A Segurança Marítima no Atlântico: Uma Perspectiva do Sul Lusófono

July 24, 2017 | Autor: Andre Thomashausen | Categoria: Maritime Security, South Atlantic Defense and Security
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O MAR NO FUTURO DE PORTUGAL A

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CIENCIA E VISA O ESTRATEGICA 1

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Pedro Borges Graça e Tiago Martins (Coordenação) Aldino Santos de Campos, Alexandre Reis Rodrigues, Ana Colaço, André Thomashausen, António Carneiro Marques, J\ntónio Neves Correia, António Rebelo de Sousa, Charles Buchanan, Fernando Angelo, Fernando de Melo Gomes, Fernando Lobo Pereira, Gonçalo Magalhães Collaço, Jaime Ferreira da Silva, João Borges de Sousa, John Richardson, José Félix Ribeiro, Kanna Rajan, Luís Arsénio, Marisa Fernandes, Mark Spalding, Miguel Bessa Pacheco, Nuno Vieira Matias, Pedro Mamede, Raúl Bettencourt, Ricardo Serrão Santos, Susana Reis, Tiago Pitta e Cunha e Vítor Lopes Dias.

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A

CENTRO DE ESTUDOS ESTRATEGICOS DO ATLANTICO 2014

O MAR NO FUTURO DE PORTUGAL CIÊNCIA E VISÃO ESTRATÉGICA Pedro Borges Graça e Tiago Martins (Coordenação)

~

FCT

Fundação para a Ciência e a Tecnologia

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Portugal

LISBOA I

UNIVERSIDADE DE LISBOA

Publicação associada ao projecto financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia, "A Extensão da Plataforma Continental Portuguesa: Implicações Estratégicas para a Tomada de Decisão': (PTDC/CPJ-CPO/ 120926/20 I 0), em parceria com a Marinha Portuguesa e a Esri-Portugal, Sistemas de lnformação Geográfica, SA., no quadro do Centro de Administração e Políticas Públicas do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa, subsidiada pela Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento e pela Esri-Portugal.

FUNDAÇÃO

LUSO-AMERICANA Centro Estudos Estratégicos Atlântico

2014

Ficha Técnica Título: O Mar no Futuro de Portugal: Ciência e Visão Estratégica Edição: Centro de Estudos Estratégicos do Atlântico Coordenação: Pedro Borges Graça e Tiago Martins Impressão e Acabamento: Etigrafe, Lda. Tiragem: 1000 exemplares ISBN: 978-989-98982-0-2 Depósito Legal: 375678/14 Data de Edição: Junho de 2014 Capa: Reprodução repetida de uma das rosas-dos-ventos do chamado Planisfério de Cantina de 1502, cujo nome coevo é Carta Padrão do Rei, obtido clandestinamente em Lisboa pelo comerciante-espião italiano Alberto Cantina ao serviço do Duque de Ferrara. 4

ÍNDICE APRESENTAÇÃO .. .. .... .... ...... ... .. .... .. .... .... .. ...... ... ... .. ....... .. .. ... ..... ... .. .. ... .... .... .. .....

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KEYNOTE: PORTUGAL AND FUTURE OCEAN CHALLENGES .. .. ... ... .. .. ..... ..... .. ...... .. ... Charles Buchanan

11

A PERSPECTIVA DO CONHECIMENTO 1.

O CONHECIMENTO NA PROJECÇA-0 MARÍTIMA DE PORTUGAL ... .. .... Nuno Vieira Matias

15

2.

A GEOGRAFIA MARÍTIMA DE PORTUGAL .. .... .... ... .. ... ... .. ... .. .. ..... .... .. .. .. .. . Miguel Bessa Pacheco

25

3.

ECOSISTEMAS HIDROTERMAIS PROFUNDOS: FONTES PARA A BIOTECNOLOGIA .:................ ........................... .............. ................. ..... .. ....... Ricardo Serrão Santos, Ana Colaço e Raúl Bettencourt

37

MARINE ECOSYSTEM SERVICES, OCEAN NATURAL CAPITAL AND THE NEW BLUE ECONOMY FOR HUMAN WELLBEING ..................... ..... Tiago Pitta e Cunha

49

4.

5.

ON THE FUTURE OF OCEAN OBSERVATION ...... .. .. ..... ... .. ..... ..... ...... .... .. .. João Borges de Sousa e Fernando Lobo Pereira

6.

EVOLVING TRENDS IN MARINE ROBOTICS AND THE ROLE OF ARTIFICIAL INTELLIGENCE TECHNICS ....... ............... ............ ........ ..... Kanna Rajan

7.

CIBERSEGURANÇA E CONHECIMENTO SITUACIONAL MARÍTIMO ..... . António Gameiro Marques

57

67

77

5

O PAPEL DOS SISTEMAS DE INFORMAÇÃO GEOGIUFICA NO COSHECI.\!EYTO DO MAR ... .... .......... .. .... ...... .. ..... ............................... .. ....... \ ! to r Lopes Dias 9.

O CLUSTER DO CONHECIMENTO DO MAR EM PORTUGAL ... ..... ... ... .. .. Tiago Martins

87

97

A PERSPECTIVA DA ESTRATÉGIA I O. PORTUGAL, A EUROPA E O ATLÂNTICO... ... ....... .... .. ......... .. ...... ... ..... ... ...... Fernando de Melo Gomes

117

11. GEOPOLÍTICA DO ATLÂNTICO: A ACTUALIDADE DO TRIÂNGULO ESTRATÉGICO PORTUGUÊS ... ... ..... .. .... .... .. ..... ... ...... ... .. ... .... ..... ........ ... .. ..... Marisa Fernandes

123

12. DA SINGULARIDADE DE PORTUGAL A AFIRMAÇÃO DE UMA ESTRATÉGIA NACIONAL PARA O MAR ................. .......................... .... ... ..... Gonçalo Colaço

