A relevância da ética para as ciências, segundo Augustín Vallina

July 23, 2017 | Autor: Adriano Oliveira | Categoria: Filosofía, Filosofia da Ciência
Share Embed


Descrição do Produto

UNIVERSIDADE CATÓLICA PORTUGUESA – CENTRO REGIONAL DE BRAGA Departamento de Filosofia – Doutoramento em Filosofia da Religião

“Nem tudo aquilo que, cientificamente, pode-se fazer, tem que ser feito” A relevância da ética para as ciências, segundo Augustín Vallina.

Trabalho final da Disciplina Temas e Autores de Filosofia Contemporânea II – Religião e Ciência, do Programa de Doutoramento em Filosofia da Religião da UCP – Braga. Orientador: Professor Dr. Álvaro Balsas Orientando: Adriano Oliveira

Braga – Abril de 2015.

Ponto de Partida Os capítulos finais da obra de Augustín Udías Vallina, Ciencia y religión: dos visiones del mundo, tratam da pertinência da ética para os domínios do saber científico e do desenvolvimento tecnológico. O autor parte do princípio de que as ciências empíricas constituem atividades específicas de conhecimento humano e, como tais, estão sujeitas à avaliação e ajustamento aos conteúdos normativos e princípios éticos gerais. Tendo em vista que a dimensão religiosa traz consigo elementos de natureza moral, a abordagem de assuntos referentes à práxis é quase inevitável quando são pensadas as relações entre ciência e religião1. Isto posto, a síntese do texto de Vallina que apresentamos pretende considerar a fundamentação ética para as disciplinas científicas, a responsabilidade moral no contexto do trabalho investigativo e de suas aplicações práticas, e as implicações éticas entre o progresso humano e o cuidado com a vida e o meio ambiente. Sobre o fundamento ético das ciências A reflexão proposta por Augustín Vallina vale-se da compreensão tradicional de ética, mediante a qual subentende-se “(...) la consideración de las normativas o criterios por los que se pueden juzgar las acciones humanas como buenas o malas.”2. Ademais, o âmbito da moralidade tem a ver com o discernimento acerca das atitudes, comportamentos e decisões dos indivíduos. Pode ser afirmado que a dimensão ética não figura como algo alheio ou extrínseco ao ser do sujeito, pelo contrário, ela revela-se um dos seus constituintes elementares. O autor, ao comentar sobre o mecanismo evolutivo e a relação entre maior complexidade e maior liberdade, põe em relevo a condição singular do homem enquanto a sua ultrapassagem do estado de subserviência ao dado e ao instintivo. Assistida pela inteligência, a vida humana insere-se no patamar diferenciado do dever ser e nos domínios da autonomia e da liberdade3. Esses elementos favorecem a percepção do homem como ser moral e o reconhecimento de que o horizonte axiológico afeta as diversas realizações humanas, entre as quais as próprias produções dos saberes científico e tecnológico. Sobre este aspecto, o jesuíta defende, desde o prisma deontológico, que o trabalho das ciências deve ser percebido como um bem. Isto não apenas configura-se como pressuposto valorativo essencial toda e qualquer investigação, bem como realça as implicações da responsabilidade individual e coletiva na consecução de tais atividades, sejam elas teóricas ou práticas4.                                                                                                                 1

Cf.: VALLINA, A. Ciencia y religión: dos visiones del mundo. 2ª Ed. Santander: Sal Terrae, 2010, p. 353-423. VALLINA, A. Ciencia y religión. p. 353. 3 Cf.: VALLINA, A. Ciencia y religión. p. 353-355. 4 Cf.: VALLINA, A. Ciencia y religión. p. 356-359. 2

 

