou seja, “em que medida os achados do estudo são o produto do foco de investigação e não uma interpretação arbitrária e enviesada do próprio investigado” (Loureiro, 2006, p.30). A validação dos principais resultados pela orientadora da tese e por um perito na área da investigação qualitativa e tratamento em DP, permitiu auditar todo o processo de investigação.

A validação da estrutura do fenómeno foi realizada nos meses de Julho e Agosto de 2011 junto de participantes e de pessoas que não tendo sido participantes nesta investigação partilham o fenómeno da realização de DP. A opção de recorrer a outros participantes para a validação do fenómeno permitiu verificar se o mesmo era percebido como estrutura da sua vivência em DP. Este procedimento foi realizado individualmente, ou seja, através de uma conversa informal com os participantes, aos quais foi apresentada a estrutura do fenómeno e recolhidos os comentários e sugestões dos mesmos.

1.6 – CONSIDERAÇÕES FORMAIS E ÉTICAS O processo de elaboração de um trabalho de investigação requer o cumprimento de considerações formais e éticas. Até, sob o ponto de vista da responsabilidade pode dizer-se que, como refere Carpenter (2002, p.37), comprometer-se com “um estudo de investigação implica, para o seu investigador, a responsabilidade pessoal e profissional de assegurar que o mesmo seja sólido de um ponto de vista ético e moral”.

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A garantia da preservação da justiça, é essencial que os investigadores tenham, também, a preocupação de zelar pela confidencialidade e pelo anonimato, devendo para tal, acolher os participantes com respeito e dignidade. Na opinião de Carpenter (2002), algumas das formas de garantir a preservação dos princípios éticos ao longo de uma investigação relacionam-se com a obtenção do consentimento informado, a reserva da confidencialidade e anonimato dos participantes, o teor circunspecto da relação participante-investigador e com a forma de analisar os dados obtidos.

A investigação qualitativa e a utilização da entrevista poderão levantar algumas considerações éticas em relação à confidencialidade e ao anonimato, pela frequente necessidade de validar os dados recolhidos e da verificação da estrutura que descreve o fenómeno. Como tal e de acordo com Polit, Beck e Hungler (2004, p.87) o consentimento informado assume particular importância porque “significa que os participantes possuem informação adequada no se refere à investigação; são capazes de compreender a informação; têm capacidade de escolher livremente, capacitando-os para consentir ou declinar voluntariamente a participação na investigação”.

Os princípios de não-maleficência, autonomia, beneficência e justiça foram assegurados pelo investigador, ao abrigo dos deveres éticos que constam do Código Deontológico dos Enfermeiros, respeitando inteiramente a vontade dos participantes, aceitando as suas decisões no decurso da investigação. O desenvolvimento desta pesquisa tendo em conta os pressupostos referidos, implicou a elaboração do consentimento informado (Apêndice 2) a apresentar aos participantes no início da entrevista. Assim, em cada entrevista foi explicado inicialmente os objectivos do estudo e lido, em conjunto com o participante o documento que posteriormente foi assinado pelo investigador e participante. Foi explicado e garantido aos participantes que estavam livres para abandonar o estudo, sem que por isso sofressem qualquer prejuízo. Para além destas diligências junto dos participantes foi pedida autorização

à

instituição hospitalar (Apêndice 7), para o desenvolvimento da pesquisa da qual obtivemos deferimento (Anexo 2). A par com a instituição hospitalar e pela necessidade de obter permissão de realizar o estudo no decurso da actividade profissional, foi igualmente pedida autorização ao Director de Serviço assim como Enfermeira-Chefe, a qual obteve resposta afirmativa. Página 44

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No decurso das entrevistas tivemos a preocupação de reafirmar junto dos participantes a exclusiva utilização dos dados gravados para fins de investigação. Os mesmos ficaram à guarda do investigador e foram dadas garantias aos participantes que seriam destruídos após a conclusão do estudo. Foi garantida a confidencialidade e anonimato dos participantes em todo o decurso da investigação, sendo a sua identidade apenas conhecida pelo investigador, pois após a transcrição das entrevistas estas foram codificadas pelas letras do alfabeto. A descrição dos procedimentos metodológicos e o seu fundamento bibliográfico que suportam a sua escolha permitem que se passe ao capítulo seguinte, a apresentação e análise dos resultados obtidos.

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CAPÍTULO O 2 - APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS OS

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CAPÍTULO 2 – APRES PRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS

Este capítulo apresen resenta os dados recolhidos junto dos participa rticipantes no decurso da investigação e a resp respectiva análise em função dos objectivos ctivos propostos, com a finalidade de descrev screver e compreender o fenómeno em estud estudo. Iniciamos com a caracterização dos os pa participantes em relação ao género, idade, tempo em diálise, estado civil, etiologia iologia da doença renal, escolaridade e act actividade profissional fundamentando-os os com os dados nacionais. De seguida, apresen resentamos os temas que emergiram da análise nálise do conteúdo das entrevistas realizadas zadas, os quais também alicerçados na bibliogr ibliografia consultada.

RIZAÇÃO DOS PARTICIPANTES 2.1 – CARACTERIZAÇ

Na opinião de Bogdan Bogda e Biklen (1994) a investigação qualitati alitativa possibilita várias formas de apresenta esentação dos dados, pois o investigador ador rege-se pela sua interpretação. A par ccom a sua organização, este não se dissoc dissocia da sua análise e interpretação levando ando a que a apresentação dos mesmos apareça reça em conjunto.

A transcrição integral egral de 9 entrevistas das 12 realizadas, permit permitiram a obtenção de dados para a caract caracterização inicial dos participantes. Oss da dados das 3 últimas entrevistas, realizadas zadas para confirmação de alguns significados, dos, fo foram posteriormente incluídos na caracteriz cterização. Em relação ao género dos participant cipantes, a distribuição foi maior no género mas asculino com a participação de 8 homens.. Do género feminino participaram 4 mulhere ulheres. Distribuição por Género 4 Masculino ulino

8

Feminino ino

Gráfi n.º 1 – Distribuição dos participantes por género Gráfico géne

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A proporção encontrada na distr distribuição da doença renal pelo género cons consolida os dados do registo nacional de e trata tratamento da doença renal crónica terminal. nal. D De acordo com Macário et al., (2011) é no género masculino que existe maior incid incidência da doença renal e posterior prevalênc valência nas técnicas de substituição da função ção re renal. Na caracterização da idade,, os d dados nacionais mostram que a média a de idade da população em diálise peritoneal oneal está nos 51,5 anos (Macário et al., 2011). 201 Uma população adulta, em idade activ activa. Na nossa investigação, a média de ida idades dos participantes foi de 49,25 anos nos e a média de tempo em diálise foi de 12,82 meses, como demonstra o gráfico seguint guinte. Assim, a média de idades vai de encontro contro à média nacional, mostrando também que os nossos participantes são adultos em idad idade activa. Os

dados

revelam

também bém

que

todos

os

participantes



conta contam

com

aproximadamente 1 ano em diálise diálise. Distribuição ição da idade e do tempo em diálise Idade (an (anos)

Tempo em diálise (meses)

68

62 50

16

A

47

15

B

45

9

C

45

E

44

46 38 19

G

12

10

9

F

60

39

17

10

9

D

47

H

I

J

16

10

K

L

Gráfico nº. 2 – Distribuição Dist da idade e do tempo em diálise

Os resultados obtidos da transcriç nscrição das entrevistas permitem também caract caracterizar os participantes em relação ao seu estado civil, escolaridade, actividade profis profissional e etiologia da doença renal. Na a sua su maioria os participantes são casados, o nível de escolaridade abrange desde e a 4ª classe, preparatória, bacharelato e licenciatura. licenc À data da recolha de informação ão 5 mantinham a sua profissão, 7 deixaram m de trabalhar apesar de manifestarem vontade ntade de manterem-se em actividade. As etiolo etiologias da doença renal, segundo conhec onhecimento dos participantes tiveram como causas principais a hipertensão arterial rial e a diabetes, seguindo-se as causas hereditá ereditárias. Os dados nacionais analisados pela S Sociedade Portuguesa de Nefrologia (Macá Macário et al., 2011) apontam a glomerulonefri lonefrite crónica (24,9%) como a principall etio etiologia da doença renal nas pessoas em m DP DP, seguida da diabetes (17,1%) e hipertensão ensão (14,9%) e com menor expressão as causas ausas hereditárias (9,4%). Página 50

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Os resultados da análise do conteúdo das entrevistas são apresentados com o recurso à experiência vivida dos participantes, aumentanto assim a riqueza da investigação. Carpenter (2002, p.12) refere que o investigador construtivista acredita que o conhecimento se obtém através de um processo “dialógico entre o auto-conhecimento da pessoa e aquilo que é encontrado seja um texto, uma obra de arte ou a expressão significativa de outra pessoa”. Foram assim, utilizadas expressões das declarações significativas, que identificassem o tema interpretado pelo investigador.

As vivências da pessoa IRCT no período inicial da realização da diálise peritoneal podem-se agrupar em vários temas: as disposições invididuais para o início da DP; as condições facilitadoras e/ou inibidoras no processo de transição para o início do tratamento; as respostas na realização de DP; as mudanças experienciadas; a (re) construção do quotidiano e o cuidado de enfermagem no processo de transição da pessoa em diálise peritoneal. A par com a apresentação é realizada uma breve descrição e interpretação dos mesmos. No entanto, no final será apresentado a estrutura do fenómeno na sua globalidade e será realizada uma discussão final dos dados encontrados.

2.2 – “SE TIVER QUE FAZER TENHO DE FAZER.” “Foi assim, numa consulta no médico de família o Dr. ficou admirado com a tensão alta então passou-me uma carta para as urgências, vim aqui às urgências do hospital e apareceu-me o Dr.P. Ele viu o que é que eu tinha, entretanto marcoume as consultas para as consultas externas e fez vários exames cá no hospital e depois disse-me que tinha insuficiência renal. Andei assim uns anos, talvez 12 ou 13 anos nestas consultas, a tensão arterial estava controlada com os medicamentos mas acho que a parte renal começou-se a degradar, não é? Até que comecei, até que ele me falou na diálise peritoneal e disse-me “um dia você mais tarde vai ter que fazer”. E se tiver que fazer tenho que fazer. Quando foi nesse ano de 2009, talvez no verão ele disse-me na consulta, “tem que ir meter o cateter para fazer a diálise peritoneal”, comecei a fazer manual e depois passados uns tempos em Fevereiro no ano seguinte passei para a automática”. (EA – L373 47)

Este pequeno excerto de entrevista é revelador da predisposição que as pessoas inicialmente detêm para a realização de uma técnica de diálise domiciliária. O período de pré-diálise por vezes nestas pessoas tem uma duração longa, como se pode

3

Para referenciar as várias declarações significativas, utilizámos a seguinte simbologia expressa por:

(EA-L37-47): E – Entrevista; A – 1º participante; L – Linha de identificação na entrevista transcrita; 37-47 – intervalo de linhas de texto referente à entrevista transcrita.

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constatar no relato e em outros é de carácter urgente influenciando de certa forma como a pessoa experienciará o seu início. “Lembro-me bem, foi um choque grande que eu tive, porque eu não sabia o que era, nem imaginava tal coisa e fiquei bloqueada mesmo. Sofri um bocado com isso, mas agora já estou um bocadinho mais aliviada porque já tenho mais forças e assim, mas foi um choque grande, mas vai passando”. (EC-L20-23)

As situações de início de diálise de carácter urgente são um “choque” e um sofrimento para a pessoa que a experiencia.

2.2.1 – Disposições individuais para o início da diálise peritoneal

Na trajectória de análise das entrevistas transcritas, ressaltou as disposições individuais que as pessoas detêm para o início da DP. Por disposições entende-se, de acordo com Hjelle e Ziegler (1992) uma abordagem à personalidade enfatizando as qualidades duradouras ou traços que residem dentro da pessoa e que tornam o comportamento consistente da pessoa ao longo do tempo e através das situações. Na procura do significado da experiência da pessoa IRCT no período inicial da realização da DP, foi transversal em todos os participantes que o momento de diagnóstico da insuficiência renal é o ponto de viragem para a ocorrência das mudanças na sua vida, pois é nesse momento que a pessoa é confrontada com o diagnóstico de doença crónica. O conjunto das respostas emocionais que diferem de pessoa para pessoa e que faz parte da sua personalidade, permite que haja uma disposição individual para o desenvolvimento de estratégias de enfrentamento (coping), levando-os a um determinado comportamento. Este é assente na base do conhecimento que a pessoa detém de si própria. A denegação da sua condição de doente crónico; a aceitação do seu estado de saúde; a tomada de decisão na escolha da terapêutica e a adaptação à insuficiência renal crónica terminal reflectem as disposições individuais da pessoa para o início da diálise peritoneal (Figura 2), ou seja, para o seu processo de transição, este iniciado pelo “choque” ou acontecimento crítico que é o diagnóstico da doença renal (Hutchinson, 2005).

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Figura 2 – Disposições individuais para o início da diálise lise p peritoneal

Todas as pessoass têm uma determinada disposição pessoal para rreagir a determinado acontecimento. Peran Perante a notícia do diagnóstico da doença nça renal, as respostas emocionais decorrente rrentes desse momento, como a preocupação, ação, tristeza, desânimo, infelicidade, abatiment imento, choro e sofrimento são indicadores que retratam re na pessoa a sua permanente fragil fragilidade, a ameaça à integridade e até a su sua finitude (Barbosa, 2004). “É uma doença, a, m mas pronto o tempo que eu durar, durei. Não pos posso desmoralizarme, ir para baixo, ixo, porque se não...Senti-me um bocado coisa, ma mas agora já não é tanto. A minha vid vida agora olha, um dia de cada vez, a gente só ó pe pensa num dia de cada vez, de resto esto agora já não penso tanto. Tanta preocupação ão q que eu tinha, que agora já não tenh tenho, já não tenho tanto medo. Pronto, vamos an andando...”. (EC – L29-34)

Noutro relato a notícia otícia do diagnóstico provoca reacções emociona ocionais negativas, mas o sentimento de esperan perança acaba por surgir, numa tentativa de adiar a inevitabilidade do início do tratamento. nto. “Há um ano atrás trás era para entrar em diálise acabei por não entra entrar, e portanto fui ficando neste lim limbo, nesta esperança que as coisas se adias diassem. Na altura mesmo, quando do d decidimos entrar em diálise, primeiro impacto o “ok “ok, tudo bem” era uma situação ante antecipada e prevista, mas emocionalmente a dad dada altura abateume, abateu-me e um bocado. Abateu, senti-me realmenteE Houve ouve uma altura em que me sentii em baixo e que as lágrimas me vieram aoss ol olhos, dizia bom, estamos perante nte a situação e começa a ser complicado. Isso so deixou-me um bocado abatido, o, u um bocado em baixo e a família também preoc reocupada em torno desta situação”. (EB (E – L30-39)

As respostas emocio mocionais estão relacionadas com o facto cto de a pessoa ver-se confrontada com o di diagnóstico de uma doença crónica. Ass sua suas características de longevidade e de lim limitação em torno da dependência do tra tratamento de diálise influenciam a sua a ace aceitação. No entanto, o conhecimento prévio do diagnóstico da doença crónica permit ermitirá à pessoa preparar-se para encararr a su sua condição, olhando para o início do tratam ratamento como uma necessidade (Hurst e Thomas, Thoma 2008). Página 53

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“Não senti nada. Para mim é uma doença normal como outra qualquer, então e aguentar 10 anos à volta de comprimidos já foi uma grande sorte. (E) Sim, já andava aqui no hospital com o Dr. P. Já estava a contar com isto mais tarde ou mais cedo.” (EH – L19-23)

O momento do conhecimento da doença renal é para os participantes o início no seu processo de transição. Moos e Schaefer (citado por Ogden, 2004) falam-nos do processo de coping que as pessoas iniciam quando confrontadas com a situação de doença, referindo que a doença leva a certas mudanças, seja de identidade, de localização, papel, apoio social ou de futuro. As pessoas ao serem confrontadas com a sua situação de doença, inicialmente fazem uma avaliação cognitiva e de acordo com Ogden (2004) após esta, desenvolvem um conjunto de tarefas adaptativas e gerais que lhes permitem aceitar a sua condição de doente crónico e redefinir o futuro. Assumindo a opinião dos autores e equacionando o conceito de “transição” de Meleis et al., (2000) estamos na presença do início de uma transição de saúde/doença. A avaliação cognitiva da sua situação de doença leva a pessoa a experienciar e a viver diversas etapas que caracterizam assim o tema emergente das disposições para o início do tratamento por diálise peritoneal. Denegação da condição de doente crónico Ogden (2004) refere que as pessoas quando confrontadas com a doença reagem com uma descarga emocional, e a partir daí desenvolvem determinadas estratégias para enfrentar o problema. Na análise das entrevistas evidenciou-se a denegação por parte dos participantes em relação à condição de doente crónico. “Quando soube da notícia, eu acreditava como não acreditava, com a medicação que eu andava a tomar, eu pensava assim "ah eu vou melhorar" e nunca vai ser preciso diálise. Mas eu tinha que me convencer que um dia tinha que fazer hemodiálise. Pronto, fiquei um bocadinho triste, andei triste mesmo, andava assim um bocado deprimido "é pá tão novo, fazer diálise, hemodiálise e assimE" e foi isso que me aconteceu”. (EF – L61-65)

O conceito de denegação é clarificado segundo Conselho Internacional de Enfermeiras (2001, p.50) como sendo um tipo de coping caracterizado pelas “disposições que se tomam para reduzir, evitar ou repudiar um conhecimento ou o seu significado no sentido de minimizar a ansiedade ou conflito por uma recusa inconsciente de aceitar pensamentos, sentimentos, desejos, impulsos ou factores externos que, conscientemente seriam intoleráveis”.

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Recusando a sua condição de doente crónico denegam a existência da doença, numa tentativa de recuperar a sua anterior condição de pessoa saudável. As suas respostas são influenciadas pelas características da sua personalidade. É certo que, quanto mais tempo a pessoa demorar em denegar a sua condição de saúde, mais tempo levará até à aceitação e à adaptação da doença e do tratamento (Hurst e Thomas, 2008). Aceitação do estado de saúde A ideia de conformação, ou de aceitação resignada, indica-nos que as pessoas não têm outra opção se não aceitar o que lhes é destinado. Aceitação é um tipo de coping caracterizado pela “disposição para, com o tempo, gerir e manejar o stress, eliminar ou reduzir sentimentos de apreensão e tensão, restrição de comportamentos destrutivos” (Conselho Internacional de Enfermeiras, 2001, p.50). Na análise dos relatos dos participantes é revelador que a necessidade do tratamento para a manutenção da sua saúde é imprescindível, logo, aceitam esse facto como inevitável, uma necessidade para a manutenção da vida. “Mesmo quando comecei a fazer diálise peritoneal que era a manual isso pronto, uma pessoa fica a pensar um bocado, agora não, com a máquina é uma maravilha. Uma pessoa deita-se à noite, mesmo à noite é uma preocupação, ter que pensar que tem de ir fazer aquele trabalho mas tem de ser, tem de ser e o que tem de ser é mais forte! Agora a manual mete uma pessoa de rastos, um bocadinho”. (ED – L28-33)

No decurso da investigação analisámos que a não-aceitação da doença influencia a adaptação e a consequente adesão terapêutica. Num dos relatos dos participantes a análise revelou que a sua não-aceitação da doença, provocou uma má adaptação à técnica de DP e a consequente renúncia da mesma. “Eu para dizer a verdade, não aceitei muito bem e não aceitei muito bem que há poucochinho tempo aconteceu o que aconteceu, não sei se lembra, mas tive cá à 15 dias (...) e foi na altura que me senti muito mal e se eu quiser contar alguma coisa, não consigo, porque não me lembro do que se passou”. (EF- L33-59)

Auer (2008) refere que “o doente está consciente da realidade da situação mas não suporta enfrentá-la de frente”. Ou seja, a autora reforça a ideia que por vezes a preocupação excessiva e obsessiva com a doença e o tratamento também não é desejável por levar a comportamentos de não-adesão podendo transformar-se numa ameaça se conduzir a comportamentos que ponham em risco a vida.

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Tomada de decisão na escolha da opção terapêutica A doença renal crónica é caracterizada por alterações físicas, psicológica, sociais e culturais. Cada pessoa é única com características próprias, e as estratégias que desenvolvem para enfrentar a doença acaba por determinar para si próprio o que é ou não importante, levando-a um determinado comportamento. Esse comportamento está relacionado com o auto-conhecimento que a pessoa detém de si própria, permitindolhe a tomada de decisão perante a opção de escolha do tratamento para a doença renal (Healy e Monahan, 2010). No trajecto da doença renal a escolha da terapêutica é actualmente uma decisão consciente entre equipa multidisciplinar e a pessoa. A educação através de programas pré-diálise é recente e possibilita que a pessoa tome contacto com as técnicas disponíveis para o tratamento da sua doença (Rodrigues, 2010). “A minha causa da doença renal foi, as minhas tensões muito altas e com dores de cabeça. Depois fui ao médico e até foi o Dr. P que procurou qual era o meu problema e disse-me que um dia mais tarde tinha que fazer hemodiálise. Nessa altura ainda não se falava em outra diálise. Tenho vindo, vinha às consultas externas e de um momento para o outro, piorei, fui piorando, piorando e depois tive que entrar em hemodiálise. Hemodiálise primeiro e depois deram-me a opção hemodiálise ou diálise e eu escolhi a diálise peritoneal”. (EF – L15-20)

A tomada de decisão é definida pela “disposição que a pessoa tem para aceitar ou abandonar acções tendo em conta o seu julgamento; a capacidade de escolher entre duas ou mais alternativas pela identificação de informação relevante; a necessidade de fazer escolhas que podem afectar o próprio ou terceiros” (Conselho Internacional de Enfermeiras, 2001, p.50). Na análise dos resultados dos participantes, contou para a escolha da técnica a informação dos profissionais de saúde, o conhecimento de outras técnicas, a partilha de experiências e a observação de outras pessoas em DP. “Apesar de ter visto uma pessoa na altura que me disse que isto era bom e não sei quê, mas eu não acreditava pronto, não acreditei mesmo. Ela ainda me disse "isto vai ser bom, é uma diálise boa" e eu toca de chorar. Apanhei uma depressão por causa disso, foi um bocado muito conturbado. O enfermeiro N é que sabe muito bem disso, que ele é que me teve de aturar muito em baixo. Depois começou-me a contar histórias de vidas que também não tem sido boas e assim, comecei a pensar então, bom se há vidas assim, a minha também...O cancro háde ser pior, pronto”. (EE – L33-40)

O processo de adoecer estabelece novos parâmetros de vida e introduz uma nova realidade à pessoa, assim ela redimensiona toda a sua vida. Neste sentido a doença e o tratamento levam a pessoa a um processo de revisão de si, das suas relações e da Página 56

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sua própria vida. Na opinião de Barbosa (2004, p. 29) “a adaptação às técnicas de diálise é um processo complexo e multidimensional”. Adaptação à Insuficiência Renal Crónica Terminal A adaptação segundo o seu conceito refere-se à “disposição para gerir novas situações e desafios” (Conselho Internacional de Enfermeiras, 2001, p.50). Os processos de desenvolvimento e o decurso da vida, ao qual estão associadas experiências de saúde e de doença são de acordo com Abreu (2011, p.41) “potenciais situações de transição pelas mudanças que suscitam nas pessoas e no meio ambiente, requerendo processos de adaptação e de coping”. Na análise dos relatos dos participantes, ressalta que os que desenvolvem estratégias que lhes permita aceitar a sua doença e o tratamento acabam por se adaptar e a desenvolver novas capacidades de gerir o seu dia-a-dia. Um participante refere “Optei pela DP e estou a fazer há cerca de ano e meio e estou muito satisfeita. (E) Não é doloroso, o que é também muito bom”. (EG – L59)

No entanto, sobressai em todas as entrevistas que o momento do diagnóstico é o mais difícil de gerir, pois envolve conceitos e a percepção de pessoa enquanto portadora de uma doença crónica levando a que sejam necessários ajustamentos psicológicos para lidar com as mudanças que a mesma impõe. “Aquilo que me custou mais foi realmente quando soube o que eu tinha, nessa altura quando soube o que tinha fiquei um bocado desesperado, depois fui-me adaptando e quando vim para o tratamento já vinha à espera. O pior momento foi quando soube, foi um bocado triste, agora estou mais ou menos adaptado a esta, como é que eu hei-de dizer, estou conformado. O que hei-de fazer, se não fosse este tratamento já cá não estava”. (EA – L-54-58)

Na fase de adaptação, a maioria dos participantes expressa sentimentos de medo, dúvidas e inquietações relacionadas com o desconhecimento que envolve as técnicas de diálise e na associação à ideia que outras doenças possam aparecer e tornar ainda mais difícil o processo. “Nos princípios custou-me muito, estive sempre muito nervosa, era o que eu sentia, por medo, era medo. Tive momentos que tinha medo de ter cá isto dentro e medo de me aparecer outra coisa, medo sei lá, mas prontos. O que eu haveria de fazer? Era um medo. E depois uma pessoa com aquele medo a gente enerva-se. Tinha medo quando ficava sozinha lá por casa e desatava a chorar, mas porque tinha que chorar? Mas uma pessoa nunca se viu com isto, nunca ouviu falar de tal coisa. Foi assim um choque, pronto. Volta e meia ainda me lembro, ainda foi há pouco, não é? Agora já estou a aceitar melhor, já me sinto um bocadito mais conformada.” (EC – L46-52)

Decorrente da análise identificou-se que o tempo é um factor necessário para que se alcance um amadurecimento do processo de adaptação à doença renal e tratamento. Página 57

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As pessoas que expressaram as suas experiências referem que no início foi muito difícil de admitir a doença e o tratamento, no entanto não havendo outra solução acabam por aceitar e adaptarem-se à sua nova condição. Barbosa (2004) refere que para essa aceitação depende em muito a personalidade do indivíduo, ou seja, as suas disposições individuais para gerir o acontecimento crítico de diagnóstico da doença renal crónica.

2.3 – “CRIÁMOS ALGUM DRAMA À VOLTA DISTOH” “Quando iniciei, criámos algum drama à volta disto, foi preciso preparar quarto, foi preciso comprar material para por no quarto, quer dizer, eu criei algum aparato em torno desta situação. Cria-me algumas restrições porque tenho que fazer três vezes por dia, embora faça às 8 às 4 da tarde e meia-noite às vezes é limitativo. Temos que parar para ir fazer diálise (E)”. (EB – L80-83)

Os humanos são definidos como seres activos que têm percepções e significados ligados a situações relativas à saúde e doença. Estas percepções e significados são influenciados por uma multiplicidade de factores ligados às vivências, e por sua vez, influenciam as condições sob as quais ocorre uma transição. Assim, para compreender as experiências das pessoas em processo de transição é necessário saber as condições pessoais e ambientais que facilitam ou impedem o progresso para atingir uma “transição saudável”, ou seja, conhecer os factores que influenciaram o processo de transição para o início do tratamento por DP (Meleis et al., 2000, p.14).

2.3.1 – Condições facilitadoras e/ou inibidoras da experiência de diálise peritoneal

Durante o período de transição, o indivíduo experimenta mudanças no seu mundo interno e externo, bem como na forma de perceber o mundo, tal como refere Abreu (2011, p.44) “a pessoa possui um sentimento de perda ou de alienação em relação a coisas ou espaços que lhe eram familiares e valorizava”. A figura seguinte sistematiza, os resultados encontrados decorrentes da análise das entrevistas em relação às condições que influenciaram o processo de transição da pessoa no início do seu tratamento por DP.

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Figura 3 – Condições facilitadoras e/ou inibidoras da experiência de DP

Nas condições inerentes à própria pessoa analisámos que, a sua experiência é condicionada pelas suas emoções, pelo seu estilo de vida, pelas crenças que detém após o diagnóstico da sua doença e pelo conhecimento que vai adquirindo através do contacto com familiares, amigos, profissionais de saúde ou outras pessoas na mesma condição de doença renal crónica. Em relação aos recursos da Sociedade e Comunidade percebe-se que o processo familiar poderá ser um factor facilitador em alguns casos como recurso, suporte e protecção. Noutros, porém poderá ser inibidor quando a situação do elemento que tem a condição de doença crónica influenciará toda a sua estrutura, relações e suporte económico. O processo comunitário, o trabalho e emprego e os recursos materiais e físicos são igualmente factores que poderão condicionar a vivência da diálise e que se ligam directamente ao contexto social e comunitário onde a pessoa está inserida. O meio onde vive, as informações que detém, as próprias experiências anteriores ou de familiares poderão ser factores inibidores, principalmente se as concepções que percebe do início da diálise forem percepções negativas. Por outro lado, o acompanhamento dos profissionais de saúde, o conhecimento e o convívio com outras pessoas em diálise peritoneal são condições facilitadoras através do contacto e da troca de experiências. O trabalho e emprego é decerto um factor inibidor da experiência de diálise, o seu início é caracterizado pelas idas frequentes ao hospital, por vezes mesmo necessário recorrer ao internamento e à baixa médica por dias. Esta situação poderá prolongar-se por algum tempo pelas condições médicas influenciando a actividade profissional. O mercado de trabalho não receptivo, o desemprego, a não conciliação de Página 59

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trabalho/diálise faz com que as pessoas deixem de trabalhar e recorram a outros meios de compensação económica como seja a antecipação da reforma (Bluemental e Schwarz, 2009). No entanto, os que mantêm a sua actividade profissional vêm-na condicionada pelas limitações de horários e restrições impostas pela diálise.

Factores pessoais As características da pessoa influenciam a sua experiência de transição, pois cada pessoa é única na sua forma de pensar e de agir. O conceito de pessoa surge definido pelo Conselho Internacional de Enfermeiras (2001, p.43), como sendo um tipo de fenómeno de enfermagem, no qual “o indivíduo é entendido como agente intencional desempenhando acções motivadas por razões baseadas em crenças e desejos de ser humano individual, isto é, racionalidade”. Para além da racionalidade, as emoções ditam toda uma forma de comportamento pessoal.

Sentimentos/Emoções Para Damásio (2003, p.104) “um sentimento é uma percepção de um certo estado do corpo, acompanhado pela percepção de pensamentos com certos temas e pela percepção de um certo modo de pensar”. Na opinião do autor, as emoções são acções ou movimentos, muitos deles públicos, que ocorrem no rosto, na voz ou em comportamentos específicos. Os sentimentos, pelo contrário, são necessariamente invisíveis para o público. “As emoções desenrolam-se no teatro do corpo. Os sentimentos desenrolam-se no teatro da mente” (Damásio, 2003, p. 45). As emoções condicionam a experiência de diálise, a sua expressão como já foi referido anteriormente é a percepção da pessoa em relação ao seu processo de mudança. O início de diálise é visto para alguns participantes como uma situação de dependência e estes equacionam como solução a possibilidade de suicídio. “Digo várias vezes aos meus amigos se não fosse a medicina já cá não estava. (E) Olhe, eu até pensei em matar-me... (choro) Lembrei-me dos meus filhos que eram pequenitos, novos e não podia fazer isso e fui-me conformando e agora olhaE Felizmente vivo, mas não ando feliz. (E) Dá-me alguma qualidade ainda não é? Por enquanto...” (EA – L61-75)

De acordo com Damásio (2003, p.161) “os sentimentos podem ser os sensores mentais do interior do organismo, as testemunhas do estado de vida”. As emoções são reveladoras de um estado de luto que a pessoa inicia quando percebe que a sua condição de pessoa saudável terminou e que a partir de um determinado ponto, Página 60

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necessita de tratamentos para manter a sua vida. No entanto e dependendo das características intrínsecas do individuo este poderá ter mais ou menos capacidades de as expressar e de as viver. Thomas (2009) fala-nos no impacto psicológico que a doença e o tratamento impõem na pessoa, e que as suas reacções emocionais fazem parte do seu processo de adaptação. “Nunca me senti mal, choro. A pessoa ir-se abaixo e virem as lágrimas aos olhos e chorei. E dizia "bolas" finalmente... Bom, tem de ser, julgávamos que não chegava a altura mas tinha que ser, não é? Mas a questão do choro, é uma tristeza que surgiu, não expressa para os outros mas vivida por mim, pessoalmente”. (EB – L50-53)

Os sentimentos e as emoções são vivenciados de forma individual e na opinião de Meireles, Goes e Dias (2004) as limitações e restrições impostas pela diálise provocam um aparecimento de sentimentos muitos dos quais por vezes ambivalentes que influenciarão todo o processo de mudança. “Acho que me caiu o céu em cima da cabeça, fiquei mesmo de rastos, até tive uma depressão e tudo. Andava mesmo para baixo, mais para baixo do que para cima. Foi mesmo uma altura da minha vida que eu nunca pensei, acho que se a tornasse a passar não aguentava. Digo eu, mas talvez sim, sou muito forte. Eu aguento muita coisa, mas foi mesmo mau”. (EE-L24-27)

Na análise dos resultados, os participantes experienciaram sentimentos de sofrimento e infelicidade, bem como, emoções de tristeza e choro com o início da diálise. A vivência dos mesmos de forma mais intensa ou menos intensa condicionou a todos os participantes a sua experiência de início de DP. Estilo de vida O estilo de vida é um conceito amplo que engloba a pessoa como um todo e em todos os aspectos da sua actividade, isto é, forma como gere a sua existência, pelo que esses aspectos se combinam para influenciar todas as dimensões que compõem o conceito de saúde física, mental, social, emocional e espiritual, e traduzem-se por níveis de “satisfação, de bem-estar, competência, capacitação, aceitação social e qualidade de vida” (Rapley, 2003). As pessoas que mantêm a sua rotina diária vêemna alterada com a necessidade de depender de um tratamento, tornando-se por vezes condição inibidora do processo de transição. A análise revelou que a maioria dos participantes vê condicionado o seu estilo de vida, pelo facto de realizarem diálise. “A minha vida andava muito por fora de casa e não tinha problemas, se fosse caso de dormir fora dormia em serviço e tinha lazer, mas deixei de fazer isso. Tenho de regressar sempre a casa, às vezes tenho uns períodos mais longos de férias ou de uns dias, mas levo a máquina e levo o material todo para cinco a dez dias mais ou menos”. (EA – L77-78)

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Para outros participantes analisámos que o estilo de vida é beneficiado pelo início da diálise pois possibilita a compreensão do estado de saúde. Noutros participantes, o seu estilo de vida facilita a experiência de diálise porque permite adequar o tratamento à sua rotina diária. “Para já e numa primeira etapa teve alguma vantagem, obrigou-me a parar um bocadinho, obrigou-me a ir para casa às 4 da tarde, descansar, parar. Hoje em dia já não é tanto assim, hoje em dia já me esqueço que tenho o cateter, facilito mais um bocado e não devo”. (EB-L-85-88)

O estilo de vida que a pessoa percepciona para o conceito de bem-estar influencia o processo de transição, condicionando-o. Crenças de saúde: Ameaça As ideias, as crenças ou as significações da pessoa em relação ao processo de doença são influenciados pelos conceitos que o próprio tem sobre o conceito de doença (Joyce-Moniz e Barros, 2005, p.17).

Ameaça é definido como um “tipo de crença de saúde caracterizado pela convicção pessoal de que um problema de saúde é grave e tem potenciais consequências negativas para o estilo de vida” (Conselho Internacional de Enfermeiras, 2001, p. 53). Na opinião de Auer (2008) a insuficiência renal representa uma ameaça à vida e muito frequentemente os doentes renais pensam que a morte está mais próxima pelo facto de estarem mantidos por um sistema de suporte de vida. Menciona ainda que estes doentes têm a consciência da realidade da fragilidade da vida humana e a possibilidade de morte precoce.