139

13. A PROSPECTIVA E A ESTRATÉGIA NACIONAL PARA O MAR. ....... ....... ..... Pedro Mamede

153

14. OS OCEANOS- REPOSICIONANDO PORTUGAL NA GLOBALIZAÇÃO... .. José Manuel Félix Ribeiro

163

15. OS FACTORES ESTRATÉGICOS DO MAR PORTUGUÊS ..... ..... ... ..... .... ... ... Jaime Ferreira da Silva

173

16. A RELEVÂNCIA GEOECONÓMICA DO ATLÂNTICO PARA PORTUGAL..... António Rebelo de Sousa

183

17. O PROCESSO DE EXTENSÃO DA PLATAFORMA CONTINENTAL ....... .. .. Aldino Santos de Campos

195

18. A EXTENSA-O DAS PLATAFORMAS CONTINENTAIS- TENSÕES CONFLITOS ......... ... ..... ................ ................................. .... ..... .. .. .. ..... ........ .. .. . António Neves Correia 19. A SEGURANÇA MARÍTIMA NO SÉC.XXI ...... .............. .. .. .. .. ... .. .................... Alexandre Reis Rodrigues

6

207

219

20. A SEGURANÇA MARiTIMA NO ATLÂNTICO: UMA PERSPECTIVA DO SUL L USÓFONO.... ...................... ............... .......... ........... .. .... ....... ........ ... . André Thomashausen

229

21. A RELAÇA-0 ESTRATÉGICA DO BRASIL COM O ESPAÇO LUSÓFONO ATLÂNTICO. ... ............................................ ........ ... ... .. .. .................................... Luís Arsénio

241

22. THE ROLE OF !NTELLIGENCE lN MAR ITIME SECURITY ..................... .. . Fernando Ângelo 23. AS ILHAS SELVAGENS: MANOBRAS ESPANHOLAS, AMEAÇAS E OPORTUNIDADES. .. ... ..... ......... .... ........................... ... ... .. .............................. .. Susana Reis 24. A NEW VOYAGE OF DISCOVERY: THE DEVELOPMENT OF INTEGRATED MARITIME POL!CY AS AN ELEMENT OF EU EXTERNA L POLICY.................. ........... ...................... ....................... .. .. ...... ..... John Richardson 25. LEADERSHIP STRATEGIES lN MAR!NE CONVERVATJON: THE ROLE OF PORTUGAL !N THE FUTURE OF TRANS-ATLANTJC COOPERATION WITH US ......................... ........ .............................................. Mark Spalding

251

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291

26. A EXTENSA-O DA PLATAFORMA CONTINENTAL: IMPLICAÇÕES ESTRATÉG!CAS PARA A TOMADA DE DECISA-0...................................... ... Pedro Borges Graça

301

ANEXO- SEMINIÍR/0 DO MAR...................................... ...... ....... .. ........... .. .

311

7

20. A SEGURANÇA MARÍTIMA NO ATLÂNTICO: UMA PERSPECTIVA DO SUL LUSÓFONO André Thomashausen Professor da University of South Africa. Director do Institute ofForeign and Compara tive Law. Consultor do Projecto.

Os Limites das Plataformas Continentais A segurança marítima é a preocupação central de todos que pretendem navegar ou utilizar de alguma forma os recursos marinhos, incluindo, evidentemente, os jazigos de recursos naturais nos subsolos das crostas continentais e plataformas continentais. O enquadramento jurídico universal encontra-se codificado na Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar de 1982. O preâmbulo da Convenção releva o aspecto da segurança ambiental dos oceanos, postulando "a utilização equitativa e eíiciente dos seus recursos, a conservação dos recursos vivos e o estudo, a protecção e a preservação do meio marinho". Desde logo, a génesis complicada da Convenção sobre o Direito do Mar ilustra a dificuldade do estabelecimento dum consenso universal sobre a conduta humana em relação aos oceanos. É graças à obra de Fernando Loureiro Bastos sobre a "Internacionalização dos Recursos Naturais Marinhos" (2005) que o mundo lusófono possui uma referência moderna e mestra sobre esta matéria. Tal como vem documentado e analisado no seu terceiro capítulo 1, a entrada em vigor da Convenção, em 1994, demorou 12 anos, após quase 10 anos de trabalhos preparativos assumidos por uma totalidade de 164 nações (de 1973 a 1982), e mesmo assim, essa entrada em vigor em 1994, só foi possível na base de um tratado complementar, sobre o condicionamento da aplicação do capitulo XI da Convenção sobre o Mar. Tendo em conta que o condicionamento das disposições do capítulo 1 F L Bastos, A Internacionalização dos Recursos Marinhos, Almedina (Lisboa) 2005, 194-204: ver também: F L Bastos, "The governance models for oceans and the United Nations Convention on the Law of the Sea", in: (20 12) 37 South Aji·ican Yearbook of fnternational Law- SAYJL , 110-130.

