A relevância da arbitragem na Baixa Idade Média
Descrição do Produto
26/03/2015
A relevância da arbitragem na Baixa Idade Média Jus Navigandi
Este texto foi publicado no site Jus Navigandi no endereço http://jus.com.br/artigos/37524 Para ver outras publicações como esta, acesse http://jus.com.br
A relevância da arbitragem na Baixa Idade Média Frederico Bonaldo
Publicado em 03/2015. Elaborado em 03/2015.
Trata da importância da arbitragem no período da Baixa Idade Média, quando este instituto se estendeu prodigiosamente pela Europa, introduzindose de maneira sólida no universo mercantil e até mesmo possibilitando o surgimento da diplomacia estatal. 1. INTRODUÇÃO A prática da arbitragem, apesar de milenar, tem, nos dias de hoje, uma importância crescente, uma vez que o seu aperfeiçoamento como instituto jurídico e a sua aplicação a situações cada vez mais numerosas são uma constante em muitos países. Por exemplo, é chamativo o fato de a American Bar Association – o órgão de classe dos advogados norteamericanos – estar, há mais de uma década, concentrando esforços na direção do alargamento da utilização da arbitragem como meio alternativo ou complementar para diminuir ao máximo os efeitos nocivos produzidos pelos vagorosos tribunais locais [1]. No Brasil, após a promulgação da Lei n.º 9.307/96, os caracteres deste instituto têm sido intensamente esmiuçados pela doutrina, posto que os obstáculos para a sua implementação já não possuem mais a força de antes, e também porque o conteúdo da famigerada Lei Marco Maciel “coadunase, perfeitamente, com os princípios fundamentais do Estado Democrático brasileiro, conforme acentua o preâmbulo da Constituição Federal de 1988” [2]. As vantagens do processo arbitral frente ao processo judiciário estatal – celeridade, informalidade e confidencialidade – são notórias e frequentemente veiculadas. Porém, talvez não seja suficiente para a defesa e promoção deste instituto o seu tratamento exclusivo nos termos em que hoje se apresenta ou, no limite, nos contornos que assumiu no passado recente. Enxergase haver a necessidade de adentrar as suas raízes históricas, especialmente daqueles períodos em que seus elementos constitutivos começaram a solidificarse e em que a sua utilização alcançou grande expansão. Não raramente, a história do Direito e do pensamento jurídico é negligenciada por quem o concebe como o objeto de uma disciplina cientificamente neutra, despida de lastro cronológico e valorativo. Mas, a bem da verdade, é preciso reconhecer que “é natural que as diversas fases do pensamento humano acabem por influenciar a visão que os juristas têm do mundo jurídico e seus elementos, levando a que uma postura determinada seja predominante em certa época” [3]. Ao abordar a arbitragem – e qualquer outro instituto jurídico – pelo seu viés histórico, podese fornecerlhe “a compreensão de sua retrospectiva, esclarecendo as dúvidas e levantando, passo a passo, […] suas bases de fundo e suas características de forma, até chegar à razão de ser de seu significado e conteúdo” [4]. Por isso, neste estudo, procurase trazer à tona a relevância do instituto da arbitragem no período da Baixa Idade Média (época compreendida entre os séculos XIII a XV d.C.), quando se estendeu prodigiosamente pela Europa, introduzindose de maneira sólida no universo mercantil e até mesmo possibilitando o surgimento da diplomacia estatal. Contudo, convém antes descrever em breves linhas o contexto social e jurídico em que a arbitragem ao tempo da sua gênese. 2. CONTEXTO SOCIAL EUROPEU NA BAIXA IDADE MÉDIA Como é sabido, “no século XIII, verificase uma mudança considerável na estrutura da sociedade medieval. Já iniciada no século XII, essa mudança prossegue até o fim da Idade Média” [5]. Precisamente, este é o arco temporal denominado Baixa Idade Média. A mudança referida foi marcada por duas peculiaridades dignas de nota: (1) o enfraquecimento do sistema feudal e (2) o surgimento das comunas ou cidades. No século XIII, a vida política européia estava associada a um certo otimismo reinante nas cidades que renascem e que renascem através de um esforço coletivo. Este esforço é, geralmente, uma guerra empreendida contra o senhor feudal, leigo ou bispo: e o fim da guerra é selado pela capitulação do senhor que concede à cidade a sua Carta, seu estatuto, seu foral. Algumas vezes esta carta de liberdade urbana é concedida