2/10

A posição do autor em subordinar a ciência à ética opõe-se, diretamente, a um tipo de postura bastante contestado, porém vigente, que advoga em nome da neutralidade da primeira perante a segunda. Conforme tal perspectiva, as pesquisas científicas se achariam fora do universo dos valores e emancipadas da observação e do julgamento moral. Vallina declara que este modo de pensar tem seus vínculos com ideologias cientificistas e não se mostra como sustentável nos tempos atuais5. Estabelecido que a eticidade convém e importa ao saber empírico analítico, Vallina examina certas linhas de pensamento que asseguram a competência das ciências em prover, a si mesmas, os referenciais valorativos que regem suas atividades e formam sua ética interna. Ele cita Jacques Monod, o qual aponta o postulado de objetividade como fundamento ético exclusivo subjacente ao exercício científico; Jacob Bronowski, que afirma que a ética da ciência emerge de sua inerente atividade e está relacionada à universalidade do princípio de verificação; e Robert Merton, que, sob o viés sociológico, declara a existência de princípios comuns à comunidade científica e que compõem um ethos interno, enquanto conjunto de normativas aceito pelos seus membros6. Após assinalar as insuficiências no posicionamento desses cientistas, Augustín Vallina atesta incapacidade da ciência em autoinstituir seus princípios morais e pontua que sua ética interna encontra-se sujeita à ética geral que norteia o comportamento humano. Ele afirma que é cada vez mais evidente que a comunidade científica deve respeitar os pressupostos éticos, enquanto condição de possibilidade do labor científico em si. Isto não cabe somente aos cientistas das ciências aplicadas, mas refere-se a todos os pesquisadores, inclusive aqueles cujas investigações não divisam implicações éticas tão evidentes7. Ainda sobre os fundamentos, outro assunto discutido Vallina diz respeito à ideia da origem da ética com base nos princípios científicos. Em geral, as tentativas de derivar a moralidade humana das ciências remontam às concepções estritas da teoria evolutiva, que estatuem que o comportamento ético deve ser entendido nos limites da luta pela sobrevivência e no contexto da seleção dos seres mais adaptados. A sociabilidade, a cooperação e a bondade são vistas como resultados de uma evolução biológica da espécie. Vallina realça que este tipo de abordagem, levado às últimas consequências, assume conotações deterministas e suprime a dimensão da liberdade. Não há motivos para se falar em ações morais onde a vontade livre inexiste e o dado impera8.                                                                                                                 5

Cf.: VALLINA, A. Ciencia y religión. p. 369. Cf.: VALLINA, A. Ciencia y religión. p. 361-365. 7 Cf.: VALLINA, A. Ciencia y religión. p. 365-366. 8 Cf.: VALLINA, A. Ciencia y religión. p. 371-373. 6

 

3/10

Vallina não ignora as possíveis influências das disposições evolutivas nas atitudes e posturas humanas. O que ele apregoa é a não redução da vivência ética e da moralidade ao fisicalismo genético absolutista. O geofísico critica as concepções que buscam localizar as razões éticas nos domínios do conhecimento objectivável. Ao saber empírico-formal cabe o estudo do como do ser, pois encontra-se na ordem dos fatos e atua no domínio do mensurável das coisas. A ciência é incompetente para constituir, desde si própria, o fundamento moralidade humana. O embasamento último do dever ser é algo que lhe escapa, este revela-se como proprium da dimensão axiológica da existência9. Nas palavras explícitas do autor, “La ética (…) tiene a ver con otros aspectos de la realidad que, de hecho, son más importantes en la vida humana, como son las relaciones personales, la búsqueda de la felicidad, la creatividad, la libertad y el sentido de la transcendencia, que no pueden ser adecuadamente tratados sólo desde la ciencia.”10 Diante disso, Vallina estabelece o seguinte argumento: ou se pressupõe a redução completa do fenômeno humano ao observável e verificável ou se abandona a obstinação de fazer derivar a ética das ciências11. Ciência e ética, desenvolvimento e responsabilidade Conforme foi visto, a ética geral diz respeito ao saber empírico no sentido de fundamentar os princípios morais internos da investigação científica. Contudo, as implicações do horizonte axiológico nas ciências não terminam aí. Augustín Vallina patenteia a existência de uma ética externa, como aquela que concerne aos resultados dos estudos e aplicações práticas dos cientistas. Ela salienta o aspecto da responsabilidade na consecução dos trabalhos científicos e dos desenvolvimentos tecnológicos. O autor deixa entrever a importância da prudência e do discernimento ao ambiente científico. Se a ciência deve mirar o bem do homem, é mister pensar as possíveis consequências das atividades investigativas12. O catedrático jesuíta declara que a responsabilidade pessoal ou coletiva sobre os resultados do trabalho realizado não pode ser suprimida e abrange todas as áreas das ciências, teóricas ou aplicadas.