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XI (essencialmente sobre a exploração mineira dos solos marítimos do alto mar), tinha sido exigido pelos Estados Unidos, é espantoso que os deputados conservadores (republicanos) nos EUA continuam até à data corrente a bloquear a ratificação pelos EUA da Convenção. No entanto, a Convenção entrou em vigor universalmente (mas sem os EUA) em 16 de Novembro de 1994, tendo sido ratificada pela Guiné-Bissau a 25 de Agosto 1986, por São Tomé e Príncipe a 3 de Novembro 1987, por Angola a 5 de Dezembro 1990, e por Moçambique a 13 de Março 1997. O artigo 76 da Convenção sobre o Direito do Mar é a base legal para o alargamento sucessivo da zona que os estados costeiros podem excluir do regime (relativamente livre) do alto mar ou do mar internacional, sujeitando assim essas zonas, pelo menos parcialmente, à sua jurisdição nacional e aos seus direitos de utilização económica exclusiva. O elemento inovador deste artigo 76 é a garantia duma zona exclusiva económica de 200 milhas marítimas (equivalentes a 370 km) sem referência à extensão da plataforma continental, e para além dessa ZEE, uma opção dos estados costeiros de declararem uma extensão a partir da ZEE até ao extremo da margem continental, mas limitada a uma distância máxima de 350 milhas marítimas (648 km). O fundamento teórico désta disposição reside num conceito absolutista da ideia da soberania territorial, considerando-se a crosta continental um prolongamento natural do território terrestre, até a borda exterior da margem continental. A aplicação formal da ideia da territorialidade na base duma "continuação da terra" no mar sofre porém da omissão dum outro critério igualmente importante para a constituição da ideia do poder soberano do estado, nomeadamente a condição do domínio efectivo, como elemento constitutivo duma reclamação de soberania territorial. Este conceito é um dos mais antigos do direito internacional, determinando que a natureza de estado só pode reclamar quem exerce um domínio efectivo sobre um território claramente delimitado e sobre as populações que habitam nesse território definitivamente 2 . A reclamação duma extensão a partir da ZEE até ao limite máximo de 350 milhas marítimas é condicionada pelos poderes fiscalizadores e de verificação científica (mas não do ponto de vista legal) da Comissão de Limites da Plataforma Continental, estabelecida nos termos do artigo 76 (8) e do Anexo II à Convenção sobre o Direito do Mar. Os prazos estabelecidos para a reclamação duma extensão da ZEE foram prorrogados devido ao atraso na publicação das Directivas Cientificas e Técnicas da Comissão, que só a 13 de Maio de 1999 vieram a ser adoptadas. Questões complicadas de processo e de mérito surgem quando dois estados fazem reclamações conflituantes para a extensão das suas plataformas continentais, numa altura em que os limites da extensão da plataforma continental ainda não estão determinados 3 . Para que a reclamação de uma "zona económica exclusiva" ' Jorge Bacelar Gouveia, Manual de Direito In ternacional Público, 2 ed (Lisboa) 2005 , pp 430 com as demais referências. 3 Ver com referencias à jurisprudencia: A G Oude Elferink, "Commission on the Limits of the Continental Shelf', in: Wolfrum et ai, ed., Max Planck Encyc/opedia ofPublic International Law- MPEPJL , May 2007

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alargada (solo e subsolo) por Moçambique venha a ser confirmada pela Comissão de Limites, terá que haver uma resolução das reclamações potencialmente em conflito de Madagáscar, França, Ilhas Comores, Seychelles e Tanzânia4 • Felizmente, em relação a potenciais diferendos sobre o alargamento da plataforma moçambicana e sul-africana, prevalece um acordo tácito, baseado no que se pode referir como "costume bilateral"5 . Um outro desafio futuro reside no disposto do artigo 82 da Convenção sobre o Direito do Mar, segundo o qual o estado costeiro beneficiador de explorações mineiras na sua plataforma continental alargada deverá contribuir com uma taxa de compensação para a comunidade internacional. Angola submeteu a sua reclamação duma extensão a partir da ZEE conforme os limites da sua Plataforma Continental a 6 de Dezembro 2013 6 , com base no estudo preparado pela Comissão Interministerial para Delimitação e Demarcação dos Espaços Marítimos de Angola, constituída para o efeito 7 . A Comissão beneficiou de apoios técnicos decisivos da parte do Brasil e de Portugal, na base do Acordo de Cooperação de Defesa na Estratégia da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa de 201 O. A maior dificuldade consistiu na aplicação de apenas quatro linhas de base duas ao norte, em Luanda, e duas a sul, no Namibe -, que não correspondiam às exigências da Convenção sobre o Direito do Mar. A actualização foi demorada devido à carência de capacidade científica nacional. Moçambique solicitou já a 7 de Julho 201 O às Nações Unidas uma área adicional de 136 mil quilómetros quadrados 8, para estender a sua plataforma continental para um total de 676 mil quilómetros quadrados, tendo beneficiado de assistência técnica específica do Secretariado do Commonwealth, da Alemanha, África do Sul, França e Noruega. As submissões de Angola e Moçambique documentam a grande dificuldade e elevados custos de pesquisa e análise dos dados geomorfológicos requeridos para satisfazer os critérios do artigo 76 da Convenção sobre o Direito do Mar. As dificuldades técnico-científicas associadas ao alargamento da "zona económica exclusiva" explicam os atrasos no projecto de São Tomé e Príncipe. Está ainda 4

Elísio Benedito lamine, Maritime Boundaries Delimilation, Management and Dispute Resolution. Delimitation oj1he Mozambique Maritime Boundaries with Neighbouring Slates (Inc/uding the Extended Conlinenta/ Sh e/f) and the Managemenl of Ocean lssu es, United Nations (NY) 2007, 158 pp ; (http://www.un.org/depts/los/nippon!unnff_programme_home/fellows_pages/fellows_papers/jamine_0607 _mozambique.pdf). 5 Ver a contribuição fundamental de Miguel Gaivão Teles, "Costume bilateral em Direito Internacional Público" , in: O Direito , Ano 142, ." 2 - 20 I O, pp 353 -368 (http ://www.mlgts .pt/xms/files/ Publicacoes/ Artigos/20 l 0/Costume_bilateral_em_direito_internacional_publico.PDF, acesso 31 .03.0 14). 6 Ver listagem das submissões: https ://www.un.org/depts/Jos/clcs_new/commission_submissions.htm, acesso 3 I .03.014. Ver submissão de Angola : http s://www.un.org/depts/los/clcs_new/submissions_files/ ago69_2013/es_ago_en.pdf . 7 Ver Despacho Presidencial No I 06113, Diário da República I" Série 11 ° 211 de I de Novembro de 2013 (Pág. 3000); http ://www.scm.gov.ao/diploma_texto.php?diploma!D= 117987, acesso a 31.03.014. 8 lbid, nota 7 anterior. Ver a submi ssão de Moçambique aqui: https://www.un.org/depts/los/clcs_new/ submissions_ files/ moz52_l O/moz_20 1O_es.pdf, acesso 31.03.0 14.