http://jus.com.br/imprimir/37524/arelevanciadaarbitragemnabaixaidademedia
1/5
26/03/2015
A relevância da arbitragem na Baixa Idade Média Jus Navigandi
com menos violência e guerra, mas é sempre uma forma de pacto. E os cidadãos não são cidadãos isolados: são as corporações e guildas, que fazem entre si um pacto de defesa mútua, uma conjuração pela paz […]. A própria comuna ou cidade é uma corporação formada por alguns cidadãos capazes e posta sob a tutela de um grupo de autoridades que deve zelar para que ela cumpra seus fins corporativos (ou fim comum) [6]. Mesmo persistindo em algumas regiões do continente europeu até o final do Antigo Regime, o poder dos senhores feudais sobre os seus vassalos foi suplantado pelo fortalecimento dos reis e de outras figuras da nobreza. Com isso, a ideia moderna de Estado começou a formarse, especialmente por meio da estruturação jurídica dos corpos políticos e dos seus corpos representativos (os Estados Gerais franceses, o Parlamento inglês, as Cortes espanholas etc.) [7]. Por outro lado, a restrição da hierarquia feudal propiciou o surgimento das comunas dentro de um novo marco administrativo. Nelas, a atividade industrial passou a desenvolverse de maneira pujante, e uma economia ágil substituiu a economia fechada que antes prevalecia, possibilitando, assim, uma vida comercial de grande intensidade e alcance que interconectava muitas localidades, principalmente da Europa ocidental [8]. 3. A ESCOLA DOS COMENTADORES E A FORMAÇÃO DE UM NOVO CENÁRIO JURÍDICO A reestruturação da sociedade medieval entre os séculos XIII e XV encontra as suas causas no resgate da cultura clássica grecolatina um ou dois séculos antes, período em que foram fundadas as primeiras universidades. Nestas, o estudo do Direito – que buscou a reabilitação do espírito jurídico dos jurisconsultos romanos – constituía uma das disciplinas centrais, sendo a escola de Bolonha a que maior prestígio alcançou. Em Bolonha, no final do século XIII e início do XIV, aparecem os comentadores (ou pósglosadores), estudiosos do Direito romano – ao qual imprimiram um certo grau de erudição, passando a denominálo ius commune, – que, ao contrário dos seus predecessores – os glosadores – “influenciaram na aplicação prática do direito de sua época” [9]. Eles foram os grandes conselheiros dos príncipes, das comunas e dos particulares por meio das opiniões e pareceres que emitiam, o que representou um forte auxílio na harmonização dos Direitos locais disseminados pela geografia europeia [10]. Entre os comentadores, a maior figura foi Bártolo de Sassoferrato, seguido de Baldo de Ubaldis. Enfim, os glosadores tornaram possível “uma convivência da tradição feudal com as novas tendências da vida européia: o comércio e a monetarização da vida e das obrigações, uma certa flexibilização nas transferências de terras e sucessões” [11]. Dada essa recuperação do Direito romano adaptado à conjuntura políticosocial medieval, podemse ressaltar algumas características do novo cenário jurídico que então se formou: (1) a reaparição da lei como fonte do Direito, principalmente nas searas administrativa e econômica; (2) a redução a escrito dos costumes locais e regionais, em virtude da necessidade de segurança jurídica; (3) o apogeu do Direito canônico em decorrência das sistematizações de Graciano e do papa Gregório IX; (4) a supressão dos meios probatórios irracionais, tal como ordálios e duelos judiciários, por influência do processo jurídico canônico; (5) a consideração da justiça e da equidade como fundamentos do Direito; e (6) os primeiros esforços de formulação de um Direito objetivo aplicável a todos os habitantes de um território ou a todos os membros de um grupo social determinado [12]. 