A Sebenta da Liberdade

September 15, 2017 | Autor: Idalina Correia | Categoria: Literature, Literatura, Filosofía, Filosofia da Religião
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I – O PROCESSO DE CRIAÇÃO
O nosso processo de criação parte da reflexão e da discussão de textos literários e filosóficos, referências de toda a espécie incluindo do cinema, casos reais e experiências pessoais. É um percurso de reflexão pessoal do TEMA que será sistematizado através de sessões de pensamento crítico coletivas e colaborativas. Uma vez que o trabalho final vai integrar atividades de formação e criação com crianças e jovens deveremos ter o cuidado (care thinking) de adequar modos de fazer, linguagens e finalidades aos seus universos.

II – O TEMA
O tema escolhido é de grande amplitude. É um gigante, um mastodonte ou talvez mais precisamente o grande Geiser filosófico. Perguntem ao Sartre porque é que o homem está "condenado à liberdade" ou, por outro lado, a Foucault como é que um preso, um condenado (um "corpo domesticado") "explode em desejo obstinado de liberdade". Talvez tenhamos que indagar, num certo momento e algures se navegar à deriva é a melhor forma de navegar a imensidão oceânica do tema. Levaremos connosco, eventualmente, alguns destroços a partir dos quais construir uma canoa, uma jangada, um bote a que chamaremos a rir de Kit salva-vidas mas que assinalaremos no nosso mapa como PONTO DE PARTIDA, numa tentativa de nos mostrarmos sérios a rir.

III – O PONTO DE PARTIDA
O nosso ponto de partida não é um, são dois ("entre les deux mon coeur balance" - Toneká): o primeiro, mais axiomático e que se prende com a exploração do tema da liberdade na perspetiva de saber se o mundo que temos é resultado de um determinismo absoluto ou se há nele lugar para o livre arbítrio. O segundo de ordem mais concreta e subjetiva e que se prende com a nossa ação. A grande pergunta fundadora da ética e da moral que é diretamente sobre a liberdade é esta: O QUE (DEVO) FAZER? Esta é mais uma das intermináveis querelas filosóficas nas quais se confrontam aguerridos guerreiros de exércitos inimigos. Vamos colocar frente a frente, o exército epicurista e o exército estoico. Colocaremos também um exército de um homem só que andará pelos campos de batalha a causar incómodo às hostes estoicas e epicuristas porque andará teimosamente à procura do homem com uma candeia e a chamar a atenção para algumas evidências desconcertantes.


DESTROÇOS INICIAIS

TEXTO A
Pensar a ideia de criar uma sebenta da liberdade. O que pode conter uma tal sebenta? Imaginemos que foi este o pensamento que Deus pensou ao criar o mundo. Pensou primeiro em criar uma sebenta, um espaço branco e vazio circunscrito. Depois desenhou todas as coisas e criaturas como a criança desenha as árvores em frente de uma montanha com neve debaixo do sol que aquece os bigodes do gato ao mesmo tempo que faz escaldar as telhas do telhado e talvez aqueça também o pelo de algum macaco pendurado num galho de uma dessas árvores. Deus retorceu o nariz aos desenhos que tinha feito de tal maneira que poderíamos pensar que se sentia meio-enfurecido, meio-entediado com o que acabara de criar. Coisa que não terá acontecido uma vez que a perfeição divina é completa e não compatível com estados de fúria e de tédio. E, contudo, Deus começou a encher a sebenta de rabiscos, inúmeros rabiscos dispostos nas mais diversas direções e sentidos. As coisas e as criaturas que antes assumiam o primeiro plano, foram cobertas de riscos e rabiscos e resignaram-se a permanecer nos bastidores. Deus pegou nesses rabiscos e ao imaginar o que poderia fazer com eles criou os acontecimentos. Havia agora imensa animação dentro da sebenta que Deus criara. Todas as coisas se movimentavam, adquiriam novas formas, misturavam-se. Às vezes as criaturas desapareciam e depois de as procurar em todas as páginas da sebenta, Deus era obrigado a aceitar que não sabia mesmo onde se tinham metido. O facto é que, confuso ou não, a certa altura Deus fechou a sebenta com toda a determinação. Este gesto divino teve tantas consequências e é tão incompreensível… Uns pensam que Deus terá deixado o mundo à sua mercê porque acreditam que Deus pintou as criaturas com uma tinta especial que se chama livre-arbítrio e que só assim se compreende que tenha decidido fechar a sebenta para sempre. Já outros levam o ato divino de fechar a sebenta com determinação à letra. Ou seja, consideram que Deus só se poderia ter decido por fechar a sebenta uma vez após ter desenhado tudo, todas as criaturas e todas as coisas possíveis, todas as leis que as governam e todos os acontecimentos possíveis.

Há sábios que dizem que foi nesse momento que Deus criou duas outras sebentas: uma feita de ar e de céu e outra feita de fogo e metais pesados, onde desenhar as criaturas que teimavam em desaparecer da primeira de todas as sebentas. Não fora a perfeição divina, poder-se-ia auspiciar que Deus se sentia confuso com o que fizera.

TEXTO B























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