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por ser apresentado no decorrer de 2014, havendo por enquanto unicamente as "informações preliminares" submetidas à Comissão dos Limites da Plataforma Continental9 . A plataforma continental das ilhas é relativamente pequena e dificil de determinar, devido à grande profundidade das águas que contornam as ilhas. Assim, o sucesso das eventuais reclamações de São Tomé e Príncipe mantêm-se em dúvida. O que se pode constatar no entanto é que Angola e Moçambique serão os dois gigantes da plataforma continental alargada, com superficies possíveis de 897.876 km 2 (Angola) e de 676.000 km 2 (Moçambique), equivalentes em superficies aos territórios nacionais do Paquistão e de Burma, respectivamente. A manutenção da segurança marítima nas dimensões reais dessas futuras "ZEEs" passará a ser uma responsabilidade nacional de Angola e Moçambique.

As 4 Componentes da Segurança Marítima A segurança marítima tem objectivos distintos que reflectem os usos e a funções estratégicas dos oceanos: 1. Em primeiro lugar, a segurança ambiental do planeta depende dos oceanos; não restando dúvidas científicas que os oceanos são mais decisivos do que qualquer outro factor para as alterações climáticas. 2. Em segundo lugar, a segurança alimentar da humanidade também depende, sem a menor dúvida científica, dos oceanos, especialmente no que diz respeito às proteínas. 3. Em terceiro lugar, a segurança económica global depende da viabilidade económica dos transportes marítimos, condição absoluta para atingir os objectivos do desenvolvimento humano e da globalização da Organização Mundial do Comércio (OMC) . Em quarto lugar, a segurança nacional marítima dos países litorais em África é determinante para a sobrevivência desses países como estados.

SEGURANÇA MARÍTIMA AMBIENTAL As vertentes do grande tema existencial da humanidade, a crise climática do planeta terra, foram muito recentemente actualizados e reconfirmadas no V Relatório do Grupo Intergovernamental de Especialistas sobre a Evolução Climática (IPCC) 10 . O consenso é universal de que o único impacto decisivo sobre 9

Ver as comunicações preliminares: http ://www.un.org/depts/los/clcs_ new/commission_preliminary.htm, acesso 31.03.014. 10 IPC C Fifth Assessment Report: Clim ate Change 2013 (ARS); C limate Change 2014: Impacts, Adaptation, and Vulnerabili ty - SUMMARY FOR POLICYMAK.ERS 3 1 March 2014; http://ipccwg2.gov/ AR5/images/uploads/IPCC_WG2AR5_SPM_ Approved.pdf; ver também http://www.wmo.int/ pages/themes/c1 i mate/in terna ti onal_i pcc. ph p; http :1/www. ipcc. eh/pu bl ic ati ons_and_data/pu bl ications _and_data_ reports .shtm1# I ; acesso a 31.03.0 14.

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o desenvolvimento e controlo do aumento do gás co2 resulta dos mecanismos transformadores inerentes à vida dos oceanos. Igualmente não restam dúvidas que a relativa desaceleração da subida das temperaturas durante as últimas duas décadas é devida à capacidade dos oceanos de absorver o co 2 e de transferir calor climático para as águas profundas dos mares. 11 Podemos assim constatar que a ecologia e a protecção ambiental dos oceanos constituem a mais importante vertente de segurança existencial da humanidade. É de esperar que esta realidade venha futuramente a inspirar mais vivamente as politicas, iniciativas e medidas destinadas à protecção do meio ambiente, por enquanto ainda mais viradas para os desafios existentes em terra, simplesmente por estarem mais presentes de que os riscos ecológicos dos oceanos 12 • O "Sul Lusófono" a que esta contribuição é dedicada, limita-se a Angola e Moçambique em termos geográficos estritos e pelo facto de serem estes os únicos países do Sul Lusófono que reivindicaram formalmente o alargamento das suas "zonas económicas exclusivas". Mas mesmo assim, para a consideração das componentes da segurança marítima acima anunciadas, podemos incluir São Tomé e Príncipe. Justifica-se a sua inclusão já pelo facto de a segurança marítima constituir o mais importante interesse em comum, partilhado por estes três países de expressão portuguesa. Cada um dos três países do Sul Lusófono dispõe de vastas dimensões costeiras mesmo em termos convencionais da delimitação das suas zonas económicas exclusivas: Angola com uma extensão costeira de 2,253 km e uma área da ZEE de 518,433 km 2 , e Moçambique com uma linha costeira de 2,470 km e uma área da ZEE de 578 ,986 km 2 , reúnem superficies marítimas enormes, considerando-se que só poucos navios de patrulha terão um alcance suficiente para percorrer a extensão norte sul duma ZEE com estas dimensões, sem reabastecer combustível, necessitando navegar em ve'locidade de ponta pelo menos 4 dias e noites contínuos. São Tomé e Príncipe conta com uma ZEE não alargada de 165,364 km2 . 13 A primeira conclusão a tirar destas características é de que cada um destes países corre um elevado risco ecológico, na eventualidade duma subida significativa dos níveis do mar, e em situações de agravamento das instabilidades temporais, provocando cheias, erosão e destruição de instalações costeiras. Podemos concluir que Angola, Moçambique e São Tomé e Príncipe deveriam manifestar mais activamente o seu interesse directo de colaborar nos trabalhos científicos sobre a preservação do equilíbrio climático e da ecologia dos oceanos. 13

