A remessa necessária no novo CPC

June 12, 2017 | Autor: Pedro Dias | Categoria: Direito Processual Civil, Direito Administrativo, Direito Público, Processo Civil
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A remessa necessária no novo CPC





































Pedro Dias de Araújo Júnior

Procurador do Estado de Sergipe
Pós graduado em Direito Constitucional e Processual civil pela UFS
Mestrando em Processo Civil pela UFS
Email: [email protected]; [email protected].
Resumo: visa o presente artigo estudar uma nova conceituação processual
para a remessa necessária no CPC/15, bem como estudar as suas origens,
analisar as suas principais inovações e disciplinar o conflito de leis no
tempo.


1 – INTRODUÇÃO

O novo CPC trouxe inúmeras mudanças significativas no processo civil
brasileiro, indo muito além do que uma simples atualização legislativa –
não seria ousado dizer que há uma mudança estrutural no processo
brasileiro. Questões relativas aos IRDR (Incidente de Resolução de Demandas
Repetitivas), alterações no sistema recursal, inclusão de novos tipos de
tutela (urgência e evidência), dentre outros, mostram que o novo CPC
emprestará uma nova alma ao sistema jurisdicional brasileiro.


A remessa necessária foi um dos institutos repaginados pelo novo
Código. Na doutrina, ela possui vários sinônimos, como reexame necessário,
apelação ou remessa ex officio, duplo grau de jurisdição obrigatório,
dentre outros. No CPC/15, seu nome oficial é remessa necessária.


Na reforma, foi-se discutido inclusive a sua exclusão do sistema
processual. Entretanto, como diria Tobias Barreto, "o direito não é filho
do céu, é simplesmente um fenômeno histórico, um produto cultural da
humanidade". E, como tal, deve ser interpretada a reforma do reexame
necessário, destacando-se ab initio a alteração dos valores de seu piso a
patamares bem superiores aos valores que se encontravam no então vigente
art. 475 do CPC/73.


De outro turno, o reexame necessário incorporou novos elementos, como a
possibilidade de sua não ocorrência todas as vezes em que na matéria houver
um posicionamento oficial de seu órgão de consultoria jurídica, dando um
destaque maior às decisões das procuradorias.


Adiante vamos tecer algumas considerações sobre os principais pontos da
reforma.




2 – ASPECTOS RELEVANTES EM TORNO DA IDEIA DO DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO

Algumas considerações prévias se fazem necessárias, antes de se
adentrar com profundidade na reforma processual.


Para um melhor estudo da matéria, precisamos saber qual a conceituação
do que venha a ser duplo grau de jurisdição, pois desta premissa é que
parte o resto do trabalho, onde iremos centrá-lo no duplo grau de
jurisdição obrigatório.


Por grau de jurisdição, conceito normalmente não analisado pelos
processualistas, devemos entender todo o esforço e poder de investigação
que são outorgados constitucionalmente ao Poder Judiciário para o
julgamento de uma causa na sua acepção mais ampla.


A Constituição Federal, em quatro incisos do artigo 5º, outorga algumas
diretrizes onde será realizado o grau de jurisdição. São eles:

LIII – ninguém será processado nem sentenciado senão pela
autoridade competente;
LIV – ninguém será privado da liberdade ou de seus bens
sem o devido processo legal;
LV – aos litigantes, em processo judicial ou
administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o
contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a
ela inerentes;
LVI – são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas
por meios ilícitos.

Assim, ocorrerá um grau de jurisdição toda vez que o juiz for
competente, houver um devido processo legal que oferte aos acusados o
contraditório e a ampla defesa e com provas obtidas através de meios
lícitos.


Logo, conclui-se que ocorrerá um grau de jurisdição toda vez que o
órgão dotado de competência constitucional para a análise da causa puder
analisar as matérias pertinentes a direito e fatos.


Por sua vez, o artigo 108 da Constituição traz a seguinte regra:

Art. 108. Compete aos Tribunais Regionais Federais:
(...)
II - julgar, em grau de recurso, as causas decididas pelos
juízes federais e pelos juízes estaduais no exercício da
competência federal da área de sua jurisdição.


Apesar da regra constitucional prever apenas institucionalização do
duplo grau para os tribunais federais, em nome do princípio da simetria o
constituinte estadual deve "seguir fielmente as opções de organização e de
relacionamento entre os poderes acolhidas pelo constituinte federal"
(MENDES : 2008, p. 814). Noutras palavras, as constituições estaduais devem
prever a mesma regra.


O segundo grau de jurisdição já parte de uma restrição, de regra, da
análise da situação fática do processo, posto que receberão os fatos
arrecadados e analisados pelo juiz de primeiro grau para, em segundo grau
de jurisdição, analisá-los novamente e aplicar o direito que entenderem ser
o mais acertado. São raras as vezes em que o tribunal determina a
realização de novas provas e anula o julgamento a quo.


Este segundo grau de jurisdição nem sempre ocorrerá no processo
brasileiro, mesmo no CPC/15. Cito, como exemplos, os casos dos mandados de
segurança de competência original de tribunais julgados procedentes ou os
casos dos recursos extraordinários lato sensu. Partindo-se do pressuposto
que o segundo grau de jurisdição tem sempre que reanalisar matéria de fato
e de direito, sob pena de não se celebrar uma jurisdição completa, não
haverá segundo grau nestas hipóteses; haverá, isto sim, uma instância
superior, extraordinária, de análise unicamente do direito. No processo
civil, não existe terceira instância ou terceiro grau de jurisdição, coisa
que de forma explícita os Tribunais Superiores refutam[1].


A remessa necessária consiste em uma espécie de duplo grau de
jurisdição obrigatório em casos específicos.


3 – AS ORIGENS DA REMESSA NECESSÁRIA

As origens da remessa necessária advém do direito português. Segundo
lições da abalizada doutrina (CUNHA : 2015, p. 124),

O estudo histórico do reexame necessário – originariamente
denominado recurso de ofício – denota seu surgimento no
Direito Medieval ostentando matizes mais fortes e
acentuados em Portugal, mais especificamente no processo
penal, como uma proteção ao réu, condenado à pena de
morte. Nas Ordenações Afonsinas, o recurso de ofício era
interposto, pelo próprio juiz, contra as sentenças que
julgavam crimes de natureza pública ou cuja apuração se
iniciasse por devassa, tendo como finalidade corrigir o
rigor do princípio dominante e os exageros introduzidos no
processo inquisitório.

Para Nelson Nery Jr, "no direito brasileiro, a primeira notícia que se
tem da 'apelação ex officio' parece haver surgido com a Lei de 4.10.1831,
art. 90, que determinava ao juiz a remessa necessária ao tribunal superior
de sua sentença proferida contra a Fazenda Nacional. O CPC/1939 822 manteve
o instituto" (NERY JR : 2014, p. 91).


No CPC de 73, em sua redação originária houve a preocupação cultural
com a manutenção do casamento – algo para a época sagrado e de vínculo
indissociável (apenas pela morte), afirmando que era caso de reexame
necessário a sentença que declarasse a nulidade do casamento. Assim, ao
invés dos processos de divórcio atuais, tentava-se buscar as anulações de
casamento, o que devolvia os cônjuges para a condição de solteiros. Como
isso "agredia" o senso comum/religioso dos parlamentares da época, a
sentença que declarasse a nulidade do casamento teria que,
obrigatoriamente, ser submetida a reexame necessário.