Meleis et al., (2000) refere que as crenças e as atitudes influenciam as transições e poderão ser inibidoras quando são associadas a estigmas. De certo modo a presença de uma doença crónica poderá levar a pessoa a sentir-se dependente, e a conotação associada à dependência poderá originar o estigma de inutilidade. Da análise realizada um entrevistado refere que se sente “inútil” para a sociedade. A percepção que a pessoa detém sobre a dependência do tratamento, fá-lo comparar com uma prisão, pela falta de liberdade, permitindo condicionar de forma inibidora e frustrante a vivência do tratamento de diálise para o próprio e para os seus familiares. “De resto, à noite tenho que me limitar àqueles horários, tenho que estar preso não posso sair, por vezes tenho insónias, não posso sair. Tenho que ficar na

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cama, dou voltas na cama, mas pronto tenho que ficar não posso fazer mais nada”. (EA-L82-84)

A pessoa na concepção e percepção do seu estado de saúde entende também que acaba por influenciar a sua família. Perante as crenças evidenciadas pela pessoa, é importante fornecer toda a informação necessária para o esclarecimento de questões e dúvidas que poderão estar na base das crenças. Da análise dos resultados as crenças mostraram serem condições inibidoras da experiência de diálise. Conhecimento Meleis et al., (2000, p.15) referem que “a preparação antecipadora facilita a experiência de transição, ao passo que a falta de preparação é um inibidor”. Intimamente relacionado com a preparação está o conhecimento sobre o que esperar durante a transição e que estratégias podem ser úteis para a gerir. É importante saber que conhecimento as pessoas detêm, para identificar as melhores estratégias para a realização da DP. “Como sou da área da saúde, a primeira dificuldade confesso que senti, foi quando me deram o manual e eu comecei a ler, tira dum lado, mete do outro. Enquanto não vi o mecanismo achei que aquilo ia ser uma coisa muito complicada. Depois vi que era muito simples, roda sempre para o mesmo lado, ou de um lado para o outro, é simples. Não sabia o que é o "cup" e quando li aquilo fiquei um pouco apreensivo, pensei que era uma coisa mais complicada, não é? Hoje em dia lido com bastante facilidade, mas sempre com grande medo das peritonites e dessas coisas todas”. (EB – L106-112)

Por conhecimento entende-se como um tipo de pensamento caracterizado pelo “conteúdo específico do pensamento com base em sabedoria adquirida ou em informação e competências aprendidas; domínio e reconhecimento da informação” (Conselho Internacional de Enfermeiras, 2001, p.45). Os conhecimentos que adquirem dos profissionais de saúde e de práticas anteriores condicionam a sua experiência de diálise. A análise da informação mostrou que na sua maioria os participantes vêm facilitada a vivência de DP, pelo conhecimento que detêm de experiências anteriores de familiares e amigos. “Eu não tinha sequer a mínima noção, nem a mínima informação do que era a diálise peritoneal, porque conheci minimamente a hemodiálise porque já o meu pai e os meus tios tinham feito, mas diálise peritoneal eu nunca tinha ouvido falar. Visto ou ouvido falar, não tinha informação nenhuma e aí foi um bocado confuso. Primeiro o choque em si de ter que entrar assim rapidamente e depois o não saber o que escolher, porque depois deram-me a escolher se queria uma ou queria outra. Até que acabei por optar pela diálise peritoneal, porque achei, depois de me explicarem, achei que era mais cómoda e melhor para mim”. (EG – L23-29)

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Por outro lado, o conhecimento de outras terapêuticas nomeadamente a hemodiálise, condicionam também a vivência em diálise peritoneal. No seu íntimo as pessoas vêmna como um tratamento no qual se podem refugiar no seu lar e sem se exporem a unidades hospitalares, aos profissionais que ali trabalham ou mesmo a formas agressivas de terapêuticas ou tratamentos. “Olhe psicologicamente a gente fica abalado e segundo aquilo que a gente já tem alguns conhecimentos da outra hemodiálise, porque esta não era conhecida para mim, a gente fica um bocadinho assustados. Porque ficamos, ficamos pronto abalados mas isso penso que em qualquer doença a pessoa pode ficar abalado. Depois houve uma adaptação e hoje aqui estamos a fazê-lo, do mal ao pior. Acho que me sinto melhor se tivesse que fazer a outra seria muito pior. É certo que quando vou fazer as minhas mudas que chatice mas depois a gente volta atrás e se tivesses que ir para lá quatro horas. E pronto, a gente aceita”. (EI – L23-29)

No seu processo de adaptação à doença a pessoa experiencia, também a sua adaptação cognitiva. Ogden (2004) refere que isso acontece, através da procura do significado do que aconteceu, do que pode fazer para a controlar e do desenvolvimento da auto-estima. A adaptação cognitiva, o conhecimento que tinham e o que adquirem permitem facilitar o processo de realização de diálise.

Sociedade e Comunidade Meleis et al., (2000, p.16) dizem-nos que “os recursos da comunidade também facilitam ou inibem as transições”. Referem-nos que como facilitadores inclui o apoio de companheiros e família; informações relevantes obtidas dos profissionais de saúde; aconselhamento de outros; de modelos ou as respostas a questões. Porém como inibidores descrevem o apoio inadequado, o aconselhamento negativo, informações insuficientes ou contraditórias e a preocupação de ser estereotipada (ser doente crónico). A sociedade, também de uma forma geral pode ser facilitadora ou inibidora da transição. Meleis et al., (2000) na elaboração da teoria de médio alcance sobre o processo de transição referem-nos que na observação de processos de transição, as pessoas que de alguma forma surjam estigmatizadas e

com significados

estereotipados, tendem a interferir no processo de transição. Para Foucault (citado por Abreu, 2011) o corpo está sujeito a um controlo social muito apertado que lhe impõe constrangimentos, interdições e obrigações.

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Processo Familiar O processo familiar é entendido com “as interacções positivas ou negativas que se vão desenvolvendo e padrões de relacionamento entre os membros da família” (Conselho Internacional de Enfermeiras, 2001, p.65) e que se inserem nos recursos da Comunidade e Sociedade. A doença crónica tem impactos de diversos cunhos na família, principalmente porque atinge o funcionamento familiar, exigindo toda uma reorganização de funções e papéis. Góngora (citado por Sousa, Relvas e Mendes, 2007) indica que os impactos podem ser: estruturais e relacionais. Na opinião dos autores, podem ser agrupados em várias categorias como sejam na sua estrutura, no seu processo, emocionais e derivados das características especiais da doença. No entanto as transformações ocorrem simultaneamente influenciando de forma inibidora a vivência da DP. “A família estaria à espera, era uma situação que andava para entrar numa altura ou noutra. Estaria à espera mas também, com aquela expectativa será depois, para amanhã? Para o ano? Não foi agora isto aguenta-se mais uns meses, pode ser queE Ainda hoje a família nomeadamente os filhos não lidam bem com a situação, pronto sabem que eu faço diálise, tudo bem, mas não entram no quarto quando eu estou a fazer diálise, não gostam quando eu mostre o cateter, não gostam que eu verbalize ou exteriorize a situação da diálise portanto preferem que o pai como estava”. (E B – L206-210)

Na maioria dos participantes houve alterações no seu processo familiar. A mudança de papéis poderá provocar alterações profundas no núcleo familiar e ser um factor condicionante para uma experiencia negativa e desagradável em DP. Quando uma doença crónica grave acontece a um elemento da família, um conjunto de outras consequências emerge, tais como: o sofrimento que se repercute em toda a família, a necessidade de reorganizar as tarefas e há efeitos específicos no elemento que assume o papel de cuidador (Sousa, Relvas e Mendes, 2007). A maioria dos entrevistados demonstrou que as relações familiares se alteraram, no entanto, apenas alguns referem que isso contribuiu como condição inibidora da sua experiência. “Os filhos aceitaram naturalmente, não se manifestaram muito. Lá em casa não se manifestam muito, não sei se é para não me sentir pior, mas não se manifestam. É natural que as coisas no lar tornaram-se um pouco mais complicadas porque toda a gente, a minha mulher, os meus filhos não, mas a minha mulher está presa por minha causa, não é?”. (EA – L94-97)

Da análise da informação, sobressaiu que as relações conjugais influenciam a pessoa e a sua experiência de diálise. A não-aceitação da doença e do tratamento por parte do cônjuge é inibidor e condiciona a pessoa neste processo. “O marido é que não aceitou lá muito bem, ele é daqueles. Ele tem 49 anos mas parece que ele tem 85, a mente dele está muito na velhice. (E) depois o homem

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também, é uma pessoa que, eu venho para Coimbra e ainda agora me esteve a ralhar, quando eu disse que ia para Coimbra (E) Depois a minha filha mais nova que estava lá disse-lhe "Oh pai ela vai para Coimbra porque precisa", por isso é que eu digo que ele é um bocado antiquado. Mas se fosse ele a precisar não era bem assim, ele não tem compreensão”. (EE – L48-55)

No entanto, a família é também um factor importante como condição facilitadora do processo de vivência da diálise. Por vezes, é percebido pelos participantes que a sua condição de doente crónico em diálise não é bem-aceite no seio familiar, havendo receio de dar a notícia e enfrentar a realidade. Mas, quando são desfeitos os medos, existem sentimentos de altruísmo que podem surgir dos familiares numa tentativa de aliviar o sofrimento que a doença e o tratamento impõem na vida quotidiana do doente. “Os meus filhos quando souberem, eles ainda não me viram, quer dizer, ela já me viu assim, o meu filho ainda não. O que me custava era eles verem-me nesta situação mas agora já estamos a aceitar melhor, ela, porque ele ainda não me viu, sabe mas ainda não me viu. Ele até já me disse que me dava um rim, mas ele não está cá. Eu disse-lhe, não! Há-de haver, tu ainda és muito novo deixa estar”. (EC – L55-60)

Na análise do conteúdo das entrevistas, a maioria dos participantes referem a família como um recurso facilitador da sua experiência de DP, tornando-se esta parte integrante das soluções para os problemas originados pela doença e pelo tratamento. “Tive muito apoio da minha família, principalmente do meu marido e da minha filha que foram espectaculares, acompanharam-me sempre às consultas, acompanharamme sempre para todo o lado que eu precisasse de ir e ajudaram-me muito. Levámos os livros para casa, para lermos e para percebermos melhor a diálise, como era feita e como eram os cuidados que tínhamos que ter. Eles leram comigo, ajudaram-me a decidir e apoiaram-me muito e pronto. O meu marido ajeitou digamos assim, o que era preciso em casa, uma divisão só para a diálise”. (EG – L40-46)

Processo Comunitário O processo comunitário é caracterizado pela “sucessão de interacções positivas ou negativas e padrões de relacionamento entre os membros da comunidade que vivem e funcionam lado a lado numa localidade ou área geográfica, partilhando interesses colectivos, trabalho em comum, instituições de educação ou saúdeH” (Conselho Internacional de Enfermeiras, 2001, p.67). O contacto com outras pessoas na mesma situação de insuficiência renal em diálise peritoneal e o apoio dos profissionais de saúde, permitem facilitar o processo de mudança da pessoa. Em relação aos profissionais de saúde estes são considerados por todos os participantes como facilitadores, intervindo na informação e no processo de aprendizagem da técnica de diálise. Página 66

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“Eu acho que o que facilitou a aprendizagem foi os profissionais que aqui tive e que me estiveram a acompanhar, foram pessoas sempre bastante simpáticas, elucidativas na exaustão das explicações para eu não me esquecer. Foram as pessoas, os enfermeiros que me ajudaram bastante e facilitaram-me a vida na aprendizagem”. (EA-L140-143)

A referência aos profissionais de saúde como condição facilitadora do processo de transição é relevante em outro testemunho. “É assim facilitou-me muito o apoio, a dedicação, a maneira como me explicaram de toda a equipa. A equipa, seja de enfermagem, seja de médicos, toda esta equipa que trabalha neste sector. Acho que se empenha muito com os doentes e tem muitaE uma muito boa relação com os doentes e isso dá-nos uma confiança muito grande”. (EG-139-142)

O contacto com outras pessoas que experienciam o tratamento de diálise peritoneal é referido também para a maior parte dos entrevistados como uma condição facilitadora da experiência de DP. “Eu tento sair de casa, falar com pessoas, vou ter com as minhas amigas que tem o mesmo problema, é um bocadinho retirado mas vou lá. Elas vêm a minha casa, eu telefono-lhes e elas vêm a minha casa. Vou até ao café e tento esquecer, esquecer não esquece, mas não me lembrar da doença que tenho. Tento abalar de casa, tento em conviver”. (EC-64-68)

Trabalho e Emprego Trabalho e emprego é um tipo de prestação de serviços caracterizado pela “provisão de oportunidades de trabalho, negócios, parcerias, corporações comerciais ou contratos profissionais e outros empreendimentos e empresas que assegurem os pagamentos ou salários necessários para sustentar financeiramente as pessoas” (Conselho Internacional de Enfermeiras, 2001, p.72). Uma das grandes alterações que condicionam a experiência da pessoa em diálise é em relação ao seu trabalho e emprego, pois a realização de uma técnica domiciliária requer que se cumpram horários de tratamento, por vezes incompatíveis com a actividade profissional, podendo deste modo constituir um elemento não facilitador deste período. “Era a pensar que já não podia ir trabalhar para (E) porque andava lá no restaurante e gostava muito. Não poder trabalhar para mim é uma coisa que não cabe em mim, mesmo em casa eu não posso estar quieta. A minha irmã ralha-ma, os meus ralham-me porque eu depois fico muito cansada, não é? Depois tenho que me deitar, como aconteceu esta semana, mas foi a melhor coisa que fizeram por mim aqui”. (EE – L28-32)

Aliás, a condição de desemprego é vista por todos os participantes como uma condição inibidora. A dependência económica impõe transformações na vida e no desempenho pessoal. Página 67

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Recursos Materiais e Físicos A realização do tratamento a nível domiciliar, poderá de certa forma condicionar a experiência. Na percepção da realização da DP, as pessoas não conhecem os procedimentos e, no caso de muitos participantes envolve também a adaptação e conhecimento de recursos materiais e físicos, como seja a aquisição de material, electricidade, definição de um espaço próprio para o tratamento e um local de armazenamento do material (Espejo e Castilla, 2006). Na análise dos resultados ressaltou que a maior parte dos entrevistados necessitou de adquirir material, definir um espaço próprio para o tratamento e organizar horários. “Uma pessoa tem que se encaixar, para não ir ao mesmo tempo que eles, se não é chato. Às vezes eles perguntam-me "Oh mãe vais para a diálise a que horas?" eu digo-lhes "vocês já sabem é sempre à mesma" e depois não vão para eu ir, outras vezes, dizem-me "Oh mãe espera um bocadinho 10 minutos, que eu vou tomar banho e tu já vais". É assim...” (EE-L58-62)

No entanto, salienta-se que estas condições necessárias para o tratamento domiciliário

não

foram

expressas

pelos

participantes

como

factores

de

constrangimento ou dificuldade para o processo. O que emerge como condicionador e que de certa forma contribui como condição inibidora são as características do próprio material utilizado na DP. As quantidades de material, o peso dos equipamentos são elementos que nos primeiros contactos funcionam como entraves na vivência do quotidiano. “Eu acho que a própria máquina é pesadíssima para transportar, muito pesada, e seria fácil portanto, se a máquina fosse mais pequena, mais leve, que a pudéssemos levar durante o fim-de-semana. Porque levar aquela máquina e todas as caixas é complicado, de qualquer maneira penso que esta peritoneal dá-nos muita liberdade, dá-nos uma certa qualidade dentro do possível, uma certa qualidade de vida. Com um senão, sempre que nos deslocamos a qualquer lado, temos que levar um armazém. Se desenvolvessem algum tipo de computador, seria mais fácil, é esse incómodo que vejo nesta diálise. (EA – L180-186)

Ao descrever as condições que influenciam a experiência de DP, salienta-mos que em relação aos factores pessoais, as pessoas que conseguem gerir as suas emoções, que conhecem e aceitam o seu estado de saúde obtêm como resultado uma vivência facilitada. A sociedade e comunidade são para os participantes facilitadores quando referem o apoio da família, dos profissionais de saúde e dos amigos. No entanto, na experiência do tratamento as pessoas confrontam-se com o desemprego e este é, para todos os participantes em actividade o factor mais inibidor da vivência da DP. Página 68

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2.4 – “ SINTO QUE ISTO CANSA MUITOH”

“Olhe sinto que isto cansa muito, não imaginava que a doença renal antes da diálise peritoneal que cansasse tanto. Desgasta muito mais daquilo que estava à espera. Por um lado, não é tão dramático como às vezes as pessoas pensam, vai desgastando. Desgasta uma pessoa em termos de cansaço. No dia-a-dia desgasta muito, não estava à espera que desgastasse tanto. Estava à espera que chegasse aqui, tipo bombas de gasolina, chega abastece-te e vai-te embora e estás outra vez com o depósito cheio, mas não é verdade, isto desgasta muito”. (EB – 191-197)

2.4.1 – Respostas à experiência de diálise peritoneal

Na realização de DP existem respostas que as pessoas experimentam fazendo parte do seu processo de transição (Meleis et al., 2000). Por resposta entende-se como “uma reacção a estímulos” (Conselho Internacional de Enfermeiros, 2011, p.72). Na opinião de Dantas (2001, p.109) “todo o ser humano tem, por definição, uma actividade de vivência, que pode consciencializar, e tem de percepcionar o real, porque não o pode abarcar na sua materialidade”. No período inicial da DP as pessoas experimentam determinadas respostas perante o fenómeno. As mesmas são determinantes no processo de avaliação cognitiva da pessoa em relação à sua doença e tratamento, influenciando assim, todo o processo de transição. Os autores Garcia (2002); Leung (2003) e Meireles, Goes e Dias (2004) relatam as alterações físicas, psicológicas, sociais e profissionais que envolvem o início da diálise. Para Aeur (2008) o início de diálise é caracterizado por tensão. Descreve que esta é sentida pelo próprio, pela família, pelos amigos e por colegas de trabalho. Da interpretação das várias entrevistas analisadas emergiram dois grandes grupos de significados agregados referentes às respostas que a própria pessoa percepciona (respostas intrapessoais) quando inicia a diálise, e as respostas que a pessoa evidencia nas suas relações interpessoais (respostas interpessoais). Da sua análise sobressaiu na quase totalidade dos participantes, vivências de carácter emocional como respostas ao início da diálise. Este período é caracterizado por uma explosão de emoções, sendo que estas tomam um sentido desfavorável pela sua conotação negativa como o medo, a preocupação, o nervosismo, a ansiedade, o Página 69

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sentimento de impotência, o cans cansaço, sentimento de falta de liberdade e desconforto. des Abreu (2011, p 83) refere que ““trabalhar com respostas humanas é um p processo complexo que envolve avaliação iação e interpretação diagnóstica. A complexidad exidade reside na natureza holística das pessoas ssoas e nos significados que constroem no quotid quotidiano”. É esta complexidade que torna a o próprio processo de transição complexo. No entanto procurámos evidenciar as resp respostas que mais emergiram das entrevis ntrevistas dos participantes.

Figura 4 – Respostas Resp à experiência de Diálise Peritoneal

Respostas intrapessoais ficiente renal ao atingir o estádio terminall da d doença e A situação vivida pelo insuficient perante a necessidade de entrar ntrar em programa de diálise tem, de acordo do com Garcia (2002) todas as características as de uma situação de crise, de sofrimento,, de a ameaças, de perturbações e de perdas. as. O afastamento da escola ou trabalho,, o p peso dos exames médicos, a medicação, ão, os internamentos e os tratamentos fomenta nta n no doente um isolamento familiar e social. ial. D De acordo com Hutchinson (2005), provocam ocam também uma sensação de dependência ncia que pode gerar sentimentos de medo. o. Os medos associados a estados de ansiedad siedade são factores que estão directamente e rela relacionados com os comportamentos de não adesão a a regimes terapêuticos. Respostas Desfavoráveis Os participantes descrevem nas ssuas entrevistas que o início do tratamento ento d de diálise peritoneal é o momento mais ais m marcante da sua vivência, traduzido por or em emoções e reacções. Página 70

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Medo O Medo é a emoção mais evidente na vivência dos participantes, este é caracterizado por um tipo de emoção com as características específicas: “sentimento de ameaça, perigo ou infelicidade com causa conhecida acompanhada por estado de alerta, concentração na origem do medo, comportamento agressivo em posição de ataque com os olhos muito abertos ou fuga da fonte do medo” (Conselho Internacional de Enfermeiras, 2001, p.47).

As emoções controlam muito da nossa acção e na opinião de Goleman (2010, p.168) o medo aparece apenas com um pensamento. Refere também que quando estamos doentes ficamos mais frágeis emocionalmente, pelo simples facto de que nunca estamos preparados para adoecer. Quando isso acontece, o autor diz que nesse momento as pessoas sentem-se “fracas, impotentes e vulneráveis”. Esta citação revela que a doença altera o estado de espírito das pessoas, tornando-as vulneráveis. Da análise dos relatos dos participantes o medo assume várias descrições. Para alguns este está inicialmente relacionado com o desconhecido e com a sua auto-percepção em relação à doença renal crónica. Para outros, o medo surge com a necessidade de aprender a desenvolver capacidades de executar a técnica no domicílio, onde não tem a supervisão dos profissionais de saúde. “Esses foram uns dias de nervos, era a tal coisa, de medo, medo de me enganar "ai meu deus se eu me engano". Era aquela preocupação de me enganar, que não soubesse, sei lá. Eu também pensava muito se uma pessoa “vareia” da cabeça com alguma coisa. Coisas que a gente pensa, a minha maior dificuldade era a fazer as ligações, de resto não”. (EC-L105-108)

O medo também surge, na expressão de vários participantes pelo desconhecimento que têm em relação ao tratamento de DP. O contacto com algo de novo e que estranham provoca-lhes receio de fazerem algo que lhes prejudique o seu bem-estar. “Eu acho que nem tive dificuldades nenhumas, primeiro era mais o medo e tirando isso até aprendi muito rápido, embora tivesse estado aqui cerca de oito dias, mas penso que foram só os dois primeiros dias que precisei de ajuda, depois comecei a fazer praticamente o tratamento sozinha”. (EG – L134-137)

No entanto, o medo é evidenciado por grande parte dos participantes associado às complicações resultantes da realização da DP. As infecções relacionadas com a implantação do cateter peritoneal e/ou a execução da técnica são os principais elementos subjacentes à expressão do medo. Principalmente referem o medo do aparecimento de complicações infecciosas, nomeadamente a peritonite.

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“Eu tinha muito medo de apanhar alguma peritonite, eu tinha muito medo. Porque eu sou muito cuidadoso, eu sou muito responsável por mim próprio. E como disseram-me para eu ter muito cuidado com a questão das peritonites, porque dá muitas dores e eu não, nessa altura pensei "ah depois vou para a praia e depois coiso, depois tem muitas pessoas, uma pessoa anda ali misturado e pronto, não fui já a pensar nisso”. (EF – L74-78)

De facto, a peritonite é a complicação infecciosa mais frequente em DP e implica em muito dos casos a transferência de técnica (Rodrigues, 2010). Preocupação A preocupação está presente como resposta devido ao facto de ser a própria pessoa a realizar o tratamento. Entende-se por preocupação como um tipo de pensamento caracterizado por “algo que domina e monopoliza o espírito, com exclusão de outros pensamentos,

ou

estar

mentalmente

distraído”

(Conselho

Internacional

de

Enfermeiras, 2001, p.45). De certa forma a pessoa ao realizar a técnica intervém directamente no seu estado de saúde. Esta participação activa na gestão da sua doença e do tratamento gera sentimentos de preocupação. A maior parte dos participantes sentem que não são capazes da execução da técnica e entendem que isso de certa forma lhes será prejudicial. “(E)Foi uma preocupação na minha cabeça. Uma preocupação e na altura lembrava-me muito dos meus filhos, na altura era o que me lembrava”. (EC-L54-55)

A preocupação surge também para alguns participantes, associado à alteração da imagem provocada pela implantação do cateter e a cicatrização do orifício externo do cateter peritoneal (Thomas, 2009). “Uma vez que o cateter estava tapado, não mexeu muito comigo. Mexeu mais quando eu tive que ir para a praia, e dizer “agora aonde é que eu ponho isto, o que é que eu faço a isto?” essa parte foi mais complicada. O cateter não tem interferido em termos de imagem, sei que está lá e que faz parte de mim, portanto e que me integra. Agora a questão de ir para a praia, tive que arranjar umas estratégias para lidar, não tanto por mim, mas pelos outros. Quer dizer, as pessoas ficam a olhar e assim, mais pelos outros. O cateter não mexe muito comigo, foi mais complicado porque não cicatrizou logo a ferida e andei aqui com alguns problemas na pele, algumas lesões em torno do cateter, alguns meses e sim isso preocupou-me no sentido do cateter não estar a fixar bem e não estar a evoluir bem a situação e isso deixou-me preocupado”. (EB – L65-74)

Há também expressão de preocupação associada ao desenrolar dos procedimentos que antecedem o início da diálise. O contacto com algo novo, desconhecido e que lhes influencia

directamente

o

seu

bem-estar

monopolizadores do seu estado de espírito.

Página 72

fazem

surgir

os

pensamentos

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“Quando o vi pela primeira vez, antes de colocarem o meu cateter eu vi aqui numa senhora que estava aqui em consulta e aí já fiquei com uma ideia de mais ou menos o que era. A minha preocupação na altura é se aquilo ficava a causar dor ou incómodo. Depois quando me colocaram o cateter ficou interior, não ficou exterior, porque julgavam que eu aguentava ainda mais algum tempo sem começar os tratamentos, mas infelizmente aguentei pouco mais de um mês. Depois foi extraída a ponta e comecei logo, dia 20 de Outubro a fazer a diálise, depois não me assustou e como vi a outra senhoraEComo vi que realmente apesar de isto andar por fora, mas não me causava dor”. (EG – 171-178)

Para Auer (2008) é importante que haja aconselhamento, ajustamento e informação que resulte numa pessoa informada e preparada para a realização do seu tratamento.

Ansiedade A exigência da realização da técnica poderá estar na génese de sentimentos de ansiedade experienciados por todos os participantes da pesquisa. Ansiedade é definida como um “tipo de emoção: Sentimento de ameaça, perigo ou infelicidade sem causa conhecida, acompanhados de pânico, diminuição da auto-segurança, aumento da tensão muscular e do pulso, pele pálida, aumento da transpiração, suor na palma das mãos, pupilas dilatas e voz trémula” (Conselho Internacional de Enfermeiras, 2001 p.47).

Na opinião de Alves e Afonso (2011) os estados de ansiedade e de angústia são frequentes nas pessoas em diálise peritoneal. A adaptação à doença renal e tratamento é um longo processo psicológico. Referem que existem fases nesse processo de ajustamento, no qual destacam a fase inicial, caracterizada por manifestações de ansiedade ou pânico. A fase de “lua-de-mel” com um período médio de 3 meses onde a ansiedade persiste relacionada com a realização do tratamento. A fase de depressão emerge quando a pessoa percepciona a sua condição de saúde e por último a fase de adaptação, na qual a pessoa aceita a doença e o tratamento em benefício da sua vida. “É assim, a primeira vez se calhar, o primeiro dia talvez pareceu-me um pouco confuso. Aqueles passinhos todos e depois as recomendações dos enfermeiros a dizerem-me que nós não nos podíamos esquecer de passo nenhum porque podia ser, um passo em falso ou um esquecimento podia ser fatal para uma infecção, para uma peritonite. Isso assustou-me um bocadinho os primeiros dias e achava que era muita coisa, que tinha que aprender muitas pequeninas coisas e ter o cuidado de não esquecer de nenhuma delas, que era um seguimento passo a passo”. (EG-L116-121)

Nos casos de pessoas que não aceitam a sua situação de doença acabam por atingir grandes estados de ansiedade, levando mesmo à depressão com necessidade de

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apoio especializado, sendo que no caso de um participante houve necessidade de recorrer a apoio e medicação psiquiátrica. “Ah! Sim foi bastanteE (++) Eu para dizer a verdade, não aceitei muito bem e não aceitei muito bem que há poucochinho tempo aconteceu o que aconteceu, não sei se lembra, mas tive cá há 15 dias... Depois não comecei a sentir-me muito bem, com uma depressão muito grande, muita ansiedade”. (EF L33-35/45-46)

O caso deste participante, é revelador do quanto é necessário um acompanhamento minucioso do início da experiência de DP. Este participante refere que a sua vivência foi sempre provida de grandes episódios de ansiedade, os quais não conseguia controlar e como consequência levaram-no à depressão e ao consequente abandono da técnica. Estes episódios de ansiedade e importantes estados depressivos surgem associados às perdas que a pessoa experiência na realização da diálise, a perda de status familiar, social e profissional, e segundo (Alves e Afonso, 2011, p.23) “a depressão é a patologia psíquica mais frequente nas pessoas em diálise peritoneal”. Depressão As investigações que se preocupam com o estudo das alterações psicológicas das pessoas que iniciam diálise referem que os estados de ansiedade e depressão são as mais expressivas (Blumental e Schwarz, 2009). Referem ainda que para haver uma adequação da pessoa ao processo de diálise, é necessário que estes sejam informados do que envolve a realização da DP no domicílio. Que as pessoas estejam motivadas para o seu autocuidado, que reconheçam a necessidade de mudança de estilos de vida e que a família esteja preparada para aceitar a doença e o tratamento. Por definição, depressão é uma “emoção negativa: sentimento de tristeza a melancolia, com diminuição da concentração, perda de apetite e insónia” (Conselho Internacional de Enfermeiras, 2001, p.48), a qual é experienciada na vivência da pessoa em DP e na análise das entrevistas foi verificado que dois dos participantes evidenciaram estados depressivos com necessidade de apoio médico e de um maior acompanhamento da equipa de enfermagem na tentativa de apoiar e aliviar os sentimentos que poderão ter estado na origem da depressão. “Apanhei uma depressão por causa disso, foi um bocado muito conturbado. O enfermeiro N é que sabe muito bem disso, que ele é que me teve de aturar muito em baixo.(E) Só me dava vontade de me matar, de sumir. Mas pronto, tive ajuda e também estou a tomar anti-depressivos.” (EE-L36-38/42-43)

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Para Barbosa (2004) a depressão e o sofrimento são potencializados pelas transformações familiares, laborais e sociais, inerentes à situação, exigindo do indivíduo a capacidade para a reorganização da sua vida, quando ele por vezes se encontra tão fragilizado pelas múltiplas perdas sofridas. Refere também que, neste período o apoio psicológico e a manutenção da actividade profissional, são factores de extrema importância, porque permitem o reforço da auto-estima, impedindo que se fixe apenas ao papel de doente.

Cansaço A exigência de que depende a realização da diálise no domicílio revela-se por vezes excessiva para a pessoa, reflectindo-se em respostas de cansaço. Definido como uma emoção negativa, é caracterizado por “sentimentos de diminuição da força ou resistência, desgaste, cansaço mental ou físico e lassidão, com capacidade reduzida para o trabalho físico e mental” (Conselho Internacional de Enfermeiras, 2001, p.42). O desgaste está relacionado com a falta de capacidade que as pessoas têm de manter a sua actividade tal e qual como mantinham antes de serem doentes renais crónicos. A doença renal crónica é nas suas características uma doença limitativa. As implicações da doença no organismo são várias e afectam todo o seu equilíbrio e homeostasia. A diálise é apenas um tratamento que visa repor o equilíbrio homeostático e eliminar as substâncias tóxicas no organismo. No entanto, pela insuficiência renal há alterações na produção de hemoglobina por vezes responsáveis por estados de anemia, frequentes nos doentes em diálise podendo também influenciar as respostas de cansaço (Hurst e Thomas, 2008). “Olhe sinto que isto cansa muito, não imaginava que a doença renal antes da diálise peritoneal que cansasse tanto. Desgasta muito mais daquilo que estava à espera. Por um lado, não é tão dramático como às vezes as pessoas pensam, vai desgastando. Desgasta uma pessoa em termos de cansaço. No dia-a-dia desgasta muito, não estava à espera que desgastasse tanto”. (EB-L191-195)

A luta por vezes em querer manter a sua actividade diária pode ser infrutífera, como já foi referido pelas características limitativas da própria doença. A maior parte dos participantes refere que o cansaço é evidente e que isso também está relacionado com a realização do tratamento. Associado ao cansaço e como reflexo emergem respostas de impotência, ou seja, de incapacidade de conciliar as suas anteriores actividades com a diálise. Na análise das entrevistas a maior parte dos participantes revelou sentirem-se incapazes de conciliar as actividades de vida diária e a realização do tratamento de Página 75

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DP. Reflecte-se essa incapacidade na vida social, profissional e familiar. As pessoas sentem que deixam de ser capazes de responder a todas as solicitações que antes mantinham e que faziam parte da sua identidade. “Na vida social reduzi imenso, não saio à noite, acabei com as reuniões, acabei com outras actividades que tinha de escutismo, e de outras coisas que ocupavam os tempo livres com as quais me cansava, isso abandonei, não consigo conciliar tudo. Eu se dou aulas até ao meio dia ou uma da tarde, chego a casa de rastos, cansado. Não consigo à noite ainda ir, ou à tarde ainda ir, há coisas que eu não faço porque estou cansado. Deixei de estabelecer contactos que estabelecia, a rede de contactos diminuiu porque depois também não a posso alimentar, digamos assim”. (EB-L138-144)

O facto de as pessoas abdicarem das suas actividades, seja de lazer ou profissionais, torna-as mais vulneráveis a respostas de cansaço, desânimo, tristeza e depressão. Sentimento falta de liberdade As pessoas ao utilizarem a expressão de “prisão” em relação ao seu tratamento de diálise exprimem fundamentalmente sentimento de falta de liberdade. A maior parte dos participantes referem-se à diálise como a sua “prisão”. “A minha vida andava muito por fora de casa e não tinha problemas, se fosse caso de dormir fora dormia em serviço e tinha lazer, mas deixei de fazer isso. Tenho de regressar sempre a casa, às vezes tenho uns períodos mais longos de férias ou de uns dias, mas levo a máquina e levo o material todo para cinco a dez dias mais ou menos. Às vezes portanto ia para casa de familiares passar o fim-de-semana, não posso, deixei de ir, deixei de fazer essa vida. De resto, à noite tenho que me limitar àqueles horários, tenho que estar preso não posso sair, por vezes tenho insónias, não posso sair. Tenho que ficar na cama, dou voltas na cama, mas pronto tenho que ficar não posso fazer mais nada. Limitou-me um bocado a minha vida sem dúvida em relação aos meus amigos, de vez em quando a gente saía para fora, ficávamos fora um dia ou uma noite e deixei de fazer isso, acabo por ficar em casa”. (EA-L77-87)

Da análise das entrevistas a vivência de uma resposta de falta de liberdade atribuído à diálise, permitiu perceber que a dependência do tratamento é demasiado penosa para a pessoa que o realiza. “Nisso é que me prende um bocado, porque é assim, eu só saio mais é à tarde, depois de almoço. Acabo de almoçar, faço o tratamento e depois é que tenho um bocadinho a mais. Eu tenho as minhas amigas que às vezes me convidam "é pá eu convidava-te para ir mais a gente a algum lado, mas tens de fazer o tratamento, depois não estás cá a tempo!". Eu digo-lhes se vocês forem, vão depois de almoço, porque eu faço de manhã, depois faço hà uma hora e depois tenho toda a tarde até às cinco e meia, seis horas”.(EC-L90-95)

Em todos os relatos a realização da diálise evidenciou respostas de limitação e restrição de horários contribuindo para as respostas desfavoráveis na vivência da pessoa no período de início da DP. “Cria-me algumas restrições porque tenho que fazer três vezes por dia, embora faça às 8 às 4 da tarde e meia-noite às vezes é limitativo. Temos que parar a para

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ir fazer diálise, agora tenho ajustado isso, às vezes não faço oito horas faço dez, faço 6, portanto tenho ido ajustando assim há medida das necessidades. Para já e numa primeira etapa teve alguma vantagem, obrigou-me a parar um bocadinho, obrigou-me a ir para casa às 4 da tarde, descansar, parar”. (EB-L82-87)

Desconforto A terapêutica por diálise peritoneal implica a permanência de em média de 2 litros de líquido de diálise a nível abdominal (Páez e Palma, 2006). Todo este volume poderá interferir com a capacidade de a pessoa de se movimentar ou realizar determinadas tarefas, traduzindo-se para ela numa resposta menos agradável, de desconforto. Por desconforto entende-se “Status Comprometido: posição da pessoa em relação a algo ou alguma coisa “ (Conselho Internacional de Enfermeiros, 2011, p.48). A presença do volume a nível abdominal compromete de certa forma a aparência corporal aumentando para um participante a sensação de desconforto. “Na minha vida pessoal posso dizer, que praticamente a única coisa que mudou foi deixar de trabalhar nas terras, porque é um trabalho duro e a única coisa que tenho dificuldade é andar abaixada, pelo volume da barriga, pelos tubos, com medo de os vincar ou fazer estragar qualquer coisa.(E) É um bocadinho mais de desconforto de ter este volume na barriga que não, a gente não se sente, a roupa não assenta tão bem, não se sente tão jeitosa, não se sente! Mas de resto, o convívio seja com a família, seja com amigos, a diálise peritoneal não me impede de nada disso”. (EG-L70-73/107-110)

As respostas vivenciadas no início da diálise, são na sua grande maioria vivências emocionais, um período de grande adversidade caracterizado por medo, preocupação, cansaço, ansiedade e por vezes estados de depressão. No entanto, a experiência em si também é traduzida pelos participantes, por respostas consideradas vantajosas e benéficas. “Em termos de diálise peritoneal, acho que tem muitas vantagens, permite alguma mobilidade. Eu já fui começando a mobilizar um bocado mais para fora de casa, a dúvida agora é quando eu sair do manual para o automático, como é que eu o posso fazer? Mas pronto, é uma contingência, uma adaptação de vida, não posso ir para todos os sítios, não se pode fazer exactamente a mesma vida que se fazia antes, adaptas-te com alguma facilidadeE” (EB-l197-202)

Respostas Beneficiadoras Para Rodrigues (2010, p. 20) “a diálise peritoneal apresenta-se como uma terapia dialítica domiciliária, a qual preserva a liberdade individual e veicula melhor a reabilitação do doente”. Os participantes identificaram as seguintes respostas beneficiadoras.