Base de dados do " Sea Around Us Project": http ://www.seaaroundus.org/eez/, acesso 31.03.0 14. W D Nordhaus, " Why the Global Warming Skeptics are Wrong", in: The New York Review of Books, 22 Mar 2012, http://www.nybooks.com/articles/archives/20 12/mar/22/why-global-warming-skeptics-arewrong/?utm_medium=email&utm_campaign=February+ 28+ 20 12&utm_content=February+ 28+ 20 12+CJ D_ 195731 e375 1cf26ce0870891 a2cb4dba&utm_source=Email+marketing+software&utm_term=Why+th · e+G lobal+Warming+Skeptics+ Are+ Wrong, acesso 3 1.03 .O 14. 12 Doris Konig, "Marine Environment, lnternational Protection", in Wolfrum et ai , ed., Max Planck Encyclopedia. of Public Internationa/ Law- MPEP!L , April 2011. 11

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SEGURANÇA MARITIMA ALIMENTAR A captura de peixe segundo as estatísticas para 2011 da Organização Mundial da Alimentação (FAO) indicam os seguintes volumes totais 14 e ainda estimativas do abastecimento/consumo per capita para Angola, Moçambique, Guiné Bissau e São Tomé e Príncipe 15 Potencial de Captura

Captura nacional

Consumo médio por

por ano

realizada por ano

ano per capita

Ango la

700.000 16

213 500

15,7 kg

Moçambique

269.000 17

189 035

6,5 kg

São Tomé e Príncipe

8500 19

3900

28,2 kg

Podemos dar major ilustração a estas médias estatísticas, calculando que um cidadão Angolano consegue consumir um pouco menos que I ,3 kg de peixe por mês, um cidadão em Moçambique somente meio quilo, enquanto o são-tomense vive em relativa fartura de proteína marítima, tendo ao seu dispor quase 2 Yz kg de peixe por mês. Na realidade, unicamente o são-tomense tem uma refeição de peixe em cada semana garantida. O significado destas estatísticas para o desenvolvimento humano é ilustrado pela consideração, que pelas mesmas estatísticas, o consumo anual per capita em Portugal ficou registado com 56,5 kg, quer dizer quase 5 kg por mês por pessoa, ou quase exactamente o dobro do consumo em São Tomé, e perto de dez vezes o consume de cada Moçambicano. 14 FAO Yearbook oj' Fishery Statistics, 2011. Summary tables, World fisheries production, by capture and aquaculture, by country (20 I I), ftp ://ftp.fao.org/Fl/STAT/summary/a-Oa.pdf. 15 FAO Yearbook of Fishe1y Statistics, 2011. Summary tables, Appendix I - Fish and fishery products apparent consumption; ftp ://ftp.fao.org/FIISTAT/summary/applybc.pdf. Existe Ullla discrepância nas estatísticas para Moçambique, havendo várias fontes que indicam uma produção total annual inferior a 40.000 t. Estes dados porém exc lu em estimativas sobre o rendimento da pesca informal ou artese nal. Ver: http://www.mozpesca.gov. mz/images/estatistica.pdf; FAO, Smu'Ce bookfor the in/and jishe1y resow'Ces of Ajhca ... , Countly fi le Mozambiqu e; http://www.fao.org/docrep/005/T0473E/T0473E06.htm#ch 12 e também: República de Moçambique, Ministério das Pescas, Balanço da Campanha de Pesca - 201 I , p. 20, http://www.adnap.gov.mz/images/documentos/outros/balanco_campanha_pesca_20 ll.pdf, acesso 3 1.03.0 14. 16 FAO's Fishery Country Profile for Angola(2007) ; http ://www.fao.org/f ishery/facp /AG O/en# CountrySector-Overview and ftp: //ftp.fao.org/F!/DOCUMENT/fcp/en/Fl_CP_ AO.pdf, acesso 31.03.014. 17 Chifre do Ministério da Pesca, " Table I - Potential for fisheries and aquacu lture", http://www.mozpesca.gov.mz/index.php/en/economies-and-policies/economic-analysis, acesso 31.03 .O 14. 18 República da Guiné-Bissau, Ministério de Desenvolvimento Rural e Agricultura, Recursos Naturais e Ambiente, Estratégia e Plano de Acção para a Biodiversidade na Guiné-Bissau, 1997; p.29-30; http://www.didinho.org/PLANODEACCAOPARAABIODIVERSIDADENAGUINEB!SSAU.pdf, acesso 31 .03 .0 14. 19 Mé-Chinhô Costa Alegre, Towards a National Ocean Policy in Sao Tome and Príncipe, UN (New York) 2009, P 7; http ://www. un.org/depts/los/nippon/unnff_programme_ home/fe llows_pages/ fellow s_ papers/costa-alegre_0910_sao-tome-principe.pdf, acesso 31.03.0 14.

234

Um Sul-Africano, por comparação só chega a consumir 5.7 kg por ano, ligeiramente menos que um Moçambicano. No entanto, a Africa do Sul produz a sua alimentação proteína em indústrias bovinas e galinheiras altamente desenvolvidas, que na realidade continuam insignificantes nos países do Sul de expressão Portuguesa. Indústrias essa que faltam em Moçambique. As estatísticas servem para ilustrar o impacto e a importância fundamental da segurança marítima. Com uma zona económica exclusiva bem administrada e protegida, e uma indústria da pesca desenvolvida, Portugal atinge uma produção pesqueira I O vezes superior à produção de Moçambique, e 312 superior à de Angola, ou quase 25 vezes superior à produção de São Tomé. Os dados demonstram que em cada um destes três países, a pesca está longe de atingir o seu potencial, mas mesmo assim existem indicações de exploração excessiva e esgotamento dos recursos. No caso de Angola, a dimensão total do recurso era estimada em perto de 700.000 toneladas em 1970, tendo baixado para uma estimativa de 370.000 t correntemente20 . A mais provável explicação é a actividade pesqueira ilegal que nunca deixou de ser conduzida agressivamente nos mares da Africa ocidental e oriental, especialmente por empresas de pesca industrial da ásia mas também da Europa, com destaque para empresas oriundos da Espanha. O relatório "Review of Impacts of Illegal, Unreported and Unregulated Fishing on Developing Countries" conclui que em 2005 , só na ZEE de Angola, um mínimo de 72.000 t anuais de captura foram perdidos às actividades ilegais e de pilhagem dos recursos pesqueiros 21 . Neste contexto muito pouco adiantou o contencioso amargo sobre direitos de pesca marítima entre a União Europeia e Angola, nem se podem considerar positivos os acordos de pesca praticados pela UE com os pequenos países Africanos. No caso de Moçambique, por exemplo, um Acordo de Pesca do Atum prevê uma "contribuição financeira" da UE de 980.000 Euros (alem de pequenos pagamentos de licença para as embarcaç'ões), para um volume anual de 8000 toneladas de capturas de atum 22 . No caso de São Tomé e Príncipe, o Acordo de Parceria no Domínio da Pesca da UE de 2006 prevê "contribuições financeiras" da UE de 682.500 Euros por ano, em compensação para a pesca de 7000 toneladas de atum por ano, alem de pequenas taxas para o licenciamento das embarcações 23 . Assim o "preço base" da UE por tonelada de atum pescado em Moçambique é de 112,50 Euros por tonelada, e nas águas de São Tomé de 97,50 Euros, quer dizer um valor derisório inferior a um Euro por kg de Atum. Desta forma, toda a mais-valia da pesca do atum é acumulada fora da economia do país de origem. 20

