A Subjetividade em Slavoj Žižek: perspectivas para a psicologia social crítica

June 30, 2017 | Autor: A. Rodrigues de M... | Categoria: Psicanáliese E Psicologia Social, Subjectivity, Filosofia
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Amom Rodrigues de Morais





A Subjetividade na filosofia e psicanálise de Slavoj Žižek: perspectivas para a psicologia social crítica






Pré-Projeto de Pesquisa apresentado ao Programa de Estudos Pós-graduados em Psicologia: Psicologia Social, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), como um dos requisitos da seleção para ingresso no Mestrado em Psicologia: Psicologia Social, Núcleo: NUPS – Psicologia e Sociedade.









São Paulo, 2013.
INTRODUÇÃO

O presente texto se propõe a ter como objeto de investigação as noções da categoria de subjetividade recorrentes na vasta obra do filósofo e psicanalista Slavoj Žižek. A obra desse autor apresenta, de modo geral, uma reflexão sobre a lógica cultural do capitalismo globalizante e ela desse modo, tem se constituindo como referência na contemporaneidade para o pensamento da filosofia política, da crítica cultural e de vários aspectos que perpassam hoje as ciências humanas. Sendo assim, o presente trabalho pretende indagar quais as possíveis contribuições advindas da filosofia e da psicanálise lacaniana para o conceito de sujeito e de subjetividade presentes em vários momentos na obra de Žižek.
Tendo em vista que a categoria de subjetividade faz parte das bases epistemológicas da psicologia e de modo mais específico da psicologia social, propor uma reflexão das possíveis contribuições da filosofia e da psicanálise para o pensamento social crítico é ao mesmo tempo problematizar a definição conceitual de subjetividade e abrir perspectivas teóricas que auxiliem nos impasses que a psicologia enfrenta na compreensão dessa dimensão subjetiva do sujeito na atualidade.
É pertinente aqui expor sucintamente a contextualização da definição do objeto de estudo do presente texto. A ciência psicológica como sabemos, ao longo da história tem tentado buscar delimitar seu objeto de estudo. Entretanto, o que se observou, foi que no decorrer de cada investigação em busca do tal objeto, apoiada por uma dada orientação epistemológica e influenciada por outros saberes e práticas, surgia uma nova abordagem em psicologia, de tal modo que atualmente ensina-se nas formações acadêmicas várias psicologias. Em toda essa busca pelo objeto de estudo a psicologia, nas suas diversas ênfases, partiu do pressuposto de uma ontologia positiva, ou melhor, substancial, o que significa: qualquer que fosse o fenômeno prioritário a ser estudado, este seria portador de uma substancialidade de qualquer natureza, seja ela fosse material ou imaterial.
Nesse sentido, poderia emergir dois tipos de conhecimentos, um de base concreta, logo, conhecimento objetivo; e um outro, que seria de ordem subjetiva pois seu acesso implicaria o sentir ou pensar. Por conseguinte, desse tipo de ontologia resultou várias dicotomias como: material/imaterial, interno/externo, objetivo/subjetivo, etc. (Oliveira, s/d). Em função desses impasses de dicotomias, determinadas psicologias ora eram condenadas por externalismo, objetivismo ou mecanicismo, ora eram ao contrário, condenadas por subjetivismo ou internalismo.
Por sua vez, a subjetividade se tornou também refém de uma ontologia substancial, de forma que mesmo sendo considerada de natureza objetiva ou subjetiva ela deveria ser encontrada no espaço, num lugar que obviamente seria no interior do sujeito. Ademais, além de substancial a subjetividade ainda era concebida por muitas abordagens como estática. E por mais que houveram tentativas de superação desses limites epistemológicos, ao exemplo da metodologia materialista dialética utilizada através da psicologia social latina americana, ainda se observa em algumas teorias a herança do positivismo objetivista que pode ser ilustrado pela psicologia quantitativa incorporada nos testes psicométricos ou na mensuração de "aspectos" dessa subjetividade como inteligência, personalidade ou comportamento (Oliveira, s/d).