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Bem-estar O alcance do bem-estar físico, psíquico ou social é considerado fundamental para que a pessoa recupere do seu estado de doença e reiniciei um novo ciclo da sua vida (Alves e Afonso, 2011). Bem-estar é segundo o Conselho Internacional de Enfermeiras (2001, p.43) “um tipo de autoconhecimento com as seguintes características específicas: imagem mental de estar bem, equilibrado, contente, bem integrado e confortável por orgulho ou alegria e que se expressa habitualmente demonstrando relaxamento de si próprio e abertura às outras pessoas ou satisfação com independência”. O bem-estar poderá ser apenas percepcionado pela pessoa após um período de realização do tratamento no domicílio. Ou seja, inicialmente o processo complexo que é o início da DP não permite aos participantes alcançar os benefícios do tratamento. “Sinto-me bem. Quando fazia a manual preparava o material todo, punha a máscara e ia lavar as mãos, enxugava-as com papel, sempre enxugar as mãos de cima para baixo e ia para o quarto. Abria os sacos e depois dos sacos abertos, vinha outra vez lavar as mãos. Pendurava o saco e com cateter preparado para ligar. Depois tinha as compressas, ligava o cateter e abria. Drenava para o saco e depois infundia o líquido para dentro e assim sucessivamente, com todos os cuidados”. (ED-L74-79)

Após experienciar a diálise durante um período de tempo, as pessoas são capazes de identificar o seu bem-estar. “Está tudo bem. Foi a melhor coisa que escolheram para mim, vocês diziam-me que esta era melhor para mim, mas eu não acreditava. Mas agora sinto-me muito bem, uma pessoa não sabe para onde é que vai, estou bem assim como eu estou.” (EE-L110-112)

Alguns dos participantes consideram a DP vantajosa em relação a outras terapêuticas, nomeadamente a hemodiálise. “Não, eu só digo que a faça por muitos anos! Que a faça por muitos anos, se a tiver que a deixar de fazer tudo bem, mas se tiver possibilidade que faça esta por muitos anos. Porque entre esta e outra deixo-me estar com este rebuçadinho!” (EIL133-135)

Esperança O factor tempo é fundamental para a pessoa em diálise, pois ele permite que haja um período de adaptação. É necessário saber se existe uma adaptação ao tratamento e se isso lhes proporciona nova esperança na sua vida. Os participantes evidenciaram que após a fase inicial, se sentem confiantes de conseguirem ultrapassar todas as etapas em direcção à esperança do transplante renal (Blumental e Schwarz, 2009). “Optei pela DP e estou a fazer há cerca de ano e meio e estou muito satisfeita. Deus queira que aguente assim bastante tempo até vir o transplante e que não precise de ir

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para a hemodiálise, porque neste momento, se eu tivesse optado pela hemodiálise, aí sim, não sei, ainda estaria viva, mas acho que não.” (EG – L46-49)

A esperança é um tipo de emoção caracterizado por “sentimentos de ter possibilidades, confiança nos outros e no futuro, entusiasmo pela vida, expressão de razões para viver e de desejo de viver, paz interior, optimismo; associada ao traçar de objectivos e mobilização de energia” (Conselho Internacional de Enfermeiras, 2001, p.47). “Mas pronto, é uma contingência, uma adaptação de vida, não posso ir para todos os sítios, não se pode fazer exactamente a mesma vida que se fazia antes, adaptas-te com alguma facilidade. Retrospectivamente acho que tem funcionado tudo bem, a família também.” (EB – L200-202)

As pessoas após o período de início experienciam sentimentos de pertença, reconhecem as vantagens do seu tratamento e interferem directamente na prevenção de complicações cumprindo com a adesão terapêutica, reconhecendo que isso lhes trará uma nova esperança para a sua vida. Liberdade dietética De acordo com López e Melero (2006) a perda de função renal requer que as pessoas se privem de um grande prazer que é a liberdade de ingerir os alimentos que mais gostam. Os autores recomendam que os objectivos a cumprir com as pessoas, devem ser individualizadas e variadas, nas quais sejam abrangidas as necessidades de cada um. Referem ainda que, as pessoas com função renal residual têm a vantagem, relativamente aos anúricos (ou seja, que não urinam), de poder ter uma dieta mais livre de potássio e fósforo e têm menos problemas com os balanços hídricos, daí ser fundamental manter a diurese o maior tempo possível. A DP é a técnica que permite manter esta função por mais tempo traduzindo-se em menor expressão de comorbilidades associadas à perda da função renal residual. A resposta da liberdade dietética é vivenciada por um participante. “Não alterou mais nada, se eu for a uma festa posso comer de tudo, coisa que se eu fizesse hemodiálise já não podia ser, não é? Porque tinha de ter mais restrições na comida, na bebida e neste caso não tenho, convivo na mesma. É um bocadinho mais de desconforto de ter este volume na barriga que não, a gente não se sente, a roupa não assenta tão bem, não se sente tão jeitosa, não se sente! Mas de resto, o convívio seja com a família, seja com amigos, a diálise peritoneal não me impede de nada disso”. (EE-114-116)

Ausência de dor A dor na diálise peritoneal, poderá ter como causas a infusão ou drenagem do líquido peritoneal. Em outros casos pode ocasionar dor lombar (De La Torre, 2006). A dor na infusão ou da drenagem do líquido poderá estar relacionada com a posição do cateter Página 79

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junto à parede abdominal. A causa da dor lombar surge associada à presença do volume abdominal ou a outras patologias que a pessoa possa ter como antecedentes. No entanto, a DP é uma técnica que por norma é indolor (Rodrigues, 2010). “Acho que era um sofrimento muito maior, um desgaste muito maior e a diálise peritoneal dá-nos um conforto, podemos estar na nossa casa, no nosso ambiente, a fazer os nossos tratamentos desde que tenhamos a consciência que temos de cumprir horários e temos de ter regras. Temos de ter higiene, temos de ter os nossos cuidados mas acho que em termos de apanhar vírus ou apanhar qualquer contaminação estamos mais livres ao fazer este tratamento em casa do que propriamente vir ao hospital. Não quer dizer que o hospital não seja desinfectado e tudo mais, mas há muitas pessoas a vir ao mesmo local, a virem às mesmas máquinas a trabalhar com os mesmos materiais, ali não, somos só nós, somos só nós que mexemos, somos só nós que entramos claro, sempre com a precaução das máscaras, mas acho que é muito melhor. Não é doloroso, o que é também muito bom.” (EG-46-59)

Respostas interpessoais No contexto da vivência da pessoa em DP, as respostas interpessoais referem-se à percepção do próprio em relação aos familiares e aos amigos. Estanqueiro (2008, p. 45) diz-nos que “o sucesso nas relações interpessoais depende muito da capacidade de dar atenção, em cada momento, às necessidades concretas das pessoas com quem lidamos". Nas relações inter-pares um acontecimento crítico como seja o princípio de um tratamento, provavelmente afectará as suas relações e interacções. Familiares e Amigos A bibliografia distingue quatro perspectivas sobre a forma como a família, em que um elemento tem doença crónica, pode e/ou tem sido compreendida e envolvida nos cuidados de saúde: “recurso, défice, influência e impacte”(Sousa, Relvas e Mendes, 2007, p.26). Família segundo o Conselho Internacional de Enfermeiras (2001, p.45) é um “conjunto de seres humanos considerados como unidade social ou todo colectivo composto de membros unidos por consanguinidade, afinidades emocionais ou relações legais, incluindo as pessoas significativas”. Recurso As pessoas que experienciam mudanças complexas como seja o início de um tratamento de diálise, demonstram como são importantes os seus familiares e amigos para ultrapassar esta etapa inicial. Sousa, Relvas e Mendes (2007), falam-nos que a perspectiva de recurso por parte da pessoa aos familiares permite-lhes uma melhoria da condição médica e a aceitação do tratamento. Página 80

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Da análise realizada, as declarações significativas mostram-nos que a família é para a maioria dos participantes o seu recurso face à dependência do tratamento. A família e os cuidados familiares são o complemento do tratamento da pessoa fornecendo apoio e protecção. “Tive muito apoio da minha família, principalmente do meu marido e da minha filha que foram espectaculares, acompanharam-me sempre às consultas, acompanharam-me sempre para todo o lado que eu precisasse de ir e ajudaramme muito. Levámos os livros para casa, para lermos e para percebermos melhor a diálise, como era feita e como eram os cuidados que tínhamos que ter. Eles leram comigo, ajudaram-me a decidir e apoiaram-me muito e pronto. O meu marido ajeitou digamos assim, o que era preciso em casa, uma divisão só para a diálise. Optei pela DP e estou a fazer há cerca de ano e meio e estou muito satisfeita”. (EG-L40-47)

Também é referido pelos participantes que a ajuda dos amigos foi importante e que de certa forma contribuíram para uma vivência mais positiva no início da DP. “Não acreditaram que eu fosse mesmo entrar em diálise. Ainda hoje à pessoal que quando sabe fica um bocado espantado que estou em diálise e penso que foi para todos um choque. Sinto-me protegido por isso também, eles hoje têm algum cuidado comigo e tal, protegem-me de certa forma. Quando eu dizia “é pá não posso mais, estou cansado, não aguentoE”, eles não acreditavam, pensavam que eu me estaria a desculpar e isso foi um choque para eles”. (EB – L57-62)

Super-protecção A presença da doença crónica suscita na pessoa sentimentos em relação aos seus familiares. Alguns participantes referem que se sentem alvo de superprotecção pelos seus familiares. Sousa, Relvas e Mendes (2007), referem que perante a doença crónica, qualquer família tende a focalizar-se nas necessidades derivadas da doença, havendo implicações nas relações existindo por vezes a superprotecção e promoção da dependência da pessoa com a doença. “O meu marido ainda está desempregado, tanto a ele como a mim não. A ele é capaz de lhe estar a custar um pouquito mais, porque ele quer ir ali ou acolá e não gosta de me deixar sozinha. Ele quando pensa em sair tenho de ir sempre com ele. Já antes eram assim, fosse para onde fosse, ele não gostava de ir sozinho e eu ia sempre com ele, até para a fazenda. Parece que agora ainda ficou mais preocupado comigo, ficou assim. Todos os dias, não há vez nenhuma que eu faça ao tratamento que ele não me pergunte se está bem, o líquido está limpidozinho? Todas as vezes me pergunta, se me dói, se não dói, todas as vezes me pergunta. Por acaso, preocupa-se muito comigo nesse aspecto”. (EC-L81-88)

Um participante considera mesmo algo excessivo, mas benéfico a super-protecção dada pela sua família, o que contribui de forma positiva para a vivência no período inicial da DP. “Na minha vida familiar não implicou nada, pelo contrário, acho que até ajudou bastante. Que se eu tinha uma família muito unida, desde que entrei em diálise peritoneal mais unida e mais preocupados. Eu noto às vezes até preocupação a

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mais comigo, às vezes gostava de fazer as coisas mais à minha vontade e eles ralham comigo de eu fazer algum esforço ou de euE Às vezes digo "eu não estou inválida, estou apenas a fazer um tratamento, mas eu sei que consigo fazer a minha vida normal". Nesse aspecto, acho que nos uniu mais ainda e noto neles que tem sempre uma preocupação. Se eu for para agarrar uma coisa qualquer e um deles tiver ao pé de mim "deixa estar que quem pega nisso sou eu", prontos, para eu não fazer esforço (++), com aquela preocupação de alguma coisa me fazer mal”. (EG-62-70)

Afastamento Rolland (citado por Sousa, Relvas e Mendes, 2007, p. 30) afirma que “o tratamento convencional duma doença crónica pode salvar o paciente, mas também pode causar danos irreparáveis na família”. O impacto que a doença crónica poderá ter na família, trará na opinião de Sousa, Relvas e Mendes (2007) alterações no funcionamento (estruturais), no processo e emocionais. O isolamento social da família é frequente e poderá fragilizar e perturbar as relações familiares, principalmente quando são criados estigmas em relação à doença, ou seja, nas várias análises realizadas às entrevistas encontra-se na experiência dos participantes diferentes respostas em relação aos seus familiares e amigos. Enquanto algumas pessoas realçam o seu papel de recurso, outros referem que a sua doença provocou um afastamento dos mesmos. “Ainda hoje a família nomeadamente os filhos não lidam bem com a situação, pronto sabem que eu faço diálise, tudo bem, mas não entram no quarto quando eu estou a fazer diálise, não gostam quando eu mostro o cateter, não gostam que eu verbalize ou exteriorize a situação da diálise portanto preferem o pai como estava”(E) Mudanças, brinco um bocado com o cateter dizendo que é a algália e tal, mas a família não gosta muito da brincadeira. Para mim pronto, essas coisas estão cá, mas parece-me que afecta mais os outros quando mostro o cateter a alguém. Em termos da família, acha que é uma situação que não deve ser mostrada, verbalizada, não há necessidade. (EB-L44-48/88-92)

As relações conjugais também poderão sair fragilizadas pelo processo de vivência da doença crónica e do tratamento. Esse afastamento trará implicações em todos os aspectos relacionais e, como refere um participante, esse afastamento provocou alterações profundas na sua relação conjugal. A pessoa ao não ser aceite no seu seio familiar sente-se incompreendida e culpa a doença pela sua situação. “O marido é que não aceitou lá muito bem, ele é daqueles (E) depois o homem também, é uma pessoa que, eu venho para Coimbra e ainda agora me esteve a ralhar, quando eu disse que ia para Coimbra e disse "mas (E) que vais fazer para Coimbra tanta vez?" Depois a minha filha mais nova que estava lá disse-lhe "Oh pai ela vai para Coimbra porque precisa", por isso é que eu digo que ele é um bocado antiquado. Mas se fosse ele a precisar não era bem assim, ele não tem compreensão”. (EE-L48-55)

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Profissionais e Sociais O encarar da doença como a IRC e a aprendizagem da técnica de diálise domiciliar, constitui uma profunda alteração nas relações familiares, profissionais e sociais (Marques, 2011). O início da diálise pode tornar mais vulnerável a vida individual e colectiva da pessoa, e qualquer que seja a sua idade ela comporta distúrbios e desajustes em relação aos padrões convencionais de vida em sociedade. Marques (2011) refere-nos que as implicações sociais mais frequentes são o desemprego, a inversão do papel na família, alterações na vida social, na auto-estima e na função sexual”. Desemprego Na opinião de Blumental e Schwarz (2009) para a maioria das pessoas em DP as implicações financeiras e económicas do tratamento são a maior fonte de insegurança e preocupação. Referem também que, o emprego não só fornece à pessoa uma renumeração, mas também socialização, auto-estima e segurança financeira.

Desemprego ou taxa de desemprego é caracterizado pela “taxa relativa de indivíduos incapazes de conseguir um trabalho ou emprego renumerado” (Conselho Internacional de Enfermeiras, 2001, p.67). Marques (2011) diz-nos que em diálise peritoneal contínua ambulatória, a pessoa efectua em média 4 sessões por dia, com 30 minutos cada, o que totaliza cerca de 728 horas anuais. Se optar pela diálise peritoneal automática, totalizará uma média de 8 horas de tratamento dialítico por noite. Estes números são impressionantes acarretando para a pessoa uma grande exigência de tempo disponível para a realização do seu tratamento. Muito frequentemente a solução mais habitual perante a realização da diálise e a sua exigência de tempo, é o desemprego. Esta realidade é frequente nas pessoas que iniciam diálise, com todas as consequências sócioeconómicas que acarreta uma situação de desemprego. Na análise das entrevistas, os participantes referem que foi o desemprego, a situação que mais contribuiu para uma vivência menos positiva da DP. As pessoas sentem-se inúteis perante a sociedade e isso influencia a sua relação com a mesma. “Senti-me um bocado inútil para a sociedade, uma vez que também não podia trabalhar. É que não podia mesmo fazer nada. Ainda agora em Dezembro estava de rastos, agora hoje não, agora estou em forma! Antes estava sempre a pensar se me ia doer ou não, agora não, agora movimento-me e agora sinto-me desatado psicologicamente. É assim, enquanto tiver que fazer isto, sinto sempre que tenho um empecilho. Tenho de fazer a diálise é um empecilho para tudo, vida social também”. (ED-L41-46)

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No entanto, também é referido por outros participantes que a opção pela DP permitiulhes adequar melhor os horários de tratamento e de trabalho. Mas, referem que não conseguem produzir o mesmo volume de trabalho e isso interfere na sua vida profissional. “No trabalho houve algum cuidado em reduzir a carga lectiva, de qualquer forma isto interferiu muito no trabalho, basta dizer que estava a fazer o doutoramento e desisti de fazer o doutoramento porque fiquei sem capacidades de o fazer. Quando tenho muitas aulas seguidas, os próprios alunos reparam, e alguns enfim dizem-me "está muito cansado" ou "está muito desgastado". Alguma visualização externa desta situação que eu a dada altura não reparo, mas não tenho a mesma capacidade, nem de longe nem de perto. Não tenho a possibilidade de desenvolver a mesma capacidade de trabalho, que se vai reflectir na avaliação.” (EB-L123-130)

O recurso ao desemprego é uma realidade vivenciada pela maioria dos participantes que deixaram de trabalhar por não se sentirem capazes de corresponder aos objectivos traçados. “Na minha vida pessoal posso dizer, que praticamente a única coisa que mudou foi deixar de trabalhar nas terras, porque é um trabalho duro e a única coisa que tenho dificuldade é andar abaixada, pelo volume da barriga, pelos tubos, com medo de os vincar ou fazer estragar qualquer coisa. É mais por aí porque de resto a vida normal de casa, faço a vida normal.” (EG-70-74)

O desempenho profissional da pessoa é um factor importante e determinante para o seu bem-estar. A pessoa que é profissionalmente activa não vivencia de forma acentuada sentimentos de dependência, angústia e desespero. Assim, a inserção e manutenção da vida profissional de pessoa em DP está directamente associada a um melhor estado geral (Marques, 2011). Isolamento Social A fim de cumprir com o tratamento, a pessoa vê-se confrontada com a necessidade de cumprir horários, existindo assim um menor contacto com os amigos e menor frequência dos locais habituais (Marques, 2011). Por sua vez, a menor socialização das pessoas acaba por isolá-las tornando-as vulneráveis. O isolamento social foi vivenciado por alguns participantes na pesquisa, contribuindo de forma negativa para o seu processo de vivência da DP. Por isolamento social entende-se como a pessoa ter o seu “status: comprometido” (Conselho Internacional de Enfermeiros, 2011, p.60). Este isolamento social poderá comprometer a experiência de diálise e surge associado ao receio de prejudicar a sua saúde.

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“Deixei de estar (~~~~~) com os meus amigos. Deixei de estar, eu muitas vezes, quer dizer, por exemplo, eu durante a segunda, terça, quarta e quinta é muito raro eu sair à noite, à sexta é que saía, ia um bocadinho ao café estava ali um pouco com os meus amigos. Agora também deixei de ir, deixei de ir porque também sou um bocado pessimista, sou um bocado pessimista porque "é pá, vou ali à casa de banho fazer um xixi, e eu sei lá quantas pessoas não vão ali, depois tenho medo é o problema de apanhar alguma peritonite, é isso”. (EF-L84-89)

Todos os participantes referem que o principal factor que intervém na sua vida social subsiste no facto de o tratamento impor restrições e limitações de horários. Dependendo da modalidade que o participante optou esta poderá limitar os horários durante o dia ou restringir-lhe a liberdade durante a noite. Alves e Afonso (2011, p. 22) são da opinião que a resposta de uma pessoa à doença e ao tratamento dependerá da “sua personalidade, da extensão do suporte familiar, dos amigos e da evolução da doença subjacente”. “Eu tenho as minhas amigas que às vezes me convidam "é pá eu convidava-te para ir mais a gente a algum lado, mas tens de fazer o tratamento, depois não estás cá a tempo!". Eu digo-lhes se vocês forem, vão depois de almoço, porque eu faço de manhã, depois faço há uma hora e depois tenho toda a tarde até às cinco e meia, seis horas. Assim, depois tenho esse tempo todo, mas muitas das vezes, como elas não sabem, eu explico-lhes, mas elas não sabem já não me dizem tanto. Já não me convidam tanto (E)” (EC – L92-97)

As pessoas insuficientes renais vêm a sua vida sofrer mudanças profundas relacionadas com a necessidade da diálise. Ao realizarem-na, as suas respostas no período de inicial são de expressão emocional negativa como o medo, a preocupação, ansiedade, depressão, cansaço, falta de liberdade e desconforto. Estas emoções estão relacionadas com a natureza do tratamento que é baseado no auto-cuidado, na aprendizagem e realização de uma técnica no domicílio. No entanto, após o período de inicio experienciam sentimentos de bem-estar, esperança, liberdade dietética e ausência de dor como resultado de um processo de auto-ajustamento da pessoa à doença e tratamento. Na relação com os outros, a pessoa em DP vive as repercussões que o tratamento exerce no seu seio familiar e de amigos. Estes são para a pessoa a sua fonte de recurso e de protecção. No entanto, também está consciente que o facto de realizar um tratamento em casa poderá provocar um afastamento dos mesmos, traduzindo-se numa maior dificuldade para a pessoa de viver de forma positiva o período de início da diálise.

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As profundas alterações provocadas pela necessidade do tratamento também se repercutem a nível profissional e social. As pessoas vêm-se por vezes forçadas a situações de desemprego e de isolamento social, fundamentalmente pela obrigação de cumprimento dos horários dos tratamentos e cuidados na sua realização.

2.5 – “FAZER AS TROCAS À HORA CERTA H” “Primeiro foi a parte da higiene, fundamental para o tratamento. Depois, portanto o próprio tratamento em si, explicaram-me como é que se fazia a manual e como se faz a automática, aprendi cada uma a seu tempo como as coisas se faziam, mas não foi difícil. A manual aprendi aqui, a automática foi em casa. Foi uma senhora enfermeira que lá foi explicou-me o que é que se passava e começou a funcionar até hoje. Fundamentalmente foi Era ter cuidado com os horários para fazer as trocas à hora certa, aquela hora, e sim ter que verificar como estava o líquido que saía, se estava transparente ou não e hoje continuo a verificar a mesma coisa. Fundamentalmente temos de ter cuidado com todo o material que estamos a utilizar para não aparecer lá qualquer impureza ou sujidades. Fundamentalmente é isso. Hoje faço este tratamento um bocadinho à vontade, sem aquele receio de estar a pensar em todas as coisas e tal. Hoje já faço mais ou menos as coisas de forma automática, por acaso nunca me enganei.” (EA114-125)

2.5.1 – Mudanças experienciadas na realização da diálise peritoneal

A transição ocorre devido a um evento significativo ou ponto de viragem que exige novos padrões de resposta. Meleis e Schumacher reforçam a ideia que uma transição implica um processo de mudança (Abreu, 2011).

Na opinião de Schumacher e Meleis (citado por Abreu, 2011) as transições desenvolvem-se em determinados períodos de tempo, sendo o tempo um factor fundamental. No caso das pessoas em DP verificou-se ser necessário um período de tempo, um trajecto de vivência da doença e do tratamento que permita evidenciar as mudanças ocorridas. As transições podem por vezes ter reflexos na mudança da esfera identitária, papéis sociais e padrões de comportamento. Elas poderão ser sequenciais, múltiplas estando ou não relacionadas. Na opinião de Chick e Meleis (citado por Abreu, 2011) referem que as transições são complexas e multidimensionais, nas quais é possível verificar importantes características sobre a mudança. Para os autores todas as transições implicam mudança, mas nem todas as mudanças significam transição. Os autores defendem que as transições são produtos da mudança e resultam em mudança. Página 86

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Neste processo reitera reiteram a necessidade de perceber o significado icado que a mudança tem para a pessoa e aler alertam que estas podem ocorrer a nívell de todas as realidades humanas (representa entações e cognições). A figura seguinte te mo mostra-nos como a pessoa experiencia ia as mudanças no seu processo de transiçã nsição para o início da DP. As mudanças ças q que ocorrem devem funcionar entre si como com um motor em constante rotação, para que qu a pessoa vivencie os seus processos os de forma simultânea e que estes ocorram rram de modo estável e sereno. A correcta cta articulação a entre as diferentes mudanças anças experienciadas é vantajoso para o bem bem-estar físico, psicológico e social da a pes pessoa. Da análise da informação dos partic participantes emergiu um conjunto de mudanças anças que enquadramos em dois grupos de ssignificados agregados. A necessidade e de adesão ao regime terapêutico através és da aprendizagem da técnica e do auto-cuid cuidado para a DP. A gestão do regime e tera terapêutico através da adopção de um estilo tilo de vida que comporte os horários dos tratam ratamentos influenciando os hábitos de vida.

Figura 5 – Mudanças experienciadas pela pessoa a em DP

Como já referimos, Meleis Me et al., (2000) falam-nos que os resultad sultados de uma transição traduzem-se em mu mudança, e através da aquisição de ccompetências e de comportamentos nece necessários para gerir as suas novas situações ações permitem que este processo ocorra de m modo mais saudável. Para além das pesso pessoas necessitarem de adquirir competências ências e saberes para realizar o tratamen tamento, ao fazerem-no experienciam novas vas cconcepções sobre si mesmo, perguntando ando-se o que fazem de diferente? É o que e faze fazem de diferente, que lhes permite serem m dife diferentes.

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A adesão ao tratamento de DP é fundamental para que a transição ocorra de modo sereno e aliviando gradualmente a pessoa dos sintomas da insuficiência renal. No entanto esta poderá estar comprometida pela agressividade das intervenções necessárias para o início da diálise e em certos casos a adesão poderá estar condicionada pelos efeitos colaterais ou complicações que poderão surgir durante a permanência em DP. Adesão ao regime terapêutico na diálise peritoneal A adesão do regime terapêutico é caracterizada pelo desempenho de “actividades para satisfazer as exigências terapêuticas dos cuidados de saúde; aceitação do decurso de tratamento prescrito como prestador de cuidados ou apoiante” (Conselho Internacional de Enfermeiras, 2001, p.58). Da análise da informação, os participantes, na sua

maioria evidenciaram

comportamentos de adesão ao regime terapêutico. “Não, já não trabalho, já não trabalho, faço às vezes uns trabalhos para o tribunal mas isso não impede que venha para casa, o próprio Portugal é pequenino. Vou e venho, se for para o Minho vou e venho no mesmo dia, se for para o sul vou e venho no mesmo dia”. (EA-L89-91)

Demonstraram também a aquisição de capacidades e desenvolvimento de aptidões. Todos os participantes referiram que aprenderam a fazer o tratamento e a “lidar” com a doença, o que lhes implicou aprenderem a executar procedimentos rigorosos e exigentes. “Lembro que tive que saber lidar com a doença com toda a higiene. O que eu aprendi aqui no hospital com vocês e tive aprender a lidar com o problema, com a higiene e segurança e pronto.(E) Aprendi a fazer o penso, a pôr a máscara, a lavar as mãos em condições e a desinfectá-las. Não tocar com as mãos em nada e aprendi também que no local onde estivesse a mudar o penso e a fazer a diálise tinha que ter tudo desinfectado, as portas fechadas e não podia ter lá ninguém dentro. Aprendi muita coisa” (ED – L57-60).

Aprendizagem da técnica de diálise peritoneal Por aprendizagem de capacidades, entende-se ser um tipo de aprendizagem caracterizada pela aquisição do domínio de actividades práticas associadas a treino, prática e exercício (Conselho Internacional de Enfermeiras, 2001). A aprendizagem da técnica de DP está muito relacionada com o ver fazer e fazer por repetição. Todos os participantes referem que o ver fazer e depois o experimentar possibilitou-lhes adquirir as capacidades necessárias para a realização do seu tratamento.

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“(E) eu no princípio tinha uma pessoa ao meu lado a ver se eu fazia bem ou fazia mal, às vezes tinha dúvidas ao lavar as mãos, mas com o tempo, aprendi rapidamente. Em casa também foi a mesma coisa, também, em questão de higiene já sabia o que tinha que fazer na manual. Depois experimentei três vezes na máquina também, ao segundo dia já sabia, mas eu sou um bocado, eu não gosto muito de andar a chatear as pessoas. Ao segundo dia já sabia e depois até disse à enfermeira L se podia ir lá no terceiro dia para ver se eu fazia bem e ela esteve lá a ver bem e ela disse-me que eu estava mesmo apto a fazer sozinho. E a partir daí até hoje, não tenho tido problemas...” (EF-L114-123)

O programa de treino realizado pelo enfermeiro durante o período de aprendizagem, tem por objectivo fornecer à pessoa/cuidador a informação necessária para se adaptar à sua nova circunstância, potenciar o seu autocuidado e permitir o desenvolvimento de capacidades de adesão e gestão do seu regime terapêutico (Magalhães et al., 2011). Estão descritas na literatura as recomendações de como esse treino e ensino deve ser feito e qual o seu conteúdo. Este deverá ser estruturado e deverá englobar todos os assuntos que estejam relacionados com os procedimentos da técnica e as implicações na vida da pessoa (Wild, 2008). No entanto, já descrevemos que o início da diálise é uma fase caracterizada pelos níveis elevados de ansiedade e medo influenciando assim, o processo de aprendizagem. Para Armangué e Suaréz (2006) a aprendizagem é uma capacidade cujo desenvolvimento se efectua de forma individual ao longo do processo evolutivo. O ensino deve ser realizado de um modo contínuo durante o tempo em que a pessoa permanece no programa de DP da unidade. Da informação analisada, a maior parte dos participantes refere que precisou de 3 a 4 dias para receber o ensino inicial sobre a técnica de DP. A construção do conhecimento resultante da aquisição de saberes, difere de pessoa para pessoa, todos nós somos diferentes e temos diferentes maneiras de aprender e de ensinar. Thomas (2009) refere-nos que para se assegurar a melhor possibilidade de ensino e de aprendizagem, deve-se ter em atenção os diferentes estilos de aprendizagem da pessoa e as possíveis barreiras à aprendizagem (físicas, psicológicas ou ambientais) tornando-se necessário o desenvolvimento de um plano de ensino para cada unidade. Para Berbaum (1993, p.13) a aprendizagem é “como o processo de construção e assimilação de uma nova resposta, isto é, um processo de adequação do comportamento, seja ao meio, seja ao projecto perseguido por cada interessado”. Assim, para que a pessoa aprenda a realizar o tratamento precisa de construir na sua Página 89

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memória os passos necessários para uma correcta realização. Um ensino estruturado, sistemático e contínuo trará benefícios para a pessoa através da correcta execução dos procedimentos e a identificação das possíveis complicações. O acompanhamento é fundamental no processo formativo da pessoa para que esta não abandone a técnica perante o aparecimento das primeiras dificuldades. A consciencialização e a percepção das implicações relacionadas com a realização do tratamento requerem um período de aprendizagem e de treino. A pessoa, através dos ensinos do enfermeiro, executa os passos, repetindo-os até o enfermeiro avaliar se a pessoa está apta a realizar o seu próprio tratamento no domicílio (Magalhães et al., 2011). Palangana (citado por Petronilho, 2007, p.59) refere-nos que, existe um aspecto básico na forma da compreensão de como o sujeito aprende e se desenvolve. Na sua opinião refere que “a aprendizagem e o desenvolvimento do pensamento pressupõem sempre uma relação entre o sujeito e o objecto do conhecimento”, ou seja, para a pessoa aprender terá de contactar com os procedimentos e assim interpretá-los e guardá-los na sua memória para depois ser capaz de novamente executar a sua tarefa. Da análise das declarações significativas, os participantes referem que inicialmente sentem uma grande apreensão sobre a aprendizagem, por pensarem que não são capazes de o fazer sozinhos, referindo dificuldades na manipulação dos componentes relacionados com a diálise, principalmente na manipulação do sistema nas conexões para a infusão e drenagem do líquido peritoneal. “Foi muito difícil aprender, a manipular aquela coisa e meter naqueles três buracos, parece que não via nada daquilo.(E) Dificuldade em não saber, depois ir para casa e errar aquela coisa e meter no buraco onde não devia de ser. Por acaso, aconteceu-me algumas vezes, mas depois reparei o erro. A L estava lá para ver”. (EE – L91-96)

Mas, a maior parte dos entrevistados referem na sua maioria que precisaram de poucos dias para perceberem a técnica e a sua execução. ”Sim lembro-me, tive aqui internada cerca de uma semana mais ou menos os primeiros dias a ver fazerem-me e depois comecei eu, a pouco e pouco a fazer até que não foi difícil, não é difícil, não acho que isto seja uma coisa difícil de aprender”. (EG-L112-114)

Na explicação das suas experiências descrevem em pormenor os procedimentos que aprenderam. Página 90

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“Olhe, tive que aprender a fazer o penso, a desinfectar as mãos. Eu para desinfectar as mãos antigamente ou para as lavar era a fugir, era tudo à pressa e de fugida. E tive que aprender a fazer diálise sozinho, que eu cá gosto pouco de encostos, que andem atrás de mim, se eu ando a fazer as coisas bem ou se ando a fazer mal. É só essa parte mais nada”. (EH-43-46)

De facto, inerente ao processo de aprendizagem emerge a necessidade de as pessoas desenvolverem competências para cuidar de si próprias, sendo este o principal objectivo para a adesão ao regime terapêutico. Neste estudo, as pessoas adquirem competências através do ensino, para o auto-cuidado o qual é realizado exclusivamente pelo enfermeiro. Auto-cuidado em diálise peritoneal A DP exige a aprendizagem de uma técnica e conhecimentos que possibilitem à pessoa realizar o seu tratamento domiciliar, ou seja, tem de ser preparada para o autocuidado para a DP. Auto-cuidado é definido pelo Conselho Internacional de Enfermeiras (2001, p.41) como “uma actividade executada pelo próprio com as características específicas: tratar do que é necessário para se manter, manter-se operacional e lidar com as necessidades individuais básicas e intimas e as actividades da vida diária”. Um participante relatou minuciosamente os cuidados que tem para com o tratamento. “Quando fazia a manual preparava o material todo, punha a máscara e ia lavar as mãos, enxugava-as com papel, sempre enxugar as mãos de cima para baixo e ia para o quarto. Abria os sacos e depois dos sacos abertos, vinha outra vez lavar as mãos. Pendurava o saco e com cateter preparado para ligar. Depois tinha as compressas, ligava o cateter e abria. Drenava para o saco e depois infundia o líquido para dentro e assim sucessivamente, com todos os cuidados. A máquina, sobre a máquina, eu uma hora antes meto um saco a aquecer e meto a cassete em cima, depois à volta das 10h30, 11h meto os sacos em cima da cama e preparo tudo. Meto a máscara e vou lavar as mãos, enxugo-as não é? Volto para o quarto onde abro os sacos todos, no fim de estar todos os sacos abertos, desinfecto a mesa e a bancada onde o saco vai ficar de noite. Desinfecto-a, limpoa e volto a lavar as mãos. Desinfecto-as, depois penduro um saco no pendural, parto e o líquido fica a escorrer a misturar um líquido com o outro, este é o que vai ficar toda a noite em cima da máquina. No fim dos sacos estarem todos pendurados, vou acabar de montar a máquina, abro a parte da cassete, agarro na cassete, meto-a e fecho-a. Depois começo a ligar os sacos até ao final. Quando faltam 3 sacos ligo a máquina, depois faz o auto-teste e depois sigo os sigamentos da máquina. Depois espero que a máquina me chame, depois deito-me.” (ED-L7489)

O auto-cuidado, a autonomia, e a independência são na opinião de Abreu (2011, p.110) “simultaneamente processos que podem condicionar a mudança mas que podem também eles próprios serem o resultado de mudanças, sejam elas vivenciadas positiva ou negativamente”.