4. FATORES DO ÊXITO DA ARBITRAGEM NA BAIXA IDADE MÉDIA No número 10 do seu extenso e rico verbete “Arbitragem internacional (introdução histórica)”, Guido Soares expõe, primeiramente, a conjuntura medieval que propiciava o alargamento da arbitragem operada por papas e bispos em questões políticas das comunas. Posteriormente, o mencionado autor reportase ao trabalho de um autor europeu a fim de explicitar três razões do sucesso da arbitragem na Idade Média, agregando, ao final, uma quarta referente às corporações de ofício [13]. Neste tópico, desenvolvemse estes dois destaques de maneira que o primeiro sirva de suporte para o segundo – o mais importante para os fins deste estudo. Preliminarmente, cabe enfatizar que “a partir do século XII, a Idade Média está repleta de casos de arbitragem, entre cavaleiros, entre barões, entre proprietários feudais e entre soberanos distintos” [14]. Nesse período, houve conflitos de suma importância para o futuro desenrolar da história ocidental que foram resolvidos através da arbitragem. A solução dos litígios entre o imperador Frederico II e o papa Inocêncio IV, por intermédio do parlamento da cidade de Paris, e o Tratado de Tordesilhas entre Portugal e Espanha, orquestrado por uma bula do papa Alexandre VI, são exemplos emblemáticos [15]. O período final da Idade Média tem como característica marcante a cristianização praticamente integral do continente europeu. Com efeito, a Europa de então era a chamada cristandade, situação esta que levou muitos historiadores a denominarem pax christiana a esse fortíssimo influxo da religião cristã – em clara semelhança formal e oposição de conteúdo com a pax romana pagã do século I d.C. De acordo com este estado de coisas, a arbitragem operada pelo papa – nessa época, estreitamente unido ao imperador, figura máxima da ordem temporal – representava o julgamento da autoridade maior do âmbito espiritual. Com este amplo espaço jurisdicional, era mais comum que a arbitragem papal fosse acionada na ocorrência de disputas públicas; porém, também era muito frequente a interferência papal na esfera privada, através dos seus emissários, que funcionavam como mediadores e conciliadores para assuntos não só das ordens religiosas como também das comunas. Conforme cita o Guido Soares, o jurista francês Michel de Taube – no seu artigo intitulado “Les origines de l’arbitrage international; antiquité et Moyen Âge” – aponta três fatores que determinaram o grande êxito da arbitragem na época medieval: (1) a prática frequente da arbitragem no âmbito da Igreja católica romana; (2) o recurso à arbitragem nas questões intercomunais; e (3) o sistema de direitos recíprocos presente na estrutura feudal.
http://jus.com.br/imprimir/37524/arelevanciadaarbitragemnabaixaidademedia
2/5
26/03/2015
A relevância da arbitragem na Baixa Idade Média Jus Navigandi
Quanto ao primeiro fator, na Idade Média – tal como ainda hoje acontece, se bem que de um modo menos perceptível para o comum dos cidadãos – coexistiam as jurisdições civil e eclesiástica. Como os clérigos estavam sujeitos a esta última e muitos deles eram proprietários de extensas áreas de terra onde se formavam comunidades várias, o recurso às instâncias eclesiásticas – em casos de litígios que ocorriam no interior dessas comunidades – era mais frequente que o recurso aos tribunais judiciais civis. Como indica Guido Soares, esta prática se intensificara em virtude da proibição estabelecida por Paulo de Tarso de que os cristãos recorressem à justiça profana nos casos de conflitos entre si (isto consta da sua primeira carta aos habitantes de Corinto, concretamente no seu capítulo VI, versículos 1 e seguintes). De maneira parecida ao que ocorria entre as poléi gregas na Idade Antiga, as comunas do Baixo Medievo passaram a resolver suas questões de limites territoriais por meio da escolha de um árbitro, em detrimento do aparelho judiciário do Sacro Império Romano Germânico. A reabilitação do Direito romano foi um forte impulso para esta alternativa, uma vez que o seu ius civile possuía um caráter eminentemente privado, inclusive no tratamento de assuntos