Mesmo que os projetos e empreendimentos exijam um número

ampliado de profissionais, isto não isenta a obrigação moral individual em sua execução. O objetivo ético a ser perseguido é o de que cada um dos participantes empregue os seus esforços, de modo que o que vem sendo desenvolvido, seja para o bem do homem e da sociedade13.                                                                                                                 9

Cf.: VALLINA, A. Ciencia y religión. p. 373-374, 379-380. VALLINA, A. Ciencia y religión. p. 375. 11 Cf.: VALLINA, A. Ciencia y religión. p. 375. 12 Cf.: VALLINA, A. Ciencia y religión. p. 366-368. 13 Cf.: VALLINA, A. Ciencia y religión. p. 366-367 10

 

4/10

Outro aspecto relacionado à ética externa liga-se à ação das ciências na vida das pessoas. O dia-a-dia do homem moderno encontra-se envolto num emaranhado de aparatos tecnológicos que promovem o conforto, mas que trazem consigo os seus senões. Augustín adverte para o risco de uma situação de dependência ou instalação de uma artificialidade generalizada da vida quotidiana. A influência científica é sentida também através da disseminação de uma visão de mundo, que consagra o modelo empírico formal como a única fonte de conhecimento válido e verdadeiro. Trata-se, muitas vezes, de um assentimento acrítico por parte das pessoas em relação àquilo que é posto sob a chancela das ciências14. E, em tempos supervalorização do saber positivo, Vallina põe em destaque a circunstância complexa e cada vez mais evidente da ciência e da técnica como fontes de controle e dominação. Embora a relação entre conhecimento e poder não se configure algo específico da contemporaneidade, ela tem se mostrado imperiosa partir do processo de industrialização da ciência e da associação desta às instâncias político-econômicas. “(…) los pueblos que poseen las llaves de la ciencia y de la tecnología son los pueblos más influentes, tanto política como económicamente, y corren el peligro de volverse dominadores y agresivos. A esta situación corresponde, como reacción, una conciencia de que la ciencia ha dejado de ser un vehículo de liberación para el hombre ya ha se convertido en un factor más dentro de los mecanismos del control del poder, y que la práctica de la ciencia es, cada vez con más frecuencia, manipulada por intereses extra-científicos.”15

No contexto do processo de ideologização do conhecimento e de manipulação da atividade científica, o autor recorda as responsabilidades dos cientistas que, ainda que inconscientes, têm colaborado na efetivação e perpetuação das relações de domínio e exploração no mundo moderno. Em geral, como a detenção da tecnologia e do desenvolvimento é privilégio que sustenta a hegemonia de poucos países, isto faz com que a grande maioria dos povos orbite ao redor desses poucos, numa atitude de sujeição. Ele enfatiza o aspecto perverso da relação entre ciência e poder, enquanto agravamento das discrepâncias sociais e da sustento dos regimes de dominação por parte dos países tecnologicamente desenvolvidos16.

                                                                                                                14

Cf.: VALLINA, A. Ciencia y religión. p. 368-369. VALLINA, A. Ciencia y religión. p. 370. 16 Cf.: VALLINA, A. Ciencia y religión. p. 370. 15

 