Como podemos observar, ao refletirmos de modo sintético os pressupostos ontológicos e epistemológicos que estruturaram as psicologias no estudo da subjetividade historicamente, encontramos a presença de muitas lacunas através das dicotomias e das limitações teóricas de modo geral, algo que implicará é claro, na reduzida possibilidade de intervenção da prática profissional diante dos muitos desafios impostos pelo sujeito moderno. Talvez nossa ciência aqui necessite de uma certa "moratória", ou seja, como bem adverte Dunker (2002): "um espaço e um tempo para dialogar consigo mesma, para se interrogar e, assim, encontrar saídas na grande transitoriedade que caracteriza o fluxo das demandas humanas".
Além do mais, é uma reflexão das bases teóricas (onde se coloca em xeque seus dispositivos conceituais) da categoria de subjetividade tão utilizada no discurso psicológico que possibilitará a emergência de propostas mais amplas, aprofundadas e que dê conta dos desafios das transformações nos modos de subjetivação pelo qual passa o sujeito do capitalismo na contemporaneidade, no sentido de proporcionar um maior diálogo com a filosofia, com a psicanálise, com os estudos culturais e as questões atuais no plano da política, da economia e da sociedade, diálogo, o qual, Žižek nos oferece em seus escritos.
É desse modo, que na sequência será exposta uma proposta no intuito de contribuir (conceitualmente e ontologicamente) para um maior e mais amplo entendimento da subjetividade. Para tanto, se faz relevante uma maior descrição a respeito da necessidade e justificativa de uma proposta de reflexão da categoria subjetividade, através de uma explanação da atual conjuntura de nosso tempo histórico-social, ao lado de um sucinto esboço dos principais aspectos a serem explorados na teoria filosófica e psicanalítica contidos no pensamento de Žižek.
Antes de mais nada, é imprescindível versar a respeito dos pressupostos teóricos na obra de Slavoj Žižek, uma breve apresentação do autor é de suma importância para nos situarmos perante o seus pressupostos teóricos e seu contexto intelectual. Nascido na Eslovênia, Slavoj Žižek tem se destacado nos últimos anos no cenário intelectual como uma grande referência nas reflexões críticas do nosso tempo atual, abordando diversos temas, muitos aparentemente distantes, no entanto o filósofo esloveno transita por temas ligados desde à ontologia, filosofia da ciência, filosofia política, crítica da ideologia, ética, globalização, espaço cibernético, estudos sobre cinema, música, literatura, cognitivismo, teologia, dentre outros. Tudo isso é possível em apenas um pensador, pois o mesmo tem como base fundamental de referência a filosofia idealista e a dialética especulativa de Hegel no qual o "o espírito é um osso", e um diálogo constante com outros idealistas alemães, além da psicanálise lacaniana e o marxismo. Este último que lhe oferece bases para uma "paixão" por um certo heterodoxo materialismo (talvez uma combinação de um estruturalismo formalista aplicado à concretude das práticas sociais).
Por essas vias o filósofo consegue articular vários temas com uma ampla gama de recursos teóricos e conceituais. Essas são as três principais fontes teóricas da qual o filósofo esloveno parte na sua elaboração conceitual e crítica, sempre em diálogo com outros pensadores de peso como Heidegger, Derrida, Deleuze, Foucault, Agamben, Alain Badiou e outros. No que concerne ao seu estilo literário, Žižek se destaca por aproximar temas da filosofia, psicanálise e marxismo da cultura popular, tornando seu pensamento atraente e um pouco mais claro e dinâmico do que os muitos textos herméticos sistemáticos da academia.