Tal dispositivo perdeu sua razão de ser com o advento do desquite anos
depois, até que veio a ser totalmente retirado do CPC/73 em 2001 por
desuso. Permaneceu, entretanto, a remessa necessária nas hipóteses em que a
Fazenda Pública fosse condenada.


Neste mesmo ano, tivemos a primeira grande reforma da remessa
necessária. Como forma de evitar que os tribunais tivessem que julgar toda
e qualquer sentença proferida contra a Fazenda Pública, criou-se duas
situações em que a mesma não ocorreria:

a) na primeira hipótese, estipulou-se um piso de 60 salários mínimos para
que o reexame ocorresse. Tal piso seria calculado sobre a condenação
proferida contra a Fazenda Pública;
b) na segunda hipótese, criou-se uma regra de flexibilização de acordo
com o fundamento utilizado na sentença. Todas as vezes em que a
sentença se fundasse em jurisprudência do plenário do STF, suas
súmulas ou súmulas de Tribunal Superior o reexame não ocorreria.


Posteriormente, o CPC/15 trouxe novas evoluções para a remessa
necessária, incluindo novos patamares de pisos para que o mesmo ocorra,
desafogando as pautas dos tribunais, bem como erigindo outros paradigmas
para que a remessa necessária não ocorra quando há alto grau de certeza
jurídica na sentença proferida contra a Fazenda Pública.


4 – NATUREZA JURÍDICA DA REMESSA NECESSÁRIA

Celeuma antiga no direito processual brasileiro era saber qual era a
natureza jurídica do reexame necessário: se era classificado como recurso
ou condição de eficácia da sentença. Essa discussão ainda persiste no
CPC/15.

4.1 – A remessa necessária como "recurso"

Vários doutrinadores encaram a remessa necessária como sendo um recurso
interposto pelo próprio juiz da causa. Para Fred Didier e Leonardo Carneiro
da Cunha (CUNHA : 2015, p. 129-130),

Na maioria dos países, os recursos caracterizam-se por
conter (a) provocação ao reexame da matéria e (b)
impugnação da decisão recorrida. Pode-se dizer que, no
Brasil, a definição de recurso só pode apegar-se a (a) e
não a (a) + (b), pois a remessa necessária é recurso não
impugnativo: o juiz recorre oficiosamente da própria
sentença, provocando-lhe o exame sem contra ela insurgir-
se.


No CPC de 39, era nominada de "apelação ex officio" e tinha ainda
várias semelhanças com os recursos cíveis. Estas consequências e
semelhanças continuaram no CPC/73 e persistem ainda no CPC/15. Como o
recurso de apelação cível, a remessa necessária possui as seguintes
características em comum:

a) processamento: seu processamento nos tribunais é o mesmo da apelação
cível normal;

b) efeito devolutivo: a condenação, in totum, é devolvida para a apreciação
do tribunal competente, independentemente de haver recurso de apelação
cível e de sua extensão;


c) efeito translativo: no julgamento de uma apelação cível, o tribunal está
autorizado a analisar as questões de ordem pública incidentes na causa,
mesmo que não tenham sido arguidas pelas partes, quer seja na apelação ou
nas contrarrazões. Adaptada a situação para a remessa necessária, o
tribunal está autorizado a analisar questões de ordem pública não
arguidas pelas partes no curso do processo[2].

d) efeito suspensivo: uma vez incidindo a regra do reexame necessário, a
causa não rende ensejo à execução provisória, tendo efeitos semelhantes
ao recurso de apelação cível do julgado de primeiro grau;

e) efeito substitutivo: o acórdão do Tribunal substituiria a decisão do
juízo de primeiro grau, mesmo que o fosse pela confirmação do julgamento
a quo.


4.2 – Remessa necessária como condição de eficácia de uma decisão proferida
contra a Fazenda Pública


A doutrina majoritária concorda que o reexame necessário não é um
recurso. Para Teresa Arruda Alvim Wambier, "não se trata, aqui, de recurso,
mas de condição de eficácia da sentença e para que se opere o trânsito em
julgado. Falta-lhe a característica, típica dos recursos, que é a
voluntariedade" (WAMBIER : 2015, p. 808).


Segundo Nelson Nery Jr, mais preciso, "Faltam-lhe a voluntariedade, a
tipicidade, a dialeticidade, o interesse em recorrer, a legitimidade, a
tempestividade e o preparo, características e pressupostos de
admissibilidade dos recursos" (NERY JR : 2014, p. 91).


No que tange especificamente quanto ao preparo, este seria incabível de
ser exigido contra a Fazenda Pública, pois ela está dispensada do pagamento
das custas judiciais. Acresço às razões expostas por Nelson Nery Jr a
ausência do contraditório (contrarrazões) na remessa necessária.


Assim, em suma, a remessa necessária não pode ser considerada recurso
por:

a) inexistência de voluntariedade: de fato, não existe a voluntariedade
porque não é a Fazenda Pública quem recorre: é o próprio juiz quem
determina a subida do processo e o faz de forma independente de
qualquer requerimento das partes, sob pena de avocação por parte do
Presidente do Tribunal;
b) faltar-lhe tipicidade, não por inexistência de lei federal prevendo a
sua existência – posto que está regrado no art. 496 do CPC/15 - mas
por não estar previsto em lei federal como recurso;
c) faltar-lhe interesse em recorrer: nas vezes em que a própria Fazenda
Pública não recorre da decisão, por que razão o magistrado deveria
substituir a procuradoria e, no lugar dela, interpor um recurso,
quando o próprio magistrado tem interesse em que a decisão seja
mantida, pois foi por ele proferida?
d) faltar-lhe dialeticidade, posto que o magistrado não vai encaminhar,
junto com o reexame necessário, as razões pelas quais a decisão deva
ser reformada, o que seria um contrassenso. Ressalte-se que a ausência
de dialeticidade nos recursos importa no seu não conhecimento;
e) faltar-lhe a legitimidade: não sendo parte nem terceiro interessado,
não tem o magistrado legitimidade nem interesse em recorrer;
f) faltar-lhe tempestividade: não importa quanto tempo a decisão do juiz
foi proferida e publicada; o reexame necessário ocorrerá a qualquer
tempo, desde que estejam preenchidos os seus pressupostos. A
consequência da não ocorrência do duplo grau de jurisdição nos casos
legais é que a decisão não transita em julgado, independentemente do
tempo da sentença de primeiro grau;
g) inexistência de contraditório: na remessa necessária, o juiz não abre
prazo para a outra parte apresentar suas razões pelas quais o tribunal
deverá manter a sentença[3].


Importante salientar também a posição de Luiz Rodrigues Wambier e
Eduardo Talamini quando afirmam:

Enfim, tal como no caso dos recursos, a função do reexame
necessário é a de tentar assegurar um maior controle da
qualidade da sentença proferida. Mas o mecanismo empregado
para tanto não é um instrumento de emprego voluntário –
como é o recurso -, e sim a estipulação, pela própria lei,
de uma condição para que a sentença possa transitar em
julgado. Merece ser enquadrado entre os instrumentos de
revisão das decisões judiciais. Mas não é propriamente um
meio de impugnação das decisões e tampouco um recurso.
(WAMBIER, TALAMINI : 2015, p. 886).


Destaco também que no nosso sistema recursal inexistem recursos não
impugnativos. Todo e qualquer recurso está submetido, minimamente, a todos
os requisitos supra, o que demonstra que o sistema de recursal brasileiro
tem como pressuposto ser impugnativo e, como consequência da impugnação,
tem-se o reexame da matéria.