A. Thomashausen, " ANGOLAN MARITIME SECU RJTY", in: 2008 (No 2) Revista de Ciências Sociais e Políticas, pp 7 - 32 (18); FAO's Fishery Country Profile for Angola (2007), p 3; http://www.fao.org

/fishery/facp/AGO/en#CountrySector-Overview and ftp ://ftp.fao.org/Fl/DOCUMENT/fcp/en/Fl_CP_AO.pdf, acesso 31.03 .0 14. 21 Review of lmpacts oflllegal, Unreported and Unregulated Fishing on Developing Countries. SYNTHESIS REPORT, July 2005. Marine Resources Assessment Group Ltd. London, UK; A Thomashausen, supra (n 21), pp 30-31 , http://www.imcsnet.org/imcs/docs!iuu_ f ishing_synthesis_report_rnrag.pdf, acesso 31 .03 .0 14. 22 http://ec.europa.eu/fisheries/cfp!intemational/agreements/mozambique/index_pt.htm, acesso 31 .03.0 14. 23 http://ec.europa.eu/fisheries/cfp/international/agreements/sao_tome/index_pt.htm, acesso 31.03.0 14.

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O argumento em defesa destas contribuições financeiras modestas dirão que assim pelo menos existe um sector legal e declarado de embarcações de pesca europeias, o que é um melhoramento em relação à pesca ilegal que não contribui em nada. Infelizmente, este tipo de raciocínio sustenta uma atitude passiva das pequenas e fracas elites políticas nos países assim explorados. Em vez duma prática de verdadeira parceria industrial, em que uma indústria nacional de pesca deveria ser desenvolvida e continuamente reforçada, são encorajados estes os governos em "arrendarem" o aproveitamento dos recursos a industrias estrangeiras, na base de pequenas receitas de "renda" que só servem para a alimentação dos governantes e administradores assim "comprados". Mesmo assim, o impacto da pesca para o emprego em Angola, Moçambique e São Tomé é fundamental para a sustentabilidade desses países. No caso de Angola, estima-se um total de 235.000 trabalhadores empregados nos sectores primários e secundários da pesca com tendência crescente 24 . Porém, segundo os dados da FAO, deve estimar-se que na realidade metade da população de Angola depende para a sua sobrevivência das actividades e industrias pesqueiras 25 • Para Moçambique, a estimativa incluindo o sector informal situa-se nos 350.000 26 , e para São Tomé e Príncipe facilmente se pode estimar· que a actividade pesqueira é a actividade industrial principal. De entre vários acordos multi e bilaterais de que todos os três países são membros27, é de salientar o Protocolo das Pescas da Southern African Development Cooperation (SADC), em vigor desde 8 de Agosto de 2003 , de que são membros Angola e Moçambique 28• O protocolo vincula os países membros a desenvolver activamente o sector da pesca, na base da sustentabilidade e da cooperação regional. O protocolo e os trabalhos incentivados na base do protocolo, tal como o estabelecimento em 2010 dum Centro Operativo Regional para o Combate da Pesca IlegaJ29, delineiam a estratégia para um maior reforço da segurança marítima alimentar. Esta estratégia tentará ultrapassar a escassez dos recursos das pequenas marinhas de guerra dos SADC através da cooperação e integração de medidas de formação, manutenção de equipamentos, logística, recolha de informações e inte-

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FAO, Fisheries and Aquaculture Statistics 20 li, p 18; http://www. fao .org/docrep/0 19/i3507t/i3507t.pdf, acesso 31.03.014. 25 FAO, Fishery Country Profile for Angola(2007), p. 8; ftp: //ftp.fao.org/ Fl/DOCUMENT/fcp /en/ FI_CP_AO.pdf, acesso 31.03.014. 26 Ministry of Fisheries Mozambique, A Management Plan Proposa/ for the Marine Linefishery of Mozambique, May 2013, p 8: http://www.adnap.gov.mz/documentos/plano/PG_Peixe%20_1inha20 13.pdf, acesso 31-03 -014. 27 Ver listagem: http://ec.europa.eu/ fisheries/documentation/publications/cfp_factsheets/rfmo_pt.pdf, acesso 31.03.014. 28 O texto oficial em Português está disponível aqui: http://faolex.fao.org/docs/pdf/moz50050.pdf ; ver também: http ://www.sadc. int/documents-publications/show/Protocol_on_F isheries200 I. pdf#, acesso 31.03.0 14. 29 Na base da declaração de Windhoek de 4 de Julho 2008, ver: http ://www.commonwealthfisheries.org/ admin/downloads/docs/SADC%20Statement%20of%20 Commitment%20on%20IUU%20Fishing %20040708.pdf, acesso 31.03.0 14.