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Todos os participantes revelaram que ao aprenderem a realizar o tratamento, também aprenderam a cuidar de si próprios, evidenciando os cuidados na preparação do material para o tratamento, na execução da técnica e nos cuidados ao orifício do cateter peritoneal. “Sim, tive que aprender os métodos exigidos e os melhores métodos para que isto corresse sempre bem, por causa sobretudo das infecções, não é? Tive preparação cá no hospital, que fui muito bem ensinado, penso eu, e recebi muito bem a lição. E que hoje já faço isso realmente, já está treinado e já se faz aquilo pronto, mecanicamente”. (EI-L72-75)

A evidência de comportamentos de adesão ao regime terapêutico são fundamentais para o bem-estar da pessoa enquanto portador de uma doença crónica. Este regime vai para além dos tratamentos de diálise, requer que a pessoa cumpra a toma correcta da medicação e que adira às orientações dos profissionais de saúde em relação à alimentação, exercício físico, higiene e prevenção das complicações relacionadas com a DP. Gestão do regime terapêutico na diálise peritoneal Gestão do regime terapêutico é um tipo de comportamento de adesão caracterizado por “executar as actividades, cumprindo um programa de tratamento da doença e das suas complicações, actividades essas que são satisfatórias para atingir objectivos específicos de saúde, integrar actividades para tratamento ou prevenção da doença na vida diária” (Conselho Internacional de Enfermeiras, 2001, p.58). A exigência da necessidade de realizar o tratamento transforma a pessoa como actor principal na gestão do seu regime terapêutico, capacitando-o com os conhecimentos necessários para a prevenção de complicações. Os participantes no estudo têm consciência do que é necessário para evitar o aparecimento de complicações, nomeadamente infecciosas. “Usar máscara, lavar as mãos e ter tudo desinfectado. É o que eu faço sempre, por isso é que ainda não ganhei nada”. (EE-L118-119)

Na opinião de Magalhães et al., (2011), é essencial enfatizar a responsabilidade do doente face ao seu tratamento, fazendo-o compreender e assumir como é importante a sua participação e colaboração para o êxito da técnica. “Pois eu quando comecei na manual, é pá disse " eu gostava mais da manual" (E) mas eu se fosse fazer a minha opção para a manual era muito chato porque não podia trabalhar não é? Tornava-se mais grave para a minha situação e estou-me a dar bem com a máquina.” (EF – L125 – 130)

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Horários do tratamento As mudanças que o tratamento impõe restringem o quotidiano pela necessidade de cumprimento de horários. Gerir o seu regime terapêutico, requer que as pessoas desenvolvam estratégias que lhes permita alcançar o bem-estar no quotidiano enquadrando as suas potenciais limitações. Emergiu da análise dos resultados que os participantes passaram a viver a sua vida em função dos horários dos tratamentos. “A única coisa que modificou é cumprir com os horários dos tratamentos, ou seja, se eu tiver num almoço, ou se tiver numa festa ou num casamento ou uma coisa assim, sei que àquela hora tenho que vir a casa fazer o tratamento, porque de resto, vou às compras na mesma, vou passear de vez em quando aos fim-desemanas, só que em vez de sair de manha e não ter horas para voltar a casa, sei que tenho que voltar para fazer o tratamento esteja aonde estiver. Vá para onde for tenho que organizar o tempo, as horas, de modo àquela hora estar em casa, eu tento o máximo possível ser rigorosa com as horas do tratamento”. (EG-L8187)

Hábitos de vida Os hábitos de vida dos participantes alteraram-se pela necessidade de cumprir com as exigências da doença e do tratamento. Mas, apesar de os participantes referirem que se alterou significativamente o seu modo de vida, acabam depois por referir que se adaptam com alguma facilidade. “Mas pronto, é uma contingência, uma adaptação de vida, não posso ir para todos os sítios, não se pode fazer exactamente a mesma vida que se fazia antes, adaptas-te com alguma facilidade. Retrospectivamente acho que tem funcionado tudo bem, a família também.” (EB – L200-202)

Na adesão e gestão ao regime terapêutico como mudanças nas vidas das pessoas em DP, salientamos um estudo de Gray et al., (citado por Abreu, 2011) no qual refere como sendo importante aprofundar quatro dimensões na adesão ao regime terapêutico por parte dos profissionais. Envolver as pessoas no seu tratamento, saber lidar com as resistências proporcionando alternativas, promover acções educativas e gerir discrepâncias para prevenir o abandono ou o aparecimento de complicações relacionadas com o tratamento, são aspectos importantes também para as pessoas que realizam DP. Assim, o processo formativo de aprendizagem de competências relacionadas com a técnica e com o auto-cuidado requer que o enfermeiro envolva a pessoa no seu processo de reabilitação. Este deve ser acompanhado de forma sustentada e contínua para que a pessoa se sinta confiante e segura na realização do tratamento. As mudanças que ocorrem na pessoa através do desenvolvimento de capacidades de gestão e da adopção de comportamentos de adesão em relação ao seu tratamento Página 93

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produzem reflexos na sua identidade. Esta altera o seu comportamento e vive em função do que é permitido pela diálise peritoneal. “Não alterou mais nada, se eu for a uma festa posso comer de tudo, coisa que se eu fizesse hemodiálise já não podia ser, não é? Porque tinha de ter mais restrições na comida, na bebida e neste caso não tenho, convivo na mesma.” (EG – L105 – 107)

2.6 – “FAZER UM PROGRAMA DE VIDA, ORGANIZAR O TEMPOH” “E depois fazer um programa de vida, organizar o tempo de modo a poder fazer os tratamentos, não é? No meu caso que trabalho e trabalho a 7 km de casa, consegui ter possibilidades de fazer no emprego porque reúno condições. Segundo que a colega foi ver e que reúno condições, até lá foi ver duas vezes e isso também facilita um bocadinho a perca de tempo, transporte e que possa estar mais acessível esta muda (E) Facilitou também uma parte do equipamento para fazer uma segunda troca noutro local, não é? Temos o problema do caso de uma saída ao domingo que é mais (~~~~~~) por causa dos horários. Não por sistema, mas tenho feito já só três. O médico também me deu essa autorização, que não abusasse e faço-o. E pronto é uma questão de organização de vida que a gente têm. Eu por exemplo faço férias, quase todos os fim-de-semana vou para a praia porque tenho uma casa na praia, agarro na maquinazinha levo-a, levo o aquecedor, levo e tenho lá condições. Levo os equipamentos e faço lá também e teve que se realmente fazer um programa de vida diferente, não é? Para quem tinha uma actividade como eu tinha, de muitas reuniões até à noite, tenta-se conciliar uma coisa com a outra. Como há um espaço de 4 a 6h de muda dá espaço para que nós possamos programar a vida, não é?” (EI – L37-53)

2.6.1 – (Re) construção do quotidiano

Meleis et al., (2000) falam-nos que como consequência da mudança, as “experiências de transição têm sido caracterizadas como resultando numa reformulação da identidade”. A pessoa que experiencia a aprendizagem de uma técnica de diálise para manter a sua vida, não é mais a pessoa que era antes de depender de diálise. Passou pela crise de identificar-se como sendo doente renal e percebeu a diálise como uma necessidade. Para isso precisou de aprender todos os procedimentos para gerir e manter o equilíbrio da sua vida e a partir daí (re)definir novos objectivos. A figura seguinte demonstra, como da análise da informação das entrevistas os participantes construíram a sua nova identidade. Ou seja, perante as mudanças que tiveram que realizar no seu quotidiano, também houve necessidade de o (re)construir através da adopção de comportamentos de adesão e passaram a viver a sua vida familiar, profissional e social em função da DP com necessidade de (re)definição de novos objectivos de vida. Página 94

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Antes de conhecerem cerem a doença, todas as implicações da doen doença e do tratamento eram-lhes desconheci nhecidas. Ao viveram as mudanças e ao o ex experienciar todas as transformações que vã vão ocorrendo no seu quotidiano, as pessoa essoas desejam que este decorra sem problema blemas e complicações até ao transplante. Oss par participantes do estudo referem que esse e é o seu novo objectivo de vida, ser transplanta plantado para recuperar a sua liberdade e indepe ndependência da diálise. “Uma sugestão o e em relação ao transplante, nós que temos a hipótese de ser transplantado rins e pâncreas deveríamos ser primeiros. Porque ue o pâncreas é só até aos 45 anos os e se eu for só transplantado de rim, depois o pâ pâncreas dá outra vez cabo do rim. im. A Acho que o estado devia ajudar mais os doentes, tes, deviam arranjar um trabalho para ara as pessoas, sempre andava a fazer mais algu alguma coisa e não ficava tanto em m ca casa. Para os doentes em peritoneal, acho que ue d devia haver mais apoio no material rial a fornecer, é pouco.” (ED – L 108-113)

Comportamen mentos de adesão ão à diálise periton itoneal (Re)Construção do quotidiano

Vida familia miliar, social al e profissional nal em função da D DP

(Re)definição ição dos objectivoss de vida Figura 6 – (Re) construção do quotidiano iano

Comportamentos s de adesão à diálise peritoneal Por comportamento nto d de adesão, entende-se que é um tipo o de comportamento de procura de saúde caracterizado cara pela “acção auto-iniciada para ra pro promover o bem-estar, recuperação e reabilit eabilitação, seguindo as orientações sem desvio desvios, empenhado num conjunto de acções ões o ou comportamentos” (Conselho Internacion nacional de Enfermeiras, 2001, p.57). os na mudança da esfera De acordo com Abreu (2011, p.45) as transições “têm reflexos identitária”, ou seja, a pessoa antes da doença e do tratam tratamento detinha uma determinada identidade tidade, e que ao sofrerem as mudanças e ao o exp experienciá-las de certa forma necessitam de ((re) construir essa mudança na sua “esfera sfera iidentitária”, para que de forma serena a alc alcancem a transição, implicando o assum assumir dos papéis de

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responsabilidade no seu tratamento, no envolvimento da construção de novos projectos de vida tendo como objectivos melhorá-la e adaptá-la ao seu bem-estar. Mendes, Bastos e Paiva (2010, p.14) falam-nos que “o modo como cada pessoa encontra, ou reencontra, o seu bem-estar emocional, o seu bem-estar nas relações que estabelece nos contextos em que se insere e o nível de mestria conseguido que lhe permite viver face a determinada situação, revelam o resultado no processo de transição”. Revelando-se assim que transição é o (re) construir de uma nova identidade, assente na anterior que a pessoa detinha. “Está tudo bem. Foi a melhor coisa que escolheram para mim, vocês diziam-me que esta era melhor para mim, mas eu não acreditava. Mas agora sinto-me muito bem, uma pessoa não sabe para onde é que vai, estou bem assim como eu estou”. (EE – L 110-112)

Vida familiar, social e profissional em função da diálise peritoneal Para além da sua própria identidade, também as transições têm reflexos nos papéis familiares, sociais e profissionais que as pessoas desempenham, passando estes para segundo plano e passam a ser geridos em função do tratamento. Todos os participantes revelam que alteraram a sua forma de viver transformando também as suas relações familiares, profissionais e sociais. “Eu já fui começando a mobilizar um bocado mais para fora de casa, a dúvida agora é quando eu sair do manual para o automático, como é que eu o posso fazer? Mas pronto, é uma contingência, uma adaptação de vida, não posso ir para todos os sítios, não se pode fazer exactamente a mesma vida que se fazia antes, adaptas-te com alguma facilidade. Retrospectivamente acho que tem funcionado tudo bem, a família também. No entanto penso que a família não lida muito bem com o doente renal. A mobilidade é sempre um bocado limitativa. Fui no outro dia para a Madeira e o meu medo era chegar lá e não ter os líquidos. O ideal era fazer menos vezes por dia. O mercado de trabalho não é muito receptivo a isto”. (EBL198-206)

Na análise do conteúdo das entrevistas foi evidente que as pessoas também optam pela técnica de DP, por esta lhes permitir continuar a trabalhar e em alguns casos a modalidade de diálise com cicladora à noite, permite ter o dia mais disponível para as actividades de vida. “A manual sentia-me bem mas depois é o caso de um gajo não poder sair de casa de 4 em 4 horas ter que fazer a muda. Praticamente era uma prisão, agora na automática claro, um gajo já tem mais tempo. Já pode ir tratar disto, já pode ir tratar daquilo. Deitase com as galinhas que é para acordar com os galos.” (EH – L56-59)

Os participantes na sua maioria referem que a sua vida social se alterou por não estarem tão disponíveis para as várias actividades que dispunham antes da doença. Página 96

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No entanto, referem que fazem escolhas do que é mais importante e valorizável para o seu processo de socialização. Por seu lado, outros referem que a DP não lhes impede de manterem a sua vida social activa, evidenciando comportamentos de adesão. “Mas de resto, o convívio seja com a família, seja com amigos, a diálise peritoneal não me impede de nada disso.” (EG – L109-110)

(Re) definição dos objectivos do quotidiano As implicações que levaram a uma (re) construção da mudança que experienciaram na sua vida, envolve de certo modo uma (re) definição de objectivos no seu quotidiano, ou seja, ao viver a vida em função da DP, requer que sejam planeados novos modos de viver, novos modos de trabalhar adaptando-se à sua nova condição de pessoa com uma situação crónica que depende da realização de um tratamento dialítico para manter o seu bem-estar. Todos os participantes referem que tiveram necessidade de repensar o dia-a-dia. “Hoje portanto é como digo "que raio de chatice que eu tenho de ir agora fazer esta muda, mas depois volto atrás e digo “será melhor esta que outra". Portanto há que enfrentar e acabo por entrar neste ritmo de que é uma coisa normal, de como ir beber a bica ao café e ler o jornal. Aquele tempo tenho que estar ali e é ali que eu faço”. (EI – L128-131)

Um (re) começo de uma nova caminhada na construção de um quotidiano equilibrado que lhes permita levar uma vida “normal”. “Fundamentalmente é isso, hoje faço este tratamento um bocadinho à vontade, sem aquele receio de estar a pensar em todas as coisas e tal. Hoje já faço mais ou menos as coisas de forma automática, por acaso nunca me enganei. Pode ser que me engane um dia, mas tem corrido tudo sempre bem até hoje”. (EA-L122126)

Para alguns participantes que reconhecem as limitações da doença e do tratamento permite-lhes alcançar a sabedoria de viver plenamente cada dia. Abraçando com alegria uma nova oportunidade de vida. Perante a adversidade, alguns participantes relatam e partilham sugestões de quem vive na própria existência a experiência de ser doente renal em diálise peritoneal. “A sugestão que eu gostaria de dar era, se alguém entrar a precisar de entrar em diálise e que tenhas condições em casa para poder fazer, condições físicas também para poder fazer DP e que os médicos não vejam nenhum inconveniente é uma excelente escolha a diálise peritoneal. Em comparação à hemodiálise, não digo que a hemodiálise não seja um bom tratamento mas eu acho que em termos de sofrimento, porque eu vi pelo que o meu pai passou quando fez durante 5 anos hemodiálise. Em termos de sofrimento, em termos de desgaste físico do organismo, acho que a DP é melhor. Não temos que vir dia sim, dia não ao hospital, temos o nosso ambiente, a nossa casa (*++) e é isso. Eu aconselho todas as pessoas que podem fazer DP, a escolher a DP. Eu sinto-me muito bem e

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espero que continue a correr tudo bem como correu até aqui, e estou muito contente por ter escolhido a DP. Muito satisfeita”. (EG-L196-205)

Na procura do seu bem-estar para continuar a viver, a pessoa procura adoptar os comportamentos que lhe possibilitem viver o seu dia-a-dia sem complicações. O tratamento passa a fazer parte da rotina diária como uma tarefa, envolvendo um novo modo de vida, de viver em DP.

2.7 - “O APOIO, A DEDICAÇÃO, A MANEIRA COMO ME EXPLICARAMH” “É assim facilitou-me muito o apoio, a dedicação, a maneira como me explicaram de toda a equipa. A equipa, seja de enfermagem, seja de médicos, toda esta equipa que trabalha neste sector. Acho que se empenha muito com os doentes e tem muitaE uma muito boa relação com os doentes e isso dá-nos uma confiança muito grande. Porque nós chegamos, eu penso, eu falo por mim (......) A gente confiar nos profissionais de saúde e a confiança que eles nos transmitem a nós, o carinho que eles nos dão, isso ajudou-me muito nessa fase. Porque eu não vejo estes profissionais como apenas enfermeiros ou como apenas médicos, mas sim quase já como família. Eu sinto-me à vontade, quando tenho alguma dúvida ponho, esclareço para não ficar com dúvidas, sempre me esclareceram e me responderam a tudo. Sempre me explicaram tudo muito bem”. (EG – L139-148)

2.7.1 – O cuidar de enfermagem no processo de transição da pessoa em diálise peritoneal

Para Meleis (citado por Abreu, 2011) o papel mais relevante do profissional de enfermagem é o de assistir utentes em processo de transição. O foco de intervenção da enfermagem têm como objectivo facilitar os processos de transição, para alcance do bem-estar por parte da pessoa. Por intervenção de enfermagem entende-se como uma acção realizada em resposta a um diagnóstico de enfermagem de modo a originar um resultado de enfermagem (Ordem dos Enfermeiros, 2009). Da análise das declarações significativas das entrevistas, percebemos que as pessoas vêm no enfermeiro um apoio, amigo, professor, um profissional dedicado que assume uma relação de empatia gerando à sua volta confiança. Todos os participantes evidenciaram a importância da intervenção dos enfermeiros na equipa multidisciplinar no cuidado à pessoa em DP.

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A figura seguinte demonstra como no processo de cuidar da pessoa em processo de transição é fundamental ou até determinante a relação que se estabelece entre o enfermeiro e a pessoa. Esta relação deve ser baseada na confiança mútua, na empatia e no respeito. São as relações que se estabelecem que servirão de base de trabalho para o enfermeiro, ou seja, quanto maior for a confiança da pessoa no trabalho do enfermeiro melhor é a capacidade deste de aceitar as intervenções de enfermagem (Hurst e Thomas, 2008).

Figura 7- O cuidar de enfermagem no processo de transição da pessoa em diálise peritoneal

As intervenções dos enfermeiros podem acontecer desde o primeiro contacto. Este pode ocorrer no período de conhecimento do diagnóstico da doença ou quando a pessoa já optou pela DP e deseja conhecer e aprender o seu funcionamento. As intervenções de enfermagem passam inicialmente por informar, e através desta acção a pessoa é instruída e orientada em relação à doença renal e aos tratamentos de substituição. São explicados, em pormenor, todos os procedimentos necessários ao correcto funcionamento da técnica dialítica. São estabelecidos limites de forma a pessoa compreender que eles são necessários para a prevenção de complicações. Todas estas acções têm como objectivo final fornecer todos os elementos necessários para que a pessoa possa tomar decisões informadas e como tal se co-responsabilizar e tornar-se autónomo. Na opinião de Wang et al., (2007) os enfermeiros têm o papel fundamental de focar os seus cuidados num papel de prevenção e de ensino para o auto-cuidado das pessoas e não apenas focalizado no treino destes. Os autores referem que nos cuidados de saúde “dar poder” é definido como um processo educacional destinado a ajudar as Página 99

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pessoas a desenvolverem conhecimentos, capacidades, atitudes e auto-consciência da tomada de responsabilidade para com o seu tratamento. O estudo realizado por Torreão, Souza e Aguiar (2009) referem que a função do enfermeiro de nefrologia é proporcionar um cuidado individualizado e holístico, assente nas competências técnicas, científicas e relacionais. Este desempenho profissional permite aumentar os níveis de confiança da pessoa insuficiente renal. Estabelecer relação comL O estabelecer de uma relação entre a pessoa e o profissional de saúde na base da confiança, no respeito e de modo empático permite que as pessoas se sintam mais abertas a compreender a sua doença e o seu tratamento. Esta relação foi evidenciada por todos os participantes, que a consideram fundamental para a sua vivência em DP. “Ah, é assim, essa é uma parte muito importante deste tipo de tratamento. É a gente sentir que temos ali uma pessoa sempre disponível para nos explicar alguma dúvida que nós tenhamos ou alguma coisa que surja menos boa, temos sempre ali um apoio para nos socorrer.(E) Para já explicaram tudo muito bem, como muita calma e sempre a perguntar se eu estava a perceber, se eu precisava e se tivesse alguma dúvida para pôr.(E) Isso dá muita confiança porque a gente sabe que temos 24 horas sempre alguém, qualquer coisa que surja, basta pegar no telefone e temos sempre alguém do outro lado, para além de nos dar muito apoio, muita força, carinho. Uma palavra amiga de conforto num momento menos bom e que temos um socorro a toda a hora”. (EG-L150-161)

Relacionar é “atender: estabelecer ou manter ligações com um ou mais indivíduos, interagir” (Conselho Internacional de Enfermeiros, 2011, p.99). A constituição de uma relação profissional entre a pessoa e o enfermeiro é importante e referido pelos participantes como facilitador do seu processo de transição para o início da diálise peritoneal. “Em relação aos profissionais, considero que fui bem apoiado, quer dizer todos os passos foram seguidos pelo pessoal de enfermagem que me deu todo o apoio, que me telefonou para casa, que se preocupou em saber como é que estava, como é que o percurso estava a evoluir, nisso acho que correu muito bem.(E) Embora não necessite, se permite uma sugestão eu ia adiantar uma sugestão, eu senti-me muito bem quando me ligaram para casa a dada altura a saber como é que estavam a correr as coisas. Embora as pessoas venham aqui à consulta, de dois em dois meses, se no intervalo houvesse nem que seja um telefonema para saber como estava, eu acho que era um apoio importante para a pessoa que esta do outro lado. Pode objectivamente não servir para nada, mas em termos de suporte e de apoio é capaz de a pessoa se sentir apoiada. Um telefonema”. (EBL154-167)

Os participantes referem que a relação de confiança estabelecida com os enfermeiros transmite-lhes segurança na realização do seu tratamento. “O enfermeiro é a pessoa que contacta mais tempo durante mais vezes e que tem mais diálogo com o doente e é nesse sentido a peça chave para articular o

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processo. Veja eu não pedi para o médico telefonar, pedi para o enfermeiro telefonar. Ouvir a outra pessoa do outro lado, mostrar-se disponível é muito importante. As consultas médicas são muito rápidas e não dá mesmo para intervalar uma conversa e esclarecer as coisas, os enfermeiros estão muito mais disponíveis e atentos no seguimento da doença. Aqui, se me permite o seguimento da doença é feito pelo enfermeiro, o médico faz a supervisão da outra parte, da laboratorial e do desequilíbrio, mas no dia-a-dia com o que o doente precisa foi o enfermeiro e acho que correu muito bem”. (EB-L177-185)

Da análise da informação emergiram algumas características que as pessoas consideram importantes e que devem fazer parte do perfil do enfermeiro de nefrologia. A empatia, a cordialidade, a assertividade e o respeito pelos valores humanos. “Eu achei tudo bem, foram todos muito atenciosos, muito, com muita paciência com a pessoa, achei tudo bem. Estava tudo bem. Atenderam-me muito bem, muito carinhosos, não tenho nada a apontar de nada. Humildes e meigos, achei tudo de bom.” (EC-L121-123)

Informar Informar é uma forma de acção de enfermagem caracterizada por falar com alguém sobre alguma coisa (Conselho Internacional de Enfermeiras, 2001). No processo de acolhimento na técnica, ao percurso efectuado pela pessoa desde a colocação do cateter peritoneal ao início da diálise, existe todo um percurso no qual os enfermeiros informam a pessoa de todos os procedimentos essenciais. Dotar as pessoas da informação necessária ao longo dos seus trajectos de vivência na DP permite-lhes diminuir os níveis de ansiedade e aumentar assim a confiança na relação que se estabelece com os profissionais de saúde. Os participantes referem que os enfermeiros foram muito exigentes e cuidadosos, certificando-se que estes adquiriam os saberes necessários ao cumprimento da técnica de DP e se reconheciam as implicações de um tratamento mal executado. “O enfermeiro foi a pessoa vital no processo de aprendizagem, desde logo, na abordagem do esclarecimento do como ia ser a diálise peritoneal, oferecer-me literatura e disponibilizar-se para me informar sobre o assunto, pôr-me ao corrente do número de doentes que também estão a fazer diálise peritoneal, para interagir, acho que foi interessante, foi importante. Depois todo o acompanhamento que é feito, o ensino meticuloso, "repita, venha cá, eu quero ver", mesmo aquela situação dos "chatinhos" que querem ver a lavar as mãos, acho que isso é muito importante. Se algumas pessoas poderão eventualmente pensar "eu sei como devo lavar as mãos", no fundo é importante que é alguém que se importe connosco, que está connosco e que quer validar connosco o procedimento. (EBL169-177)

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Ensinar O conceito de ensinar é uma forma de informar com as seguintes características específicas: dar informação sistemática sobre como fazer alguma coisa (Conselho Internacional de Enfermeiras, 2001). Em diálise peritoneal o ensino deve obedecer a programas estruturados que integrem os assuntos mais relevantes para a realização da DP. Deve contemplar todos os procedimentos e orientações necessárias para a prevenção de complicações. Da informação analisada dos entrevistados, a maioria identificou os procedimentos que foram ensinados pelos enfermeiros na preparação do material para o tratamento e muito importante, identificaram as precauções necessárias a ter com este tipo de diálise. “Primeiro disseram-me “ó senhor N em primeiro lugar tem que por a máscara e em segundo lugar tem que lavar muito bem as mãos e terceiro lugar, depois de lavar as mãos não pode mexer em mais nada que não esteja desinfectado. Foi muito fácil e foi muito bom.” (EF – L138-140)

O processo formativo, de acordo com os participantes foi realizado de forma eficiente. Os enfermeiros para além de fornecerem informação sobre como fazer, também participaram na sua demonstração. Na opinião dos informantes, o enfermeiro capacita a pessoa através do ensino de como tem de fazer, permite-lhes que estes executem o procedimento e por sua vez, o enfermeiro valida-o. “A intervenção dos enfermeiros foi fundamental, porque eu não era capaz sozinho. Só com uma explicação teórica eu não era capaz. Eles exemplificaram, fizeram, mostraram e mandaram-me fazer, pronto. Foi assim, portanto, as ligações, como desligar, como ver o penso, foi tudo. Fizeram e mandaram-me fazer para ver se eu estava a fazer bem, acho que foi isso. Fundamentalmente foi o que me ajudou a continuar a fazer as coisas bem-feitas”. (EA-146-150)

As recomendações internacionais para o ensino e treino da pessoa em diálise peritoneal referem citando o psicólogo educacional Tenbrink (citado por Bernardini, Price e Figueiredo, 2006) que a aprendizagem através da memorização requer repetição. A pessoa, ao longo do seu período de treino memoriza o tempo que necessita para realizar o tratamento, os materiais, e os equipamentos necessários. O mesmo autor refere que a postura de quem ensina, neste caso do enfermeiro, deve ser uma postura aberta, positiva e de encorajamento, porque permite, segundo o autor, que a pessoa interiorize melhor os conceitos. No entanto, a literatura refere-nos que as investigações pedagógicas realizadas sobre a formação de adultos ao fim de 30 dias, as pessoas acabam por esquecer tudo o que aprenderam (Armangué e Suaréz, 2006). Assim, o processo de ensino e de

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aprendizagem por parte da pessoa tem de ser um processo de continuidade, sendo necessárias avaliações periódicas dos saberes adquiridos. “Vim para cá no dia 6, de manha foi o Enf.º F. De tarde foi a Enfª R e depois até fui dormir a casa e não fiquei cá internado. (E) Tive lá a enfermeira (E) que me ensinou a trabalhar com a máquina, que me ensinou também e quis ver como eu fazia a parte da manual. Porque quando fui para casa fui com a manual (E)” (EH – L67-75)

A intervenção dos enfermeiros é referida por todos os participantes como facilitadora na sua vivência em DP. Evidenciam que se não houvesse este desempenho profissional as pessoas não se sentiram capazes de perceber o que lhes era solicitado. “Mais, facilitou-me aquilo que me ensinaram portanto, se me pusessem aquilo nas mãos e faz, sem ninguém me dizer nada eu não era capaz, não é? Então portanto, o que me facilitou foi da parte da enfermagem, de me ensinarem como é que se faz uma muda e como é que eu tinha que fazer. Tanto na muda como no penso e foi isso o ensinamento. Portanto, não estive cá só para me tratar mas também para me ensinarem, não é?” (EI-98-102)

Explicar Para além do ensino, a explicação dos procedimentos são fundamentais para o sucesso da técnica. A compreensão e apreensão dos cuidados necessários são essenciais para a prevenção de ocorrência de problemas relacionados com o tratamento. Explicar, é segundo o Conselho Internacional de Enfermeiras (2001, p. 157) “um tipo de informar com as características específicas: tornar alguma coisa compreensível ou clara para alguém”. A explicação permite tornar compreensível alguma coisa para alguém, ou seja, não basta informar e ensinar. É necessário que a pessoa compreenda porque são realizados os procedimentos de determinada forma e não de outra. Há necessidade de os enfermeiros tornarem perceptível para as pessoas que as suas acções influenciam o sucesso do seu tratamento. Para alguns participantes a exigência reivindicada pelos enfermeiros contribuiu para o sucesso do ensino. “Actuou muito bem, souberam explicar, insistiam com a gente para a gente aprender. Chamavam-nos a atenção, tipo ralhamento de escola "tens que aprender, porque afinal esqueceste-te" mas isso é uma chamada de atenção para que a gente não se esqueça mais não é? Claro muito simpaticamente e com boas maneiras de ensino, chamando à atenção dos erros que isso é normal em qualquer professor, não é? (risos) Porque quem não chama à atenção deixa-se baldar um bocadinho e éramos chamados à atenção. Foi isso que foi muito bom”. (EI-L104-110)

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Orientar Na percepção dos cuidados de enfermagem, os participantes salientam também que são orientados pelos enfermeiros nas questões da limpeza e higiene do domicílio, da alimentação, da sexualidade e do exercício físico. Orientar é definido como um tipo de informar, caracterizado por “dirigir alguém para uma decisão em assuntos relacionados com a saúde” (Conselho Internacional de Enfermeiras, 2001, p. 157). Proporcionar orientação ou mesmo guias orientadores são imprescindíveis para manter um acompanhamento do processo de aprendizagem e do trajecto evolutivo da vivência da pessoa em DP. “Fui bem explícito daquilo que ia fazer. Fui bem, bem elucidado dos pormenores que devia ter em casa, com a limpeza, com o tratamento e da maneira de como devia actuar. Penso que não fui daqui sem saber o que ia fazer, penso que fui bem elucidado e que o enfermeiro conseguiu portanto que eu aprendesse e que eu fixasse aquilo que era importante para eu fazer a peritoneal. (EI-L117-122)

Estabelecer limites Ao fornecer informação e orientação os enfermeiros estão a capacitar a pessoa para ser agente activo da sua própria saúde. O estabelecer de limites, segundo o Conselho Internacional de Enfermeiros (2011, p.97) está relacionado com o “limitar ou restringir o comportamento”, permite que estes direccionem a pessoa para a adopção de comportamentos adequados e a excluir aqueles que poderão colocar em causa o sucesso da terapêutica. Na análise da informação os participantes referem que os enfermeiros foram rigorosos. Reconhecem que os limites e restrições impostos foram fundamentais para a modificação de comportamentos os quais poderiam ser prejudiciais para o seu bem-estar. “Actuaram muito bem, foram exigentes, exigentes comigo. Pronto, como no ter cuidado na higiene, foram muito exigentes. Na altura até pensava assim "poxa, há aí uns enfermeiros que são mesmo maus", a exigir muito, mas valeu a pena. Porque na altura nem pensei, tanta higiene para quê? Aonde estão os micróbios nas mãos? Mas era mesmo, a gente não tem a noção dessas coisas, só quem passa no terreno ou aliás como quem está no terreno como vocês, sabem destas coisas. (E) Não faltou nada, em questão de ensino de enfermagem não faltou nada. Senti-me capaz e seguro com aquilo que vocês me ensinaram”. (ED- L95105)

Dar poder aL Na mesma linha de pensamento, é importante que as pessoas se identifiquem como capazes de gerir os seus cuidados e a sua saúde. Dar poder é “promover: permitir às pessoas realizarem a sua capacidade para influenciar a sua própria saúde” (Conselho Internacional de Enfermeiros, 2011, p.96). Potenciar a pessoa de capacidades, possibilita que estas se envolvam nos resultados obtidos para o seu estado de saúde. Página 104

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Todos os participantes confessam que a autonomia adquirida com processo de aprendizagem tornou-os mais capacitados para as decisões no quotidiano. Ou seja, o poder transformou-se em conhecimento. “Não faltou nada, em questão de ensino de enfermagem não faltou nada. Senti-me capaz e seguro com aquilo que vocês me ensinaram”. (ED – L105-106)

As intervenções de enfermagem são fundamentais na manutenção do bem-estar em pessoas que vivem processos de transição, como seja a insuficiência renal e o início da diálise peritoneal. As competências de relação, de comunicação, do saber técnico e científico são capacidades que devem ser desenvolvidas e aplicadas pelos enfermeiros no processo formativo da pessoa em diálise peritoneal. O conhecimento é poder para aqueles que o desenvolvem, para os que o usam e para aqueles que dele beneficiam (Meleis et al., 2010).