Lembro, outrossim, que nos casos dos recursos não conhecidos, há
impugnação sem reexame da matéria. A impugnação é pressuposto; o reexame da
matéria pode ocorrer ou não. Logo, nossos sistema recursal jamais poderia
ser classificado como de reexame da matéria, pois esta nem sempre ocorrerá.


4.3 – Características do duplo grau de jurisdição obrigatório e a
necessidade de uma nova conceituação

Já traçada a baliza mestra de que o duplo grau obrigatório não é
recurso, passa-se agora a definir o que vem a sê-lo. Para tanto, é
necessário fazermos um breve estudo de sua potencialidade face ao processo.


A priori, cumpre ressaltar um ponto de partida que toda a doutrina tem
em comum quando disserta sobre o duplo grau de jurisdição obrigatório.
Sintetizando-a, Nelson Nery Jr. afirma que: "em nosso sentir esse instituto
tem a natureza jurídica de condição de eficácia da sentença" (NERY JR :
2014, p. 93).


Os casos tratados pelo art. 496 do CPC tiram a possibilidade da
sentença de primeiro grau de ser uma sentença definitiva, por si própria.
Precisará ser reexaminada no Tribunal, para a partir daí a decisão do Poder
Judiciário produzir seus efeitos.


A ausência de prazo para provocar o reexame necessário provoca outro
tipo de conseqüência necessária. Os prazos são previstos no sistema
recursal como forma de fixação do dia de início do trânsito em julgado da
sentença ou acórdão.


Na sentença cível, seu prazo para o trânsito em julgado começa, de
regra, após o término do prazo para o recurso de apelação (15 dias). Ou
seja, apenas após o décimo sexto dia da publicação da sentença é que começa
a ter efeito a sentença civil, a depender de sua carga de eficácia e de se
o recurso tem efeito suspensivo.


Sem o reexame necessário nos casos previstos em lei, a decisão não
transita em julgado. E, na práxis forense, isto pode acarretar um problema
sério para as partes processuais.


Um dos problemas atuais é o caso da apelação parcial da Fazenda
Pública. Às vezes, a apelação se cinge apenas a um dos itens do comando
normativo da sentença.


Para tornar as coisas mais claras, vamos supor, então, que a Fazenda
Pública foi condenada nos capítulos de sentença "A" e "B" e decide apelar
apenas de "A". Com a atual sistemática do duplo grau obrigatório, "B" não
transitará em julgado até que seja apreciado pelo Tribunal competente via
reexame necessário.


Nesta situação, a atenção dos desembargadores há de ser redobrada, sob
pena do trabalho de apreciação da causa ter de ser refeito de forma
complementar, provocando um retardamento injustificado na entrega da
prestação jurisdicional[4]. Vale ressaltar que as próprias partes podem,
uma vez publicada a decisão e ainda dentro do prazo, embargar de declaração
para que a omissão seja sanada.


Este retardamento possui, atualmente, contornos mais sérios, ainda não
devidamente apreciados pelos Tribunais. Com o advento da EC 37/02, é vedado
o fracionamento de pedidos de formação de precatórios da Fazenda
decorrentes do mesmo processo, desde que uma das parcelas fracionadas
ingresse na dispensa de precatório[5].


A conseqüência imediata do comando constitucional é que, faltando
reexame de um dos itens do comando normativo da sentença, não se poderá
dividir o processo de execução em duas etapas, salvo se as duas parcelas
forem pagas exclusivamente por precatórios, causando graves riscos para a
parte ex adversa da Fazenda Pública.


Ademais, não vige nas apelações estatais sujeitas a reexame necessário
o princípio do tantum devolutum quantum apellatum.


Isto se dá porque a matéria eventualmente não apelada pela Fazenda
Pública subirá via reexame se estiverem preenchidos os seus requisitos. Não
sendo apreciada pelo Tribunal, aquela parcela não reexaminada não
transitará em julgado.


A apelação da Fazenda Pública não tem o condão de restringir o alcance
do reexame necessário. Para Sérgio Gilberto Porto, "pode-se, de logo,
aduzir que tanto a extensão quanto a profundidade da devolução não sofrem
limites, sendo, pois, a matéria integralmente devolvida à análise do juízo
ad quem, tenha havido ou não apelo voluntário, uma vez coloridas as
hipóteses elencadas no dispositivo aqui analisado" (PORTO : 2000, p.
239)[6].


Sob outra ótica, vários doutrinadores afirmam ser o reexame necessário
um ato complexo realizado pelo Poder Judiciário.


A conceituação de ato complexo advém do direito administrativo. Para
Hely Lopes Meirelles, o ato complexo é "aquele que se forma pela conjugação
de vontades de mais de um órgão administrativo. O essencial, nesta
categoria de atos, é o concurso de vontades de órgãos diferentes para a
formação de um ato único. (...) No ato complexo integram-se as vontades de
vários órgãos para a obtenção de um mesmo ato" (MEIRELLES : 1999, p. 154).


De acordo com o magistério de Seabra Fagundes,

Ao estipular a lei que de determinada sentença caberá
recurso necessário, condiciona a integração, e,
conseqüentemente, a validez do pronunciamento
jurisdicional ao dúplice exame da relação jurídica. Por
imposição do seu texto, não haverá sentença, como ato
estatal de composição da lide, antes que a segunda
instância confirme ou reforme o que na primeira se
decidiu. Haverá um pronunciamento jurisdicional em
elaboração, por ultimar, pendente de ato posterior
necessário. O julgado estará incompleto, como se diz em
acórdão do Supremo Tribunal Federal. É o que se infere da
natureza e finalidade desse recurso de exceção. (FAGUNDES
: 1957, p. 205)


No mesmo sentido, Juarez Rogério Félix,


Que fique, pois, fixado o entendimento neste trabalho de
que o reexame necessário é condição de existência da
sentença, pois o segundo julgamento é constitutivo
integrativo do título, como o é a sentença de liquidação
em relação ao seu aspecto quantitativo (FELIX : 1999, p.
429)[7].


Concessa maxima venia, ousamos discordar da posição dos insignes
doutrinadores. A sentença, enquanto não for passada pelo Tribunal, não será
eficaz. Na realidade, sentença que não possui ainda a possibilidade de
eficácia não é sentença, é mera possibilidade de sentença.


Enquanto que no ato administrativo complexo o ataque à sua validade se
faz com a indicação dos dois atos, que passam a ser considerados um só após
a sua validação pela autoridade competente, no processo civil basta a
indicação da decisão revista pelo Tribunal, mesmo que seja pela confirmação
da sentença. Se o acórdão substitui a decisão revisada, ele atrai, para
dentro de si, toda a motivação da decisão do juiz que foi agora transladada
para ser considerada motivação da decisão do Tribunal.


No direito administrativo, o ato complexo é realizado com o
encadeamento de dois atos, que são considerados no conjunto para a validade
do ato final. No reexame necessário, um ato, para ter validade, precisa ser
substituído (ou sacrificado) por outro, sendo um verdadeiro fenômeno
processual que não tem paralelo no direito administrativo.


Ou seja, para ter validade a decisão do juiz de primeiro grau, ela
precisa ser sacrificada para dar lugar a uma nova decisão, desta feita do
tribunal imediatamente superior. Por essa razão, entendemos que não há como
considerar o fenômeno do reexame necessário como sendo um ato complexo aos
moldes do direito administrativo.


