A sala de aula, as redes sociais e os estudantes.pdf

May 26, 2017 | Autor: A. Melchioretto | Categoria: Redes Sociais, Rizoma, Escolar
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Ficha catalográfica S57a Simpósio Integrado de Pesquisa (14. : 2016 : Itajaí, SC). Anais do XIV Simpósio Integrado de Pesquisa [recurso eletrônico] : a política educacional brasileira: desafios recentes / Universidade do Vale do Itajaí. Vice-Reitoria de Pós-Graduação, Pesquisa, Extensão e Cultura. Programa de Pós-Graduação em Educação. – Itajaí, SC: Ed. da Univali, 2016. Disponível em: www.univali.br/periodicos ISSN: 2237-8065 1. Educação - Eventos. 2. Educação – Estudo e ensino. 3. Política e educação. I. Título. CDU: 37

Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Central Comunitária – UNIVALI Todas as informações contidas nesta obra são de total responsabilidade dos autores.

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XIV Simpósio Integrado de Pesquisa 29 de novembro de 2016 – Itajaí/SC







AS REDES SOCIAIS, A SALA E OS ESTUDANTES Albio Fabian Melchioretto FURB Celso Kraemer FURB Resumo: Vivemos em espaços de conexões. O tempo de agora evidencia possibilidades de ligações ininterruptas com o ciberespaço. As novas tecnologias digitais são inseridas e reinventadas em fluxos constantes: novos espaços, novas possibilidades e novas conexões. Mas como a escola e aqueles que a compõe se colocam diante disto tudo que a atravessa? O presente artigo aborda uma questão que fez parte da pesquisaexperimentação que compôs a dissertação “Uma-aula-que-quer-ser-rizoma: Filosofia, Redes Sociais na escola” que teve como objetivo compreender as possíveis conexões entre o estudo da filosofia, o uso de Redes Sociais Virtuais (RSV) e a noção de rizoma na escola. A partir dela, recorto uma questão onde cartografaremos o olhar do estudante sobre o uso das RSV em sala de aula. A questão foi dirigida aos estudantes de uma escola profissionalizante de Blumenau e enunciava: “as redes sociais podem contribuir para a realização de atividades escolares?”. A análise das vozes dos estudantes acontece a partir das características aproximativas do rizoma descritas por Gilles Deleuze e Félix Guattari na introdução de Mil Platôs. A experimentação evidenciou que o posicionamento dos estudantes diante do acesso às RSV em sala de aula não é uníssono, há concordância e discordância quando ao uso ao modo escolar. Palavras-chave: Escola; Rizoma; Redes Sociais.

1. INTRODUÇÃO

Vivemos em espaços de conexões e de ciberligações com o uso de ferramentas de RSV. Ao pensar em RSV refletimos sobre mudanças comportamentais marcantes nas últimas duas décadas. É inegável que houve uma transformação sensível da forma como nos relacionamos com o ciberespaço e com as outras pessoas e muito desta transformação passa necessariamente pelas conexões em RSV. Para Recuero (2009, p. 15) “quando uma rede de computadores conecta uma rede de pessoas e organizações é uma rede social”, e a conexão apresenta uma infinidade de possibilidades, e hoje não pensamentos apenas por meio de computadores, mas de múltiplos dispositivos. O que transforma muitas ações cotidianas, com o acesso às informações, a relação com o mundo inúmeras vezes mediada pela conexão ao ciberespaço. 428