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CAPÍTULO 3 -VIVÊNCIAS DA PESSOA EM DIÁLISE

P PERITONEAL:

UM

PROCESSO

DE

TRANSIÇÃO ÃO COMPLEXO E DE COMPROMISSO

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CAPITULO 3 - VIVÊNCIAS DA PESSOA EM DIÁLISE PERITONEAL: UM PROCESSO DE TRANSIÇÃO COMPLEXO E DE COMPROMISSO

A investigação qualitativa procura “esmiuçar a forma como as pessoas constroem o mundo à sua volta, o que estão fazendo ou o que lhes está acontecendo” comprometendo-se assim a explicar a sua experiência (Flick, 2009, p. 8). Por seu lado, o investigador qualitativo tenta através dos resultados encontrados apresentar uma interpretação que seja fiel à realidade vivenciada pelas pessoas. No desenvolvimento deste capítulo pretendemos evidenciar as vivências que as pessoas insuficientes renais crónicas experienciam na sua transição para o início do tratamento por diálise peritoneal.

O estudo das pessoas no período de início da diálise peritoneal revelou que estamos perante um processo de transição do tipo saúde/doença, que é simultaneamente um processo de transição de padrões múltiplos e complexos. Múltiplos pelas alterações que emergem da experiência de realização de diálise e, complexos pela complexidade das respostas humanas que ocorrem naquele período e que caracterizam a transição. Todos os participantes detêm um conjunto de traços de personalidade que condicionam a sua experiência, ou seja, os traços característicos da pessoa influenciam a sua resposta de aceitação, ou denegação perante a doença e o tratamento. No entanto, essas mesmas características estão na origem de disposições de tomada de decisão da escolha da terapêutica e na adaptação à insuficiência renal crónica terminal. A literatura que descreve os aspectos psicológicos da pessoa em diálise peritoneal vai de encontro aos resultados da investigação. Blumental e Schwarz (2009) dizem-nos que após o diagnóstico da doença renal, as pessoas experienciam um processo de mudança emocional, cognitiva e de comportamento com o propósito de se adaptarem à técnica de substituição da função renal, e que alcançam o equilíbrio após o desenvolvimento de estratégias de coping. A explicação do processo de coping descrito pelos autores identifica cinco grandes fases. A primeira está relacionada com Página 109

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o “impacto inicial”, que inclui entre outras manifestações o choque e ansiedade. A segunda fase é descrita como a “mobilização de defesas” na qual a pessoa nega a sua condição de doença e resiste a aceitar o tratamento. A fase de “reconhecimento” é descrita como a terceira fase na qual a pessoa revela manifestações de culpa e possíveis estados de depressão. A quarta fase é descrita como a fase da “retaliação” caracterizada por expressões de frustração e raiva que podem ser canalizadas pela pessoa para a família ou profissionais de saúde. Por último, a fase da “re-integração” que inclui o reconhecimento e ajustamento da pessoa à doença e tratamento. Esta caracterizada pela estabilização cognitiva e emocional da pessoa que encontra na sua nova forma de vida expressões de satisfação e persegue novos objectivos de vida. As pessoas procuram e desenvolvem estratégias que lhes permita identificar o que é benéfico e positivo para a sua vida, contribuindo assim para uma vivência mais positiva do seu processo de transição. Para o seu desenvolvimento contribuem condições da própria pessoa, tais como, as suas emoções, crenças, conhecimento e o próprio estilo de vida. No meio onde a pessoa está inserida e vive contribuem como factores condicionantes os recursos materiais e físicos disponíveis, as condições de trabalho e de emprego, as relações familiares e as interacções a nível comunitário. Os resultados encontrados na nossa pesquisa revelam que as pessoas são condicionadas pelas suas emoções e que procuram suporte junto da família, amigos e profissionais de saúde. Através destes, procuram obter preparação e conhecimento para perceberem a sua doença e o tratamento, e assim alcançar o seu bem-estar. As questões relacionadas com o trabalho e o emprego são as mais referidas pelos participantes como condições inibidoras da sua vivência em início de diálise peritoneal. De forma similar Mendes, Bastos e Paiva (2010) encontram também referência aos aspectos económicos em pessoas com doença cardíaca, que se vêm confrontadas com grandes mudanças na sua vida para conseguirem lidar com a sua nova condição de doente crónico. Podemos considerar que as pessoas na sua vivência no período inicial da DP evidenciam vivências de sofrimento como o medo, a preocupação, ansiedade, depressão, cansaço, falta de liberdade e desconforto. Estes resultados vão ao encontro dos descritos por Barbosa (2004) quando nos fala das respostas que a pessoa experiencia no período de início de diálise. Para Barbosa (2004, p.28) as pessoas consideram o início de diálise um sofrimento. A autora descreve que “o Página 110

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sofrimento é um conjunto de sentimentos e emoções individuais, vivenciado e exteriorizado subjectivamente conforme a causa e a personalidade do indivíduo”. O sofrimento pode ocorrer quando algum aspecto da integridade da pessoa está seriamente afectado, como o seu papel familiar, social ou profissional. Hutchinson (2005) é da opinião que as pessoas IRCT enfrentam múltiplas transições desafiantes na sua vida, e que estas podem ser uma ameaça ao seu tratamento, dependendo da experiência que têm no início do tratamento. O autor reafirma a necessidade de os profissionais de saúde conhecerem as respostas das pessoas aos seus processos de transição, por forma, a mobilizarem apoio e suporte minimizando assim o impacto emocional que este período difícil poderá ter nas suas vidas. Em relação ao meio onde a pessoa vive e se relaciona, os participantes percepcionam respostas das relações que estabelecem com os familiares e os amigos e em relação às questões profissionais e sociais. As respostas que obtêm dos familiares são na percepção dos participantes respostas de recurso, super-protecção, afastamento e preocupação. A nível profissional e social as pessoas experienciam o desemprego e o isolamento social. Estes são dados importantes que requerem atenção dos profissionais de saúde, nomeadamente dos enfermeiros, para a detecção precoce de potenciais problemas sociais e/ou familiares, e atempadamente intervir na sua resolução. Anes e Ferreira (2009) descrevem que as pessoas alcançam melhores níveis de bem-estar quando profissionalmente activas. Da análise da informação da nossa pesquisa todos os participantes evidenciaram respostas de expressão emocional. A grande maioria dos sentimentos expressos mostrou uma conotação negativa mais evidente no início do tratamento, tais como, o medo, a preocupação, ansiedade, depressão, cansaço e a falta de liberdade. Após este período, as pessoas percepcionam respostas beneficiadoras como o bem-estar, esperança, liberdade dietética e ausência de dor. Também aqui os autores como Thomas (2009) e Blumental e Schwarz (2009) são da opinião que é necessário um período de ajustamento e que terá que ser a própria pessoa a encontrar o seu equilíbrio emocional e cognitivo. As manifestações que as pessoas sentem nesse período impulsionam para a mudança, e os participantes demonstraram adquirir capacidades de aprendizagem da técnica de DP e de gerir os seus horários e hábitos de vida em função do tratamento. Página 111

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Assim, como principais mudanças as pessoas assimilam a sequência de passos para a realização da técnica e desenvolvem capacidades para o seu auto-cuidado. A par com estas mudanças, também aprendem a gerir os horários de tratamento e os seus hábitos de vida de forma a dar resposta às exigências impostas pelo tratamento dialítico evidenciando assim comportamentos de adesão e de capacidade de gestão do seu regime terapêutico, assumindo assim o compromisso de gerir o seu bem-estar e aceitar a sua condição de doente crónico.

As mudanças que ocorrem propõem e simultaneamente conduzem a uma reorganização, uma (re) construção do seu quotidiano e dos seus hábitos de vida que incluem uma redefinição de papéis do próprio e do que os lhes estão próximo. Ou seja, a partir do momento que o tratamento de diálise faz parte da sua vida, esta organiza as suas actividades e objectivos de vida em função do tratamento, com implicações na organização da vida familiar, profissional e social. As competências que desenvolvem e os comportamentos que manifestam na gestão do quotidiano exigem adaptações da pessoa e dos que a rodeiam, pois tudo acontece em função do tratamento, ele é o elemento central à volta do qual tudo gravita. Oliveira et al., (2008) demonstraram na sua investigação que a insuficiência renal crónica compromete mais dos que as suas funções vitais, estando associada ao risco de morte, à debilidade e às limitações físicas e psicológicas. Os autores concluem que isto acontece pelo empenho exigido para que possam suportar e adequar as mudanças de vida, a exposição de contínua a condições stressantes, as perdas reais e imaginárias em torno da doença e do seu tratamento.

Este estudo vai de encontro aos resultados presentes na nossa investigação. Também aqui, os participantes apresentam alterações psicológicas e físicas com o tratamento de DP. As manifestações físicas como o desconforto e psicológicas como a ansiedade, depressão, preocupação e o medo impostas pela diálise são importantes respostas que carecem de apoio, acompanhamento e intervenção dos profissionais de saúde, nomeadamente dos enfermeiros que são o grupo profissional que maior contacto estabelece com a pessoa nesta fase da sua vida. Estes resultados que emergiram das declarações significativas são também concordantes com as principais conclusões do estudo de Scatolin et al., (2010) sobre actividades de vida diária da pessoa em DP, em que as pessoas expressaram a Página 112

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rejeição, tristeza e medo, angústia, ansiedade, sofrimento e stresse causados pela doença e pelo tratamento. No entanto, os autores identificaram alguma acomodação e mesmo obrigação em estar a realizar o tratamento, o que não é de todo confirmado na nossa pesquisa. Os resultados evidenciam que o processo de transição que a pessoa vivencia no período inicial da DP, sai facilitado se a pessoa estiver consciente das mudanças que irão ocorrer. Deste modo, os enfermeiros são os profissionais melhor posicionados para o “estabelecimento de um programa de ensino estruturado” baseado no desenvolvimento

de

competências

da

pessoa

para

o

auto-cuidado

e

no

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empowerment , pois este permite, que o processo formativo e educacional da pessoa o ajude a desenvolver conhecimentos, capacidades, atitudes e auto-consciência da toma da responsabilidade pelo seu tratamento (Wang et al., 2007). O cuidado de enfermagem é evidenciado no nosso trabalho por todos os participantes como fundamental no apoio, acompanhamento e ensino para o início da DP. Os participantes revelam que a relação de confiança que estabelecem com os enfermeiros lhes permite adquirir as competências necessárias para o seu autocuidado. Os participantes identificaram competências técnicas, científicas e relacionais nos enfermeiros considerando-os fundamentais na informação, ensino e orientação para a aprendizagem da técnica de DP. Torreão, Souza e Aguiar (2009) referem que a educação do doente renal crónico inicia-se assim que é feito o diagnóstico e que será necessário existir sempre uma continuidade do processo educativo. Os autores relatam que durante a vivência da sua doença e do tratamento a pessoa tem de ser orientada e que o acompanhamento contínuo dos enfermeiros contribuiu positivamente para a experiência, pois possibilita que em conjunto descubram formas de a pessoa viver dentro dos seus limites, identificando as suas necessidades e apoiá-los nas suas novas responsabilidades como o desenvolvimento de capacidades para o auto-cuidado na DP. Os resultados da investigação mostram que o informar, ensinar, explicar e orientar como acções de enfermagem associadas ao estabelecimento de uma relação para com a pessoa, permitirá a esta compreender os limites estabelecidos pelos enfermeiros no seu processo de auto-cuidado, capacitando-os do poder necessário 4

Empowerment – Dar poder a (CIPE, 2011)

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para assumirem a responsabilidade pelo seu tratamento no domicílio. Desta forma, os enfermeiros ao centralizarem a sua acção na pessoa e nas suas necessidades a partir do seu conhecimento aprofundado e global estão a contribuir para que este período de importantes transformações ocorra de forma estável e sereno. Uma pesquisa desenvolvida por Santos e Valadares (2011) contribuiu para a compreensão do fenómeno da vivência em diálise peritoneal. Procurou conhecer a forma pela qual a pessoa portadora de doença renal crónica enfrenta a diálise peritoneal na iminência de realização deste tratamento, conclui que uma vez diagnosticada a necessidade de diálise, destaca-se a forma como a pessoa recebe a notícia, com frustração, decepção e medo gerando uma sensação de pesadelo e de choque. Os autores no decurso do estudo demonstraram que após o “choque” inicial, a pessoa enfrenta a sua nova condição de saúde e ao experienciar o tratamento de DP, percepciona bem-estar, associado à diminuição dos sintomas decorrentes da insuficiência renal. Assim, associam a DP a uma melhoria do seu estado de saúde, aceitando o tratamento como uma forma de manter o seu bem-estar.

O nosso estudo aproxima-se também dos resultados encontrados por Santos e Valadares (2011), quando concluímos que o momento do diagnóstico é o acontecimento crítico, e uma propriedade importante do processo de transição de acordo com o modelo defenido por Meleis et al, (2000). Os sentimentos de medo, preocupação, ansiedade, depressão, falta de liberdade e cansaço evidenciados nos resultados como repostas à experiência de DP, aproximamse dos encontrados por Santos e Valadares (2011). São vivências complexas, pela componente humana que está presente, pois não se pode “reduzir a uma descrição clara, a uma ideia simples, tão pouco a uma lei simples” como Morin (2008, p. 140) refere. Os resultados da investigação são temáticas complexas, envolvem percepções e vivências de pessoas que são influenciadas por múltiplos factores, evidenciando-se que experienciam sofrimento com repercussões na sua estrutura familiar, social e profissional. O apoio e acompanhamento dos profissionais de saúde, principalmente dos enfermeiros são fundamentais para que estes desenvolvam e apreendam a capacidade de reorganizar e reconstruir o seu quotidiano e a implementar todas as mudanças que o período de início de DP exige, comprometendo-se com a sua própria saúde.

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A nossa pesquisa procurou demonstrar que os participantes integraram no seu quotidianos as limitações e as restrições impostas pela doença e pelo tratamento e reconstruíram novos objectivos de vida, procurando adaptarem-se à sua nova realidade. Ou seja, o processo de transição que ocorreu permitiu identificar alguns indicadores de processo e de resultado, reconhecendo assim que a maioria dos participantes experienciou uma transição serena. Meleis e Trangenstein (1994) referem que uma transição saudável é caracterizada por indicadores de processo e de resultado. O reconhecimento destes indicadores permitem avaliar de forma antecipada as intervenções de enfermagem necessárias para facilitar o processo de transição. Da nossa investigação emergiu que a ligação e o contacto permanente entre a pessoa e o enfermeiro possibilitaram a esta compreender a sua doença e a necessidade do tratamento. Identificou-se também que as pessoas com o tempo adquiriram compreensão dos diferentes processos relativos à doença e tratamento, adquirindo novas capacidades que lhes permitirá viver com as limitações e restrições impostas pela diálise. O desenvolvimento de confiança surgiu também como um indicador de processo, em que os participantes a adquiriram através da relação que foi estabelecida com os profissionais de saúde e o que lhes permitiu a adopção de comportamentos tais como, a aprendizagem da técnica, o desenvolvimento de capacidades de auto-cuidado, a gestão dos horários de tratamento e a alteração dos hábitos de vida. Estes levaram aos indicadores de resultado, como seja a capacidade de adesão ao regime terapêutico através da adopção de comportamentos de adesão como sejam a (re) definição dos objectivos de vida e a vivê-la em função da realização do tratamento de DP. A tomada de consciência da necessidade do tratamento, possibilita à pessoa assumir a responsabilidade e compromisso na gestão e manutenção do seu bem-estar. Como indicadores de resultado Meleis et al., (2000) defendem que a “mestria” e o desenvolvimento de uma “identidade fluida integrativa” são resultados saudáveis do processo de transição. A investigação revelou que as pessoas IRCT no período inicial de DP desenvolvem competências, saberes e comportamentos necessários para a gestão da sua doença e tratamento. Ao adquirirem competências de realização de uma técnica de diálise, ganham saberes que lhes permitem identificar as situações decorrentes da realização da técnica e adoptam comportamentos propícios a uma vida estável dentro dos constrangimentos impostos pela sua condição de doente renal Página 115

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crónico. A adaptação à sua condição de doente crónico leva a redefinir a sua identidade procurando equacionar e alcançar outros objectivos de vida, pois houve abandono de comportamentos de denegação e o surgimento de uma disposição para gerirem e lidarem com a sua situação de saúde. A investigação desenvolvida permitiu, para além de corroborar com os estudos de Oliveira et al., (2008), Scatolin et al., (2010) e Santos e Valadares (2011), encontrar novos dados, como sejam o reconhecer de respostas favoráveis como o bem-estar, a liberdade dietética, a ausência de dor que permitem à pessoa olhar para o seu tratamento como um mal menor. Para além disso, a confirmação de que o desempenho dos enfermeiros na técnica de diálise peritoneal é fundamental desde os períodos mais precoces, tanto no seu desenvolvimento como na sua manutenção, confirmando que estes são factores facilitadores no processo de transição, acompanhando o trajecto de vivência da pessoa no seu tratamento em DP. A realização deste estudo demonstrou corroborar os seus resultados com outras pesquisas realizadas na área da diálise peritoneal, mas os processos envolvidos na vivência da pessoa em processo de transição poderão ser encontrados em outros contextos de cuidados. Catela (2010, p. 51) partilha no seu artigo as experiencias vividas de pessoas que foram submetidas a transplante cardíaco. A autora identifica a adesão ao regime terapêutico e as respostas a essa adesão fundamentais no processo de sobrevivência da pessoa. Tal como no nosso estudo, estas pessoas têm um percurso de vivências com respostas a uma situação de doença, vivem um processo de transição na procura de comportamentos que lhes permitam viver o quotidiano em equilíbrio, com a reconstrução diária de objectivos de vida e transformando as limitações em “possibilidades de vida”. O papel dos enfermeiros é evidenciado como fundamental na compreensão de como estes processos de transição afectam a pessoa. A adesão ao regime terapêutico é considerado um fenómeno da prática de enfermagem avançada possibilitando a estes profissionais intervenções autónomas na promoção da saúde e na prevenção de complicações associadas ao tratamento.

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Também na situação de doença oncológica Cainé e Sousa (2008) consideram que as pessoas que se vêm confrontadas com a doença experienciam processos de transição, apresentando habitualmente um conjunto de problemas de saúde altamente sensíveis aos cuidados de enfermagem. Conhecer o modo com estas pessoas lidam e integram a sua nova condição, é fundamental para o desenvolvimento de estratégias de intervenção profissional facilitadoras da transição e na garantia da sua adaptação, de acordo com os seus projectos de saúde.

Assim, tendo em consideração os resultados encontrados na investigação e os pressupostos referidos os profissionais devem estar sensibilizados e ter a preocupação de adquirir competências e conhecer as implicações que a doença crónica impõe, de modo a compreender muitas das reacções emocionais destas pessoas, ultrapassando assim, os conflitos geradores de ansiedade e instabilidade na relação interpessoal de pessoa/enfermeiro. Os enfermeiros ao conhecerem e compreenderem as propriedades e condições inerentes a processos de transição que envolvem a pessoa no seu contexto de cuidados desenvolvem as intervenções de enfermagem adequadas às respostas e necessidades da pessoa e sua família, promovendo assim uma transição saudável (Meleis et al., 2000). De modo a ilustrar o que foi descrito neste capítulo, o esquema seguinte representa em forma de estrutura as vivências da pessoa insuficiente renal crónica em diálise peritoneal. O desenvolvimento da estrutura fundamenta-se na sexta etapa da metodologia proposta por Colaizzi (1978) na qual a descrição do fenómeno é reduzida a uma estrutura essencial que o represente e que seja compreensível para as pessoas que se deparam com a mesma situação de vida.

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Figura 8 – Estrutu strutura do fenómeno da vivência da pessoa Insuficiente iente renal crónica em diálise peritoneal

A construção procura evidenciar nciar o os temas emergentes do fenómeno em estu estudo, bem como os significados agregados. ados. Pretende demonstrar também que oss cuid cuidados de enfermagem, apesar de serem m ma mais incisivos no início da DP são contínuos uos e em toda a vivência da pessoa desde o mome momento do diagnóstico.

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CONCLUSÕES

As vivências da pessoa no período de início de diálise peritoneal são entendidas como um processo de transição. A pessoa experiencia um processo de transição de saúde/doença, e a consequente adopção de um conjunto de novos papéis. Na concepção de Meleis et al, (2000) estamos perante uma transição de natureza múltipla e complexa. Como vivências da insuficiência renal crónica terminal em diálise peritoneal as pessoas experienciam disposições de denegação, mas também de aceitação, tomada de decisão e de adaptação ao processo de reconhecimento do diagnóstico da doença renal crónica terminal e consequente tratamento.

No período que antecede o início da diálise a pessoa procura desenvolver capacidades necessárias para o enfrentar. No entanto, as respostas evidenciam que não se está preparado para algo que não se experienciou, ou seja, é necessário que a própria pessoa experimente, veja e realize o tratamento para que ocorra uma adaptação cognitiva, que é significativamente influenciada pelas condições da pessoa e do meio onde se insere. O início da diálise é vivenciado como um período difícil com evidentes respostas emocionais, na sua grande maioria negativas, ou seja, de sofrimento (Barbosa, 2004). Nesse momento só o apoio de familiares e amigos e a intervenção dos enfermeiros poderá permitir que essas respostas sejam alimento para uma transição saudável e que as mudanças operadas com a realização do tratamento se traduzam em benefícios para a pessoa. Os resultados encontrados reafirmam o conceito de Meleis que nos refere que a transição nem sempre é alvo de mudança, mas toda a mudança pressupõe transição. A investigação revela-nos as mudanças que a pessoa necessitou de integrar no seu quotidiano e a partir desse ponto a construção de novos objectivos de vida. A pessoa aprendeu a realizar uma técnica que desconhecia e adquiriu competências para a sua realização no domicílio. A partir do momento que a diálise peritoneal passou a fazer parte da rotina diária de vida, esta passou a ser equacionada em função do tratamento. A sua presença alterou as relações familiares, sociais e profissionais. A Página 119

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família funciona como o apoio e o recurso, no entanto as relações sociais passam para segundo plano, e as profissionais ficam condicionadas à necessidade e exigência do tratamento de diálise. Noshad et al., (2009) diz-nos que os avanços tecnológicos e terapêuticos na área da nefrologia contribuíram para o aumento da sobrevida das pessoas com doença renal. Contudo continuam a referir que estes não lhes possibilitam a desejada qualidade de vida. Só a tecnologia e as novas terapêuticas não são suficientes para o tratamento de doentes crónicos, existe um nível profundo de necessidades humanas que necessitam de ser cuidadas. Nesta investigação, as pessoas identificaram as necessidades de apoio familiar, social e do mercado trabalho como fundamentais no restabelecimento do seu equilíbrio físico e psicológico. Ser portador de insuficiência renal pressupõe a necessidade de mudar hábitos relacionados com as dietas, tratamentos, e dependência de outros. A sua adaptação é um processo complexo, com implicações pessoais como seja a limitação de actividades e a restrição de horários. Os enfermeiros são os profissionais de saúde que mais contactos detêm com as pessoas em início de diálise peritoneal, adquirindo um papel decisivo no acompanhamento e no processo formativo da pessoa utilizando para isso os saberes obtidos da experiência clínica diária e das evidências científicas. Os enfermeiros ao conhecerem as respostas das pessoas no seu processo de transição, e ao estabelecerem, conjuntamente com estas, um plano de cuidados individualizado e holístico que responda às verdadeiras necessidades vão ter uma intervenção fundamental na preparação para o início do tratamento dialítico e nos seus resultados. Deste modo ajudam no estabelecimento de um programa de vida, na desmitificação de medos e crenças geradores de ansiedade e depressão, assim como, nos conhecimentos que a pessoa necessita para ser autónoma no seu tratamento e no seu auto-cuidado para o bem-estar. A doença impõe ao doente um conjunto de novas adaptações e novas perspectivas de vida, como seja a realização de um tratamento enfrentando uma doença crónica terminal. O acompanhamento profissional, integrado e individualizado por parte do enfermeiro permite que a pessoa se sinta apoiada na difícil jornada de encarar a doença e o tratamento como um processo de vida.

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Os objectivos iniciais da investigação propunham responder à questão de saber quais as vivências da pessoa insuficiente renal crónica no período inicial de tratamento por diálise peritoneal. Perante o exposto ao longo da discussão dos resultados, pensamos que conseguimos compreender que as vivências das pessoas se projectam num trajecto evolutivo da sua doença, que o momento do diagnóstico é o mais significativo, pois este surge como o acontecimento crítico que ditará todo o processo de transição de saúde/doença. A partir desse momento a pessoa experimenta vivências de sofrimento na sua grande maioria emocionais relacionadas com a aceitação e adaptação à doença e ao tratamento. Na compreensão das mudanças que a pessoa teve que integrar no seu quotidiano, percebemos que estas são significativas e relacionadas com a adesão e gestão ao regime terapêutico. As pessoas vivenciam essas mudanças restringidas por horários e limitadas nas suas actividades com a necessidade do tratamento. No entanto e como refere Barbosa (2004, p.31) a “capacidade adaptativa do ser humano é ilimitada e muitos doentes confrontados com a insuficiência renal crónica lutam de modo a ultrapassar as dificuldades, reorganizam as suas vidas e integram no seu quotidiano o programa de tratamento, como se tratasse de mais uma tarefa diária”. Embora limitadas e restringidas pelos horários e tratamentos, a DP não impede que as pessoas (re) construam as mudanças operadas na sua vida e (re) descubram novas formas de adaptação à condição de pessoa com doença renal crónica em diálise peritoneal.

Os cuidados de enfermagem foram percebidos como fundamentais em todo o processo evolutivo da vivência da pessoa em DP, pois, como podemos verificar eles são essenciais no apoio emocional, na promoção do conhecimento, na orientação e no acompanhamento da pessoa no seu processo de transição. Os participantes referem que a relação que estabelecem com os enfermeiros permite-lhes adquirir confiança e mestria na aprendizagem e no desenvolvimento de capacidades para a realização do tratamento. Os enfermeiros são os profissionais de saúde que assumem o processo formativo da pessoa, e este é percebido pelos participantes como meticuloso, pormenorizado, profissional e exigente. A investigação qualitativa revelou-se para mim como uma experiência desafiadora e também vivi momentos de incerteza, de medo e em muitos instantes preocupação por Página 121

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eventualmente não atingir os objectivos inicialmente propostos. No entanto, a persistência na procura de resultados, a necessidade e o desejo de os conhecer contribuiu para o empenhamento na elaboração do presente relatório de investigação. Consciente de que se tratou de um tema extenso e complexo, mantive o rigor dos pressupostos metodológicos exigidos numa pesquisa de abordagem fenomenológica, descrevendo as experiências das pessoas tal como foi relatada, considerando os aspectos mais relevantes.

Por se tratar de uma investigação qualitativa de abordagem fenomenológica, e pelo limite temporal para a entrega do relatório de investigação, a análise e interpretação dos dados poderiam ter sido condicionados o que pensamos ter sido ultrapassado pela nossa persistência e focalização na sua realização. Contudo não podemos deixar de apresentar como limitações para além do espaço temporal para o seu desenvolvimento, o tema ser de grande complexidade e a inexperiência do investigador em investigação qualitativa. No entanto, toda a análise e apresentação dos resultados tiveram uma reflexão séria e fundamentada.

A área de Nefrologia é um desafio constante para os enfermeiros, a prática profissional desenvolvida junto de pessoas com insuficiência renal facilita o contacto com as suas reais necessidades. Compreender como vivenciam os seus processos de doença e tratamentos são o passo para o desenvolvimento de uma enfermagem assente no cuidado humano baseado na evidência científica, com reais contributos para a melhoria contínua da qualidade dos cuidados de enfermagem. O desenvolvimento desta investigação procurou identificar os temas que as pessoas evidenciam na sua vivência em diálise peritoneal. A construção de uma estrutura que resume o modo como as pessoas vivenciam e expressam o fenómeno contribui para uma melhor compreensão da complexidade deste período de vida. A partir destes temas poderão emergir linhas orientadoras de abordagem da insuficiência renal e das suas técnicas depurativas. Ao compreendermos as suas vivências, as mudanças experienciadas e a percepção que as pessoas detêm dos cuidados de enfermagem podemos proporcionar aos enfermeiros que trabalham em serviços de nefrologia e mais concretamente os que estão ligados à área da diálise peritoneal um conjunto de resultados que lhes permitirão intervir intencionalmente nas várias etapas do processo de transição da pessoa.

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Contributos para a prática profissional e para o futuro Os dados encontrados facultarão valiosos contributos para a prática profissional, como sejam: o desenvolvimento do projecto da consulta de enfermagem Pré-Diálise que envolva e integre a pessoa e o familiar de referência em início de DP; a promoção nas consultas de revisão mensal de DP, com a inclusão de aspectos familiares, sociais e profissionais, isto é, uma consulta integradora que ultrapasse a avaliação de parâmetros físicos e; a dinamização da constituição de grupos de pessoas em DP onde se fomente a partilha e o debate de experiências. Potenciar os factores facilitadores e desdramatizar ou ajudar a ultrapassar as respostas desfavoráveis das pessoas em DP, com o desenvolvimento de instrumentos que permitam a avaliação e a monitorização da adesão e da gestão terapêutica em DP. Apoiar as pessoas na reconstrução dos seus novos projectos de vida possibilitando-lhes apoio e orientação com a cooperação da equipa multidisciplinar mantendo a disponibilidade da linha de apoio telefónico e do fórum on-line.

No futuro, esperamos fomentar a elaboração de mais programas de ensino e de educação da pessoa em DP e contribuir para o desenvolvimento do conhecimento científico em enfermagem, pela continuidade de investigação que nos propomos realizar no acompanhamento da implementação de algumas destas medidas, avaliando os seus resultados. As pessoas que sofrem de insuficiência renal crónica terminal precisam de aprender a viver com a incerteza do futuro, e aqueles que procuram e encontram mecanismos de adaptação e estratégias para um equilíbrio do seu bem-estar são os que melhor vivem.

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APÊNDICES

Apêndice 1

Guião de Entrevista

GUIÃO DE ENTREVISTA Tema: As vivências da pessoa Insuficiente Renal Crónica em Diálise Peritoneal - Tipo de Entrevista: Entrevista Semi-estruturada Participantes: Pessoas em programa de diálise peritoneal com início de diálise superior ou igual a seis meses e inferior ou igual a vinte e quatro meses Objectivos: • Compreender as vivências da pessoa IRC no período inicial de tratamento por diálise peritoneal; • Compreender que mudanças a pessoa teve que integrar na sua vida quotidiana no período de transição para a DP; • Compreender como vivenciam estas mudanças; • Compreender como foi percebida a intervenção do enfermeiro no processo formativo da pessoa no período de inicio do tratamento por diálise peritoneal; BLOCOS TEMÁTICOS da BLOCO Validação entrevista e A motivação do entrevistado; Caracterização dos participantes;

OBJECTIVOS ESPECIFICOS

ORIENTAÇÃO PARA AS QUESTÕES

 Formalizar o estudo;  Autenticar a veracidade da pesquisa;  Motivar o entrevistado através do diálogo para a entrevista;

 Apresentação da entrevistadora;  Preenchimento do consentimento informado;  Informação sobre os objectivos da pesquisa;  Comunicação da garantia da confidencialidade dos dados;  Autorização para a gravação das entrevistas;  Informação dos participantes que poderão ter acesso às conclusões do estudo;  Utilização de um diálogo simples e motivador;  Sentimentos vivenciados com o inicio da diálise;  Mudanças que o tratamento implicou no quotidiano;  Dificuldades sentidas e aspectos facilitadores ao longo do processo de diálise peritoneal

BLOCO B

As vivências perante o inicio da realização da Diálise Peritoneal

Recolher dados que permitam compreender como foram vivenciadas as mudanças perante o início da diálise peritoneal

BLOCO C

Relações Interpessoais com o Enfermeiro

Avaliar a percepção dos participantes sobre o desempenho e as intervenções do enfermeiro na diálise peritoneal

  

BLOCO D

Finalização e agradecimentos

  

Confirmar com o entrevistado os principais aspectos focados; Corroborar a utilização e veracidade dos dados; Agradecer a colaboração prestada;

   

Contributo do enfermeiro durante o processo de aprendizagem da diálise peritoneal Teve o apoio necessário para as suas dificuldades? O que faltou?

Resumo da informação recolhida; Confirmação da informação fornecida pelo entrevistado, Redacção final dos dados da entrevista; Agradecimento pela colaboração, atenção e tempo dispensado;

QUESTÕES Idade; Sexo; Estado Civil; Escolaridade; Profissão; Antecedentes pessoais; Etiologia da doença renal; Inicio da diálise peritoneal. Quando lhe comunicaram a decisão da necessidade de iniciar a DP, lembra-se como se sentiu? Que sentimentos/emoções essa situação provocou? O que lhe veio à mente? Descreva-me, que mudanças o tratamento implicou?  Na vida familiar? No trabalho? Na vida social? Na vida sexual?  Como viveu essa situação? Na transição para esta nova situação de vida e para ser autónomo, o que teve de aprender?  Que dificuldades teve nesta aprendizagem?  O que facilitou a sua aprendizagem?  Como actuou o enfermeiro neste processo?  Em que medida o enfermeiro o ajudou?  O que notou que faltou nesse período? Existe mais algum aspecto que deseja referir em relação ao tema?

Apêndice 2

Consentimento Informado

CONSENTIMENTO INFORMADO

Aceito participar como colaborador, no trabalho de investigação desenvolvido por Maria Arminda Tavares, aluna do IV Curso Pós-Licenciatura de Especialização em Enfermagem de Médico-Cirúrgica da Escola Superior de Enfermagem de Coimbra, subordinado ao tema: “As vivências da pessoa Insuficiente Renal Crónica no início da Diálise Peritoneal numa unidade hospitalar”, tendo em conta os seguintes assuntos sobre os quais fui esclarecido(a): •

O objectivo do estudo é compreender as vivências da pessoa Insuficiente Renal Crónica no período de início da Diálise Peritoneal, sendo que a informação recolhida é para uso exclusivamente científico e pedagógico.