que, na Modernidade, viriam a ser iluminados pelas disposições do Direito público. Também o feudalismo – estrutura em que se organizavam amplos setores da sociedade europeia – implicou o uso incontornável da arbitragem. O proprietário de um determinado feudo reunia na sua pessoa a totalidade do poder político daquele território. No entanto, ocupava um determinado lugar na hierarquia composta por outros senhores feudais e pelos reis. Quando se davam litígios privados no âmbito daquele feudo, era praxe que os particulares recorressem – quando insatisfeitos com a decisão local – à arbitragem do superior hierárquico do seu senhor feudal – o proprietário de um outro feudo ou um rei –, a fim de obterem a solução mais ao seu gosto para aqueles litígios, prática esta que, nos dias atuais, corresponderia ao campo do Direito internacional público. Por fim, é importante mencionar a prática da arbitragem nas corporações de ofício e de profissões liberais – embriões dos contemporâneos sindicatos de classe – que surgiram em número vertiginoso no ocaso da era medieval. Neles, existia uma sólida e intransigente hierarquia, que tornava mais favorável o uso da arbitragem para a resolução de conflitos internos do que o recurso aos tribunais oficiais. 5. ASPECTOS DA ARBITRAGEM COMERCIAL NOS SÉCULOS XIII, XIV E XV A vida comercial nos três últimos séculos da Idade Média desenvolviase em feiras espalhadas por diversos pontos da Europa. Estas recebiam comerciantes e produtos procedentes de localidades diversas e as mais longínquas, o que acarretava uma série de percalços à atividade negocial, tais como a grande quantidade de tributos sobre o transporte e a venda de mercadorias, entraves para a entrada de produtos nos portos e para o tráfego dos mesmos sobre estradas e pontes [16]. A isto se uniam as características do sistema jurídico vigente à época, em que “imperava a extrema personificação da lei e a mais ampla extraterritorialidade dos estatutos pessoais” [17], cujo efeito era a necessidade de os tribunais judiciários locais aplicarem leis estranhas ao foro. Assim, os juízes desses tribunais tinham de lidar com dois fenômenos capciosos: a complexidade intrínseca às práticas mercantis e o adequado conhecimento de múltiplas legislações a eles alheias. Como contraponto, desde muito cedo foram surgindo nessas feiras tribunais arbitrais, cujo procedimento era muito mais célere que os dos tribunais judiciais, já que estavam providos de julgadores cientes da dinâmica comercial e que recorriam “à eqüidade e à aplicação de usos e costumes vigentes para as partes” [18]. Desse modo, a Idade Média tornouse o berço da arbitragem comercial. Dois acontecimentos de relevo demonstram a boa adequação das práticas comerciais à arbitragem: (1) consta de um decreto de Luís IX, rei da França, de 1250, a ordem de que fosse feito um elenco de comerciantes envolvidos em diversas atividades mercantis, com vistas à constituição de tribunais arbitrais; (2) em 1637 – portanto, não mais na Idade Média, contudo sob o seu influxo –, uma lei francesa determinou que os tribunais judiciários considerassem ex officio – quando inexistissem nos contratos de sociedade ou de seguro marítimo – cláusulas compromissórias para determinadas matérias e indicação de árbitro, nos casos de revelia e não cooperação [19]. Ressaltese uma característica da Europa medieval que, provavelmente, também estaria presente na arbitragem comercial: a mediação nos negócios entre particulares. Michel de Taube transcreve um trecho de uma obra de Boutillier – jurista francês do século XIV – que, ao repetir as definições de leis a ele anteriores, indica a existência da figura do mediador: [Á]rbitro não pode e não deve, na causa a ele submetida, proceder senão por ordem do direito vigente, segundo o alegado – ou provado perante ele – mas fazer tudo segundo a regra de direito; arbitrador, se é aquele que da causa é encarregado pela sua consciência, segundo o direito ou não; mediador ou apaziguador, se é aquele que, com o consentimento das partes, as coloca em acordo [20]. Assim, três