5/10

“A menudo, la ciencia acaba vinculándose con el poder político y económico y colaborando en los procesos que convierten a unos pueblos en dominadores de otros.”17 A manutenção deste cenário é imoral, contraria os objetivos principais das ciências e afeta a comunidade científica no seu todo. Vallina é direto e taxativo em afirmar que todo projeto ou desenvolvimento científico que não tem por fundamento o bem geral do homem e de todos os povos, corre o grave risco de se constituir num mecanismo promotor ou perpetuador de injustiças sociais18. O jesuíta observa em suas discussões sobre a relevância dá ética para o exercício científico a relação entre ciência e religião. Ele avalia como seriamente oportunas as vezes que o pensamento religioso acusa a imoralidade de certas disposições ou atitudes científicas. Segundo ele, isto não se configura uma intromissão da religião num espaço que não é seu, pois compreende-se uma chamada de atenção da não conveniência ética do que se faz ou se pretende realizar. Não se constitui ético fazer tudo o que é possível cientificamente ser feito. Além disso, o autor destaca a importância do sentimento religioso em auxiliar o cientista a ser mais moral em sua tarefa, bem como reconhece o espaço frutuoso de diálogo entre os dois horizontes de saber19. Ética, desenvolvimento e meio ambiente Em sua análise das questões éticas relativas à ciência e à tecnologia, Augustín Vallina contempla os problemas atuais sobre o meio ambiente. Ele converge suas atenções aos temas do consumo de energia e dos impactos ambientais, diante do cenário das fontes de recursos energéticos limitados e esgotáveis. No início de sua explanação, afirma que o reconhecimento dos resultados negativos da manipulação desmesurada da natureza tem feito emergir a compreensão de que a humanidade não é senhora absoluta dos bens naturais, mas que deve assumir-se como responsável imediata pelo seu cuidado e conservação20. Vallina compartilha da visão de que a natureza não deve ser entendida como meio a ser explorado à medida da mera vontade utilitarista humana. Para a justificativa de sua posição, ele retoma o primeiro relato criacional descrito no Livro do Gênesis, o qual mostra o homem como administrador ou zelador do criado. A percepção de que os bens naturais encontram-se à completa disposição do ímpeto dominador do sujeito não corresponde à tradição judaico-cristã. “Esta actitud depredadora es más bien consecuencia de la revolución industrial y el progreso tecnológico desde meados del siglo XIX y se ha ido agravando a causa del aumento exponencial de la población desde ese siglo.”21                                                                                                                 17

VALLINA, A. Ciencia y religión. p. 370. Cf.: VALLINA, A. Ciencia y religión. p. 371. 19 Cf.: VALLINA, A. Ciencia y religión. p. 382-383. 20 Cf. VALLINA, A.; Ciencia y religión. p. 385-387. 21 VALLINA, A.; Ciencia y religión. p. 389. 18

 

6/10

Sobre o consumo de energia, o autor comenta que ele é necessário a todos os seres vivos, mas a situação do ser humano acerca disto é bastante diferenciada. O homem depende de uma parcela mais significativa de energia para a manutenção do seu bem estar do que para o funcionamento de suas necessidades biológicas. Augustín apresenta a proporcionalidade: maior o progresso tecnológico de uma sociedade, maior o índice de energia consumido por pessoa. Ou seja, “El crecimiento del consumo de energía va unido al desarrollo cultural, de forma que, a medida que una cultura desarrolla, el consumo de energía de cada uno de sus miembros aumenta.”22 Esta relação demonstra que, para as análises das taxas gerais de consumo, devem ser levados em conta não somente a elevação numérica da população, mas sobretudo os valores referenciais do uso individual de energia23. As atuais fontes principais de energia são baseadas em recursos finitos e não renováveis, como os combustíveis fósseis. Segundo o geofísico, considerados os parâmetros correntes de aumento da população mundial e da elevação das taxas do consumo de energia, a humanidade poderá se deparar em breve com a escassez de matrizes ou o próprio colapso energético. A circunstância é simples: fontes limitadas de energia são incapazes de atender a uma demanda irrestrita. Vallina atesta que a sobrevivência do grupo humano carece de políticas globais de controle e limitação do consumo, bem como do rebaixamento dos índices praticados nos países desenvolvidos24. Sobre o impacto ambiental, a contaminação é apontada como fator inerente ao desenvolvimento tecnológico e científico. Ela é compreendida como o descarte excessivo de resíduos no meio ambiente, o qual configura-se como danoso à vida e tem a ver com um processo de rompimento do equilíbrio ecológico. Sinteticamente, ela se patenteia conforme as seguintes variantes: a) despejo na natureza um volume de contaminantes superior ao que pode ser assimilado ordinariamente; b) descarte produtos estranhos ao ambiente, para os quais inexistem mecanismos de degradação biológica; c) o lançamento de substâncias que são genuinamente tóxicas25.