A informação será obtida através de uma entrevista gravada em suporte áudio, não sendo

previstos

danos

físicos

ou

potenciais

efeitos

colaterais,

podendo,

eventualmente, surgir algum mal-estar emocional secundário à evocação de memórias sensíveis. Caso tal aconteça, será respeitada a vontade do entrevistado(a). A entrevista poderá ser interrompida ou suspensa a pedido do entrevistado, poder-se-á dialogar sobre o assunto e marcar novo encontro, se para tal, o entrevistado se mostrar disponível. A privacidade dos participantes será salvaguardada, sendo as suas identidades conhecidas apenas, exclusivamente, pelas pessoas directamente envolvidas no trabalho de investigação. A aluna responsável pela elaboração do trabalho compromete-se a divulgar os resultados do mesmo, directamente, a todas as pessoas que colaboraram neste, através do fornecimento dos seus testemunhos. Data: ___/___/___ Assinatura do participante: ___________________________________________________ __ Assinatura do entrevistador: ___________________________________________________ _ AUTORA: Maria Arminda da Silva Tavares Escola Superior de Enfermagem de Coimbra Contacto: 917290633 ORIENTADORA: Prof. Isabel Fernandes Escola Superior de Enfermagem de Coimbra Contacto: 239 802 850 CO- ORIENTADOR: Prof. Dr. José Roxo Escola Superior de Enfermagem de Coimbra Contacto: 239 802 850

Apêndice 3

Entrevista Transcrita

Entrevista G Decl. Si.

Entrevista 7ª entrevista Bom dia, há medida que lhe vou fazendo umas questões a senhora vai respondendo. Idade? R: 44 anos. Sexo? R: Feminino. Estado civil? R: Casada. Escolaridade? R: Sexto ano, segundo ano do ciclo, sexto ano antigo. Profissão? R: Era como trabalhadora rural, neste momento estou reformada por invalidez. Antecedentes pessoais de doença renal na família? R: Sim, já desde avô, pais, tios, irmãos e primos. Já vem de várias gerações, é hereditária. Causa da doença renal, sabe? R: Poliquistica. Lembra-se da data de início da diálise peritoneal? R: A 20 de Outubro de 2009. Quando lhe disseram que era insuficiente renal e que necessitava de diálise, como se sentiu? R: Humm!..Foi um bocado difícil, porque primeiro fo i no meio de uma crise que eu tive de vir à urgência e foi na urgência que me comunicaram que eu tinha que entrar em diálise o mais breve possível. Que estávamos mesmo no fim da linha e, foi aí que me falaram na diálise peritoneal. Eu não tinha sequer a mínima noção, nem a mínima informação do que era a diálise peritoneal, porque conheci minimamente a hemodiálise porque já o meu pai e os meus tios tinham feito, mas diálise peritoneal eu nunca tinha ouvido falar. Visto ou ouvido falar, não tinha informação nenhuma e aí foi um bocado con fuso. Primeiro o choque em si de ter que entrar assim rapidamente e depois o não saber o que escolher, porque depois deram-me a escolher se queria uma ou queria outra. Até que acabei por optar pela diálise peritoneal, porque achei, depois de me explicarem, achei que era mais cómoda e melhor para mim. Mas o apoio da família foi imprescindível, porque prime iro não sabia bem, depois não tinha informação nenhuma sobre a diálise peritoneal. Depois tive a colaboração, portanto, da equipa tanto de enfermagem como os médicos de DP que me explicaram e que me informaram. Aliás, assisti a um tratamento de uma senhora que estava aqui em consulta e pediram-me para eu ver, isso esclareceu-me alguma dúvidas que eu tinha. Depois também não tendo muito boas veias para fazer hemodiálise, para poder fazer a fístula, também foi uma das coisas que me ajudou a decidir melhor. Mas depois foi difícil, muito difícil, como sofro de ansiedade crónica também não ajudou nada, foi ali um período cerca de 2 semanas muito complicado. Eu só chorava, eu só dizia que pr eferia morrer porque achava que a vida tinha acabado e não valia a pena continuar a sofrer, porque era muito sofrimento e não compensava, não valia a pena. Tive muito apoio da minha família, principalmente do meu marido e da minha filha que foram espectaculares, acompanharam-me sempre às consultas, acompanharam-me sempre para todo o lado que eu precisasse de ir e ajudaram-me muito. Levámos os livros para casa, para lermos e para percebermos melhor a diálise, como era feita e como eram os cuidados que tínhamos que ter. Eles leram comigo, ajudaram-me a decidir e apoiaram-me muito e pronto. O meu marido ajeitou digamos assim, o que era preciso em casa, uma divisão só para a diálise. Optei pela DP e estou a fazer há cerca de ano e meio e estou muito satisfeita. Deus queira que aguente assim bastante tempo até vir o transplante e que não precise de ir para a hemodiálise, porque neste momento, se eu tivesse optado pela hemodiálise, aí sim, não sei, ainda estaria viva, mas acho que não. Acho que era um sofrimento muito maior, um desgaste muito maior e a diálise peritoneal dá-nos um conforto,

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podemos estar na nossa casa, no nosso ambiente, a fazer os nossos tratamentos desde que tenhamos a consciência que temos de cumprir horários e temos de ter regras. Temos de ter higiene, temos de ter os nossos cuidados mas acho que em termos de apanhar vírus ou apanhar qualquer contaminação estamos mais livres ao fazer este tratamento em casa do que propriamente vir ao hospital. Não quer dizer que o hospital não seja desinfectado e tudo mais, mas há muitas pessoas a vir ao mesmo local, a virem às mesmas máquinas a trabalhar com os mesmos materiais, ali não, somos só nós, somos só nós que mexemos, somos só nós que entramos claro, sempre com a precaução das máscaras, mas acho que é muito melhor. Não é doloroso, o que é também muito bom. Descreva-me um pouco que mudanças que o tratamento implicou na sua vida? Na vida familiar? R: Na minha vida familiar não implicou nada, pelo contrário, acho que até ajudou bastante. Que se eu tinha uma família muito unida, desde que entrei em diálise peritoneal mais unida e mais preocupados. Eu noto às vezes até preocupação a mais comigo, às vezes gostava de fazer as coisas mais à minha vontade e eles ralham comigo de eu fazer algum esforço ou de eu… Às vezes digo "eu não estou inválida, estou apenas a fazer um tratamento, mas eu sei que consigo fazer a minha vida normal". Nesse aspecto, acho que nos uniu mais ainda e noto neles que tem sempre uma preocupação. Se eu for para agarrar uma coisa qualquer e um deles tiver ao pé de mim "deixa estar que quem pega nisso sou eu", prontos, para eu não fazer esforço (*++), com aquela preocupação de alguma coisa me fazer mal. Na minha vida pessoal posso dizer, que praticamente a única coisa que mudou foi deixar de trabalhar nas terras, porque é um trabalho duro e a única coisa que tenho dificuldade é andar abaixada, pelo volume da barriga, pelos tubos, com medo de os vincar ou fazer estragar qualquer coisa. É mais por aí porque de resto a vida normal de casa, faço a vida normal. Uma coisa que para mim achei um bocado difícil e que me custou mais a habituar foi não poder tomar aquele banho normal como se tomava antes, poder estar ali debaixo do duche, ali se fosse preciso meia hora, com medo de fazer mal ao orifício, de infectar, de estar depois ali o penso muito tempo molhado ou isso. É sempre uns banhos mais rápidos, não é? De resto faço a vida normal. Na vida social? Os amigos? R: A única coisa que modificou é cumprir com os horários dos tratamentos, ou seja, se eu tiver num almoço, ou se tiver numa festa ou num casamento ou uma coisa assim, sei que àquela hora tenho que vir a casa fazer o tratamento, porque de resto, vou às compras na mesma, vou passear de vez em quando aos fim-de-semanas, só que em vez de sair de manha e não ter horas para voltar a casa, sei que tenho que voltar para fazer o tratamento esteja aonde estiver. Vá para onde for tenho que organizar o tempo, as horas, de modo àquela hora estar em casa, eu tento o máximo possível ser rigorosa com as horas do tratamento. Se falhar... Quantas trocas faz? R: Faço 3 por dia, se falhar meia-horita na troca da tarde, porque fui a uma consulta e demorei mais ou fui dar uma voltita e apanhámos trânsito e demorámos. Meia-horita é o máximo. Na vida sexual? R: É assim na minha vida sexual, não se pode dizer que se tenha alterado alguma coisa, porque antes de fazer diálise já não tinha uma vida sexual muito activa. Porque também tenho problemas da parte ginecológica e já não tinha, digamos prazer, na parte de sexo. Fazia-o, faço-o mais por obrigação, por saber que eu estou assim e não tenho prazer, mas o meu marido continua a ter e também não quero que ele seja castigado, digamos, por uma falta minha. Se eu não tenho mas se poder dar a ele, mas ele também compreende isso e também não é aquela pessoa de fazer exigir "de eu quero, tens fazer", não. Muitas das vezes até sou eu que acabo por insistir e proporcionar isso, mesmo eu não tendo vontade, não tendo eu qualquer prazer, qualquer gosto, nem qualquer satisfação nisso, mas sabendo que realmente há uma semana, há duas ou há três e sabendo que ele como homem tem as suas necessidades. Como viveu essa situação? O que alterou?

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R: Não alterou mais nada, se eu for a uma festa posso comer de tudo, coisa que se eu fizesse hemodiálise já não podia ser, não é? Porque tinha de ter mais restrições na comida, na bebida e neste caso não tenho, convivo na mesma. É um bocadinho mais de desconforto de ter este volume na barriga que não, a gente não se sente, a roupa não assenta tão bem, não se sente tão jeitosa, não se sente! Mas de resto, o convívio seja com a família, seja com amigos, a diálise peritoneal não me impede de nada disso. Quando foi para aprender e para se tornar autónoma, lembra-se do que aprendeu? R: Sim lembro-me, tive aqui internada cerca de uma semana mais ou menos os primeiros dias a ver fazerem-me e depois comecei eu, a pouco e pouco a fazer até que não foi difícil, não é difícil, não acho que isto seja uma coisa difícil d e aprender. Lembra-se como se sentiu nos primeiros dias? R: É assim, a primeira vez se calhar, o primeiro dia talvez pareceu-me um pouco confuso. Aqueles passinhos todos e depois as recomendações dos enfermeiros a dizerem-me que nós não nos podíamos esquecer de passo nenhum porque podia ser, um passo em falso ou um esquecimento podia ser fatal para uma infecção, para uma peritonite. Isso assustou-me um bocadinho os primeiros dias e achava que era muita coisa, que tinha que aprender muitas pequeninas coisas e ter o cuidado de não esquecer de nenhuma delas, que era um seguimento passo a passo. Só que depois, depois de começar a experimentar, comecei a ver que isto afinal não era assim tão difícil, pelo con trário, até é bastante fácil e agora é uma coisa tão rotineira, tão fácil, como de manhã levantar e tomar o nosso pequeno-almoço, tomar o nosso banho, lavar os nossos dentes, pentear o nosso cabelo, vestir a nossa roupa. Acho que faz parte da rotina diária. Não, não vejo qualquer impedimento, nem acho que seja assim nada que não se consiga aprender com facilidade desde que se tenha, pronto também se tenha um bocadinho de gosto e de interesse, porque há pessoas que encontrei, pessoas aqui internadas na altura quando chegaram, e chegaram a vir ver eu a fazer, as pessoas diziam "ai não eu nunca vou conseguir fazer isso, porque eu não vou conseguir lembrar desses passos todos" eu acho que isso tem de haver um bocadinho de concentração, de opinião e de gosto da pessoa de como em qualquer outra coisa. Que dificuldades é que teve nesse período de aprendizagem? R: Eu acho que nem tive dificuldades nenhumas, primeiro era mais o medo e tirando isso até aprendi muito rápido, embora tivesse estado aqui cerca de oito dias, mas penso que foram só os dois primeiros dias que precisei de ajuda, depois comecei a fazer praticamente a fazer o tratamento sozinha. O que acha que facilitou esse processo? R: É assim facilitou-me muito o apoio, a dedicação, a maneira como me explicaram de toda a equipa. A equipa, seja de enfermagem, seja de médicos, toda esta equipa que trabalha neste sector. Acho que se empenha muito com os doentes e tem muita, uma muito boa relação com os doentes e isso dá-nos uma confiança muito grande. Porque nós chegamos, eu penso, eu falo por mim (......) a gente confiar nos profis sionais de saúde e a confiança que eles nos transmitem a nós, o carinho que eles nos dão, isso ajudou-me muito nessa fase. Porque eu não vejo estes profissionais como apenas enfermeiros ou como apenas médicos, mas sim quase já como família. Eu sinto-me à vontade, quando tenho alguma dúvida ponho, esclareço para não ficar com dúvidas, sempre me esclareceram e me responderam a tudo. Sempre me explicaram tudo muito bem. Como actuou o enfermeiro no processo de aprendizagem? R: Ah, é assim, essa é uma parte muito importante deste tipo de tratamento. É a gente sentir que temos ali uma pessoa sempre disponível para nos explicar alguma dúvida que nós tenhamos ou alguma coisa que surja menos boa, temos sempre ali um apoio para nos socorrer. E isso foi uma coisa que me puseram logo à vontade, qualquer dúvida que eu tivesse. Para já explicaram tudo muito bem, como muita calma e sempre a perguntar se eu estava a perceber, se eu precisava e se tivesse alguma dúvida para pôr. Tinha sempre o apoio, quer que fosse pelo telefone, mesmo depois de estar em casa ou vindo cá pessoalmente, nunca me faltou apoio sempre que tive alguma necessidade. Isso dá muita confiança porque a gente sabe que temos 24horas sempre alguém, qualquer coisa que surja, basta pegar no

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telefone e temos sempre alguém do outro lado, para além de nos dar muito apoio, muita força, carinho. Uma palavra amiga de conforto num momento menos bom e que temos um socorro a toda a hora. Já teve alguns problemas? R: Já tinha começado, cerca de dois meses e tive uma peritonite. Penso e os médicos confirmaram, que tinha sido provocada por uma gastroenterite, de qualquer coisa que eu comi que não estava em perfeitas condições. A partir daí, nunca mais tive qualquer problema, apareceu-me também no início um pouco de sangue no líquido e pensa-se que tenha sido do tubo que roçava um pouco na bexiga provocando esse sangue, mas não dava dores. Como é que lida com o cateter? R: Neste momento muito bem. E quando o viu pela primeira vez? R: Quando o vi pela primeira vez, antes de colocarem o meu cateter eu vi aqui numa senhora que estava aqui em consulta e aí já fiquei com uma ideia de mais ou menos o que era. A minha preocupação na altura é se aquilo ficava a causar dor ou incómodo. Depois quando me colocaram o cateter ficou interior, não ficou exterior, porque julgavam que eu aguentava ainda mais algum tempo sem começar os tratamentos, mas infelizmente aguentei pouco mais de um mês. Depois foi extraída a ponta e comecei logo, dia 20 de Outubro a fazer a diálise, depois não me assustou e como vi a outra senhora…Como vi que realmente apesar de isto andar por fora, mas não me causava dor. Não vou dizer que nas duas primeiras semanas não senti um incómodo, porque era uma coisa estranha que estava aqui e eu notava aquela dificuldade às vezes a mexer-me a tomar banho. Não estava habituada e como aumentava a barriga nos primeiros dias também sentia aquele peso. Dava uma sensação um bocadinho desconfortável, mas foi só essas duas primeiras semanas. A partir daí, para mim agora se não fosse olhar para ele quando vou fazer os tratamentos e quando estou a tomar banho, na minha vida normal até me esqueço que tenho aqui qualquer coisa, que tenho aqui um cateter, tubos dentro da barriga, ou até mesmo o líquido a fazer o tratamento, a não ser às vezes quando me vou para baixar e barriga esta um bocadinho maior e tenho alguma dificuldade em me dobrar. O que notou que poderá ter faltado no período que esteve a aprender? R: Acho que não me faltou nada. Confesso que acho que não me faltou nada. Apoio da família tive sempre, todos os dias tinha visitas. Apoio dos funcionários do hospital (*++) não puderam ser melhores, eu quase que me sinto como se esteja em casa, porque como disse há pouco conheço este hospital há muitos anos, logo "já faço parte da família" (*++) o que às vezes fazem mais milagres que a medicação. Tive muita sorte com os profissionais e não tive nessa parte dificuldade nenhuma. Alguma sugestão? Algum comentário? R: A sugestão que eu gostaria de dar era, se alguém entrar a precisar de entrar em diálise e que tenhas condições em casa para poder fazer, condições físicas também para poder fazer DP e que os médicos não vejam nenhum inconveniente é uma excelente escolha a diálise peritoneal. Em comparação à hemodiálise, não digo que a hemodiálise não seja um bom tratamento mas eu acho que em termos de sofrimento, porque eu vi pelo que o meu pai passou quando fez durante 5 anos hemodiálise. Em te rmos de sofrimento, em termos de desgaste físico do organismo, acho que a DP é melhor. Não temos que vir dia sim, dia não ao hospital, temos o nosso ambiente, a nossa casa (*++) e é isso. Eu aconselho todas as pessoas que podem fazer DP, a escolher a DP. Eu sinto-me muito bem e espero que continue a correr tudo bem como correu até aqui, e estou muito contente por ter escolhido a DP. Muito satisfeita. Obrigado pela sua colaboração. Obrigado.

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Apêndice 4

Entrevista Sublinhada

Entrevista I SIGNIFICADOS AGREGADOS

VIVÊNCIAS

MUDANÇAS DO QUOTIDIANO

PROCESSO DE ADESÃO INTERVENÇÃO DO ENFERMEIRO

VIVÊNCIAS Conhecimento

Emoções Reacções

Adaptação

Aceitação

Entrevista

SIGNIFICADOS

9ª entrevista vou realizar-lhe algumas questões.. Idade? R:62 anos Sexo? R: masculino Estado civil? R:casado Escolaridade? R: ciclo...que a gente lhe chamava em tempos... Profissão? R:comerciante… Antecedentes pessoais de doença renal na família? R:que eu tenha conhecimento não tenho...renais não tenho...nunca tive...tenho antecedentes de família com...um irmão que morreu com 55 anos com leucemia...mas...portanto...renal, não tenho tido nada...pelo menos que a gente saiba, n é? Causa da sua doença renal? R:ah...foi a minha creatinina, que aumentou e pronto...e a perda de sangue na urina, não visível...aquela coisa que se chama...a olho nu...e então partir daí tive consult as da nefro a que levou-me a esta situação de fazer diálise peritoneal... Quando lhe comunicaram a necessidade de fazer diálise, como se sentiu? Gostava que me falasse um pouco sobre esse período? R:olhe...psicologicamente a gente fica abalado...e segundo aquilo que a gente já tem alguns conhecimentos da outra hemodiálise, porque esta não era conhecida para mim...a gente fica um bocadinho assustadores...porque ficamos...ficamos pronto abalados...mas isso penso que em qualquer doença a pessoa pode ficar abalado...depois houve uma adaptação...e hoje aqui estamos a faze-lo...do mal ao pior...acho que me sinto melhor...se tivesse que fazer a outra seria muito pior...é certo que quando vou fazer as minhas mudas que... chatice....mas depois a gente volta atrás...e se tivesses que ir para lá quatro horas...e pronto..a gente aceita....também sei que há as mudas feitas automáticas...segundo tenho falado com alguns colegas, não sei qual delas a melhor em termos práticos...porque a outra também traz os seus problemas e os seus “queês”...quando encrava a maquina...quan do aquilo não corre bem...na manual não é tanto...são problemas que se podem surgir mas que se resolvem ali muito rapidamente...pronto...faço 4 trocas por dia. .. Descreva-me um pouco as mudanças que o tratamento implicou na sua vida? Familiar? Trabalho? Social? R:portanto...aquilo que realmente que se teve de fazer

Caracterização da amostra

Idade Género Estado civil Escolaridade Profissão Antecedentes pessoais de doença renal Etiologia da doença renal

Etiologia da doença renal

Debilidade Experiências anteriores Intimidação Adaptação

Aborrecimento Dependência

Desinformação

MUDANÇAS DO QUOTIDIANO Familiar

Profissional

Social

Cultural

PROCESSO DE ADESÃO Aspectos dificultadores Aspectos facilitadores Aprendizagem Explicação

foi...arranjar condições, higiénicas...penso que é o máximo que se pode para este tipo de situação... é ter higiene, n é? e depois fazer um programa de vida, organizar o tempo de modo a poder fazer os tratamentos...n é? No meu caso que trabalho e trabalho a 7 km de casa, consegui ter possibilidades de fazer no emprego...porque reúno condições…segundo que a colega foi ver e que reúno condições...até lá foi ver duas vezes...e que isso também facilita um bocadinho a perca de tempo, transporte...e que possa estar mais acessível...esta muda, porque também a FR, não é?...hum… facilitou também uma parte do equipamento para fazer uma segunda troca noutro local, não é? Temos o problema do caso de uma saída ao domingo...que é mais (~~~~~~) por causa dos horários...não por sistema, mas tenho feito já só três...o médico também me deu essa autorização, que não abusasse e faço-o...e pronto é uma questão de organização de vida que a gente têm... eu por exemplo faço férias...quase todos os fim-de-semana vou para a praia porque tenho uma casa na praia, agarro na maquinazinha levo-a, levo o aquecedor, levo...tenho lá condições...levo os equipamentos e faço lá também...e…teve que se realmente fazer um programa de vida diferente não é? para quem tinha uma actividade como eu tinha de muitas reuniões até à noite...tenta-se conciliar uma coisa com a outra...como há um espaço de 4 a 6h de muda dá espaço para que nós possamos programar a vida, n é? Na sua vida social? Sair com os amigos? R: nem todos os amigos sabem que eu faço, não é? lá vem um ou outro caso que digo "e pah tenho de ir para casa" e depois aí é que eu explico, dou uma explicação e aceitase...penso...da outra parte não sei o que as outras pessoas possam pensar, mas penso que aceitam também a minha reacção e aceitam bem não é? Como viveu essa situação de todas estas mudanças? R: pronto...como digo abala um bocadinho o psíquico ...se a gente se lembra de todos os dias de comer também se lembra disto não é? simplesmente porque primeiro temos de fazer a nossa muda...e então aquilo já se faz quase como um ritual que quase já nem se nos lembramos do que é que vamos fazer...mas sabemos que aquela hora temos que fazer aquilo...e... tanto eu como a família já estamos preparados...chega aquela hora e "está na tua hora"..."eu sei, pronto"...à noite estou no sofá e "já fizeste?" e eu "Não...vou fazer!"...e pronto é este clima que se cria e este ritual...quase que se passa a ser uma ritual...tal como fazer a barba...vestir, né? Se antigamente demorava um quarto de hora para me preparar para sair, hoje demoro mais três quartos de hora...são 3/4 hora que me previno antes para tomar conta de mim...n é? Na transição para esta nova situação de vida e para ser autónomo, teve que aprender a fazer a diálise? fale-me um pouco sobre esse período de aprendizagem?

Adequação de recursos Organização do tempo/projecto de vida(saúde?) Facilidade de adaptação ao emprego

Limitação social

(~~~~~~) – não se percebe Organização de vida

Conciliação

Consternação Função vital do tratamento Ritual de vida Integração familiar Ritual

Tempo

Experimentação

Apreensão Compreensão

R:Sim...tive que aprender os métodos exigidos...e os melhores métodos para que isto corresse sempre bem...por causa sobretudo das infecções, não é?... e que tive preparação cá no hospital...que fui muito bem ensinado penso eu...e recebi muito bem a lição... e que hoje já faço isso realmente...já está treinado...e já se faz aquilo pronto...mecanicamente... E como se sentiu nesse período de inicio da diálise ? R: é como digo e continuo a dizer...pronto...é luta r pela vida...a gente sente-se naquele momento mas se a pessoa quer viver é mais uma etapa que vai fazer, pronto...arrisca...não é um arriscar, é fazer um trabalho para que possa resultar com resultados...pronto...e é nessa esperança que a gente vive e vamos fazendo, não é? Que dificuldades é que teve nesse período de aprendizagem? R:hum...a dificuldade foi portanto...o atrapalhar d as coisas às vezes...se a gente havia de agarrar no tubo e mete-lo no cateter, mudá-lo de um lado para o outro...esquecia de fechar o saco, ou se esquecia de rebentar o saco, mas tudo aquilo foi falta de uma prática...porque ao pr incipio a gente baralhava um bocadinho as coisas, não é? Sabemos que temos que lavar as mãos duas vezes, se calhar só se lavava uma vez e há segunda vez já não se lavava, porque já as lavei...mas "ai..tenho que as ir lavar outra vez" e já cheguei a pendurar o saco sem o rebentar e depois "e pah isto não corre..." e depois acabamos por ver e lá tenho que eu voltar à fase inicial...e fazer a mesma coisa...já me aconteceu a pipetazinha do cateter cair no chão e tive que por um saco novo e fazer tudo de inicio....são coisitas...depois na questão da adaptação foi esta atrapalhação toda...porque são muitas coisas ao mesmo tempo e que requerem uma prática...é só..pronto... O que facilitou a sua aprendizagem? R:o que é que me facilitou? facilitou o facto de eu fazer isto já muito normal...já faz parte da minha vida.. .é como por uma gravata, tenho que fazer o nó...ali tenho que esperar que aquilo corra, que saia um e entre outro...de fazer o penso...de fazer aqueles tipos todos de preparativos...pronto...para que eu me possa preparar para ir para a vida...para vida do dia a dia...mais ...facilitoume aquilo que me ensinaram...portanto...se me pusessem aquilo nas mãos e faz...sem ninguém me dizer nada, eu não era capaz, não é? então…portanto..o que me facilitou foi da parte da enfermagem de me ensinarem como é que se faz uma muda e como é que eu tinha que fazer...tanto na muda como no penso...e foi isso o ensinamento...portanto, não estive cá só para me tratar mas também para me ensinarem, não é? Fale-me um pouco sobre como actuou o enfermeiro nesse processo de aprendizagem? R:ah...actuou muito bem...souberam explicar, insist iam com a gente para a gente aprender...chamavam-nos a atenção...tipo ralhamento de escola "tens que aprender,

Aprendizagem

Ensino hospitalar Ensino/treino/instrução

Desejo pela Vida/Projecto de vida?

Resultados

Novidade/atrapalhação

Falta de prática (esquecimento)

Tempo de treino

Rotina

Ensinos

Ensino dos Enfermeiros

Tempo para o ensino

Explicação Aprendizagem

INTERVENÇÃO DO ENFERMEIRO Intervenção de Enfermagem

Ajudar Apoiar Ensinar Observar Explicar

porque afinal esqueceste-te..." mas isso é uma chamada de atenção para que a gente não se esqueça mais não é?...claro muito simpaticamente e com boas maneiras de ensino, chamando à atenção dos erros que isso é normal em qualquer professor, não é? (risos) porque quem não chama a atenção, deixa-se baldar um bocadinho...e éramos chamados à atenção...foi isso que foi muito bom... O que é que o enfermeiro fez que o ajudou? R: primeiro ele fê-lo, era ele a executar a muda...portanto tanto a nível da muda como do penso...era ele que tratava...primeiro...pronto...para vermos como ele fazia...e depois passávamos à prática a faze-lo, depois de nos ensinar...mas primeiro era ele que fazia tudo...depois passávamos então a fazermos nós... O que notou que faltou nesse período? R:...não posso dizer que tenha faltado alguma coisa , porque não faltou nada...fui bem explicito daquilo que ia fazer...fui bem...bem...elucidado dos pormenores qu e devia ter em casa, com a limpeza, com o tratamento...ahh..da maneira de como devia actuar...e penso que não fui daqui sem saber o que ia fazer...penso que fui bem elucidado...e que o enfermeiro conseguiu portanto...que eu aprendesse e que eu fixasse aquilo que era importante para eu fazer a peritoneal... Nos primeiros dias como se sentiu em casa? R:é sempre uma novidade que está em casa...é mais um aparelho que está dentro na casa de banho que faço...uma casa de banho que foi estipulada só para mim...teve que se comprar mais um móvel e partir daí como lhe digo...passou a ser um ritual... E hoje como se sente? Fale-me um pouco sobre isso... R:hoje...portanto...é como digo "que raio de chatice que eu tenho de ir agora fazer esta muda...mas depois volto atrás e digo...será melhor esta que outra"...portanto há que enfrentar e acabo por entrar neste ritmo de que é uma coisa normal, de como ir beber a bica ao café e ler o jornal...aquele tempo tenho que estar ali...e é ali que eu faço... Existe mais alguma coisa que queira dizer sobre o assunto? R: não...eu só...digo...que a faça por muitos anos. ..que a faça por muitos anos...se a tiver que a deixar de fazer…tudo bem…mas se tiver possibilidade...que faça esta por muito anos...porque entre esta e outra…deixome estar com este rebuçadinho...(risos) Muito obrigada pela sua colaboração Nada...

Observação/reparo Métodos de ensino

Explicação

Experimentação

Auto-cuidado

Novidade

Estratégia de aceitação da doença?

Apêndice 5

Análise de Conteúdo

FENÓMENO EM ESTUDO: VIVÊNCIAS DA PESSOA EM DIÁLISE PERITONEAL 1 - “() SE TIVER QUE FAZER TENHO DE FAZER” TEMA

SIGNIFICADOS AGREGADOS

D I S P O S I Ç Õ

DENEGAÇÃO ACEITAÇÃO

E S

TOMADA DE DECISÃO

I N D I V I D U

ADPTAÇÃO

SIGNIFICADOS

DECLARAÇÕES SIGNIFICATIVAS

Denegação – é um tipo de coping com as seguintes características específicas: disposições que se tomam para reduzir, evitar ou repudiar um conhecimento ou o seu significado no sentido de minimizar a ansiedade ou conflito por uma recusa inconsciente de aceitar pensamentos, sentimentos, desejos, impulsos ou factores externos que, conscientement e seriam intoleráveis (CIE, 2001).

“Foi assim, numa consulta no médico de família o Dr. ficou admirado com a tensão alta então passou-me uma carta para as urgências, vim aqui às urgências do hospital e apareceu-me o Dr.P. Ele viu o que é que eu tinha, entretanto marcou-me as consultas para as consultas externas e fez vários exames cá no hospital e depois disse-me que tinha insuficiência renal. Andei assim uns anos, talvez 12 ou 13 anos nestas consultas, a tensão arterial estava controlada com os medicamentos mas acho que a parte renal começouse a degradar, não é? Até que comecei, até que ele me falou na diálise peritoneal e disse-me “um dia você mais tarde vai ter que fazer”. E se tiver que fazer tenho que fazer. Quando foi nesse ano de 2009, talvez no verão ele disse-me na consulta, “tem que ir meter o cateter para fazer a diálise peritoneal”, comecei a fazer manual e depois passados uns tempos em Fevereiro no ano seguinte passei para a automática”. (EA – L37-47)

A I S

P A R A

O

I N I

Aceitação – é um tipo de coping com as seguintes características específicas: disposição para, com o tempo, gerir e manejar o stress, eliminar ou reduzir sentimentos de apreensão e tensão, restrição de comportamento s destrutivos (CIE, 2001).

C I O

Tomada de decisão disposição que a pessoa tem para aceitar ou abandonar

“Lembro-me bem, foi um choque grande que eu tive, porque eu não sabia o que era, nem imaginava tal coisa e fiquei bloqueada mesmo. Sofri um bocado com isso, mas agora já estou um bocadinho mais aliviada porque já tenho mais forças e assim, mas foi um choque grande, mas vai passando”. (EC-L20-23) “É uma doença, mas pronto o tempo que eu durar, durei. Não posso desmoralizar-me, ir para baixo, porque se não...Senti-me um bocado coisa, mas agora já não é tanto. A minha vida agora olha, um dia de cada vez, a gente só pensa num dia de cada vez, de resto agora já não penso tanto. Tanta preocupação que eu tinha, que agora já não tenho, já não tenho tanto medo. Pronto, vamos andando...” (EC – L29-34) “Quando soube da notícia, eu acreditava como não acreditava, com a medicação que eu andava a tomar, eu pensava assim "ah eu vou melhorar" e nunca vai ser preciso diálise. Mas eu tinha que me convencer que um dia tinha que fazer hemodiálise. Pronto, fiquei um bocadinho triste, andei triste mesmo, andava assim um bocado deprimido "é pá tão novo, fazer diálise, hemodiálise e assimB" e foi isso que me aconteceu”. (EF – L61-65) “BemBeu já que andava com a certeza que ia para a peritoneal mais tarde, para a diálise mais tarde, porque ele avisou-me logo, isto vai andando até que um dia tem mesmo que fazer, portanto eu sabia, não estava bem preparado mas estava à espera para fazer este tratamento. Aquilo que me custou mais foi realmente quando soube o que eu tinha, nessa altura quando soube o que tinha fiquei um bocado desesperado, depois fui-me adaptando e quando vim para o tratamento já vinha à espera. O pior momento foi quando soube, foi um bocado triste, agora estou mais ou menos adaptado a esta, como é que eu hei-

D A

D I Á L I S E

P E R I T O N E A

acções tendo em conta o seu julgamento; a capacidade de escolher entre duas ou mais alternativas pela identificação de informação relevante; a necessidade de fazer escolhas que podem afectar o próprio ou terceiros (CIE, 2001, p.50). Adaptação – é um tipo de Autoconhecime nto com as seguintes características especificas: disposição para gerir novas situações e desafios (CIE, 2001).

de dizer, estou conformado. O que hei-de fazer, se não fosse este tratamento já cá não estava”. “Mesmo quando comecei a fazer diálise peritoneal que era a manual isso pronto, uma pessoa fica a pensar um bocado, agora não, com a máquina é uma maravilha. Uma pessoa deita-se à noite, mesmo à noite é uma preocupação, ter que pensar que tem de ir fazer aquele trabalho mas tem de ser, tem de ser e o que tem de ser é mais forte! Agora a manual mete uma pessoa de rastos, um bocadinho. (ED – L28-33) “Pronto lidei bem com isso, tinha de ser”. (EB-L30). “A minha causa da doença renal foi, as minhas tensões muito altas e com dores de cabeça. Depois fui ao médico e até foi o Dr. P que procurou qual era o meu problema e disse-me que um dia mais tarde tinha que fazer hemodiálise. Nessa altura ainda não se falava em outra diálise. Tenho vindo, vinha às consultas externas e de um momento para o outro, piorei, fui piorando, piorando e depois tive que entrar em hemodiálise. Hemodiálise primeiro e depois deram-me a opção hemodiálise ou diálise e eu escolhi a diálise peritoneal”. (EF – L15-20) “Optei pela DP e estou a fazer à cerca de ano e meio e estou muito satisfeita. (B) Não é doloroso, o que é também muito bom. (EG – L59).