Este recorte focará apenas a relação escola-ciberespaço mediado pelas RSV, através das vozes dos estudantes. As redes sociais em si não formam exclusivamente uma estrutura hierárquica verticalizada construída a partir de uma relação de poder, mas um espaço, em certo grau, livre, orientada por uma lógica associativa, o que é demasiadamente intrigante. Pensar estas alterações é também pensar como isto tudo atravessa o espaço escolar. Há uma lógica associativa na conexão com as RSV em confronto com um olhar hierarquizado e tradicional da escola. A partir deste contexto temos o objetivo de cartografar as vozes dos estudantes diante da possibilidade do uso de RSV em sala de aula perguntando se elas podem contribuir para a realização de atividades escolares. Para pensar este problema vamos utilizar os seis princípios aproximativos de rizoma apresentados na introdução de Mil Platôs, por Deleuze e Guattari (2000). Os seis princípios são o princípio da conexão; da heterogeneidade; de multiplicidade; da ruptura assignificante; de cartografia e da decalcomania. A ideia do rizoma é um contraponto ao paradigma impositivo de uma lógica binária que não aceita novas possibilidades. O rizoma remete à multiplicidade, e a ciberconexão em sala de aula é uma possibilidade múltipla. Apresentaremos um a um os princípios aproximativos, mas assim eles não o são, se fossem, não seriam rizoma, estão interconectados. O primeiro princípio é o da conexão. “Qualquer ponto de um rizoma pode ser conectado a qualquer outro e deve sê-lo” (DELEUZE; GUATTARI, 2002, p. 15). Os pontos de conexão não seguem uma estrutura binária previamente ordenada, são multipontos de conexão. Qualquer ponto, virtualmente, é uma possibilidade de conexão em outro ponto, a independer da ordem, da posição ou do estar. Não há uma ordem prévia que determina os pontos, mas as conexões estão no fluxo, formando nodos diante das mais diferentes possibilidades. O segundo princípio é o da heterogeneidade. Se as conexões fossem sempre iguais, homogêneas, não haveria rizoma. A heterogeneidade é a consequência da conexão entre multipontos. A diversidade que os diferentes nodos podem criar é o que trata a heterogeneidade. O terceiro princípio é o da multiplicidade. São características que somam diversas tramas que se entrelaçam. Aqui, os autores buscam a figura das hastes que movem uma marionete, para descrever o terceiro princípio. A multiplicidade reside na pessoa 429



que move a marionete, nas palavras dos autores, “a multiplicidade não tem nem sujeito, nem objeto, mas somente determinações, grandezas, dimensões que não podem crescer sem que mude de natureza” (DELEUZE; GUATTARI, 2000, p. 16). Não há um elemento que sirva de pivô, ou de sujeito ou de objeto, mas a multiplicidade ocupa todos os espaços. A marionete não é corda única, mas multicordas que possibilitam o movimento. O quarto princípio é o da ruptura assignificante. Este princípio deixa evidente porque o rizoma não pode contar com o dualismo. Ele não pressupõe processos de significação. Ele se rompe em qualquer lugar e também se retoma em qualquer lugar.

Todo rizoma compreende linhas de segmentaridade segundo as quais ele é estratificado, territorializado, organizado, significado, atribuído, etc., mas, compreende também linhas de desterritorialização pelas quais ele foge sem parar (DELEUZE; GUATTARI, 2000, p. 18).

A linha de fuga faz parte do rizoma. Elas não param de se remeter umas às outras. Rupturas, linhas de fuga, são pontos que se rompem e novamente conectam-se, nos mesmos pontos, em outros ou com novas formações. A lógica está além de uma forma binária entre dois pontos apenas. Das rupturas nascem novas conexões, conexões que são heterogêneas. O rizoma é sempre um devir, “uma cartografia a ser traçada sempre, a cada instante” (GALLO, 2016, p. 94). Deleuze e Guattari (2000, p. 20) afirmam,

o livro não é a imagem do mundo segundo uma crença enraizada. Ele faz rizoma com o mundo, há evolução a-paralela do livro e do mundo, o livro assegura a desterritorialização do mundo, mas o mundo, opera uma reterritorialização do livro, que desterritorializa por sua vez em si mesmo.

Um movimento de ruptura, mas não definitivo, que no movimento seguinte, reconstroem-se assignificante. O quinto princípio é o da cartografia. O rizoma é mapa e não decalque, “fazer o mapa e não o decalque” (DELEUZE e GUATTARI, 2000, p. 21). O rizoma pode ser cartografado, mas toda cartografia rizomática expõe os múltiplos pontos 430



de conexão. Uma lógica binária arbórea pode ser reproduzida, copiada, mostrando sempre os mesmos pontos. Na cartografia rizomática os pontos são múltiplos com rupturas assignificantes, mostram novas possibilidades a cada mapa. A cartografia está pautada numa lógica do devir. O sexto princípio é o da decalcomania. O decalque volta sempre ao mesmo ponto. Um mapa “pode ser rasgado, revertido, adaptar-se a montagens de qualquer natureza, ser preparado por um indivíduo, um grupo, uma formação social” (DELEUZE e GUATTARI, 2000, p. 22). Um mapa ao ser copiado não garante a exata cópia, ele é novo, ele é múltiplo. Ao transformar um mapa em imagem, ele é estratificado. Das conexões há uma transformação em raiz, estabilizando qualquer possibilidade de ser diferente, deixando ser somente do jeito que é. A partir destes seis princípios vamos pensar as conexões ou rupturas que são possibilitadas na escola com a inserção das RSV, faremos isto a partir do devir aluno. Qual o olhar deste diante das ações que são pensadas para ele? Um movimento de olhar para o estudante a fim de fazer-se com a sua miséria de acordo com Gallo (2016). Pensar com o estudante a fim de promover uma ruptura assignificante com as formas tradicionais a dinâmica das tecnologias digitais, e valorizar aquilo que o estudante fala sobre. O trabalho está dividido em quatro partes. Nesta primeira apresentamos os conceitos que permitirão navegar entre as ligações da leitura de Deleuze e Guattari (2000) com as vozes dos estudantes. Na próxima seção apresentaremos como as vozes dos estudantes foram ouvidas para na sequência cartografá-las. E por último, registraremos os incômodos que estas vozes trouxeram.