                                                                                                                22

VALLINA, A.; Ciencia y religión. p. 390. O aumento da taxa do consumo de energia por indivíduo é tão impactante ao meio ambiente como o aumento populacional de um grupo, cujo consumo de energia é constante. São os países mais desenvolvidos que exercem maior pressão no consumo de energia. Os Estados Unidos, embora represente apenas 5% da população mundial, são responsáveis pelo consumo de 26% do total de energia consumida no planeta. Cf.: VALLINA, A.; Ciencia y religión. p. 390, 399. 24 Cf.: VALLINA, A.; Ciencia y religión. p. 396-400. 25 Cf.: VALLINA, A.; Ciencia y religión. p. 402-403. 23

 

7/10

Embora o fenômeno da contaminação apresente-se como recorrente na história, ele vem sendo potencializado desde o século XIX, em virtude do crescimento populacional e da concentração das pessoas nos espaços urbanos, do aumento da taxa do consumo de energia e do aceleramento do progresso técnico-científico. Enquanto ações humanas, a indústria, a agricultura e a população em geral compreendem os principais causadores de contaminação, seja do ar, das águas ou do solo. E seus efeitos mais sentidos são, no caso da atmosfera, o aquecimento global e a destruição da camada de ozônio, e, nos outros dois, os problemas relacionados à saúde humana e animal. Tem-se ainda as contaminações radioativas, cujo aumento das usinas nucleares amplia a possibilidade de vazamentos de elementos nocivos26. Em tempos de crescimento populacional, maior demanda de energia, recursos limitados e impactos no meio ambiente, Augustín Vallina defende a mudança no comportamento humano que vislumbre a finitude das matrizes energéticas, a proteção da natureza e a solidariedade entre povos. Ele deixa entrever que a sustentabilidade da vida no planeta passa por escolhas radicais e imediatas. Uma das questões prementes é a adoção de políticas reguladoras de uso das riquezas naturais e do controle de contaminantes. Estas precisam ser estabelecidas tendo em vista o bem humano geral. Vallina é do parecer de que as decisões acerca destes assuntos devem ser tomadas a nível internacional, pois os recursos naturais são patrimônios da humanidade e o fenômeno da contaminação é algo social27. Urge também a implementação de mecanismos de controle e de limitação do consumo de energia. Em termos de moralidade e justiça social, isto deve incluir a distribuição equitativa de recursos, a diminuição do grave abismo entre ricos e pobres e o inadiável combate à miséria e à fome no mundo. O geofísico adverte que o estabelecimento da situação de equilíbrio do consumo energético não pode significar a padronização referenciada nos índices dos países desenvolvidos, porque isto incorreria numa exigência maior de energia, no aumento da contaminação e na própria exaustão do sistema. O que se requer é a adequação do consumo a um modelo de qualidade de vida digna para todos. Ele mesmo demonstra em suas análises a falsa equiparação entre maior consumo de energia e maior qualidade de vida28. “(…) una vida más plena y de mayor calidad en todos los sentidos no implica necesariamente un mayor consumo de energía. Aceptar este principio supone un cambio radical en los hábitos de consumo establecidos en los países desarrollados y que los países pobres tienden a imitar. (…) La vuelta a un ritmo más pausado de vida y a una cierta limitación de bienes materiales será absolutamente necesaria.”29

                                                                                                                26

Cf.: VALLINA, A.; Ciencia y religión. p. 403-410. Cf.: VALLINA, A.; Ciencia y religión. p. 410-414. 28 Cf.: VALLINA, A.; Ciencia y religión. p. 416-419. 29 VALLINA, A.; Ciencia y religión.. p. 420. 27