Considerando a extensa obra e a diversidade de temas abordados em seus livros, investigar as noções e perspectivas da subjetividade em Žižek se torna um desafio, que exige priorizar o ponto de partida da qual ele concebe o sujeito e a subjetividade, qual seja o pensamento lacaniano e a filosofia de Hegel. Essas duas referências oferecem dois conceitos básicos. Do hegelianismo a ideia de negatividade absoluta referida a ela mesma, da psicanálise a noção de pulsão de morte. Nas palavras do próprio Žižek:
Isso está bem no centro do que faço em linhas gerais. Minha tese básica é que o traço central da subjetividade no idealismo alemão – essa ideia dessubstanciada da subjetividade como uma lacuna na ordem do ser – é compatível com a ideia do "objeto pequeno a", que todos sabemos, é uma falta para Lacan (Žižek e Daly, p. 79. 2004).

Focar no nosso "objeto" de estudo, requer saber que a subjetividade irá aparecer como tema não só quando vier à tona seu significante, mas também quando a temática de reflexão estiver em interface com outros aspectos, seja do campo da filosofia abstrata, seja da ordem das práticas sociais ou políticas, isto é, a atenção deve estar voltada para a totalidade abrangente das análises filosóficas ou de conjuntura, em que podemos encontrar a possibilidade das implicações teóricas de seus conceitos para o pensamento psicológico crítico.
Ainda sobre os pressupostos teóricos de Žižek, é interessante destacar o porquê da sua opção por Lacan, ou pela sua escola de psicanálise. Segundo o autor, a teoria de Lacan torna-se interessante e chamativa por seu teor filosófico. Nesse sentido a psicanálise não seria considerada uma técnica de tratamento de distúrbios psíquicos, mas uma teoria e prática que põe os indivíduos confrontados com a dimensão mais radical da existência (Žižek, 2006,). Longe de ser uma atividade que procura ajustar o sujeito às demandas da "realidade" social, a psicanálise procuraria mostra ao sujeito como essa realidade se constitui. Daí podemos já observar as interrogações do estatuto ontológico que a psicanálise nos proporciona, se constituindo, ao meu ver, uma prática que pode ser muito subversiva, do ponto de vista individual ou mesmo social.
Talvez seja por aí uma das motivações que nos lançam a um possível retorno do diálogo constante e permanente das ciências humanas, de modo especial da psicologia interessada nas questões sociais, com a filosofia, de forma a expandir cada vez mais os conceitos, afim de, alcançarmos uma maior compreensão da nossa realidade humana e social na contemporaneidade.
Abre-se, portanto na sequência um espaço para propormos uma articulação sucinta dos processos de desenvolvimento das forças de produção no capitalismo atual, de modo a abarcar as configurações da atual lógica de dominação do capital, e as formas de organização do trabalho nesse novo cenário com os modos e normas de socialização e portanto, de "subjetivação". Essa tentativa nos serviria como exemplo para compararmos uma tradicional análise da subjetividade, no caso relacionado ao trabalho, com uma possível ampliação do conceito a partir da filosofia de Žižek, e por conseguinte, poder verificar as possiblidades de diálogo, interface ou implicações entre uma subjetividade psicológica, tradicionalmente concebida e a subjetividade compreendida pela psicanálise lacaniana.
Nessa tentativa de aproximar a análise psicológica da subjetividade e a análise do sistema econômico, observa-se que nas relações entre sociabilidade, trabalho e linguagem, mais um elemento de mediação necessita ser incluído, a saber, a ideologia, a qual, articula contraditoriamente a lógica necessária de expansão do Capital ( que é uma relação social) e os modos do ser subjetivo na vida, expressos nos hábitos, comportamentos, valores e padrões de relações afetivas.
Seguindo tal abordagem, é pertinente, primeiro desenvolver uma tentativa de descrever sinteticamente e bem a grosso modo, o cenário contemporâneo do mundo do trabalho. Segundo Harvey (1992, p. 138) vivemos no atual contexto àquilo que foi denominado como reestruturação produtiva, iniciado por volta da década de 70, com as revoluções técnico informacionais instaurando um novo modo de acumulação produtiva, a acumulação flexível.