L “Apesar de ter visto uma pessoa na altura que me disse que isto era bom e não sei quê, mas eu não acreditava pronto, não acreditei mesmo. Ela ainda me disse "isto vai ser bom, é uma diálise boa" e eu toca de chorar. Apanhei uma depressão por causa disso, foi um bocado muito conturbado. O enfermeiro N é que sabe muito bem disso, que ele é que me teve de aturar muito em baixo. Depois começou-me a contar histórias de vidas que também não tem sido boas e assim, comecei a pensar então, bom se há vidas assim, a minha também...(pausa) O cancro há-de ser pior, pronto”. (EE – L33-40) “Eu para dizer a verdade, não aceitei muito bem e não aceitei muito bem que há poucochinho tempo aconteceu o que aconteceu, não sei se lembra, mas tive cá à 15 dias (...)e foi na altura que me senti muito mal e se eu quiser contar alguma coisa, não consigo, porque não me lembro do que se passou”.(EF- L3359) “Aquilo que me custou mais foi realmente quando soube o que eu tinha, nessa altura quando soube o que tinha fiquei um bocado desesperado, depois fuime adaptando e quando vim para o tratamento já vinha à espera. O pior momento foi quando soube, foi um bocado triste, agora estou mais ou menos adaptado a esta, como é que eu hei-de dizer, estou conformado. O que hei-de fazer, se não fosse este tratamento já cá não estava”. (EA – L-54-58) “Nos princípios custou-me muito, estive sempre muito

nervosa, era o que eu sentia, por medo, era medo. Tive momentos que tinha medo de ter cá isto dentro e medo de me aparecer outra coisa, medo sei lá, mas prontos. O que eu haveria de fazer? Era um medo. E depois uma pessoa com aquele medo a gente enervase. Tinha medo quando ficava sozinha lá por casa e desatava a chorar, mas porque tinha que chorar? Mas uma pessoa nunca se viu com isto, nunca ouviu falar de tal coisa. Foi assim um choque, pronto. Volta e meia ainda me lembro, ainda foi há pouco, não é? Agora já estou a aceitar melhor, já me sinto um bocadito mais conformada.” (EC – L46-52)

2 – “()CRIÁMOS ALGUM DRAMA À VOLTA DISTO” TEMA

C O N D I Ç Õ E S F A C I L I T A D O R A S E / O U I N I B I D O R A S D

SIGNIFICADOS AGREGADOS PESSOAIS • Emoções • Estilo de Vida • Crença Saúde:Ameaça • Conhecimento

SOCIEDADE E COMUNIDADE • Recursos Materiais e Físicos • Trabalho e

SIGNIFICADOS

DECLARAÇÕES SIGNIFICATIVAS

PESSOAIS • Sentimentos/E moções Sentimento é uma percepção de um certo estado do corpo. Emoções são acções ou movimentos, muitos deles públicos, que ocorrem no rosto, na voz ou em comportament os específicos. (Damásio, 2003)

“Digo várias vezes aos meus amigos se não fosse a medicina já cá não estava. (B) Olhe, eu até pensei em matar-me... (choro) (B) Mas, depois lembrei-me dos meus filhos que eram pequenos aindaB (B) Foi há 13 anos, tinha 55 anos nessa altura...Lembrei-me dos meus filhos que eram pequenitos, novos e não podia fazer isso e fui-me conformando e agora olhaB (B) Felizmente vivo, mas não ando felizB (B) Dá-me alguma qualidade ainda não é? Por enquanto...”(EA – L61-75)

Emprego • Processo Familiar • Processo Comunitário

• Estilo de Vida é um conceito amplo que engloba a pessoa como um todo e em todos os aspectos da sua actividade, isto é “forma como gere a sua existência”, pelo que esses aspectos se combinam para

“Nunca me senti mal, choro. A pessoa ir-se abaixo e virem as lágrimas aos olhos e chorei. E dizia "Bolas" finalmente... Bom, tem de ser, julgávamos que não chegava a altura mas tinha que ser, não é? Mas a questão do choro, é uma tristeza que surgiu, não expressa para os outros mas vivida por mim, pessoalmente”. (EB – L50-53) “Acho que me caiu o céu em cima da cabeça, fiquei mesmo de rastos, até tive uma depressão e tudo. Andava mesmo para baixo, mais para baixo do que para cima. Foi mesmo uma altura da minha vida que eu nunca pensei, acho que se a tornasse a passar não aguentava. Digo eu, mas talvez sim, sou muito forte. Eu aguento muita coisa, mas foi mesmo mau”. (EE-L24-27) “A minha vida andava muito por fora de casa e não tinha problemas, se fosse caso de dormir fora dormia em serviço e tinha lazer, mas deixei de fazer isso. Tenho de regressar sempre a casa, às vezes tenho uns períodos mais longos de férias ou de uns dias, mas levo a máquina e levo o material todo para cinco a dez dias mais ou menos”. (EA – L77-78) “Para já e numa primeira etapa teve alguma vantagem, obrigou-me a parar um bocadinho, obrigou-me a ir para casa às 4 da tarde, descansar, parar. Hoje em dia já não é tanto assim, hoje em dia já me esqueço que tenho o cateter, facilito mais um bocado e não devo”.(EB-L-85-88) “Facilitou o facto de eu fazer isto já muito normal. Já

A E X P E R I Ê N C I A D E D I Á L I S E P E R I T O N E A L

influenciar todas as dimensões que compõem o conceito de saúde física, mental, social, emocional e espiritual, e traduzem-se por níveis de “satisfação, de bem-estar, competência, capacitação, aceitação social e qualidade de vida” (Rapley, 2003, p. 9399). • Crença Saúde: Ameaça - é definido como um tipo de crença de saúde caracterizado pela convicção pessoal de que um problema de saúde é grave e tem potenciais consequência s negativas para o estilo de vida (CIE, 2001, p.53)

• Conhecimento - um tipo de Pensamento caracterizado pelo conteúdo especifico do pensamento com base em sabedoria adquirida ou em informação e competências aprendidas; domínio e reconheciment o da informação

faz parte da minha vida. É como pôr uma gravata, tenho que fazer o nó, ali tenho que esperar que aquilo corra, que saia um e entre outro, de fazer o penso, de fazer aqueles tipos todos de preparativos. Pronto para que eu me possa preparar para ir para a vida, para vida do dia-a-dia”. (EI-L94-98) “De resto, à noite tenho que me limitar àqueles horários, tenho que estar preso não posso sair, por vezes tenho insónias, não posso sair. Tenho que ficar na cama, dou voltas na cama, mas pronto tenho que ficar não posso fazer mais nada”. (EAL82-84) “É natural que as coisas no lar tornaram-se um pouco mais complicadas porque toda a gente, a minha mulher, os meus filhos não, mas a minha mulher está presa por minha causa, não é? Ela não vai a lado nenhum”. (EA-L-95-98) “Como sou da área da saúde, a primeira dificuldade confesso que senti, foi quando me deram o manual e eu comecei a ler, tira dum lado, mete do outro. Enquanto não vi o mecanismo achei que aquilo ia ser uma coisa muito complicada. Depois vi que era muito simples, roda sempre para o mesmo lado, ou de um lado para o outro, é simples. Não sabia o que é o "Cup" e quando li aquilo fiquei um pouco apreensivo, pensei que era uma coisa mais complicada, não é? Hoje em dia lido com bastante facilidade, mas sempre com grande medo das peritonites e dessas coisas todas”. (EB – L106-112) “Deus queira que aguente assim bastante tempo até vir o transplante e que não precise de ir para a hemodiálise, porque neste momento, se eu tivesse optado pela hemodiálise, aí sim, não sei, ainda estaria viva, mas acho que não. Acho que era um sofrimento muito maior, um desgaste muito maior e a diálise peritoneal dá-nos um conforto, podemos estar na nossa casa, no nosso ambiente, a fazer os nossos tratamentos desde que tenhamos a consciência que temos de cumprir horários e temos de ter regras. Temos de ter higiene, temos de ter os nossos cuidados mas acho que em termos de apanhar vírus ou apanhar qualquer contaminação estamos mais livres ao fazer este tratamento em casa do que propriamente vir ao hospital. Não quer dizer que o hospital não seja desinfectado e tudo mais, mas há muitas pessoas a vir ao mesmo local, a virem às mesmas máquinas a trabalhar com os mesmos materiais, ali não, somos só nós, somos só nós que mexemos, somos só nós que entramos claro, sempre com a precaução das máscaras, mas acho que é muito melhor. Não é doloroso, o que é também muito bom”. (EG – L47-59) “Olhe psicologicamente a gente fica abalado e segundo aquilo que a gente já tem alguns conhecimentos da outra hemodiálise, porque esta não era conhecida para mim, a gente fica um bocadinho assustadores. Porque ficamos, ficamos pronto abalados mas isso penso que em qualquer

(CIE, 2001, p.45).

SOCIEDADE E COMUNIDADE •Processo Familiar - é entendido com “as interacções positivas ou negativas que se vão desenvolvendo e padrões de relacionamento entre os membros da família”. (CIE, 2001, p.65)

•Processo Comunitário - é caracterizado pela “sucessão de interacções positivas ou negativas e padrões de relacionamento entre os membros da comunidade que vivem e funcionam lado a lado numa localidade ou área geográfica, partilhando interesses colectivos, trabalho em comum, instituições de educação ou saúdeB”(CIE, 2001, p.67)

doença a pessoa pode ficar abalado. Depois houve uma adaptação e hoje aqui estamos a fazê-lo, do mal ao pior. Acho que me sinto melhor se tivesse que fazer a outra seria muito pior. É certo que quando vou fazer as minhas mudas que chatice mas depois a gente volta atrás e se tivesses que ir para lá quatro horas. E pronto, a gente aceita. Também sei que há as mudas feitas automáticas, segundo tenho falado com alguns colegas, não sei qual delas a melhor em termos práticos. Porque a outra também traz os seus problemas e os seus “queês”, quando encrava a máquina ou quando aquilo não corre bem. Na manual não é tanto, são problemas que se podem surgir mas que se resolvem ali muito rapidamente. Pronto, faço 4 trocas por dia”. (EI – L23-34) “Eu já sou diabético há 20 anos, torno as culpas a isso. Eu, talvez há 3 anos apanhei aquela doença, a doença dos ratos a leptospirose. Apanhei essa doença e o que eu sei, é que este caso dos rins foi sempre piorando”.(ED-L17-19) “Lembro que tive que saber lidar com a doença com toda a higiene. O que eu aprendi aqui no hospital com vocês e tive aprender a lidar com o problema, com a higiene e segurança e pronto”. (ED – L53-55) “Depois começou-me a contar histórias de vidas que também não tem sido boas e assim, comecei a pensar então, bom se há vidas assim, a minha também...(pausa) O cancro há-de ser pior, pronto. (EE-L38-40)

“A família estaria à espera, era uma situação que andava para entrar numa altura ou noutra. Estaria à espera mas também, com aquela expectativa será depois, para amanhã, para o ano, não foi agora isto aguenta-se mais uns meses, pode ser queB Ainda hoje a família nomeadamente os filhos não lidam bem com a situação, pronto sabem que eu faço diálise, tudo bem, mas não entram no quarto quando eu estou a fazer diálise, não gostam quando eu mostro o cateter, não gostam que eu verbalize ou exteriorize a situação da diálise portanto preferem que o pai como estava”. (E B – L206-210) “Os filhos aceitaram naturalmente, não se manifestaram muito. Lá em casa não se manifestam muito, não sei se é para não me sentir pior, mas não se manifestam. É natural que as coisas no lar tornaram-se um pouco mais complicadas porque toda a gente, a minha mulher, os meus filhos não, mas a minha mulher está presa por minha causa, não é? Ela não vai a lado nenhum. Eu digo-lhe, vai que eu troco-me sozinho, não preciso dela lá em casa, mas ela não quer ir, fica ali. É assim, modificou um bocado a nossa vida. Bastante”. (EA – L94-99) “Uma preocupação e na altura lembrava-me muito dos meus filhos, na altura era o que me lembrava.

•Trabalho e Emprego - é um tipo de prestação de serviços caracterizado pela “provisão de oportunidades de trabalho, negócios, parcerias, corporações comerciais ou contratos profissionais e outros empreendiment os e empresas que assegurem os pagamentos ou salários necessários para sustentar financeiramente as pessoas” (CIE, 2001, p.72).

Os meus filhos quando souberem, eles ainda não me viram, quer dizer, ela já me viu assim, o meu filho ainda não. O que me custava era eles veremme nesta situação mas agora já estamos a aceitar melhor, ela, porque ele ainda não me viu, sabe mas ainda não me viu. Ele até já me disse que me dava um rim, mas ele não está cá. Eu disse-lhe, não! Háde haver, tu ainda és muito novo deixa estar. Fiquei bloqueada na altura e só pensava em coisas piores que me poderiam acontecer. Além de ter isto pensava que iria ter alguma coisa pior, mas era mais aquele medo, era medo”. (EC – L54-62) “O marido é que não aceitou lá muito bem, ele é daqueles. Ele tem 49 anos mas parece que ele tem 85, a mente dele está muito na velhice. Às vezes nem me lembro que esta coisa está a gravar, depois o homem também, é uma pessoa que, eu venho para Coimbra e ainda agora me esteve a ralhar, quando eu disse que ia para Coimbra e disse "mas que ca*** vais fazer para Coimbra tanta vez?" Depois a minha filha mais nova que estava lá disselhe "ó pai ela vai para Coimbra porque precisa", por isso é que eu digo que ele é um bocado antiquado. Mas se fosse ele a precisar não era bem assim, ele não tem compreensão”. (EE – L48-55) “ Não faltou nada. Faltou apoio em casa, o que vale é que tenho apoio para mim e para ele”. (EE – L107108) “Também foi numa altura muito difícil, vendia-se e não se recebia, depois a minha doença. Eu chegava a casa jantava, às vezes nem podia estar um bocadinho com a família porque tinha que ir fazer o meu tratamento para me levantar a horas para ir de manha trabalhar. Depois não comecei a sentir-me muito bem, com uma depressão muito grande, muita ansiedade”. (EF – L42-46)

•Recursos Materiais e Físicos

“Tive muito apoio da minha família, principalmente do meu marido e da minha filha que foram espectaculares, acompanharam-me sempre às consultas, acompanharam-me sempre para todo o lado que eu precisasse de ir e ajudaram-me muito. Levámos os livros para casa, para lermos e para percebermos melhor a diálise, como era feita e como eram os cuidados que tínhamos que ter. Eles leram comigo, ajudaram-me a decidir e apoiaram-me muito e pronto. O meu marido ajeitou digamos assim, o que era preciso em casa, uma divisão só para a diálise. Optei pela DP e estou a fazer à cerca de ano e meio e estou muito satisfeita. (EG – L4047) “Eu acho que o que facilitou a aprendizagem foi os profissionais que aqui tive e que me tiveram a acompanhar, foram pessoas sempre bastante simpáticas, elucidativas na exaustão das explicações para eu não me esquecer. Foram as pessoas, os enfermeiros que me ajudaram bastante e facilitaram-me a vida na aprendizagem”. (EA-L140143)

“É assim facilitou-me muito o apoio, a dedicação, a maneira como me explicaram de toda a equipa. A equipa, seja de enfermagem, seja de médicos, toda esta equipa que trabalha neste sector. Acho que se empenha muito com os doentes e tem muita, uma muito boa relação com os doentes e isso dá-nos uma confiança muito grande”. (EG-139-142) “Eu tento sair de casa, falar com pessoas, vou ter com as minhas amigas que tem o mesmo problema, é um bocadinho retirado mas vou lá. Elas vêm a minha casa, eu telefono-lhes e elas vêm a minha casa. Vou até ao café e tento esquecer, esquecer não esquece, mas não me lembrar da doença que tenho. Tento abalar de casa, tento em conviver. Eu não posso estar muito tempo em casa, faço a minha vida. Chega a hora do café, vou tomar o meu café ou o meu chá e passo lá uma hora ou duas. Depois vou a casa de uma vizinha ou elas vem a minha casa ou assim”.(EC-64-69) “Era a pensar que já não podia ir trabalhar para a "Pia do Urso" porque andava lá no restaurante e gostava muito. Não poder trabalhar para mim é uma coisa que não cabe em mim, mesmo em casa eu não posso estar quieta. A minha irmã ralha-ma, os meus ralham-me porque eu depois fico muito cansada, não é? Depois tenho que me deitar, como aconteceu esta semana, mas foi a melhor coisa que fizeram por mim aqui”.(EE – L28-32) “Quando iniciei, criámos algum drama à volta disto, foi preciso preparar quarto, foi preciso comprar material para por no quarto, quer dizer, eu criei algum aparato em torno desta situação”.(EB – L8082) “É sempre uma novidade que está em casa. É mais um aparelho que está dentro na casa de banho. Que faço numa casa de banho que foi estipulada só para mim, teve que se comprar mais um móvel e partir daí como lhe digo passou a ser um ritual”. (EI – L124-126) “Uma pessoa tem que se encaixar, para não ir ao mesmo tempo que eles, se não é chato. Às vezes eles perguntam-me "ó mãe vais para a diálise a que horas?" eu digo-lhes "vocês já sabem é sempre à mesma" e depois não vão para eu ir, outras vezes, dizem-me "ó mãe espera um bocadinho 10 min, que eu vou tomar banho e tu já vais". É assim...” (EEL58-62) “Eu acho que a própria máquina é pesadíssima para transportar, muito pesada, e seria fácil portanto, se a maquina fosse mais pequena, mais leve, que a pudéssemos levar durante o fim-de-semana. Porque levar aquela máquina e todas as caixas é complicado, de qualquer maneira penso que esta peritoneal dá-nos muita liberdade, dá-nos uma certa qualidade dentro do possível, uma certa qualidade de vida. Com um senão, sempre que nos deslocamos a qualquer lado, temos que levar um

armazém. Se desenvolvessem algum tipo de computador, seria mais fácil, é esse incómodo que vejo nesta diálise. (EA – L180-186) “Em casa, é assim, a minha dificuldade é a noite. Agora já não é tanto, mas a minha dificuldade é a noite, porque falha muitas vezes a luz à noite, como falha muitas vezes a luz à noite, eu até já lá pus um candeeirozito, porque fica uma escuridão que não dá para a gente trocar as coisitas. Agora tenho um candeeirozito. Aqui há tempos quase que tive de o aquecer ao lume. De resto não tenho mais dificuldades”. (EC – L111-115)

3 - “(1) SINTO QUE ISTO CANSA MUITO1” TEMA

R E S P O S T A S À

SIGNIFICADOS AGREGADOS Respostas Intrapessoais •

Desfavoráveis

Medo Preocupação Ansiedade Depressão Cansaço Sentimento falta

E X P E R I Ê N C I A

liberdade Desconforto • Beneficiadoras  Bem-estar  Esperança  Liberdade dietética

D E D I Á L I S E

 Ausência de dor Respostas Interpessoais



Familiares e Amigos

 Afastamento P E R I T O

 Recurso  Preocupação  Protecção

SIGNIFICADOS Medo - um tipo de emoção com as características especificas: sentimentos de ameaça, perigo ou infelicidade com causa conhecida acompanhada por estado de alerta, concentração na origem do medo, comportament o agressivo em posição de ataque com os olhos muito abertos ou fuga da fonte do medo. CIE (2001, p.47)

Preocupação - um tipo de pensamento caracterizado por “algo que domina e monopoliza o espírito, com exclusão de outros pensamentos, ou estar mentalmente distraído”.

DECLARAÇÕES SIGNIFICATIVAS “Nos princípios custou-me muito, estive sempre muito nervosa, era o que eu sentia, por medo, era medo. Tive momentos que tinha medo de ter cá isto dentro e medo de me aparecer outra coisa, medo sei lá, mas prontos. O que eu haveria de fazer? Era um medo. E depois uma pessoa com aquele medo a gente enerva-se. Tinha medo quando ficava sozinha lá por casa e desatava a chorar, mas porque tinha que chorar? Mas uma pessoa nunca se viu com isto, nunca ouviu falar de tal coisa. Foi assim um choque, pronto”. (EC-L45-50) “Esses foram uns dias de nervos, era a tal coisa, de medo, medo de me enganar "ai meu deus se eu me engano". Era aquela preocupação de me enganar, que não soubesse, sei lá. Eu também pensava muito se uma pessoa “vareia” da cabeça com alguma coisa. Coisas que a gente pensa, a minha maior dificuldade era a fazer as ligações, de resto não”. (EC-L105-108) “Eu acho que nem tive dificuldades nenhumas, primeiro era mais o medo e tirando isso até aprendi muito rápido, embora tivesse estado aqui cerca de oito dias, mas penso que foram só os dois primeiros dias que precisei de ajuda, depois comecei a fazer praticamente a fazer o tratamento sozinha”. (EG – L134-137) “Eu tinha muito medo de apanhar alguma peritonite, eu tinha muito medo. Porque eu sou muito cuidadoso, eu sou muito responsável por mim próprio. E como disseram-me para eu ter muito cuidado com a questão das peritonites, porque dá muitas dores e eu não, nessa altura pensei "ah depois vou para a praia e depois coiso, depois tem muitas pessoas, uma pessoa anda ali misturado e pronto, não fui já a pensar nisso”.(EF – L74-78) “Esses foram uns dias de nervos, era a tal coisa, de medo, medo de me enganar "ai meu deus se eu me engano". Era aquela preocupação de me enganar, que não soubesse, sei lá. Eu também pensava muito se uma pessoa “vareia” da cabeça com alguma coisa. Coisas que a gente pensa, a minha maior dificuldade era a fazer as ligações, de resto não. O penso não

N E A L



Profissionais

(CIE, 2001, p.45)

e Sociais  Desemprego  Isolamento Social

Ansiedade um tipo de emoção. Sentimentos de ameaça, perigo ou infelicidade sem causa conhecida, acompanhado s de pânico, diminuição da autosegurança, aumento da tensão muscular e do pulso, pele pálida, aumento da transpiração, suor na palma das mãos, pupilas dilatas e voz trémula (CIE,2001, p.47)

Depressão - é uma “emoção negativa: sentimento de tristeza a melancolia, com diminuição da concentração, perda de apetite e insónia” (CIE, 2001, p.48)

Cansaço uma emoção negativa. Sentimentos de diminuição da força ou resistência, desgaste, cansaço mental ou físico e lassidão, com capacidade reduzida para

tinha, era a mexer nos coisitos. Era aquilo, a minha maior dificuldade era aquela”. “Uma vez que o cateter estava tapado, não mexeu muito comigo. Mexeu mais quando eu tive que ir para a praia, e dizer “agora aonde é que eu ponho isto, o que é que eu faço a isto?” essa parte foi mais complicada. O cateter não tem interferido em termos de imagem, sei que está lá e que faz parte de mim, portanto e que me integra. Agora a questão de o ir para a praia, tive que arranjar umas estratégias para lidar, não tanto por mim, mas pelos outros. Quer dizer, as pessoas ficam a olhar e assim, mais pelos outros. O cateter não mexe muito comigo, foi mais complicado porque não cicatrizou logo a ferida e andei aqui com alguns problemas na pele, algumas lesões em torno do cateter, alguns meses e sim isso preocupou-me no sentido do cateter não estar a fixar bem e não estar a evoluir bem a situação e isso deixou-me preocupado”. (EB – L65-74) “Quando o vi pela primeira vez, antes de colocarem o meu cateter eu vi aqui numa senhora que estava aqui em consulta e aí já fiquei com uma ideia de mais ou menos o que era. A minha preocupação na altura é se aquilo ficava a causar dor ou incómodo. Depois quando me colocaram o cateter ficou interior, não ficou exterior, porque julgavam que eu aguentava ainda mais algum tempo sem começar os tratamentos, mas infelizmente aguentei pouco mais de um mês. Depois foi extraída a ponta e comecei logo, dia 20 de Outubro a fazer a diálise, depois não me assustou e como vi a outra senhoraBComo vi que realmente apesar de isto andar por fora, mas não me causava dor”. (EG – 171-178) “Muito nervosa, muito nervosa mesmo, pensei para que é isto? Pronto, para que é que eles me puseram isto? O que querem fazer com isto? Se é para muito tempo? Se para pouco? Uma coisa nova, mas lembro de pensar isso. Acima de tudo sentia-me muito nervosa, muito mesmo nervosa. Pensava em tudo, a maneira de como hei-de andar vestida, de que maneira é que eu ia para a praia? Eu também não sou muito de praia, mas pensava, ir a um lado qualquer e mostrar a barriga, era aquela preocupação”.(EC-L36-41) “É assim, a primeira vez se calhar, o primeiro dia talvez pareceu-me um pouco confuso. Aqueles passinhos todos e depois as recomendações dos enfermeiros a dizerem-me que nós não nos podíamos esquecer de passo nenhum porque podia ser, um passo em falso ou um esquecimento podia ser fatal para uma infecção, para uma peritonite. Isso assustou-me um bocadinho os primeiros dias e achava que era muita coisa, que tinha que aprender muitas pequeninas coisas e ter o cuidado de não esquecer de nenhuma delas, que era um seguimento passo a passo”.(EG-L116-121) “Ah! Sim foi bastanteB(++) Eu para dizer a verdade, não aceitei muito bem e não aceitei muito bem que há poucochinho tempo aconteceu o que aconteceu, não sei se lembra, mas tive cá à 15 dias... Depois não comecei a sentir-me muito bem, com uma depressão muito grande, muita ansiedade”.(EF L33-35/45-46)

o trabalho físico e mental (CIE, 2001, p. 42) Desconforto - Status Comprometido : posição da pessoa em relação a algo ou alguma coisa (CIE, 2011, p.48)

Bem-estar tipo de autoconhecim ento com as seguintes características específicas: imagem mental de estar bem, equilibrado, contente, bem integrado e confortável por orgulho ou alegria e que se expressa habitualmente demonstrando relaxamento de si próprio e abertura às outras pessoas ou satisfação com independência (CIE, 2001, p.43)

Esperança emoção caracterizada por sentimentos de ter possibilidades, confiança nos outros e no futuro, entusiasmo pela vida, expressão de razões para viver e de desejo de

“Na vida social reduzi imenso, não saio à noite, acabei com as reuniões, acabei com outras actividades que tinha de escutismo, e de outras coisas que ocupavam os tempo livres com as quais me cansava, isso abandonei, não consigo conciliar tudo. Eu se dou aulas até ao meio dia ou uma da tarde, chego a casa de rastos, cansado. Não consigo à noite ainda ir, ou à tarde ainda ir, há coisas que eu não faço porque estou cansado. Deixei de estabelecer contactos que estabelecia, a rede de contactos diminuiu porque depois também não a posso alimentar, digamos assim”. (EB-L138-144) “No trabalho mudou tudo, porque eu não vou para lá. Não posso conciliar trabalho, casa e diálise é muita coisa. Não se pode fazer. Eu já assim me vejo nas amarelas. Somos 5 lá em casa, não é fácil. A roupa daquela gente toda é um bocado difícil, mas pronto”. (EE-L45-48) “Apanhei uma depressão por causa disso, foi um bocado muito conturbado. O enfermeiro N é que sabe muito bem disso, que ele é que me teve de aturar muito em baixo.(B) Só me dava vontade de me matar, de sumir. Mas pronto, tive ajuda e também estou a tomar anti-depressivos.” (EE-L36-38/42-43) “Olhe sinto que isto cansa muito, não imaginava que a doença renal antes da diálise peritoneal que cansasse tanto. Desgasta muito mais daquilo que estava à espera. Por um lado, não é tão dramático como às vezes as pessoas pensam, vai desgastando. Desgasta uma pessoa em termos de cansaço. No dia-a-dia desgasta muito, não estava à espera que desgastasse tanto. Estava à espera que chegasse aqui, tipo bombas de gasolina, chega abastece-te e vai-te embora e estás outra vez com o depósito cheio, mas não é verdade, isto desgasta muito”.(EB-L191-197) “Não poder trabalhar para mim é uma coisa que não cabe em mim, mesmo em casa eu não posso estar quieta. A minha irmã ralha-ma, os meus ralham-me porque eu depois fico muito cansada, não é? Depois tenho que me deitar, como aconteceu esta semana, mas foi a melhor coisa que fizeram por mim aqui.” (EE – L29-33) “A minha vida andava muito por fora de casa e não tinha problemas, se fosse caso de dormir fora dormia em serviço e tinha lazer, mas deixei de fazer isso. Tenho de regressar sempre a casa, às vezes tenho uns períodos mais longos de férias ou de uns dias, mas levo a máquina e levo o material todo para cinco a dez dias mais ou menos. Às vezes portanto ia para casa de familiares passar o fim-de-semana, não posso, deixei de ir, deixei de fazer essa vida. De resto, à noite tenho que me limitar àqueles horários, tenho que estar preso não posso sair, por vezes tenho insónias, não posso sair. Tenho que ficar na cama, dou voltas na cama, mas pronto tenho que ficar não posso fazer mais nada. Limitou-me um bocado a minha vida sem dúvida em relação aos meus amigos, de vez em quando a gente

viver, paz interior, optimismo; associada ao traçar de objectivos e mobilização de energia. (CIE, 2001, p. 47)

saía para fora, ficávamos fora um dia ou uma noite e deixei de fazer isso, acabo por ficar em casa”.(EA-L7787) “Nisso é que me prende um bocado, porque é assim, eu só saio mais é à tarde, depois de almoço. Acabo de almoçar, faço o tratamento e depois é que tenho um bocadinho a mais. Eu tenho as minhas amigas que às vezes me convidam "é pá eu convidava-te para ir mais a gente a algum lado, mas tens de fazer o tratamento, depois não estás cá a tempo!". Eu digo-lhes se vocês forem, vão depois de almoço, porque eu faço de manhã, depois faço à uma hora e depois tenho toda a tarde até às cinco e meia, seis horas”.(EC-L90-95) “Cria-me algumas restrições porque tenho que fazer três vezes por dia, embora faça às 8 às 4 da tarde e meia-noite às vezes é limitativo. Temos que parar a para ir fazer diálise, agora tenho ajustado isso, às vezes não faço oito horas faço dez, faço 6, portanto tenho ido ajustando assim há medida das necessidades. Para já e numa primeira etapa teve alguma vantagem, obrigoume a parar um bocadinho, obrigou-me a ir para casa às 4 da tarde, descansar, parar. Hoje em dia já não é tanto assim, hoje em dia já me esqueço que tenho o cateter, facilito mais um bocado e não devo”.(EB-L82-88)

Família conjunto de seres humanos considerados como unidade social ou todo colectivo composto de membros unidos por consanguinida de, afinidades emocionais ou relações legais, incluindo as pessoas significativas (CIE, 2001, p.45)

“Na minha vida pessoal posso dizer, que praticamente a única coisa que mudou foi deixar de trabalhar nas terras, porque é um trabalho duro e a única coisa que tenho dificuldade é andar abaixada, pelo volume da barriga, pelos tubos, com medo de os vincar ou fazer estragar qualquer coisa.(B) É um bocadinho mais de desconforto de ter este volume na barriga que não, a gente não se sente, a roupa não assenta tão bem, não se sente tão jeitosa, não se sente! Mas de resto, o convívio seja com a família, seja com amigos, a diálise peritoneal não me impede de nada disso”. (EG-L7073/107-110) “Em termos de diálise peritoneal, acho que tem muitas vantagens, permite alguma mobilidade. Eu já fui começando a mobilizar um bocado mais para fora de casa, a dúvida agora é quando eu sair do manual para o automático, como é que eu o posso fazer? Mas pronto, é uma contingência, uma adaptação de vida, não posso ir para todos os sítios, não se pode fazer exactamente a mesma vida que se fazia antes, adaptas-te com alguma facilidadeB” (EB-l197-202) “Sinto-me bem. Quando fazia a manual preparava o material todo, punha a máscara e ia lavar as mãos, enxugava-as com papel, sempre enxugar as mãos de cima para baixo e ia para o quarto. Abria os sacos e depois dos sacos abertos, vinha outra vez lavar as mãos. Pendurava o saco e com cateter preparado para ligar. Depois tinha as compressas, ligava o cateter e abria. Drenava para o saco e depois infundia o líquido para dentro e assim sucessivamente, com todos os cuidados”.(ED-L74-79) “Está tudo bem. Foi a melhor coisa que escolheram para mim, vocês diziam-me que esta era melhor para

mim, mas eu não acreditava. Mas agora sinto-me muito bem, uma pessoa não sabe para onde é que vai, estou bem assim como eu estou.” (EE-L110-112) “Não, eu só digo que a faça por muitos anos! Que a faça por muitos anos, se a tiver que a deixar de fazer tudo bem, mas se tiver possibilidade que faça esta por muitos anos. Porque entre esta e outra deixo-me estar com este rebuçadinho!” (EI-L133-135) “Mas pronto, é uma contingência, uma adaptação de vida, não posso ir para todos os sítios, não se pode fazer exactamente a mesma vida que se fazia antes, adaptas-te com alguma facilidade. Retrospectivamente acho que tem funcionado tudo bem, a família também.” (EB – L200-202) , “Lido bem, já faz parte de mim mesma. No início foi um bocado chato, nem tanto pelo cateter mas pelo buraco, fazia-me um bocado de impressão olhar para lá. Agora já não me faz impressão nenhuma, mas no princípio sim”. (EE-L114-116) “Não alterou mais nada, se eu for a uma festa posso comer de tudo, coisa que se eu fizesse hemodiálise já não podia ser, não é? Porque tinha de ter mais restrições na comida, na bebida e neste caso não tenho, convivo na mesma. É um bocadinho mais de desconforto de ter este volume na barriga que não, a gente não se sente, a roupa não assenta tão bem, não se sente tão jeitosa, não se sente! Mas de resto, o convívio seja com a família, seja com amigos, a diálise peritoneal não me impede de nada disso”. (EE-114-116) “Optei pela DP e estou a fazer há cerca de ano e meio e estou muito satisfeita. Deus queira que aguente assim bastante tempo até vir o transplante e que não precise de ir para a hemodiálise, porque neste momento, se eu tivesse optado pela hemodiálise, aí sim, não sei, ainda estaria viva, mas acho que não. Acho que era um sofrimento muito maior, um desgaste muito maior e a diálise peritoneal dá-nos um conforto, podemos estar na nossa casa, no nosso ambiente, a fazer os nossos tratamentos desde que tenhamos a consciência que temos de cumprir horários e temos de ter regras. Temos de ter higiene, temos de ter os nossos cuidados mas acho que em termos de apanhar vírus ou apanhar qualquer contaminação estamos mais livres ao fazer este tratamento em casa do que propriamente vir ao hospital. Não quer dizer que o hospital não seja desinfectado e tudo mais, mas há muitas pessoas a vir ao mesmo local, a virem às mesmas máquinas a trabalhar com os mesmos materiais, ali não, somos só nós, somos só nós que mexemos, somos só nós que entramos claro, sempre com a precaução das máscaras, mas acho que é muito melhor. Não é doloroso, o que é também muito bom.” (EG-46-59)

Desemprego ou taxa de desemprego -

“Tive muito apoio da minha família, principalmente do meu marido e da minha filha que foram espectaculares, acompanharam-me sempre às consultas, acompanharam-me sempre para todo o lado que eu

é caracterizado pela taxa relativa de indivíduos incapazes de conseguir um trabalho ou emprego renumerado (CIE, 2001, p.67)

precisasse de ir e ajudaram-me muito. Levámos os livros para casa, para lermos e para percebermos melhor a diálise, como era feita e como eram os cuidados que tínhamos que ter. Eles leram comigo, ajudaram-me a decidir e apoiaram-me muito e pronto. O meu marido ajeitou digamos assim, o que era preciso em casa, uma divisão só para a diálise. Optei pela DP e estou a fazer há cerca de ano e meio e estou muito satisfeita”.(EG-L40-47) “Os filhos aceitaram naturalmente, não se manifestaram muito. Lá em casa não se manifestam muito, não sei se é para não me sentir pior, mas não se manifestam. É natural que as coisas no lar tornaram-se um pouco mais complicadas porque toda a gente, a minha mulher, os meus filhos não, mas a minha mulher está presa por minha causa, não é? Ela não vai a lado nenhum. Eu digo-lhe, vai que eu troco-me sozinho, não preciso dela lá em casa, mas ela não quer ir, fica ali. É assim, modificou um bocado a nossa vida. Bastante”.(EA-L9499) “Não acreditaram que eu fosse mesmo entrar em diálise. Ainda hoje à pessoal que quando sabe fica um bocado espantado que estou em diálise e penso que foi para todos um choque. Sinto-me protegido por isso também, eles hoje têm algum cuidado comigo e tal, protegem-me de certa forma. Quando eu dizia “é pá não posso mais, estou cansado, não aguentoB”, eles não acreditavam, pensavam que eu me estaria a desculpar e isso foi um choque para eles”. (EB – L5762)

Isolamento social - status: comprometido (CIE, 2011, p.60).