 

8/10

Além do mais, podem ser elencadas como medidas a serem desenvolvidas ou praticadas: a) maior investimento na produção de energias renováveis, diminuindo a dependência de fontes energéticas não renováveis; b) exploração racional e moderada dos recursos, considerando a sua justa reserva para as gerações futuras; c) cuidado e respeito com a riqueza biológica da natureza; d) mudança no ordenamento econômico-financeiro, no sentido de assumir que somente as atividades que demandam consumo reduzido de energia e incidem no mínimo de impacto ambiental são rentáveis; e) democratização dos avanços tecnológicos, posto que a configuração atual favorece a manutenção dos regimes de hegemonia e domínio; f) paulatino e eficaz desarmamento universal. O estudioso esclarece que isto não implica a interrupção do progresso, mas seu encaminhamento racionalizado, prospectivo e ético30. A viabilidade da vida terra exige compromissos morais inadiáveis e é imprudente ignorar crise que o mundo atravessa. Augustín Vallina adverte que humanidade não deve acreditar cegamente na habilidade do progresso tecno-científico em providenciar as soluções para os problemas à medida em que se apresentarem. Ele reconhece que o homem tem condições de lidar com o desafio, mas a exigência ética para tanto é mais intensa que em outros momentos da história, sobretudo porque depende de um significativo esforço político, econômico e financeiro por parte de todos os países. O jesuíta garante que, no enfrentamento da situação, a ciência e a tecnologia têm um papel ímpar a desempenhar. Ademais, que a dimensão religiosa constitui-se um contributo relevante, porque considera o enlace entre o homem e a natureza. Ele encerra a sua reflexão, recordando o sentido sacramental atribuído à criação com o advento do Verbo e retoma a figura emblemática, inspiradora e atual de Francisco de Assis, no seu respeito incondicional ao ser criado31. Considerações finais A síntese ora apresentada assumiu como fio condutor a relevância da moralidade para as atividades científicas. Pôde ser percebido que, para Augustín Vallina, a dimensão ética não é só essencial ao trabalho investigativo, mas se constitui condição de possibilidade da própria a ciência. É significativa a maneira clara como o autor afirma a incompetência do saber científico em autoinstituir os seus princípios morais, bem como aponta os equívocos teóricos em se procurar derivar a ética das ciências. Merece realce outrossim a sua reflexão sobre o compromisso moral do cientista, tanto nos projetos individuais quanto coletivos, e a postura prudencial e de cuidado com a natureza perante o desenvolvimento tecnológico.                                                                                                                 30 31

 

Cf.: VALLINA, A.; Ciencia y religión. p. 396-398, 411, 417-418, 420-421. Cf.: VALLINA, A.; Ciencia y religión. p. 420-423. 9/10

Há de ser mencionado que o pensamento de Vallina, expressos nas páginas que serviram de base a este texto, é provocativo e corajoso. Em particular, quando se tem em mente os pressupostos éticos que ele defende. Conforme foi visto, o progresso científico deve mirar o bem da humanidade e ocorrer numa atitude de respeito ao meio ambiente. A ciência precisa se firmar, sempre mais, como meio efetivo da promoção da vida, da igualdade e da justiça social, e não se converter num instrumento de dominação, poder e imoralidades. O autor é bastante preciso em asseverar que os saberes científicos e técnicos necessitam se adequar às exigências éticas gerais e se orientar, teleologicamente, para o bem do homem e de todos os homens, posto que nem tudo aquilo que, cientificamente, pode-se fazer, tem de ser feito. Por fim, é bom lembrar o perspicaz olhar antropológico de Augustín Vallina, que compreende que a abordagem fisicalista não esgota o ser do sujeito. Outras ordens de conhecimento, incluída a religiosa, são fundamentais, quando se pretende tratar os assuntos que concernem à realidade humana. O diálogo entre estes diferentes tipos de saber, distante de ser evitado, carece ser promovido e as contribuições do geofísico jesuíta são valiosas e pertinentes neste sentido.

 

10/10

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.