2. METODOLOGIA E CONTEXTO

A parte analisada fez parte de uma experimentação que aconteceu em uma escola profissionalizante da cidade de Blumenau. A escola oferece diversas modalidades de ensino, com turmas a partir do Ensino Médio até cursos de Pósgraduação latu senso. São atendidos mais de quatro mil estudantes em três turnos durante seis dias por semana. Para a experimentação foram escolhidas aleatoriamente duas turmas do programa Jovem Aprendiz. A turma escolhida 431



para a experimentação era composta por trinta e dois estudantes. No turno matutino eles frequentavam o programa de Jovem Aprendiz e no turno vespertino estavam na escola regular. Possuíam entre quinze e dezessete anos. Todos os estudantes frequentavam o Ensino Médio; vinte e seis deles na cidade de Blumenau; cinco em Indaial e apenas um em Pomerode. Vinte e oito estudantes estavam no 1º ano do Ensino Médio; três no 2º e apenas uma frequentava o 3º ano do Ensino Médio, todas pertencentes à Gerência de Educação da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Regional de Blumenau. Dentre os estudantes, vinte e seis nasceram em Santa Catarina, quatro no Paraná, um no Rio Grande do Sul e um no Estado de Minas Gerais. Dos catarinenses, vinte e três deles nasceram na cidade de Blumenau, os outros três em Indaial, Rio do Sul e Lages. Outro dado, relacionado com a experimentação, vinte e cinco estudantes possuíam acesso à internet em casa, e sete deles não, porém, todos usavam ferramentas de formação de RSV, dentre elas a única de maneira unânime foi o Facebook. Segundo as vozes dos estudantes, os que não possuíam acesso em casa o faziam em pontos de área de cobertura de serviço de telefonia móvel. Números que permitem conhecer um pouco do contexto que estão inseridos. A experimentação aconteceu durante cinco encontros de quatro horas aulas cada, após a terceira semana do início do curso, totalizando uma unidade curricular de 20 horas aulas. Para deixar evidente ao leitor, todas as atividades foram discutidas com os estudantes antes de sua execução e desenhadas com a participação deles, no sentido daquilo que Gallo (2016) chama de professor militante. Aquele que, vivendo com os estudantes, pauta por uma construção coletiva.

Nesse sentido, o professor seria aquele que procura viver a miséria do mundo, e procura viver a miséria de seus alunos, seja ela qual miséria for, porque necessariamente miséria não é apenas uma miséria econômica; temos miséria social, temos miséria cultural, temos miséria ética, miséria de valores (GALLO, 2016, p. 73).

As aulas, de maneira geral, seguiram um tripé metodológico semelhante: apresentação do conteúdo didático com retroalimentação e exposição dialogada; discussão das atividades e, por último, a avaliação da prática através de

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atividades. Todas elas foram mediadas por uma ferramenta de criação de RSV, no caso o Facebook, escolhida em conjunto com os estudantes. O recorte que aqui apresentamos neste texto foi realizado em dois momentos. No primeiro encontro da unidade curricular e novamente no último momento. A pergunta foi pensada na vivência com os estudantes. Já que a experimentação consistia no uso de RSV em ambiente escolar, perguntamos a eles o que eles pensam da prática em si. Não apenas do uso, mas qual reação que o uso causa em suas reflexões aproximando-se da característica de heterogeneidade do rizoma, segundo apresentado por Deleuze e Guattari (2000). Todas estas ações foram guiadas pelas características aproximativas do rizoma, descritas na seção anterior. Estas características permitem a formação de nodos entre diversas possibilidades e ações a fim de pensar, não em linearidade, mas entrelaçando ideias e possibilidades. Pensar uma prática, e envolver os que estão vivenciando a prática, para pensar com eles a prática em si, um movimento rizomático. Não são sujeitos de uma pesquisa, mas partícipes envolventes, que experimentam e vivenciam. Os dados foram coletados em um questionário escrito, no primeiro encontro. Apesar da experimentação envolver as RSV, ele foi elaborado anterior ao uso da ferramenta, porque além desta questão, outras acerca do contexto de uso das RSV também foram perguntadas, mas estas não são objetos deste texto. Para a análise dos dados selecionamos as respostas de estudantes que além da resposta escrita, também partilharam oralmente em sala, provocando uma conversa sobre as questões apresentadas. O apontamento deste critério aproxima-se ao princípio da multiplicidade e da heterogenidade, apontados por Deleuze e Guattari (2000). 3. USAR OU NÃO USAR, EIS A QUESTÃO Conforme mencionado na seção anterior, foi perguntado aos estudantes, se as RSV podem contribuir para atividades escolares. As respostas que além da escrita foram partilhadas oralmente pelos estudantes em sala de aula foram:

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“Sim. Se falto no dia da aula e tem amiga ou amigo que estuda junto, daí é só perguntar o que teve, se mudou o horário ou coisa assim” (A1);



“Sim, porque as vezes pode ter um trabalho escolar em dupla ou grupo. Aí podemos nos planejar melhor para o trabalho” (A26);



“Não [risos]. Fizeram as redes sociais foi para as pessoas se divertirem e não para continuar trabalhando de escola, mas mesmo assim, as pessoas continuam utilizando-as para essas coisas, faze trabalho de escola [expressão muito séria]” (A6).

Estas três respostas representam duas conexões entre os atores. A primeira menciona as RSV como meio auxiliar para as atividades das aulas. A segunda acredita que as RSV são apenas uma forma de diversão e seria uma forma de captura do poder utilizá-las para as aulas. Para os que seguem o mesmo raciocínio de A1, as RSV podem ajudar nas atividades escolares, mas todos a reduzem a uma ferramenta de comunicação. Elas servem para tirar dúvidas das tarefas, para a reposição de conteúdo diante de uma falta ou mudanças de horário. O ator A26, ao mencionar a facilidade da comunicação, ainda pensa uma estrutura linear, mas já acena para a possibilidade de um ambiente colaborativo, um aspecto dinâmico para a comunicação. A segunda tendência, pela voz de A6, identifica a escola como um espaço de confinamento (CERVI, 2013 e SIBÍLIA, 2012). A possibilidade de ampliar a escola para o ciberespaço ameaçaria a fronteira da diversão com os processos do confinamento, pois, na perspectiva de A6, as RSV foram criadas para as pessoas se divertirem. A escola se apresenta como um espaço ríspido de confinamento para educar os cidadãos (SIBÍLIA, 2012). Esta perspectiva sobre a escola e sobre as RSV nos motivou a repensar a segunda aula, que tratarei adiante. A fala de A6 é um grito diante da sociedade de controle que modula o comportamento, como Deleuze (1992) explica. O trabalho e o estudo não param, eles continuam o tempo inteiro, e como a conexão é perene, eles são transportados para as RSV, controlam as ações que estão fora do ambiente próprio de trabalho e de estudo. Seria possível afirmar que o confinamento, por meio das RSV, ampliou sua fronteira e que as RSV não rompem o confinamento disciplinar. Esse raciocínio é discrepante do pressuposto de Sibília (2012), de que 434



as RSV romperiam o confinamento das paredes escolares. Talvez as novas tecnologias, muito antes de nos libertarem, apenas modificam a tecnologia de apropriação-expropriação e nos sequestram nos confinam nos fluxos ondulatórios das velocidades virtuais. O homem da disciplina era um produtor descontínuo de energia, mas o homem do controle é antes ondulatório, funcionando em órbita, num feixe contínuo. Por toda parte o surf já substitui os antigos esportes (DELEUZE, 1992, p. 222). O grito, e não apenas a voz de A6, é a tentativa de descrever aspectos de uma sociedade do controle virtual e de uma maquinaria escolar (CERVI, 2013), envolvendo-se “continuam utilizando-as para esses objetos [objetivos]” para o trabalho e para a escola. O trabalho e a escola sequestram o tempo todo. Na última aula da experimentação, retomamos a mesma questão. Recuperamos os mesmos estudantes que foram apontados na primeira aula. As respostas foram: •

Sim, podemos criar grupos para debater sobre o assunto, avisar o colega sobre um trabalho” (A1);



“Sim, por que você pode pedir o conteúdo ou a atividade em que você no dia que você faltou” (A26);



“Sim pode, por que os professores podem fazer um grupo e realizar suas atividades em rede com os alunos” (A6).