“O meu marido ainda está desempregado, tanto a ele como a mim não. A ele é capaz de lhe estar a custar um pouquito mais, porque ele quer ir ali ou acolá e não gosta de me deixar sozinha. Ele quando pensa em sair tenho de ir sempre com ele. Já antes eram assim, fosse para onde fosse, ele não gostava de ir sozinho e eu ia sempre com ele, até para a fazenda. Parece que agora ainda ficou mais preocupado comigo, ficou assim. Todos os dias, não há vez nenhuma que eu faça ao tratamento que ele não me pergunte se está bem, o líquido está limpidozinho? Todas as vezes me pergunta, se me dói, se não dói, todas as vezes me pergunta. Por acaso, preocupa-se muito comigo nesse aspecto”. (ECL81-88) “Na minha vida familiar não implicou nada, pelo contrário, acho que até ajudou bastante. Que se eu tinha uma família muito unida, desde que entrei em diálise peritoneal mais unida e mais preocupados. Eu noto às vezes até preocupação a mais comigo, às vezes gostava de fazer as coisas mais à minha vontade e eles ralham comigo de eu fazer algum esforço ou de euB Às vezes digo "eu não estou inválida, estou apenas a fazer um tratamento, mas eu sei que consigo fazer a minha vida normal". Nesse aspecto, acho que nos uniu mais ainda e noto neles que tem sempre uma preocupação. Se eu for para agarrar uma coisa qualquer e um deles tiver ao pé de mim "deixa estar que quem pega nisso sou eu", prontos, para eu não fazer esforço (*++), com aquela preocupação de

alguma coisa me fazer mal”. (EG-62-70) “Ainda hoje a família nomeadamente os filhos não lidam bem com a situação, pronto sabem que eu faço diálise, tudo bem, mas não entram no quarto quando eu estou a fazer diálise, não gostam quando eu mostro o cateter, não gostam que eu verbalize ou exteriorize a situação da diálise portanto preferem o pai como estava”(B) Mudanças, brinco um bocado com o cateter dizendo que é a algália e tal, mas a família não gosta muito da brincadeira. Para mim pronto, essas coisas estão cá, mas parece-me que afecta mais os outros quando mostro o cateter a alguém. Em termos da família, acha que é uma situação que não deve ser mostrada, verbalizada, não há necessidade. (EB-L44-48/88-92) “O marido é que não aceitou lá muito bem, ele é daqueles. Ele tem 49 anos mas parece que ele tem 85, a mente dele está muito na velhice. Às vezes nem me lembro que esta coisa está a gravar, depois o homem também, é uma pessoa que, eu venho para Coimbra e ainda agora me esteve a ralhar, quando eu disse que ia para Coimbra e disse "mas que ca*** vais fazer para Coimbra tanta vez?" Depois a minha filha mais nova que estava lá disse-lhe "ó pai ela vai para Coimbra porque precisa", por isso é que eu digo que ele é um bocado antiquado. Mas se fosse ele a precisar não era bem assim, ele não tem compreensão”.(EE-L48-55) “Senti-me um bocado inútil para a sociedade, uma vez que também não podia trabalhar. É que não podia mesmo fazer nada. Ainda agora em Dezembro estava de rastos, agora hoje não, agora estou em forma! Antes estava sempre a pensar se me ia doer ou não, agora não, agora movimento-me e agora sinto-me desatado psicologicamente. É assim, enquanto tiver que fazer isto, sinto sempre que tenho um empecilho. Tenho de fazer a diálise é um empecilho para tudo, vida social também”. (ED-L41-46) “No trabalho houve algum cuidado em reduzir a carga lectiva, de qualquer forma isto interferiu muito no trabalho, basta dizer que estava a fazer o doutoramento e desisti de fazer o doutoramento porque fiquei sem capacidades de o fazer. Quando tenho muitas aulas seguidas, os próprios alunos reparam, e alguns enfim dizem-me "está muito cansado" ou "está muito desgastado". Alguma visualização externa desta situação que eu a dada altura não reparo, mas não tenho a mesma capacidade, nem de longe nem de perto. Não tenho a possibilidade de desenvolver a mesma capacidade de trabalho, que se vai reflectir na avaliação. É que até aqui não tinha avaliação da função pública, e partir de agora vamos ter avaliação e eu vou ser fortemente prejudicado por isso, porque eu não tenho a mesma capacidade de estar até às 2 ou 3 horas da manhã, a fazer artigos, a ler livros, a fazer publicações, a ir para congressos, a estar metido numa série de coisas que dá pontos para a pontuação da pessoa, não tenho. Tenho que fazer a manutenção, o mínimo e mesmo assim estou com dispensa de 50% da carga lectiva e eu nesta plataforma aguento-me mas mais do que isso não, e isso preocupa-me um bocado”.

(EB-L123-136) “Na minha vida pessoal posso dizer, que praticamente a única coisa que mudou foi deixar de trabalhar nas terras, porque é um trabalho duro e a única coisa que tenho dificuldade é andar abaixada, pelo volume da barriga, pelos tubos, com medo de os vincar ou fazer estragar qualquer coisa. É mais por aí porque de resto a vida normal de casa, faço a vida normal.”(EG-70-74) “Na vida familiar não há problema nenhum. Trabalho, tive que deixar de trabalhar e acho que não há mais nada”.(EH-L31-32)

“Deixei de estar (~~~~~) com os meus amigos. Deixei de estar, eu muitas vezes, quer dizer, por exemplo, eu durante a segunda, terça, quarta e quinta é muito raro eu sair à noite, à sexta é que saía, ia um bocadinho ao café estava ali um pouco com os meus amigos. Agora também deixei de ir, deixei de ir porque também sou um bocado pessimista, sou um bocado pessimista porque "é pá, vou ali à casa de banho fazer um xixi, e eu sei lá quantas pessoas não vão ali, depois tenho medo é o problema de apanhar alguma peritonite, é isso”. (EFL84-89) “Eu tenho as minhas amigas que às vezes me convidam "é pá eu convidava-te para ir mais a gente a algum lado, mas tens de fazer o tratamento, depois não estás cá a tempo!". Eu digo-lhes se vocês forem, vão depois de almoço, porque eu faço de manhã, depois faço à uma hora e depois tenho toda a tarde até às cinco e meia, seis horas. Assim, depois tenho esse tempo todo, mas muitas das vezes, como elas não sabem, eu explico-lhes, mas elas não sabem já não me dizem tanto. Já não me convidam tanto, mas saio, quando não vou com elas, vou mais o meu marido, vou ali e acolá”. (EC-L92-98)

4 – “FAZER AS TROCAS À HORA CERTA” TEMA M U D A N Ç A S

SIGNIFICADOS AGREGADOS Adesão ao regime

SIGNIFICADOS

terapêutico

regime





Adesão do

Aprendizagem da

terapêutico -

técnica

tipo de Gestão

Auto-cuidado

na

DP

do regime terapêutico

E X P E R I E N C I A D A S

caracterizado

N A

decurso de

R E A L I Z A Ç Ã O

prescrito como

D A D I Á L I S E P E R I T O N

por “desempenhar actividades para satisfazer as exigências terapêuticas dos cuidados de saúde; aceitação do

tratamento

prestador de cuidados ou apoiante” (CIE,2001, p.58).

Gestão do regime terapêutico •

Horários dos tratamentos



Hábitos de vida

Gestão do regime terapêutico – tipo de comportamento de adesão com caracterizado por “executar as actividades,

DECLARAÇÕES SIGNIFICATIVAS “Primeiro foi a parte da higiene, fundamental para o tratamento. Depois, portanto o próprio tratamento em si, explicaram-me como é que se fazia a manual e como se faz a automática, aprendi cada uma a seu tempo como as coisas se faziam, mas não foi difícil. A manual aprendi aqui, a automática foi em casa. Foi uma senhora enfermeira que lá foi explicou-me o que é que se passava e começou a funcionar até hoje. Fundamentalmente foi, era ter cuidado com os horários para fazer as trocas à hora certa, aquela hora, e sim ter que verificar como estava o líquido que saía, se estava transparente ou não e hoje continuo a verificar a mesma coisa. Fundamentalmente temos de ter cuidado com todo o material que estamos a utilizar para não aparecer lá qualquer impureza ou sujidades. Fundamentalmente é isso, hoje faço este tratamento um bocadinho à vontade, sem aquele receio de estar a pensar em todas as coisas e tal. Hoje já faço mais ou menos as coisas de forma automática, por acaso nunca me enganei. Pode ser que me engane um dia, mas tem corrido tudo sempre bem até hoje.”(EA- 114-126) “Lembro que tive que saber lidar com a doença com toda a higiene. O que eu aprendi aqui no hospital com vocês e tive aprender a lidar com o problema, com a higiene e segurança e pronto.(B) Aprendi a fazer o penso, a pôr a máscara, a lavar as mãos em condições e a desinfectá-las. Não tocar com as mãos em nada e aprendi também que no local onde tivesse a mudar o penso e a fazer a diálise tinha que ter tudo desinfectado, as portas fechadas e não podia ter lá ninguém dentro. Aprendi muita coisa”(ED – L57-60). “(B)eu no princípio tinha uma pessoa ao meu lado a ver se eu fazia bem ou fazia mal, às vezes tinha dúvidas ao lavar as mãos, mas com o tempo, aprendi rapidamente.(B) Em casa também foi a mesma coisa, também, em questão de higiene já sabia o que tinha que fazer na manual. Depois experimentei três vezes na máquina também, ao segundo dia já sabia, mas eu sou um bocado, eu não gosto muito de andar a chatear as pessoas. Ao segundo dia já sabia e depois até disse à enfermeira L se podia ir lá no terceiro dia para ver se eu fazia bem e ela teve lá a ver bem e ela disse-me que eu estava mesmo apto a fazer sozinho. E a partir daí até hoje, não tenho tido problemas...” (EF-L114-123) “Foi muito difícil aprender, a manipular aquela coisa e meter naqueles três buracos, parece que

E A L

cumprindo um programa de tratamento da doença e das suas complicações, actividades essas que são satisfatórias para atingir objectivos específicos de saúde, integrar actividades para tratamento ou prevenção da doença na vida diária” (CIE, 2001, p.58)

não via nada daquilo.(B)Dificuldade em não saber, depois ir para casa e errar aquela coisa e meter no buraco onde não devia de ser. Por acaso, aconteceu-me algumas vezes, mas depois reparei o erro. A L estava lá para ver”. (EE – L9196) “Olhe, tive que aprender a fazer o penso, a desinfectar as mãos. Eu para desinfectar as mãos antigamente ou para as lavar era a fugir, era tudo à pressa e de fugida. E tive que aprender a fazer diálise sozinho, que eu cá gosto pouco de encostos, que andem atrás de mim, se eu ando a fazer as coisas bem ou se ando a fazer mal. É só essa parte mais nada”. (EH-43-46) “Sim, tive que aprender os métodos exigidos e os melhores métodos para que isto corresse sempre bem, por causa sobretudo das infecções, não é? Tive preparação cá no hospital, que fui muito bem ensinado, penso eu, e recebi muito bem a lição. E que hoje já faço isso realmente, já está treinado e já se faz aquilo pronto, mecanicamente”. (EI-L7275) “ Eu digo-lhes se vocês forem, vão depois de almoço, porque eu faço de manhã, depois faço à uma hora e depois tenho toda a tarde até às cinco e meia, seis horas. Assim, depois tenho esse tempo todo, mas muitas das vezes, como elas não sabem, eu explico-lhes, mas elas não sabem já não me dizem tanto. Já não me convidam tanto, mas saio, quando não vou com elas, vou mais o meu marido, vou ali e acolá. Ele pronto, já está tão ligado a mim, que vamos os dois, mas as amigas já não é tanto. Elas gostam de ir o dia todo, mas eu o dia todo não posso, um dia lá fui uma vez ou outra, mas de tarde, todo o dia não posso”. (EC-L93-100) “A única coisa que modificou é cumprir com os horários dos tratamentos, ou seja, se eu tiver num almoço, ou se tiver numa festa ou num casamento ou uma coisa assim, sei que àquela hora tenho que vir a casa fazer o tratamento, porque de resto, vou às compras na mesma, vou passear de vez em quando aos fim-de-semanas, só que em vez de sair de manha e não ter horas para voltar a casa, sei que tenho que voltar para fazer o tratamento esteja aonde estiver. Vá para onde for tenho que organizar o tempo, as horas, de modo àquela hora estar em casa, eu tento o máximo possível ser rigorosa com as horas do tratamento”. (EG-L81-87)

5 - “FAZER UM PROGRAMA DE VIDA, ORGANIZAR O TEMPO” TEMA (RE) C O N S T R U Ç Ã O D A M U D A N Ç A D O Q U O T I D I A N O

SIGNIFICADOS AGREGADOS Comportamentos de

Comportamento

adesão à DP

de adesão - é um





SIGNIFICADOS

Vida Familiar,

tipo de

Social e

comportamento

profissional em

de Procura de

função da DP

Saúde com as

(Re) definição

seguintes

dos objectivos

características

de vida

específicas: acção autoiniciada para promover o bemestar, recuperação e reabilitação, seguindo as orientações sem desvios, empenhado num conjunto de acções ou comportamentos (CIE, 2001, p.57)

DECLARAÇÕES SIGNIFICATIVAS

E depois fazer um programa de vida, organizar o tempo de modo a poder fazer os tratamentos, não é? No meu caso que trabalho e trabalho a 7 km de casa, consegui ter possibilidades de fazer no emprego porque reúno condições. Segundo que a colega foi ver e que reúno condições, até lá foi ver duas vezes e isso também facilita um bocadinho a perca de tempo, transporte e que possa estar mais acessível esta muda. Porque também a FR, não é? Facilitou também uma parte do equipamento para fazer uma segunda troca noutro local, não é? Temos o problema do caso de uma saída ao domingo que é mais (~~~~~~) por causa dos horários. Não por sistema, mas tenho feito já só três. O médico também me deu essa autorização, que não abusasse e faço-o. E pronto é uma questão de organização de vida que a gente têm. Eu por exemplo faço férias, quase todos os fim-desemana vou para a praia porque tenho uma casa na praia, agarro na maquinazinha levo-a, levo o aquecedor, levo e tenho lá condições. Levo os equipamentos e faço lá também e teve que se realmente fazer um programa de vida diferente, não é? Para quem tinha uma actividade como eu tinha, de muitas reuniões até à noite, tenta-se conciliar uma coisa com a outra. Como há um espaço de 4 a 6h de muda dá espaço para que nós possamos programar a vida, não é? (EI – L37-53) “Eu já fui começando a mobilizar um bocado mais para fora de casa, a dúvida agora é quando eu sair do manual para o automático, como é que eu o posso fazer? Mas pronto, é uma contingência, uma adaptação de vida, não posso ir para todos os sítios, não se pode fazer exactamente a mesma vida que se fazia antes, adaptas-te com alguma facilidade. Retrospectivamente acho que tem funcionado tudo bem, a família também. No entanto penso que a família não lida muito bem com o doente renal. A mobilidade é sempre um bocado limitativa. Fui no outro dia para a Madeira e o meu medo era chegar lá e não ter os líquidos. O ideal era fazer menos vezes por dia. O mercado de trabalho não é muito receptivo a isto”. (EB-L198-206) “Pois eu quando comecei na manual, é pá disse " eu gostava mais da manual" até uma vez estava ali a fazer a manual aqui no hospital e perguntei ao Dr. P qual era a diferença entre a manual e a da máquina e ele disse " a manual é melhor diálise que pode haver..." mas ele disse-me "isso não quer dizer

que a da máquina também não seja boa, também é boa, mas eu se fosse fazer a minha opção para a manual era muito chato porque não podia trabalhar não é? Tornava-se mais grave para a minha situação e estou-me a dar bem com a máquina”.(EF-L125-130) “Não alterou mais nada, se eu for a uma festa posso comer de tudo, coisa que se eu fizesse hemodiálise já não podia ser, não é? Porque tinha de ter mais restrições na comida, na bebida e neste caso não tenho, convivo na mesma. É um bocadinho mais de desconforto de ter este volume na barriga que não, a gente não se sente, a roupa não assenta tão bem, não se sente tão jeitosa, não se sente! Mas de resto, o convívio seja com a família, seja com amigos, a diálise peritoneal não me impede de nada disso”. (EG-L105-110) “Como estou em casa, não trabalho. Faço a minha vida de casa e não me influenciou muito. O meu marido ainda está desempregado, tanto a ele como a mim não. A ele é capaz de lhe estar a custar um pouquito mais, porque ele quer ir ali ou acolá e não gosta de me deixar sozinha. Ele quando pensa em sair tenho de ir sempre com ele. Já antes eram assim, fosse para onde fosse, ele não gostava de ir sozinho e eu ia sempre com ele, até para a fazenda”.(EC-L80-85) “Hoje portanto é como digo "que raio de chatice que eu tenho de ir agora fazer esta muda, mas depois volto atrás e digo “será melhor esta que outra". Portanto há que enfrentar e acabo por entrar neste ritmo de que é uma coisa normal, de como ir beber a bica ao café e ler o jornal. Aquele tempo tenho que estar ali e é ali que eu faço”. (EI – L128-131) “Fundamentalmente é isso, hoje faço este tratamento um bocadinho à vontade, sem aquele receio de estar a pensar em todas as coisas e tal. Hoje já faço mais ou menos as coisas de forma automática, por acaso nunca me enganei. Pode ser que me engane um dia, mas tem corrido tudo sempre bem até hoje”. (EA-L122-126) “É uma doença, mas pronto o tempo que eu durar, durei. Não posso desmoralizar-me, ir para baixo, porque se não...Senti-me um bocado coisa, mas agora já não é tanto. A minha vida agora olha, um dia de cada vez, a gente só pensa num dia de cada vez, de resto agora já não penso tanto. Tanta preocupação que eu tinha, que agora já não tenho, já não tenho tanto medo. Pronto, vamos andando...”(EC-L29-34) “A sugestão que eu gostaria de dar era, se alguém entrar a precisar de entrar em diálise e

que tenhas condições em casa para poder fazer, condições físicas também para poder fazer DP e que os médicos não vejam nenhum inconveniente é uma excelente escolha a diálise peritoneal. Em comparação à hemodiálise, não digo que a hemodiálise não seja um bom tratamento mas eu acho que em termos de sofrimento, porque eu vi pelo que o meu pai passou quando fez durante 5 anos hemodiálise. Em termos de sofrimento, em termos de desgaste físico do organismo, acho que a DP é melhor. Não temos que vir dia sim, dia não ao hospital, temos o nosso ambiente, a nossa casa (*++) e é isso. Eu aconselho todas as pessoas que podem fazer DP, a escolher a DP. Eu sinto-me muito bem e espero que continue a correr tudo bem como correu até aqui, e estou muito contente por ter escolhido a DP. Muito satisfeita”. (EG-L196-205)

6 – “ O APOIO, A DEDICAÇÃO, A MANEIRA COMO ME EXPLICARAM”

TEMA O C U I D A R

SIGNIFICADOS AGREGADOS Intervenções de Enfermagem – é uma acção realizada em resposta a um diagnóstico de enfermagem de modo a

D E

originar um resultado de

E N F E R M A G E M

dos Enfermeiros,

N O P R O C E S S O

Enfermagem (Ordem

2009)

SIGNIFICADOS

DECLARAÇÕES SIGNIFICATIVAS

Relacionar – Atender: Estabelecer ou manter ligações com um ou mais indivíduos, interagir (CIE, 2011, p.99)

“Primeiro foi a parte da higiene, fundamental para o tratamento. Depois, portanto o próprio tratamento em si, explicaram-me como é que se fazia a manual e como se faz a automática, aprendi cada uma a seu tempo como as coisas se faziam, mas não foi difícil. A manual aprendi aqui, a automática foi em casa. Foi uma senhora enfermeira que lá foi explicou-me o que é que se passava e começou a funcionar até hoje. (E A – L114-118)

Estabelecer limites – Restringir: Limitar ou constranger o comportamento (CIE, 2011, p.97) Dar poder Promover: Permitir às pessoas realizarem a sua capacidade para influenciar a sua própria saúde. (CIE, 2011, p.96) Informar – é uma forma de Acção de enfermagem com as seguintes características especificas: falar com alguém sobre alguma coisa (CIE,2001).

Fundamentalmente foi, era ter cuidado com os horários para fazer as trocas à hora certa, aquela hora, e sim ter que verificar como estava o líquido que saía, se estava transparente ou não e hoje continuo a verificar a mesma coisa. Fundamentalmente temos de ter cuidado com todo o material que estamos a utilizar para não aparecer lá qualquer impureza ou sujidades. Fundamentalmente é isso, hoje faço este tratamento um bocadinho à vontade, sem aquele receio de estar a pensar em todas as coisas e tal. Hoje já faço mais ou menos as coisas de forma automática, por acaso nunca me enganei. Pode ser que me engane um dia, mas tem corrido tudo sempre bem até hoje.” (E A – L115-119) “A intervenção dos enfermeiros foi fundamental, porque eu não era capaz sozinho. Só com uma explicação teórica eu não era capaz. Eles exemplificaram, fizeram, mostraram e mandaram-me fazer, pronto. Foi assim, portanto, as ligações, como desligar, como ver o penso, foi tudo. Fizeram e mandaram-me fazer para ver se eu estava a fazer bem,

• D E T R A N S I Ç Ã O D A

Ensinar – é uma forma de Informar com as seguintes características específicas: dar informação sistemática sobre como fazer alguma coisa (CIE, 2001).



Instruir – é uma forma de Ensinar com as seguintes características específicas: dar a alguém informação sistemática sobre como fazer alguma coisa (CIE, 2001).



Treinar – é uma forma de Instruir com as seguintes características específicas: Desenvolver as competências de alguém ou funcionamento de alguma coisa (CIE,2001).

P E S S O A E M D P

Explicar – é um tipo de Informar com as características especificas: tornar alguma compreensível ou clara para alguém. (CIE, 2001, p.157)

Orientar - – é um tipo de Informar com as características especificas: dirigir alguém para uma decisão em assuntos

acho que foi isso. Fundamentalmente foi o que me ajudou a continuar a fazer as coisas bem-feitas”. (E A – L146-150) “O enfermeiro foi a pessoa vital no processo de aprendizagem, desde logo, na abordagem do esclarecimento do como ia ser a diálise peritoneal, oferecer-me literatura e disponibilizar-se para me informar sobre o assunto, pôr-me ao corrente do número de doentes que também estão a fazer diálise peritoneal, para interagir, acho que foi interessante, foi importante. Depois todo o acompanhamento que é feito, o ensino meticuloso, "repita, venha cá, eu quero ver", mesmo aquela situação dos "chatinhos" que querem ver a lavar as mãos, acho que isso é muito importante. Se algumas pessoas poderão eventualmente pensar "eu sei como devo lavar as mãos", no fundo é importante que é alguém que se importe connosco, que está connosco e que quer validar connosco o procedimento. O enfermeiro é a pessoa que contacta mais tempo durante mais vezes e que tem mais diálogo com o doente e é nesse sentido a peça chave para articular o processo. Veja eu não pedi para o médico telefonar, pedi para o enfermeiro telefonar. Ouvir a outra pessoa do outro lado, mostrarse disponível é muito importante. As consultas médicas são muito rápidas e não dá mesmo para intervalar uma conversa e esclarecer as coisas, os enfermeiros estão muito mais disponíveis e atentos no seguimento da doença. Aqui, se me permite o seguimento da doença é feito pelo enfermeiro, o médico faz a supervisão da outra parte, da laboratorial e do desequilíbrio, mas no dia-a-dia com o que o doente precisa foi o enfermeiro e acho que correu muito bem”. (EB – L169-185) “Actuaram muito bem, foram exigentes, exigentes comigo. Pronto, como no ter cuidado na higiene, foram muito exigentes. Na altura até pensava assim "poxa, há aí uns enfermeiros que são mesmo maus", a exigir muito, mas valeu a pena. Porque na altura nem pensei, tanta higiene para quê? Aonde estão os micróbios nas mãos? Mas era mesmo, a gente não tem a noção dessas coisas, só quem passa no terreno ou aliás como quem está no terreno como vocês, sabem destas coisas”. (ED – L95-100) “Primeiro disseram-me "ó senhor N em primeiro lugar tem que por a máscara e em segundo lugar tem que lavar muito bem as mãos e terceiro lugar, depois de lavar as mãos não pode mexer em mais nada que não esteja desinfectado. Foi muito fácil e foi muito bo m”. (EF – L138-140) “Actuaram bem, actuaram bem, porque também não… Pelo menos, por aquilo que eu me apercebo, como é que eu hei-de dizer? É pá tratar mal as pessoas não tratam, puxar pelo cateter também não puxam... (risos) e apesar disso não tenho nada a dizer sobre eles...De mal... De bom tenho, claro... (risos)” (EH – L62-65)

relacionados com a saúde. (CIE, 2001, p.157)

“Ah! Actuou muito bem, souberam explicar, insistiam com a gente para a gente aprender. Chamavam-nos a atenção, tipo ralhamento de escola "tens que aprender, porque afinal esqueceste-te" mas isso é uma chamada de atenção para que a gente não se esqueça mais não é? Claro muito simpaticamente e com boas maneiras de ensino, chamando à atenção dos erros que isso é normal em qualquer professor, não é? (risos) Porque quem não chama à atenção deixa-se baldar um bocadinho e éramos chamados à atenção. Foi isso que foi muito bom”. (EI – L104-110) “Primeiro ele fê-lo, era ele a executar a muda. Portanto tanto a nível da muda como do penso. Era ele que tratava primeiro pronto, para vermos como ele fazia e depois passávamos à prática a fazê-lo, depois de nos ensinar! Mas primeiro era ele que fazia tudo, depois passávamos então a fazermos nós.” (EI – L112-115) “Eu achei tudo bem, foram todos muito atenciosos, muito, com muita paciência com a pessoa, achei tudo bem. Estava tudo bem. Atenderam-me muito bem, muito carinhosos, não tenho nada a apontar de nada. Humildes e meigos, achei tudo de bom. (…) Eu acho que não faltou nada, paciência tinham. Não faltou nada. (…) Eu pronto, só tenho a dizer bem. São muito simpátic os, perguntam se está tudo bem. Preocupam-se comigo e não tenho mais nada a dizer”. (EC-121-133) “Não faltou nada, em questão de ensino de enfermagem não faltou nada. Senti-me capaz e seguro com aquilo que vocês me ensinaram”. (ED – L105106) “A L facilitou-me muito por acaso, uma boa enfermeira também. Adoro a L não desfazendo de vocês aqui, não é? (…)Deram-me muito apoio, pelo menos eu senti isso. Dando apoio já é muito. (…) Pelo menos o N deu-me muito e vocês também. Naquela altura que fiquei mais coisa, diziam-me para ter calma, para não me enervar. O que me valeu foi o N, que me apanhou na altura crítica...” (EE – L98-105) “Eu acho que não faltou nada, não vou dizer que fal tou, porque não faltou nada. Pelo menos, tanto a enfermeira, como os outros enfermeiros foram espectaculares, não tenho nada a dizer, tenho a dizer bem”. (EF – L144-146) “Eu acho que o que facilitou a aprendizagem foi os profissionais que aqui tive e que me tiveram a acompanhar, foram pessoas sempre bastante simpáticas, elucidativas na exaustão das explicações para eu não me esquecer. Foram as pessoas, os enfermeiros que me ajudaram bastante e facilitaramme a vida na aprendizagem”. (E A – L140-143) “Em relação aos profissionais, considero que fui be m

apoiado, quer dizer todos os passos foram seguidos pelo pessoal de enfermagem que me deu todo o apoio, que me telefonou para casa, que se preocupou em saber como é que estava, como é que o percurso estava a evoluir, nisso acho que correu muito bem. Não tive qualquer dificuldade, depois em casa, já não foram os mesmos profissionais que me seguiram, foram os profissionais da empresa privada que fornece o material e na altura houve um seguimento nos primeiros meses. Neste momento, já estou há um ano a fazer diálise, tenho umas consultas regulares, não tem havido, também não preciso, não tenho precisado desse tipo de situação. Embora não necessite, se permite uma sugestão eu ia adiantar uma sugestão, eu senti-me muito bem quando me ligaram para casa a dada altura a saber como é que estavam a correr as coisas. Embora as pessoas venham aqui à consulta, de dois em dois meses, se no intervalo houvesse nem que seja um telefonema para saber como estava, eu acho que era um apoio importante para a pessoa que esta do outro lado. Pode objectivamente não servir para nada, mas em termos de suporte e de apoio é capaz de a pessoa se sentir apoiada. Um telefonema”. (EB – L154-167) “É assim facilitou-me muito o apoio, a dedicação, a maneira como me explicaram de toda a equipa. A equipa, seja de enfermagem, seja de médicos, toda esta equipa que trabalha neste sector. Acho que se empenha muito com os doentes e tem muita, uma muito boa relação com os doentes e isso dá-nos uma confiança muito grande. Porque nós chegamos, eu penso, eu falo por mim (......) a gente confiar nos profissionais de saúde e a confiança que eles nos transmitem a nós, o carinho que eles nos dão, isso ajudou-me muito nessa fase. Porque eu não vejo estes profissionais como apenas enfermeiros ou como apenas médicos, mas sim quase já como família. Eu sinto-me à vontade, quand o tenho alguma dúvida ponho, esclareço para não ficar com dúvidas, sempre me esclareceram e me responderam a tudo. Sempre me explicaram tudo muito bem”. (EG – L139-148) “Ah, é assim, essa é uma parte muito importante deste tipo de tratamento. É a gente sentir que temos ali uma pessoa sempre disponível para nos explicar alguma dúvida que nós tenhamos ou alguma coisa que surja menos boa, temos sempre ali um apoio para nos socorrer. E isso foi uma coisa que me puseram logo à vontade, qualquer dúvida que eu tivesse. Para já explicaram tudo muito bem, como muita calma e sempre a perguntar se eu estava a perceber, se eu precisava e se tivesse alguma dúvida para pôr. Tinha sempre o apoio, quer que fosse pelo telefone, mesmo depois de estar em casa ou vindo cá pessoalmente, nunca me faltou apoio sempre que tive alguma necessidade. Isso dá muita confiança porque a gente sabe que temos 24horas sempre alguém, qualquer coisa que surja, basta pegar no telefone e temos sempre alguém do outro lado, para além de nos dar muito

apoio, muita força, carinho. Uma palavra amiga de conforto num momento menos bom e que temos um socorro a toda a hora”. (EG – L150-161) “Fui bem explícito daquilo que ia fazer. Fui bem, b em elucidado dos pormenores que devia ter em casa, com a limpeza, com o tratamento e da maneira de como devia actuar. Penso que não fui daqui sem saber o que ia fazer, penso que fui bem elucidado e que o enfermeiro conseguiu portanto que eu aprendesse e que eu fixasse aquilo que era importante para eu fazer a peritoneal”. (EI – L117-122)

Apêndice 6

Estrutura do fenómeno

A (Re) Construção da Mudança: O sentido da Diálise Peritoneal na pessoa Insuficiente Renal Crónica Terminal (2)

Condições facilitadoras ou inibidoras da experiência da DP

Disposições individuais para o inicio da DP

Respostas à experiência de diálise peritoenal

RESPOSTAS SOCIEDADE E INTRAPESSOAIS COMUNIDADE •Desfavoráveis •Recursos Materiais e •Beneficiadoras PESSOAIS Físicos •Emoções •Trabalho e Emprego •Estilo de Vida •Processo Familiar •Crença Saúde: •Processo Comunitário Ameaça •Conhecimento

RESPOSTAS INTERPESSOAIS •Familiares e Amigos •Profissionais e Sociais

Mudanças experienciadas na realização da DP

ADESÃO AO REGIME TERAPÊUTICO •Aprendizagem da GESTÃO DO técnica REGIME •Auto-cuidado na DP TERAPÊUTICO •Horários dos tratamentos •Hábitos de vida

do quotidiano

COMPORTAMENTOS DE ADESÃO À DP •Vida Familiar, Social e profissional em função da DP •(Re) definição dos objectivos de vida

DENEGAÇÃO ACEITAÇÃO TOMADA DE DECISÃO ADAPTAÇÃO

Pré-diálise

(Re)Construção

Inicio da DP

Viver em DP

Cuidar de Enfermagem no processo de Transição Acções de Enfermagem: •Estabelecer relação com •Informar(Ensinar; Explicar; Orientar) •Estabelecer limites •Dar poder a

Apêndice 7

Pedido à instituição hospitalar

Ex. ma Sr.(a) Drª Rosa Reis Marques Presidente do Conselho de Administração do Centro Hospitalar de Coimbra Data: Assunto: Pedido de autorização para a realização do trabalho de investigação “As vivências do Doente Insuficiente Renal Crónico no tratamento da Diálise Peritoneal” Eu, Maria Arminda da Silva Tavares, Enfermeira Graduada do Serviço de Diálise do HG do CHC-EPE, a frequentar o IV Curso de Pós-Licenciatura de Especialização de Enfermagem Médico-Cirúrgica, a decorrer na Escola Superior de Enfermagem de Coimbra, sob a orientação da Prof. Isabel Fernandes e do Prof. Dr. José Roxo, e tendo como tema do projecto de investigação “ As vivências da pessoa Insuficiente Renal Crónica em Diálise Peritoneal”, vem por este meio, pedir a V. Exª autorização para a realização de entrevistas e selecção dos participantes do programa activo de diálise peritoneal do Serviço de Nefrologia/Diálise. Os participantes deverão ser pessoas que realizem diálise peritoneal tendo iniciado tratamento no serviço de Nefrologia/Diálise do CHC-EPE e os quais manifestem interesse em participar no estudo, após a leitura e aceitação do consentimento informado. A colheita de dados ocorrerá de acordo com a disponibilidade e marcação prévia. Os dados colhidos serão apenas utilizados no trabalho acima referido. A identidade dos participantes será apenas conhecida pela autora do trabalho e eventualmente, pelos professores orientadores do trabalho. Mais informo, que será igualmente realizado o pedido de autorização formal à direcção do serviço de Nefrologia/Diálise e em anexo remeto os seguintes documentos. Documentos em anexo: - Guião de entrevista - Consentimento Informado Com os melhores cumprimentos pede deferimento,

Maria Arminda da Silva Tavares

Isabel Fernandes

__________________________

__________________________

(A aluna)

(A orientadora)

Apêndice 8

Símbolos

SÍMBOLOS

(++)

Repete a mesma ideia duas vezes

(~~~~~)

Não se percebe

(...)

Interrompe a frase

ANEXOS

Anexo 1

Estrutura adaptada da Teoria de Meleis et al., (2000)

Teoria da Transição Condições de transição: facilitadoras e inibidoras Padrões de resposta

Natureza das transições Tipos Desenvolvimento Situacional Saúde/doença Organizacional Padrões Unicos Multiplos Sequenciais Simultaneos Relacionais Não-relacionais

Propriedades Consciencia Compromisso Mudança e Diferença Tempo de transição Pontos criticos e acontecimentos

Pessoal Sentidos Crenças e Atitudes culturais Status Socio-economico Preparação e conhecimento

Comunidade

Indicadores de processo Sentir-se ligado Interagir Localizar e estar situado Desenvolver confiança e confronto

Sociedade Indicadores de resultado Mestria Identidade integrativa fluida

Terapias de Enfermagem

Esquema adaptado, Meleis et al, 2000

Anexo 2

Deferimento da Unidade Hospitalar

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