Ao se investigar a subsunção de institutos administrativos para o
direito processual, verifica-se que há, em certos casos, uma impropriedade
latente. Nem sempre os conceitos de direito administrativo são aplicáveis
ao processo civil sem sofrer solavancos, uma alteração em sua substância. E
esta mudança de roupagem altera o rumo da nova definição, a ponto de
desconfigurá-la na origem[8]. É o caso do reexame necessário.


O conceito de ato complexo do direito administrativo não se amolda com
perfeições ao reexame necessário porque existem os efeitos suspensivo e
substitutivo operados na decisão do juiz de primeiro grau e no julgamento
por acórdão pelo Tribunal com relação à decisão reexaminada,
respectivamente. Enquanto que no direito administrativo o ato anterior
possui validade e é elemento do futuro ato complexo final, no processo
civil o reexame necessário substitui, in totum, a decisão não recorrida.


E tanto é substituição, e não pura e simples confirmação, que eventual
recurso interposto será da decisão do Tribunal; a ação rescisória também
será oposta contra a decisão do Tribunal, e não do juiz de primeiro grau;
os embargos de declaração serão destinados à decisão do Tribunal, e não à
decisão do juiz de primeiro grau, mesmo a que confirmou a sentença de
primeiro grau, sob pena de intempestividade[9].


Assim sendo, a remessa necessária consiste no fenômeno processual que
sujeita a sentença de primeiro grau, nos casos previstos em lei, a condição
substitutiva obrigatória para a produção de eficácia.



5 – A REMESSA NECESSÁRIA – O NOVO DISPOSITIVO

De acordo com o artigo 496 da Lei 13.105/15, litteris:

Art. 496. Está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não
produzindo efeito senão depois de confirmada pelo
tribunal, a sentença:
I – proferida contra a União, os Estados, o distrito
Federal, os Municípios e suas respectivas autarquias e
fundações de direito público;
II – que julgar procedentes, no todo ou em parte, os
embargos à execução fiscal.
§ 1º Nos casos previstos neste artigo, não interposta a
apelação no prazo legal, o juiz ordenará a remessa dos
autos ao tribunal, e, se não o fizer, o presidente do
respectivo tribunal avocá-los-á.
§ 2º. Em qualquer dos casos referidos no § 1º, o tribunal
julgará a remessa necessária.
§ 3º Não se aplica o disposto neste artigo quando a
condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de
valor certo e líquido inferior a:
I – 1.000 (mil) salários-mínimos para a União e suas
respectivas autarquias e fundações de direito público;
II – 500 (quinhentos) salários-mínimos para os estados, o
Distrito Federal, as respectivas autarquias e fundações de
direito público e os Municípios que constituam capitais
dos Estados;
III – 100 (cem) salários-mínimos para todos os demais
Municípios e respectivas autarquias e fundações de direito
público.
§ 4º Também não se aplica o disposto neste artigo quando a
sentença estiver fundada em:
I – súmula de tribunal superior;
II – acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou
pelo Superior Tribunal de justiça em julgamento de
recursos repetitivos;
III – entendimento firmado em incidente de resolução de
demandas repetitivas ou de assunção de competências;
IV – entendimento coincidente com orientação vinculante
firmada no âmbito administrativo do próprio ente público,
consolidada em manifestação, parecer ou súmula
administrativa.

5.1 – "Sentença proferida"

Por "sentença proferida" há de se compreender como toda e qualquer
sentença meritória que condene o Poder Público na perda de algo. Nesse
sentido, não é necessário que o Poder Público seja réu; ele também pode
perder uma ação sendo autor.


Menciono o fato de que a sentença deve ser meritória pela razão de que
a remessa necessária visa rever os ônus impostos ao Poder Público. Assim,
as hipóteses do artigo 485 (extinção do processo sem resolução do mérito)
não impedem que a Fazenda Pública promova nova ação (art. 486); entretanto,
se a Fazenda Pública der causa, por três vezes, a sentença fundada em
abandono de causa, esta hipótese prevê a impossibilidade de ajuizamento de
nova ação (art. 486, § 3º) e, por esta razão, sujeita esta terceira
sentença à remessa necessária.


A redação do artigo 496 do CPC não faz nenhuma ressalva quanto às
modalidades de sentença que caibam reexame necessário. Portanto, será
cabível reexame necessário nas sentenças que possuam carga de eficácia
declaratória, constitutiva e condenatória. Igualmente, ocorrerá reexame
necessário nas sentenças cuja carga de eficácia preponderante seja
mandamental ou executória lato sensu, atentando-se que, face à
especialidade da ordem judicial emanada destes provimentos, somente haverá
efeito suspensivo quando a lei específica expressamente o indicar.

5.2 – Fazenda Pública stricto sensu ou lato senso?

De acordo com a regra do CPC, a sentença tem que ser proferida contra a
Fazenda Pública, ou seja, contra as pessoas jurídicas de direito público, o
que leva a crer que não é cabível a remessa necessária contra empresas
públicas e sociedades de economia mista.


Um dos maiores problemas das criações de empresas públicas e sociedades
de economia mista, em contraponto à criação de autarquias, é que o
legislador nacional, incluindo-se os estaduais e municipais, nunca adoram
um rigor científico de distinção. Muitas vezes, empresas estatais foram
criadas para o exercício de atribuições de autarquias, apesar de não
buscarem lucros.


Para MARINELA, "no que tange à exigência de licitação e às regras
aplicáveis aos contratos, deve-se distinguir empresa pública e a sociedade
de economia mista, se prestadoras de serviço público ou exploradoras da
atividade econômica" (MARINELA : 2013, p. 158).


Neste toar, Alexandre Mazza, em excelente caráter didático, traz
importantes distinções:

"As demais características de empresas públicas e sociedades
de economia mista variam conforme a atuação preponderante
da entidade.
Assim:
1) Prestadoras de serviço público: são imunes a impostos, os
bens são públicos, respondem objetivamente (sem
comprovação de culpa) pelos prejuízos causados, o Estado é
responsável subsidiário pela quitação da condenação
indenizatória; estão sujeitas à impetração de mandado de
segurança e sofrem uma influência maior dos princípios e
normas do Direito Administrativo. Exemplo: Empresa de
Correios e Telégrafos – ECT.
2) Exploradoras de atividade econômica: não tem imunidade
tributária; seus bens são privados; respondem
subjetivamente (com comprovação de culpa) pelos prejuízos
causados; op Estado não é responsável por garantir o
pagamento da indenização, não se sujeitam à impetração de
mandado de segurança contra atos relacionados à sua
atividade-fim e sofrem menor influência do Direito
Administrativo. Exemplos: Banco do Brasil e Petrobrás"
(MAZZA : 2013, p. 174).


Essas distinções, atualmente, mudam completamente o entendimento
nacional acerca de uma série de consequências jurídicas na vida destas
empresas.


De fato, "quando prestadoras de serviços públicos, seguem as normas
gerais para licitações, é dizer, submetem-se à Lei 8.666/93 e à Lei n.
10.520/02, em cumprimento ao art. 37, XXI, combinado com o art. 22, XXVII,
ambos da CF, como entes da Administração Direta" (MARINELA : 2013, p. 158).
Ou seja, as empresas estatais prestadoras de serviços públicos são
equiparadas às autarquias.


"Entretanto" – prossegue Marinela – "quando essas empresas exploram a
atividade econômica, a situação é diferente, considerando que elas poderão
ter regime especial, mediante estatuto jurídico próprio, consoante art.
173, § 1º, III, da CF, para licitações e contratos, obedecendo sempre aos
princípios da Administração" (MARINELA : 2013, p. 158).