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ligência marítima, e interacção coordenada com outras organizações internacionais e países industrializados. Existem grandes expectativas em relação ao papel da Africa do Sul nesta cooperação a nível da SADC. Porém, as conhecidas limitações dos recursos financeiros, matérias e humanos naAfrica do Sul vão continuar a encorajar a cooperação marítima de Angola e de Moçambique com Portugal e com o Brasil.

SEGURANÇA MARÍTIMA ECONÓMICA A segurança marítima económica poderia enquadrar a segurança marítima alimentar, mas convém distingui-la pelas características e desafios bem diferentes das actividades de exploração de recursos mineiros e especialmente dos hidrocarbonatos. Dos quatro países aqui considerados, é evidentemente Angola o pais com a indústria de exploração de hidrocarbonatos na ZEE mais desenvolvida. Com uma produção de perto de 2 milhões de barris por dia, Angola é o terceiro maior produtor de petróleo em Africa e o 6. 0 maior exportador deste produto para os EUA. O estado angolano depende em 90% das suas receitas da indústria do petróleo que contribui com metade ao produto bruto interno do país. Praticamente 100% da produção é situada no mar com 65% no mar profundo e ultra-profundo, acumulando enormes valores de capital investido, para além dum total de 20.000 milhões de dólares3°. É evidente que os enormes valores económicos das plataformas de produção e igualmente das plataformas de exploração, mas também os próprios jazigos, constituem desafios à segurança marítima económica. Com o futuro alargamento da "ZEE" para uma dimensão quase dupla, as exigências colocadas à segurança marítima económica serão ainda maiores e mais dificeis a satisfazer. Embora menos desenvolvidos, os recursos de hidrocarbonatos na ZEE de Moçambique são praticamente de igual importância. Pelas pesquisas recentes e desde as primeiras descobertas em 2011, as estimativas dos volumes de gás natural presentes em jazigos na bacia do Rovuma foram repetidamente acrescentados, com a actual indicação de reservas mínimas de 100 triliões de pés cúbicos ( 100 tcf) 31. Com estas reservas, valorizadas em 350 mil milhões de dólares Americanos aos preços de energia correntes, Mozambique dentro de poucos anos ocupará o 9. 0 ou 10. 0 lugar dos países produtores de gás natural. Tal como em Angola, a produção será inteiramente situada no offshore da ZEE, fincando a instalação chave do terminal de liquefacção de gás natural igualmente exposta ao mar. O orçamento estimativo para esta instalação ronda em 20 mil milhões de dólares. 30

A Thomashausen, supra (n 21 ), pp 11-13 com as demais referências. "Gas Reserves at Mozambique field scaled up", The Economic Times, 2 April2014, http ://articles.economictimes.indiatimes.com/20 14-03-12/news/48154514_ 1_rovuma-growing-indian-gas-market-lng-project, acesso 02-04-0 14; SPTEC Advisory, 2012 Couni!J' Review Mozambique- The Emergence of a Giam in Natura l Gas, http ://www.sptec-advisory.com/SPTEC_Advisory-Mozambique-The_ Emergen e _of_a_giant_in_Natural_Gas.pdf, acesso 31.03.0 14. 31

São Tomé também é um país dotado de enormes reservas de hidrocarbonatos na sua ZEE, estimados em 11 mil milhões de barris, parcialmente situados numa zona de exploração partilhada com a Nigéria 32 . Os trabalhos de exploração no decorrer das últimas duas décadas têm sido lentos, devido aos elevados custos de exploração em águas ultra profundas, mas também devido à percepção dos elevados riscos políticos do investimento em São Tomé e na zona conjunta entre São Tomé e a Nigéria. O que não está em dúvida, é o desafio à segurança marítima económica numa ZEE, a partir do início da primeira produção petrolífera, prevista para o ano 2016. A pirataria que se poderia referir como "artesanal" tem vindo a afectar plataformas de exploração e de produção na ZEE Angolana, onde pequenas incursões de noite têm conseguido roubar equipamentos tal como pequenas unidades geradoras. No entanto existe um risco assustador da ocorrência de danos incalculáveis na eventualidade de o controlo sobre uma plataforma ser assumido por um grupo de invasores dedicados à pirataria, ou pior ainda, agindo com objectivos terroristas.

SEGURANÇA NACIONAL MARÍTIMA A segurança nacional marítima deve proteger os transportes marítimos e a integridade das fronteiras marítimas e costeiras do território nacional bem como garantir a viabilidade das indústrias pesqueiras e de exploração dos recursos naturais. A segurança dos transportes marítimos tem uma prioridade imediata. Devido à deficiência e falta de meios de transporte terreste, dependem dos transportes marítimos acima de 90% dos volumes das importações e exportações do continente Africano 33 • Mesmo pequenos aumentos no custo dos transportes, têm um impacto negativo nas economias frágeis do continente Africano. O crescimento dramático da pirataria na costa da África Oriental com até a data mais de 120 nav ios sequestrados e acima de 250 milhões de dólares americanos pagos para salvaguardar embarcações, carga e a vida das tripulações, tem tido um impacto altamente prejudicial para as economias dependentes dos transportes marítimos. Provocaram também uma alta enorme dos custos dos seguros (com uma subida das tarifas por um factor multiplicador de 40), e das medidas de segurança introduzidas pelos armadores, bem como das intervenções das marinhas de guerra de vários países que estão a contribuir para a segurança marítima da Africa oriental , na base das resoluções do Conselho de Segurança das Nações Unidas Nos 1838 e 1851 de 2008. 32

African Development Fund - AfDB , Selo Tomé and Príncipe- Maximizing Oil Wea/th f or Equitab/e Growth and Sustainable Socio-Economic Deve/opm ent, 20 13 ; http ://www.afdb.org/fileadmin/uploads/ afdb/ Docume nts/Proj ect-a nd-Opera tion s/Sao%20Tome%20and %20Princip e%2 0-% 20Max imi zing %20oil %20wealth%20for"lo20equitable%20growth%20and%20sustainable%20socio-economic%20development.pdf, acesso 3 1-.03 .01 4. 33 The Brenthurst Foundation, Marilime Deve/opment in Afi'iat, Discussion Paper 2010/03 (with contributions from Rear Admirai Steve Stead, Knox Chitiyo, Cpt Johan Potgieter and Geoffrey Til!. Johannesburg 2010, p. 5.