figuras distintas existiram na Idade Média: o árbitro, o arbitrador e o mediador. Guido Soares dálhes as seguintes definições: [C]onceituamos árbitro como aquele que julga uma causa, segundo a lei da sede do tribunal ou segundo a eqüidade (se as partes assim dispuseram e se aquela lei o permitir), num processo instituído pelas partes, segundo um ritual definitivamente caracterizado; arbitrador, aquele que exerce a peritagem técnica, a pedido de uma das partes, de ambas ou de um terceiro na relação contratual (o juiz, p. ex.), sem necessidade de ritos definitivos; mediador ou apaziguador, ou ainda amigável compositor, aquele que decide, por permissivo das partes, mas cuja decisão não é obrigatória para as partes, nem se acha restrito a decidir segundo algum rito [21]. 6. ARBITRAGEM MEDIEVAL E A ORIGEM DA POLÍTICA EXTERNA DOS ESTADOS MODERNOS
http://jus.com.br/imprimir/37524/arelevanciadaarbitragemnabaixaidademedia
3/5
26/03/2015
A relevância da arbitragem na Baixa Idade Média Jus Navigandi
Além de ter sido uma época em que os casos de arbitragem se multiplicaram e em que se originou a arbitragem comercial, a Idade Média presenciou o assentamento das bases para aquilo que depois seriam os fundamentos da política externa do Estado moderno. Essas bases só puderam ser estabelecidas graças à flexibilidade que a arbitragem imprimiu às soluções pacíficas de litígios entre comerciantes. Ora, a política externa do Estado moderno tem como fundamentos a diplomacia institucional e os exércitos permanentes [22]. Em período anterior ao Estado moderno, estes já existiam, porém vinculados ao monarca. No entanto, a gênese de ambos encontrase na atividade comercial desenvolvida nas cidades italianas setentrionais, cuja dinâmica interna fugia dos padrões do feudalismo, sistema ainda presente na Baixa Idade Média [23]. Os comerciantes de Gênova, Veneza e Florença, dentre outras cidades, passaram a ocuparse da formação de prepostos aptos a negociar com êxito os seus produtos com estrangeiros – quer na Itália, quer no exterior –, dada a rivalidade que nutriam entre si. Dessa forma, aos poucos, foram surgindo nessas localidades corporações de especialistas em negociação, que ofereciam os seus serviços àqueles que pretendessem estabelecer relações mercantis ou de outra natureza com estrangeiros. No limiar da Idade Moderna, quando as monarquias europeias recuperaram o seu vigor, tais especialistas vincularamse aos reis e passaram a exercer o papel de enviados seus nas negociações com líderes de outros reinos. Com o surgimento do Estado moderno, esses negociadores começaram a compor o corpo diplomático, que continuou a ter a mesma função. Dessa maneira, surgiu a diplomacia que hoje conhecemos. Quanto aos exércitos permanentes, a sua origem está aliada à atividade daqueles prepostos dos comerciantes do norte da Itália que deviam perambular pela geografia do continente a fim de estabelecer relações comerciais com estrangeiros. Como faz notar Souto Maior, “os salteadores de estradas, e às vezes os próprios senhores feudais, roubavam mercadorias à mão armada e de vez em quando prendiam um mercador para obter resgate. Daí, o uso de ‘caravanas comerciais’ escoltadas por grupos armados” [24]. Esta ligação entre mercadores e grupos armados acompanhou a evolução das monarquias e dos Estados modernos até assumir a configuração atual. Enfim – como se indicou no início deste tópico –, estas bases só puderam ser assentadas, em grande medida, em virtude da arbitragem, que, ao liberar as atividades comerciais medievais dos óbices jurídicos próprios daquele período histórico, proporcionoulhes uma formidável expansão a vários lugares da Europa. 