Talvez devêssemos perguntar, diante das respostas, o que é um meio de comunicação. Esta foi a pergunta que faltou para trazer profundidade para pensar as respostas. Mas é interessante perceber que, no último momento, todas as vozes se inclinaram para a redução das RSV como ferramenta de comunicação, uma ideia que se alastrou por todos, poderia chamar de ideia-nodo. O estudante A1, na primeira aula falou das RSV como uma possibilidade de comunicação com os que estão longe; na última atividade ele acrescenta a possibilidade de realizar um debate. Aqui aparece a característica aproximativa da heterogeneidade (DELEUZE; GUATTARI, 2000). A ideia de debater um assunto, apontada por A1 enuncia a possibilidade de agenciamentos diferentes que podem chocar-se com os agenciamentos maquínicos. Um debate em torno de ideias já colocadas a fim de surgir novas opiniões. Deixar falar sobre um tema, sem as paredes de controle

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da sala de aula. A parede do tempo, do limite de fala, do espaço da aula, mas um lugar para transbordar. Já A6, na primeira aula falou em entretenimento pela internet, aqui ele mostra o valor de conhecer novos amigos e de fazer amizade. A mudança mais significativa pode estar na voz de A6, que na primeira aula teceu um posicionamento sobre a função das RSV. Com ele, no primeiro momento houve um grito em relação à sociedade de controle, mas agora aceita a possibilidade, além de dar sugestões de como realizar a atividade com as RSV. Aquela voz de resistência acabou aceitando o controle apresentado e seguindo o fluxo das ações, deixando de ser uma voz diferente para entrar no cântico uníssono da rede que ele compõe na sala de aula. Enquanto isso, A1 e A26 reproduzem a ideia da ferramenta como dinâmica agregadora para comunicação, A6 mostra uma mudança de ideia. Eles continuam a demonstrar uma ideia de linearidade dentro do espaço coletivo. Será que a prática causou uma ruptura significante, da escola agindo como máquina opressora? Para Deleuze e Guattari (2000) o princípio aproximativo de ruptura assignificante afirma que um rizoma pode ser rompido em lugar qualquer e retomar uma ou outra de suas linhas formando um novo rizoma. A formação de ideia aqui é diferente. Se antes havia um posicionamento de contestação, “as redes sociais foi para as pessoas se divertirem” agora, há uma plena aceitação da atividade “os professores podem fazer um grupo e realizar as atividades”. Não há apenas uma aceitação, mas uma colaboração quanto a forma de fazer as atividades. Não há uma linha de fuga, como na primeira participação, mas uma sequência no fluxo. Não estamos julgando o posicionamento em si de A6, mas na mudança de postura. A interação no ciberespaço também pode ser compreendida como uma forma de conectar pares de atores e de demonstrar que tipo de relação esses atores possuem. Ela pode ser diretamente relacionada aos laços sociais (RECUERO, 2009, p. 34). E isto ficou evidente na fala de A26, nas duas ocasiões. O valor da amizade, para os atores, é o que ficou em evidência. As interações não são destacadas diretamente, mas é aceitável a presença dela em cada uma das vozes. Seria, então, possível afirmar que a formação de rede, a partir dos membros da sala, criou laços sociais de amizade. Poderíamos discutir o 436