E aí vem a seguinte indagação: qual seria a natureza dos bens dessas
empresas estatais? Para Marinela,


"Acolhe-se neste trabalho a orientação de que os bens
pertencentes às pessoas privadas são bens privados,
todavia, quando prestadoras de serviços públicos, em razão
de diversas regras do ordenamento jurídico, se eles
estiverem diretamente ligados à prestação dos serviços
públicos, estarão sujeitos ao regime público; para os
demais vale o regime privado. Justificam esse tratamento
especial: o princípio da continuidade dos serviços
públicos; o fato de os bens serem decorrentes da
transferência do ente que as criou; a cláusula de reversão
ao ente público que lhes deu origem e a possibilidade de a
lei instituidora dar essa especialidade para esses bens.
Ressalte-se ainda o dever de licitar dessas empresas, o
que representa também o rigor do regime público" (MARINELA
: 2013, p. 158).


O STF, há cerca de 10 anos, já vinha pontuando a diferenciação entre
estas diferentes destinações das empresas estatais. Confira-se, neste
sentido, o seguinte acórdão:


EMENTA: CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. ECT - EMPRESA
BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS: IMUNIDADE TRIBUTÁRIA
RECÍPROCA: C.F., art. 150, VI, a. EMPRESA PÚBLICA QUE
EXERCE ATIVIDADE ECONÔMICA E EMPRESA PÚBLICA PRESTADORA DE
SERVIÇO PÚBLICO: DISTINÇÃO. TAXAS: IMUNIDADE RECÍPROCA:
INEXISTÊNCIA. I. - As empresas públicas prestadoras de
serviço público distinguem-se das que exercem atividade
econômica. A ECT - Empresa Brasileira de Correios e
Telégrafos é prestadora de serviço público de prestação
obrigatória e exclusiva do Estado, motivo por que está
abrangida pela imunidade tributária recíproca: C.F., art.
22, X; C.F., art. 150, VI, a. Precedentes do STF: RE
424.227/SC, 407.099/RS, 354.897/RS, 356.122/RS e
398.630/SP, Ministro Carlos Velloso, 2ª Turma. II. - A
imunidade tributária recíproca -- C.F., art. 150, VI, a --
somente é aplicável a impostos, não alcançando as taxas.
III. - R.E. conhecido e improvido. (RE 424227 / SC,
Relator Ministro Carlos Veloso, Publicação DJ 10-09-2004
PP-00067)


No voto, destaca-se o seguinte trecho:


"Srs. Ministros, o meu entendimento, que vem de longe,
mencionado, aliás, pelo eminente Ministro Sepúlveda
Pertence, é no sentido de distinguir empresa pública que
presta serviço público de empresa pública que exerce
atividade econômica, atividade empresarial, concorrendo
com empresas privadas. A primeira, sempre sustentei, tem
natureza jurídica de autarquia"


E ainda:

"Distinção entre empresas estatais prestadoras de serviço
público e empresas estatais que desenvolvem atividade
econômica em sentido estrito. (...). As sociedades de
economia mista e as empresas públicas que explorem
atividade econômica em sentido estrito estão sujeitas, nos
termos do disposto no § 1º do art. 173 da Constituição do
Brasil, ao regime jurídico próprio das empresas privadas.
(...). O § 1º do art. 173 da Constituição do Brasil não se
aplica às empresas públicas, sociedades de economia mista
e entidades (estatais) que prestam serviço público." (ADI
1.642, Rel. Min. Eros Grau, julgamento em 3-4-2008,
Plenário, DJE de 19-9-2008.) No mesmo sentido: ARE 689.588-
AgR, rel. min. Luiz Fux, julgamento em 27-11-2012,
Primeira Turma, DJE de 13-2-2012.


E, neste toar, diversos foram os julgados do STF que concederam às
empresas estatais prestadoras de serviços públicos as mesmas garantias da
Fazenda Pública, incluindo a impenhorabilidade de seus bens e pagamento de
suas dívidas por precatório.


5.3 – Reexame necessário nas sentenças que julgar procedentes, no todo ou
em parte, os embargos à execução fiscal

Há aqui uma correção na redação originária do CPC/73, posto que não se
julga improcedente processo de execução – haja vista que sua destinação é
para a satisfação do crédito e não para chegar a uma decisão meritória. O
que se julgava procedente eram os embargos à execução de dívida ativa da
Fazenda Pública.


Segundo Flávio Cheim Jorge, "a remessa terá cabimento quando os
embargos do executado forem julgados, no todo ou em parte, procedentes. Os
embargos podem ser julgados procedentes porque possuem natureza de ação de
conhecimento, que comporta julgamento de mérito, e cuja procedência terá o
condão de extinguir o processo de execução, decorrendo daí o prejuízo para
o erário, a justificar a remessa" (JORGE, DIDIER E RODRIGUES : 2002, p.
60).


Duas outras hipóteses de embargos, não previstas no art. 496, II, podem
causar controvérsias, que são:

a) embargos à execução propostos pela Fazenda Pública, quando estiver sendo
executada;
b) embargos à execução de crédito da Fazenda Pública que não seja dívida
ativa.

Na primeira hipótese, de acordo com forte corrente jurisprudencial do
Superior Tribunal de Justiça e que deverá continuar com o CPC/15, não cabe
reexame necessário da decisão do juiz de primeiro grau que julgou
totalmente improcedente ou parcialmente procedente os embargos à execução
opostos pela Fazenda Pública[10].


Segundo sua exegese, o descabimento do duplo grau obrigatório se deve
ao fato de que a norma imperativa do então art. 475 do CPC/73 – cuja
redação se destina apenas ao processo de conhecimento e não ao processo de
execução[11].


De igual forma e pelo mesmo fundamento, não caberá reexame necessário
do julgamento de procedência dos embargos à execução de crédito da Fazenda
Pública que não seja dívida ativa, por estar fora da previsão legal.


6 – AS HIPÓTESES DE EXCLUSÃO DA REMESSA NECESSÁRIA

Com o aumento significativo de processos nos tribunais, restou
evidenciado que a remessa necessária deveria prosseguir, mas apenas para
aqueles processos cujos contornos indiquem que a reapreciação pelos
tribunais da sentença proferida contra a fazenda pública restou
evidentemente necessária. Assim, para o CPC/15 o reexame necessário
continua sendo a regra, mas os novos parâmetros de sua não incidência foram
ampliados significativamente.


As hipóteses de exclusão podem ser divididas em dois grupos: por valor
(pisos para remessa) e por mérito.

6.1 – Os diferentes pisos para remessa necessária em função da parte
pública no processo

Na prática, é fácil distinguir as diferenças econômicas entre os entes
públicos. A União tem a maior captação de recursos tributários em sede
nacional, seguida pelos Estados e, posteriormente, pelos Municípios. Assim,
uma determinada condenação à União pode lhe passar economicamente
desapercebida, mas a mesma condenação no mesmo valor a um Município do
interior de um Estado sem grandes recursos pode significar a sua
insolvência.


O legislador decidiu, então, que os valores para fins de piso para
remessa necessária deveriam seguir uma linhagem proporcional nos seguintes
termos:

a) para a União e suas autarquias e fundações de direito público, 1.000
salários mínimos;
b) para os Estados, Distrito Federal e Municípios que sejam as capitais
dos Estados e suas autarquias e fundações de direito público, 500
salários mínimos;
c) para os demais Municípios e suas autarquias e fundações de direito
público, 100 salários mínimos.