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A ausência de forças navais com capacidade real de intervenção em todos os estados costeiros africanos, é uma realidade amplamente documentada 34 . A única excepção (embora relativa) é a Africa do Sul, mas a sua capacidade naval continua limitada e parcialmente incapacitada, e tem pouca relevância para as ZEE de Angola e de Moçambique, situadas numa distância de mais 2000 milhas náuticas das bases navais da Africa do Sul. A prática da aplicação da jurisdição penal do estado costeiro na sua ZEE, em condições de falta de capacidade de intervenção naval, provoca uma realidade contra produtiva em que a actividade criminosa de piratas e possíveis terroristas se pode desencadear em relativa liberdade dentro das ZEEs. Esse efeito não foi intencionado pelas regras da Convenção sobre o Direito do Mar35 , mas no caso dos países do Sul Lusófono vai agravar-se sensivelmente quando começarem a vigorar os alargamentos das "ZEEs". Os organismos e as competências internacionais criados para o combate da pirataria baseiam-se na Convenção Internacional para a Salvaguarda da Vida Humana no Mar (SOLAS) de 1974 (com as alterações introduzidas em 2003) e da Convenção para a Supressão de Actos Ilícitos contra a Segurança da Navegação Marítima (SUA) de 1988 (com a alterações introduzidas em 2005). Porém a eficácia das medidas previstas nestas convenções depende muito da capacidade de reacção e cooperação dos estados costeiros 36 . Para Angola, Moçambique e São Tomé é urgente a integração e plena participação nos procedimentos e processos estabelecidos na base das convenções SOLAS e SUA. Evidentemente que a fiscalização das actividades pesqueiras e igualmente da exploração dos recursos naturais na ZEE compete ao estado costeiro. Porém, na ausência de meios navais minimamente adequados, esta postulação de soberania do estado costeiro simplesmente provocará um esvaziamento do ordenamento. O afastamento da aplicação do direito internacional e do direito do (alto) mar da ZEE e da "ZEE alargada"; sem que haja capacidade suficiente para a imposição efectiva das leis nacionais, vai provocar uma situação em que vastas zonas marítimas ficarão isentas de qualquer tipo de regulamento. Considerando as exigências urgentes da realização da segurança marítima nacional nas ZEE e futuramente nas "ZEE alargadas", dentro do enquadramento real da ausência de meios navais e de fiscalização costeira, os países do "Sul Lusófono" devem considerar adotar uma atitude mais ofensiva em relação às estratégias de segurança marítima. Uma iniciativa para o reposicionamento da estratégia de segurança marítima pode encontrar um ponto de partida na recente formulação em 20 13 pelo estado português da sua Estratégia Nacional para o Mar. De modo semelhante, os países do Sul Lusófono, que têm em comum a realidade duma indústria pesqueira nacio34

Ver para Angola: A Thomashausen, supra (n 2 1), pp 21-22. Dolliver Nelson, "Exclu sive Economic Zone", in: Wolfrum et ai, ed., Max Planck Encyc!apedia of Pub!ic ln temational Law- MPEPJL , March 2008, par. 86 et seq. 36 Craig Forres!, "The balancing of maritime interests in the Southern African oceans in li ght of the new international maritime security regime", in XLI CJLSA 2008, pp 1-23 (9 -15). 35

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na] subdesenvolvida, potencialidades enormes de exploração de recursos naturais nas ZEE, e a escassez dramática de capacidades de fiscalização e intervenção naval, poderiam considerar criar um processo destinado ao desenvolvimento e à definição duma Estratégia Marítima Comum de Angola, Moçambique e São Tomé e Príncipe. A perspectiva duma estratégia partilhada e integrada poderia favorecer a optimização de recursos financeiros e humanos, criando melhores oportunidades de formação, estudo e integração de informações e inteligência marítima37 . Os grandes temas para a Estratégia Marítima Comum poderiam ser: • Actualização e harmonização das leis e regulamentos marítimos com especial relevo para a cooperação nos termos das Convenções e SOLAS e SUA. • A concepção e priorização de processos de escolha e definição de equipamentos navais capazes de serem integrados, utilizados e mantidos regionalmente e de características de preferência uniformes. • A elaboração para a capacitação e formação integrada de forças de patrulha costeira e do policiamento marítimo . • A integração das forças navais nos esforços de defesa e de intervenção regionais da SADC. • Os processos de partilha e eventual integração e a institucionalização da cooperação referente às informações e à inteligência marítima. • Plano de preparação das forças navais para a prestação de socorros marítimos e de resposta em casos de calamidades ambientais. • Criação dum Centro de Estudos das Plataformas Continentais Alargadas para o eventual aproveitamento dos recursos que virão a ser acessíveis em consequência do alargamento. • Promoção duma "Cultura do Mar" com vista à integração prioritária do desenvolvimento das indústrias pesqueiras nacionais nos planos de desenvolvimento. Uma Estratégia Marítima Comum dos países do "Sul Lusófono" apresentase como a estratégia mais adequada para a estabilização económica, social e politica e para o desenvolvimento.

37 Ver Pedro Borges Graça, Por um Sistema de Informações Estratégicas Marítimas, in: AAVV, ] 0 Simpósio das Marinhas dos Países de Língua Portuguesa, Cadernos Navai s, n° 26, Grupo de Estudos e Reflexão Estratégica I Edições Culturais da Marinh a, pp. 131 - 13 8.

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