conceito de amizade nas RSV, um incômodo que permanece aberto, mas necessário diante deste tempo. Para Recuero (2009, p. 36) “a interação mediada pelo computador é também geradora e mantenedora de relações complexas e de tipos de valores que constroem e mantêm as redes sociais na Internet”. As relações constituídas são a unidade básica para a formação de uma rede, seja ela no ciberespaço, no confinamento de uma escola, ou onde for, a ideia aqui independe do conteúdo, mas é dada a partir do grau de importância que possuem, diante da exposição dos atores. Todos mencionaram as RSV como um espaço para isto. Enfim, é um espaço virtual para amizade.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A experimentação quando foi pensada tinha como intenção vivenciar o uso de RSV em sala de aula, mas à medida que ela aconteceu tornou-se também uma reflexão sobre a própria prática e a escola. Em certa medida, a experimentação tornou-se um rizoma. “Um rizoma não pode ser justificado por nenhum modelo estrutural ou gerativo. Ele é estranho a qualquer ideia de eixo genético ou de estrutura profunda” (DELEUZE; GUATTARI, 2000, p. 20). Pensar com os estudantes, a própria miséria (GALLO, 2016) na vivência entre as paredes (SIBÍLIA, 2012), pode ser uma maneira de tentar romper em algum aspecto com a máquina. Isto é apenas uma provocação. A experimentação não tinha como intenção apresentar um juízo de valor do tipo, com uso de tecnologias digitais a escola é boa, e sem ela é mal. Não era isto. Ao indicar uma ferramenta virtual, no caso as RSV, é propor trazer para dentro das paredes da escola aquilo que está fora, aquilo que é vivencial, não somente aos estudantes, mas a todos. “O bom e o mau são somente o produto de uma seleção ativa e temporária a ser recomeçada” (DELEUZE; GUATTARI, 2000, p. 17). Mas ela desnudou algumas reflexões. Embora tenhamos a tecnologia digital de maneira vivencial, incorporando ela em diversos momentos da vida, os estudantes ainda a enxergam apenas como instrumental. Ela está para fazer alguma coisa. Como se o método escolar com as tecnologias digitais ou não fosse o mesmo método. Ao manter esta linha 437



de pensar, não importa a inclusão de ferramentas de RSV, e suas possibilidades, como descreve Recuero (2009), pois o modo escolar de fazer as coisas prevalece. Talvez aqui a voz de contestação de A6 seja importante. Quando ele questiona o uso da escola, ele pode não estar questionando as RSV, mas a apropriação de algo que é “legal”, algo que está para o entretenimento, ao modo escolar de se fazer as coisas. A voz de A6, num primeiro momento pode ser a voz que denuncia o tédio da escola. Ou ainda, a escola como lugar de morte da criatividade, que deve seguir modos repetitivos de realizar atividades, sem a formação de laços ou nodos entre os pares. As ferramentas que formam RSV estão construídas numa proposta que intercruzam diversas possibilidades, formam nodos e laços sociais. O que as vozes dos estudantes apresentaram foi uma proposta linear e enrijecida de comunicação apenas. A ferramenta pode ser inovadora quando comparada a metodologias não digitais, mas seu uso ainda não é diferenciado, porque ainda é um uso linear. A voz de A1, no último momento, quando menciona a possibilidade do debate, pode estar numa direção que rompe com a linearidade, e estabelece um olhar para outra direção. A voz de contestação de A6 foi silenciada pela experimentação. Não questionamos o posicionamento dele, mas a alteração do posicionamento. Na primeira oportunidade ele apresentou uma ideia, na segunda oportunidade, outra, completamente diferente. O que a escola faz com cada estudante? Quando autores, como Cervi (2013) e outros trazem a ideia de maquinaria, penso que é isto, a conversão de uma ideia previa com aquilo que está ditado dentro das paredes da escola. A6 poderia chegar ao final da experimentação sustentando e apresentando outros argumentos para defender a ideia que a escola não deve se apropriar das RSV, mas não o fez. A6 fez um mapa ou um decalque? E este incômodo não foi respondido pela experimentação. Então, qual caminho seguir? Duas ideias decorrem. A primeira é que o uso de RSV em ambiente escolar, se refletido com os escolares podem trazer a luz questões não apenas instrumentais, mas da própria escola e as dinâmicas que nela estão inseridas. A segunda ideia é que as tecnologias digitais quando forem olhadas apenas como instrumentos reproduzem o modo tradicional de realizar atividades, para introduzilas dentro das paredes escolas e para formar nodos o modo de interação 438



precisam propor a maneira além da escola, a maneira vivencial, senão reproduzirá o mais do mesmo. Mas não são ideias conclusivas, apenas novos incômodos que permitem direcionar novas possibilidades vivenciais.

REFERÊNCIAS CERVI, Gicele Maria. Política na sociedade de controle. Rio de Janeiro: Achiamé, 2013. DELEUZE, Gilles. Post-Scriptum na sociedade de controle p. 219 – p. 226 in Conversações: 1972 – 1990. Rio de Janeiro: Editora 34, 1992. DELEUZE, Gilles. GUATTARI, Félix. Mil platôs: capitalismo e esquizofrenia. Volume 1. 2ª Reimpressão. Rio de Janeiro: Editora 34, 2000. GALLO, Sílvio. Deleuze e a educação. 3 Ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2016. RECUERO, Raquel. Redes sociais na internet. Porto Alegre: Sulina, 2009. SIBÍLIA, Paula. Redes ou paredes: a escola em tempos de dispersão. Rio de Janeiro: Contraponto, 2012.

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