A norma do artigo 496, § 3º é bastante clara: a valoração para fins de
piso ocorrerá quando a condenação ou o proveito econômico obtido na causa
for de valor certo e líquido inferior aos valores paradigmas.


Uma dúvida que poderia ocorrer é: e se a condenação for no valor dos
pisos acima indicados? Como se observa pela redação, o piso de exclusão da
remessa é para valores inferiores aos narrados; logo, se a condenação for
no valor, a remessa necessária ocorrerá.


Outra consideração importante é que os pisos para remessa necessária
ocorrerão tão somente quando a sentença contiver: a) condenação; b)
declaração ou constituição de direito controvertido cujo benefício
econômico seja inferior aos valores paradigmas.


No que tange à condenação, em regra a Fazenda Pública estará no pólo
passivo da demanda ou o valor dos honorários advocatícios em uma ação em
que ela foi parte ativa foi alçado ao referido patamar. Quanto à declaração
ou constituição de direito controvertido, tanto a Fazenda Pública pode
estar no pólo ativo (como nos casos em que ela cobre algum valor igual ou
superior aos paradigmas e a sentença seja de improcedência) quanto no pólo
passivo (uma ação declaratória de nulidade de lançamento tributário).

6.2 – Hipóteses de exclusão em função do mérito da decisão

Um dos fundamentos da remessa necessária é a averiguação da ratio
decidendi pelo tribunal imediatamente superior. Se os fundamentos da
decisão estiverem com alto grau de certificação, como é o caso do
magistrado fundamentar o decisium nas súmulas de tribunais superiores,
acórdãos proferidos pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal
de Justiça em julgamentos de recursos repetitivos ou firmados em incidente
de resolução de demandas repetitivas (IRDR) ou de assunção de competência,
não há necessidade de haver remessa necessária, mesmo que o valor da
demanda ultrapasse os pisos acima identificados.


Observa-se, porém, que apesar de não escrito de forma expressa, as
decisões em IRDR dos tribunais locais servem de paradigma para a não
existência de remessa necessária. Para tanto, entendemos que o IRDR deve
estar definitivamente julgado; se houve interposição de recursos, sequer
poderia haver decisão do juiz de primeiro grau em face do efeito suspensivo
deste incidente.


Outro ponto de destaque é a dispensa de remessa necessária em função de
parecer vinculante emitido pela advocacia do órgão (art. 496, IV), que pode
ocorrer nos casos de manifestação, parecer ou súmula administrativa. Não
pode ser qualquer parecer; o mesmo tem que ter caráter vinculante, o que
faz retornar a importância da discussão sobre o grau de vinculação dos
pareceres produzidos pelas respectivas Procuradorias.




6 – O CONFLITO INTERPRETATIVO ENTRE AS DIVERSAS TIPOLOGIAS DE REMESSAS
NECESSÁRIAS FORA DO CPC

A remessa necessária está prevista em caráter geral no artigo 496 do
CPC. Entretanto, existem ainda em diplomas esparsos diversas hipóteses
específicas de duplo grau obrigatório, que são as seguintes:


a) Decreto Lei 3365/41 (desapropriação por utilidade pública): em seu art.
28, § 1º, prevê a necessidade de reexame da sentença que condenar a
Fazenda Pública a indenizar pelo dobro da quantia oferecida na inicial;


b) Lei Complementar 76/93 (desapropriação de imóvel rural para fins de
reforma agrária): é obrigatório o duplo grau de jurisdição das sentenças
que condenem o expropriante em quantia superior a 50% da oblação
inicial;

c) Lei 12.016/09 (mandado de segurança): a lei impõe o reexame necessário
no art. 14, parágrafo primeiro, para o caso de procedência do mandamus.
Nesse ponto, o STJ entende que a Lei 12.016/09 é lei específica e o
artigo 475 do CPC/73 não se aplica[12]. Assim, o Enunciado 312 do Fórum
Permanente de Processualistas Civis, quando aduz que "O inciso IV do §
4º do art. 496 do CPC aplica-se ao procedimento do mandado de segurança"
terá que provocar um overrruling na atual jurisprudência do STJ, pois
esta interpretação teria que aplicar todos as exceções da remessa
necessária à ação mandamental;

d) Lei 4.717/65 (ação popular): em seu art. 19, prevê a aparente inversão
do reexame necessário. Somente ocorrerá duplo grau de jurisdição
obrigatório se a sentença concluir pela carência ou pela improcedência
da ação. A inversão, na verdade, é meramente aparente, posto que o que
se protege, em último caso, não é a parte, mas sim o erário público,
estando esta regra em sintonia com as demais[13];


e) Lei (ação civil pública): O STJ vem aplicando o instituto da remessa
necessária às ACPs em interpretação analógica ao artigo 19 da Lei
4.717/65 (Lei da ação popular)[14].

Esta é a interpretação da atual remessa necessária em face do artigo
475 do CPC/73, que deve persistir por serem leis específicas e o novo
artigo 496 ser lei genérica.

7 – CONCLUSÕES FINAIS

Diante do exposto, concluímos que:

a) a remessa necessária não é recurso; é um fenômeno processual que
sujeita a sentença de primeiro grau, nos casos previstos em lei, a
condição substitutiva obrigatória para a produção de eficácia;
b) aplica-se a remessa necessária aos processos das empresas estatais
prestadoras de serviço público;
c) continuará a existir em nosso ordenamento a remessa necessária
específica prevista em leis especiais, como desapropriação, ação
popular e mandado de segurança, cujas exceções do artigo 496 do CPC/15
não serão a elas aplicadas.




8 - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CARNELUTTI, Francesco. Como se faz um processo. Leme/SP : Edijur, 2015.

CUNHA, Leonardo Carneiro da; DIDIER, Fred. Remessa necessária no Novo CPC.
In Repercussões do novo CPC. Advocacia Pública. Coordenador Geral DIDIER,
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JORGE, Flávio Cheim; DIDIER JR., Fredie; RODRIGUES, Marcelo Abelha. A nova
reforma processual. São Paulo: Saraiva, 2002.

MARINELA, Fernanda. Direito Administrativo. 7ª edição, revista, ampliada,
reformada e atualizada até 01/01/2013. Niterói : Ímpetus, 2013.


MARTINS, Pedro Batista. Recursos e processos de competência originária dos
tribunais. Rio de Janeiro: Revista Forense, 1957.

MAZZA, Alexandre. Manual de direito administrativo. 3ª Edição. São Paulo :
Saraiva, 2013..

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 24ª edição,
atualizada por AZEVEDO, Eurico de Andrade; ALEIXO, Délcio Balesteiro; BURLE
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MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Mandado de Segurança contra denegação ou
concessão de liminar. São Paulo: Rev. de Direito Público, n° 92, out-dez de
1989, ano 22.

MENDES, Gilmar et alii. Curso de Direito Constitucional. 2ª Edição. São
Paulo : Saraiva, 2008

MOREIRA, Alberto Camiña. Defesa sem embargos do executado – exceção de pré-
executividade. 3ª edição, revista e atualizada. São Paulo: Saraiva, 2001.

NERY JR., Nelson. Teoria geral dos recursos. 7ª edição, revista e
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NERY Jr., Nelson; NERY, Rosa Maria Andrade. Código de processo civil
comentado e legislação processual civil extravagante em vigor. 5ª edição.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005.

PORTO, Sérgio Gilberto. Comentários ao código de processo civil. V. 6. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.

WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins; RIBEIRO,
Leonardo Ferres da Silva; MELLO, Rogério Licastro Torres de. Primeiros
comentários ao novo Código de Processo Civil. Artigo por artigo. São Paulo
: Revista dos Tribunais, 2015.