7. CONCLUSÃO A perspectiva histórica parece demonstrar a admirável força de transformação das esferas jurídica, econômica e política que o instituto da arbitragem tem o condão de operar. Verificase que, quando bem teorizada e aplicada, a arbitragem pode facilitar sobremaneira a dinâmica do tecido social, a partir do mundo do Direito. Pensase que – em meio ao hodierno fenômeno de globalização, que vem enlaçando com os seus tentáculos as mais variadas esferas sociais – a arbitragem poderá ser um dos trunfos para a realização daquilo que Mauro Cappelletti denominou “a terceira onda do acesso à justiça”, isto é, a resolução das barreiras processuais. De acordo com Pedro Batista Martins, “há necessidade premente de se emprestar espírito prático e menos formal aos procedimentos de solução de conflitos, revitalizandose a arbitragem, de modo a facilitar o acesso à justiça, agilizar o resultado final da pendência e a viabilizar a própria Justiça com a redução do contencioso judicial” [25]. Esperase que a explicitação da importância deste instituto pelo prisma da história do Direito possa contribuir à sua bem sucedida consolidação no Brasil e em outros países carecedores de uma iurisdictio real e eficaz. 8. BIBLIOGRAFIA FIGUEIRA JÚNIOR, Joel Dias. Arbitragem, jurisdição e execução: análise crítica da Lei n.º 9.307 de 23/09/1996. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1999. GILISSEN, John. Introdução histórica ao direito. 2.ª edi. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, s/d. LOPES, José Reinaldo de Lima. O direito na história: lições introdutórias. São Paulo: Max Limonad, 2000. MARTINS, Pedro A. Batista. O acesso à justiça. Informativo Consulex, Ano IX, nº 35, de 28.08.95. MORAES, Renato José de. Cláusula rebus sic stantibus. São Paulo: Saraiva, 2001. SOARES, Guido Fernandes Silva. Arbitragem internacional. Introdução histórica. In: LIMONGI FRANÇA, R. (coord.). Enciclopédia Saraiva do Direito, v. 7. São Paulo: Saraiva, 1979. SOUTO MAIOR, A. História Geral, 14.ª ed. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1971.
[1] Martins, Pedro A. Batista. O acesso à justiça. Informativo Consulex, ano IX, nº 35, de 28.08.95, p. 9. [2] Idem, p. 10. [3] Moraes, Renato José de. Cláusula rebus sic stantibus. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 1.
http://jus.com.br/imprimir/37524/arelevanciadaarbitragemnabaixaidademedia
4/5
26/03/2015
A relevância da arbitragem na Baixa Idade Média Jus Navigandi
[4] Tucci, Rogério Cruz e; Azevedo, Luiz Carlos de. Lições de história do processo civil romano apud Figueira Júnior, Joel Dias. Arbitragem, jurisdição e execução: análise crítica da Lei n.º 9.307 de 23/09/1996. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1999, pp. 2324. [5] Gilissen, John. Introdução histórica ao direito. 2.ª ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, s/d, p. 239. [6] Lopes, José Reinaldo de Lima. O direito na história: lições introdutórias. São Paulo: Max Limonad, 2000, p. 146. [7] Cf. Gilissen, John, ob. cit., p. 239. [8] Cf. idem, p. 240. [9] Moraes, Renato José de, ob. cit., p. 50. [10] Cf. Lopes, José Reinaldo de Lima, ob. cit., p. 134. [11] Lopes, José Reinaldo de Lima, ob. cit., p. 134. [12] Cf. Gilissen, John, ob. cit., pp. 24041. [13] Cf. Soares, Guido Fernandes Silva. Arbitragem internacional. Introdução histórica. In: LIMONGI FRANÇA, R. (coord.). Enciclopédia Saraiva do Direito, v. 7. São Paulo: Saraiva, 1979, pp. 379380. [14] Soares, Guido Fernandes Silva, ob. cit., p. 379. [15] Cf. idem, ibidem. [16] Cf. Souto Maior, A. História Geral. 14.ª ed. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1971, p. 245. [17] Soares, Guido Fernandes Silva, ob. cit., p. 380. [18] Idem, ibidem. [19] Cf. idem, p. 381. [20] Apud Soares, Guido Fernandes Silva, ob. cit., p. 381. A ênfase foi acrescentada. [21] Soares, Guido Fernandes Silva, ob. cit., p. 381. [22] Cf. idem, p. 382. [23] Cf. idem, p. 381 [24] Souto Maior, A., ob. cit., p. 245. [25] Martins, Pedro A. Batista, ob. cit., p. 10.
Autor Frederico Bonaldo Doutorando em Direito na PUCSP. Mestre em Direito pela UERJ. Bacharel em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Professor Assistente de Metodologia e Lógica Jurídica na Faculdade de Direito da PUCSP.
Informações sobre o texto Este texto foi publicado diretamente pela autora. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi.
http://jus.com.br/imprimir/37524/arelevanciadaarbitragemnabaixaidademedia
5/5
Lihat lebih banyak...
Comentários