WAMBIER, Luiz Rodrigues; TALAMINI, Eduardo. Curso avançado de processo
civil. Volume 1. Teoria geral do conhecimento e processo de conhecimento.
15ª edição. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2015.
-----------------------
[1] "Recurso Especial. Não enseja reexame de prova (Súmula 7/STJ) nem
reabre ao vencido uma terceira instância, na qual possa contestar ou
corrigir o julgamento das instâncias ordinárias na apreciação dos fatos da
causa. Decisão, que inadmitiu o recurso, confirmada." STJ 5ª Turma, AGA
44563/RJ, Relator Ministro Assis Toledo, DJ DATA:04/04/1994 PG:06695,
RSTJ 81/325.

"Não é o Superior Tribunal de Justiça terceira instância, sendo sua função
constitucional uniformizar a interpretação da legislação federal,
preservando sua correta aplicação, motivo pelo qual o recurso especial
reveste-se de tecnicidade, cujas hipóteses de admissibilidade estão
previstas no art. 105, inciso III da CF/88, devendo ser observados os
pressupostos recursais genéricos e específicos para sua admissão." STJ 2ª
Turma, Relatora Ministra Eliana Calmon, DJU DATA:18/03/2002 PG:00223.
[2] "No reexame necessário, as questões decididas pelo juiz singular são
devolvidas em sua totalidade para exame pelo Tribunal ad quem. Há também a
ocorrência do efeito translativo, segundo o qual as matérias de ordem
pública e as questões suscitadas e discutidas no processo, ainda que a
sentença não as tenha julgado por inteiro, devem ser objeto de análise em
sede de duplo grau de jurisdição. Mitigação da Súmula 45 do STJ: "No
reexame necessário, é defeso, ao tribunal, agravar a condenação imposta à
Fazenda Pública" (REsp nº 440.248/SC, Rel. Min. DENISE ARRUDA, DJ de
05.09.2005, p. 206).

[3] Quando tece seus comentários sobre o contraditório, Carnelutti assim
leciona: "é tão difícil o feito do juiz, tanto em matéria de provas quanto
de razões, que não consegue completa-lo por si mesmo – razão pela qual a
experiência elaborou um dispositivo que o ajude. Este dispositivo tende a
procurar para eles a colaboração das partes. [...] É natural, portanto, que
a parte ofereça ao juiz as provas e as razões que considere idôneas para
determinar a solução por ela desejada. Daqui uma colaboração das partes
como o juiz, que tem, todavia, o defeito de ser parcial: cada uma delas
atua com a finalidade de desvelar não toda a verdade, mas aquele tanto de
verdade que lhe convém. Mas se a colaboração de uma parte é parcial ou, em
outros termos, tendenciosa, este defeito se corrige com a colaboração da
parte contrária, uma vez que esta tem interesse em desvelar a outra parte
da verdade. Portanto, o que torna possível e útil tal colaboração é o
contraditório. Assim vemos, no processo, uma parte combatendo contra a
outra, chocando os pedernais, de modo que acabam por fazer saltar a chispa
da verdade" (CARNELUTTI : 2015, p. 69).
[4] Esta hipótese é mais comum do que se imagina. No Estado de Sergipe, por
exemplo, várias foram as apelações da fazenda estadual que apenas
impugnaram o percentual dos honorários advocatícios, requisitando a fixação
dos mesmos pela regra do art. 20, § 4º, do CPC, e não pela regra do mesmo
artigo, só que pelo § 3º. E o Tribunal de Justiça não apreciava a
condenação principal, que depois fora erroneamente declarada como trânsita
em julgado, dando início ao processo de execução e formação de precatório
judicial. Com a formação de um precatório nulo, vários foram os embates
jurídicos para se demonstrar que a decisão do tribunal, não transitaria em
julgado na parte em que não foi reexaminada.
[5] "Art. 100. ..............................................
§ 4º São vedados a expedição de precatório complementar ou suplementar de
valor pago, bem como fracionamento, repartição ou quebra do valor da
execução, a fim de que seu pagamento não se faça, em parte, na forma
estabelecida no § 3º deste artigo e, em parte, mediante expedição de
precatório." EC 37/02, de 12 de junho de 2002.
[6] E continua: "Tal posição se justifica, exatamente, porque o propósito
da regra é de oferecer às hipóteses consagradas garantia legal de reexame
sem qualquer limitação, não sendo lógico que eventual apelo voluntário
venha a limitar a extensão do conhecimento na devolução necessária. Não
bastasse isso, cumpre esclarecer que, não sendo a devolução necessária
motivo plausível que possa fazer com que eventual apelo voluntário gere
reflexos limitativos à remessa legal, máxime frente à absoluta divergência
de propósitos e natureza jurídica da medida."
[7] in Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis de acordo com a lei
9.756/98, coordenação de WAMBIER, Teresa Arruda Alvim e NERY Jr., Nelson.
1ª edição, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 429.
[8] Cite-se o caso do alegado juízo discricionário do magistrado na
concessão da liminar em mandado de segurança. Confira-se, a propósito,
excepcional lição de MELLO, Celso Antônio Bandeira de: "Quando alguém usa
de discrição, está tomando uma decisão que, ante o direito vigente, pode
ser de tal modo, tanto como poderia ser de outro modo. Na pronúncia
jurisdicional, não. A decisão tomada exprime que alguém faz jus a uma dada
providência; que é direito de alguém; que é devido ao postulante o que
pediu, ou, reversamente, que não é devido. Jamais resultaria de uma decisão
jurisdicional a afirmação de que tal direito "pode ser reconhecido", tanto
quanto "poderia não sê-lo". Seria um absurdo dizer-se, em um dado caso
concreto e perante a norma aplicável, que alguém tem ou não tem dado
direito. Que são alternativas igualmente sufragadas pelo direito. Portanto,
o órgão jurisdicional, ao decidir, afirma que o direito por ele pronunciado
preexiste e que a solução dada é cabível e é a única, com exclusão de
qualquer outra, porque fala em nome do que já está solucionado na lei, da
qual ele é o porta-voz no caso concreto. O deslinde pode (ou não) ser
difícil; pode demandar recurso a princípios gerais, mas, de direito, sua
pronúncia é a expressão oracular do que as normas aplicáveis 'querem'
naquele caso. Este é a característica própria, específica, da função
jurisdicional". Mandado de Segurança contra denegação ou concessão de
liminar. São Paulo: Rev. de Direito Público, n° 92, out-dez de 1989, ano
22.
[9] Se a decisão do Tribunal, em reexame necessário, adotou toda a
fundamentação do juízo a quo, então esta fundamentação passa a ser do
próprio Tribunal, e não mais do juiz de primeiro grau. Tanto que quem vai
aclará-la, via embargos declaratórios, é o próprio Tribunal, podendo dar-
lhe efeitos infrigentes e alterar a decisão.
[10] "AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. ADMINISTRATIVO. EMBARGOS À
EXECUÇÃO. REEXAME NECESSÁRIO. IMPOSSIBILIDADE.
1. A sentença proferida em sede de embargos à execução não está sujeita ao
reexame necessário, por força do disposto no inciso III do artigo 475 do
Código de Processo Civil, que o restringe, no processo de execução, à
"sentença que julgar improcedente a execução de dívida ativa da Fazenda
Pública (artigo 585, VI)."
2. O inciso II do artigo 475 do Código de Processo Civil rege o duplo grau
obrigatório no processo de conhecimento.
3. Longe de incompatíveis as disposições dos artigos 475, inciso III, e
520, inciso V, do Código de Processo Civil, ajustam-se à perfeição, na
exata medida em que o reexame necessário, no processo de execução, é
restringido pelo inciso III do artigo 475 do Código de Processo Civil
apenas à hipótese de "sentença que julgar improcedente a execução de dívida
ativa da Fazenda Pública (artigo 585, inciso VI)" e o inciso V do artigo
520 do Código de Processo Civil suprime o efeito suspensivo à apelação da
sentença que "rejeitar liminarmente embargos à execução ou julgá-los
improcedentes", exsurgindo manifesta a relação norma especial - norma geral
que se estabelece entre as disposições legais processuais em questão.
4. E tanto mais evidentes se fazem a sustentada restrição do reexame
necessário, no processo de execução, e a relação norma especial - norma
geral que se estabelece entre os artigos 475, inciso III, e 520, inciso V,
do Código de Processo Civil, quanto se tem presente que a alusão "(artigo
585, inciso VI)", na disposição inserta no inciso III do artigo 475 do
Código de Processo Civil, determina que se a recolha como a hipótese legal
da sentença que julgar improcedente, não, a execução, mas, sim, os embargos
à execução de dívida ativa da Fazenda Pública, o que, mais uma vez, põe na
luz da evidência a sua pertinência exclusiva ao processo de execução e,
neste, a restrição do reexame necessário aos embargos à execução de dívida
ativa, quando julgados improcedentes e, pois, contra a Fazenda Pública.
5. É inviável apreciar em sede de agravo regimental a violação de
dispositivo legal que não se constituiu em objeto de impugnação na via do
recurso especial.
6. Agravo regimental improvido." STJ 6ª-T, AGRESP 311013/SP, Rel. Hamilton
Carvalhido, DJU DATA:04/02/2002 PG:00596.

"A Eg. Corte Especial firmou entendimento no sentido de que a sentença
proferida em embargos à execução de título judicial opostos por autarquias
e fundações não se sujeita ao reexame necessário (art. 475, II do CPC),
tendo em vista que a remessa oficial só é cabível em processo de cognição
sendo inaplicável em execução de sentença devido ao prevalecimento da
disposição contida no art. 520, V, do CPC." STJ RESP 262990/RS, relator
FRANCISCO PEÇANHA MARTINS, publicada no DJU de 11/03/2002, página 225.


[11] Concessa maxima venia, entendo que a jurisprudência criada foi fruto
mais de razões fáticas do que propriamente jurídicas.
Na práxis judicial, verifica-se que é no processo de execução onde ocorrem
os maiores riscos à Fazenda Pública. Cite-se, pois, um caso ocorrido no
Estado de Sergipe no início da década passada, onde cerca de 500 médicos
ingressaram, conjuntamente, contra o Estado, requerendo uma revisão
salarial. Venceram a demanda em primeiro grau, e houve apelação do Estado.
Após o trânsito em julgado, o escritório de advocacia passou um ano e meio
trabalhando incansavelmente na execução da sentença, enquanto que o Estado
teve apenas dez dias para embargar mais de 5.000 folhas de cálculo.
Entendo, na realidade, que o processo de embargos à execução –com esteio na
doutrina – é processo de conhecimento, e como tal, perante o ordenamento
jurídico, teria de ter o reexame necessário. Mas, pelas mesmas razões de
práxis apontadas pela jurisprudência do STJ, reconheço que o reexame
necessário nos embargos seria mais um dos inúmeros calvários a serem
impingidos a quem litiga contra a Fazenda Pública.
A melhor solução para o processo de execução, ao meu ver, seria a adoção do
modelo alemão, com as arestas determinadas pela conversão ao nosso direito
pátrio. Segundo o testemunho de MOREIRA: "Sabe-se que nesse país a execução
não se faz perante o juiz do processo de conhecimento, como entre nós, mas
perante o executor judicial, pessoa que não é perita em direito. Por essa
razão, certamente, não se lhe confia a apreciação de questões técnicas
emergentes de debates que o contraditório propicia, razão de a oposição
(embargos) ser aforada no tribunal do processo de primeira instância, em
distribuição livre, pois pode ser apreciada por órgão distinto do que
proferiu a sentença". (MOREIRA : 2001, p. 10).
[12] "A jurisprudência prevalecente no STJ é no sentido de que não se
aplica ao Mandado de Segurança a regra do art. 475, § 2°, do CPC, por força
de previsão específica na lei que disciplina o rito dessa Ação
Constitucional (art. 12, parágrafo único, da revogada Lei 1.533/1951 e art.
14, § 1°, da Lei 12.016/2009) (EREsp 687.216/SP, Rel. Ministro Castro
Meira, Corte Especial, DJe 4/8/2008; REsp 1.274.066/PR, Rel. Ministro Mauro
Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 9/12/2011; REsp 1.047.540/MT, Rel.
Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe 14/8/2008).
[...]" (AgRg nos EDcl no AREsp 302.656/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN,
SEGUNDA TURMA, julgado em 15/08/2013, DJe 16/09/2013).
[13] "Processual Civil. Mandado de Segurança Contra Ato Judicial. Ação
Popular. Sentença Terminativa do Processo. Duplo Grau de Jurisdição.
Antecipação de Efeitos Executórios. Inscrição Imobiliária de Hipoteca
Judiciária. Lei 4717/65 (Arts. 19 e 22). CPC, artigos 466 e 475.
1. A ação popular está sob a iluminura de superiores interesses públicos
(coletivos), com assentamento constitucional, legitimando subjetivamente o
cidadão para reprimir atividade comissiva ou omissiva da Administração
Pública. O direito subjetivo do cidadão, movido pelo caráter cívico-
administrativo da ação popular, com a primordial finalidade de defender o
patrimônio público, não pode ficar inibido pelo receio de imposição de
ônus, antecipando-se efeitos de sentença terminativa do processo, sem o
crivo do duplo grau de jurisdição, inarredável condição de eficácia (art.
19, Lei 4.717/65). Antes do reexame obrigatório, sem o trânsito em julgado,
a sentença é ineficaz. Assim diferencia-se de outras ações, com pedidos
procedentes (art. 475, I, II e III, CPC). O processo da ação popular
inverteu essa orientação, estabelecendo obrigatório reexame para as
sentenças que declaram a carência ou improcedência.
2. A hipoteca judiciária pode ter os seus efeitos e inscrição imobiliária
antecipados, mesmo pendentes recursos contra as sentenças, em ações cujos
pedidos foram julgados procedentes, salvo aquelas submetidas às disposições
especiais do artigo 19, Lei 4.717/65.
3. Recurso provido." STJ 1ª Turma, ROMS 9002/PR, Relator Ministro Milton
Luiz Pereira, fonte DJ 07/06/1999 p. 42, JSTJ 11/101, RSTJ 119/65, RT
768/162.
[14] "Conheço e reverencio a orientação desta Corte de que o art. 19 da Lei
4.717/65 (Lei da Ação Popular), embora refira-se imediatamente a outra
modalidade ou espécie acional, tem seu âmbito de aplicação estendido às
ações civis públicas, diante das funções assemelhadas a que se destinam -
proteção do patrimônio público em sentido lato - e do microssistema
processual da tutela coletiva, de maneira que as sentenças de improcedência
de tais iniciativas devem se sujeitar indistintamente à remessa necessária"
(REsp 1220667/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA,
julgado em 04/09/2014, DJe 20/10/2014).
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