Esse regime de acumulação flexível tem um impulso enorme a debilitar o mundo do trabalho, promovendo alterações importantes na objetividade (e subjetividade) da classe de trabalhadores assalariados. (Alves, 2011, p.12). As novas condições do novo complexo de reestruturação produtiva são as inovações tecnológicas e sociometabólicas e as inovações organizacionais. As estas inovações organizacionais atribui a influência da emergência do toyotismo que permeia o novo complexo de reestruturação produtiva do capital. E essas inovações organizacionais possuem um nexo essencial com a subjetividade do novo trabalhador moldado pelo toyotismo.
Por essa sucinta descrição em relação às transformações no mundo organizacional, constata-se que a ideia de um capitalismo frio, industrial, taylorista e indiferente à "interioridade" humana foi ao longo do tempo sendo contrariada. Hoje os sentimentos, os afetos e todos os outros aspectos que supostamente compõem a subjetividade se infiltraram no mercado e nos meios corporativos. Essa é uma ideia compartilhada por Eva Illouz(2011, p.11) a qual defende a tese de que a "criação do capitalismo caminhou de mãos dadas com a criação de uma cultura afetiva intensamente especializada". Dessa forma, a psicologia não caiu apenas de "paraquedas" nesse novo modo de produção dito de "capitalismo afetivo" atendendo suas demandas, mas ao contrário, fez parte ativamente da construção desse novo modelo de sociabilidade através do discurso terapêutico, das psicometrias, da gestão de pessoas, etc. onde a subjetividade entrava como protagonista em todas as esferas da totalidade social.
Portanto, constituiu-se assim uma cultura de intensa valorização dos afetos, dos sentimentos, das emoções, do comportamento, das habilidades sociais, da inteligência emocional, da autogestão, etc. Vários outros valores fetiche poderiam ser citados no novo discurso onde as injunções pró-neoliberais bombardeiam a singularidade de cada sujeito. Será apenas essa então, a subjetividade psicológica que foi de fato capturada pelo capital? A impressão que se tem é que essa "riqueza" interior do sujeito, a experiência fenomenal de si, constitui então a subjetividade posta em xeque anteriormente pela crítica do capitalismo? O que pode ser negado nesta concepção clássica de subjetividade e/ou que pode ser acrescentado a ela? Vejamos as implicações de Slavoj Žižek.
Primeiramente deve se referir à ideia de sujeito concebida por Žižek como foi por Lacan, pois é o sujeito desprovido de substância que pré-existe como fundamento da subjetividade (Bazzanella, p.24. 2009). Então para falarmos da subjetividade é necessário antes tentar conceituar o sujeito e como dissemos, este não é concebido como uma ordem positiva ou consciente, ou inconsciente, não se trata de associá-lo ao eu pensante do qual se interessa a psicologia do ego. O sujeito em Lacan é "barrado" e está marcado por uma divisão e sua principal característica é estar situado entre o eu e o inconsciente. É seguindo nessa definição negativa que Žižek conceberá o sujeito: desprovido de algo substancial precedente, ou de qualquer outro fundamento que o determine, assim, nessa perspectiva há uma indeterminação pretérita e futura em relação ao sujeito em sua natureza e ao seu vir a ser. Ele, o sujeito, está totalmente sem garantias, vinculado radicalmente na contingência e por isso mesmo pode ser responsável pelo o que pode se tornar.
No processo de subjetivação, o sujeito na condição de vazio primordial constitutivo é a sua pré-condição e a impulsiona. Mas ao mesmo tempo, o sujeito não é complementado pela subjetivação, ele resiste a ela, pois é falta e excesso simultaneamente em todas as formas de subjetivação. (Bazzanella, p.26,2009).
Nessa perspectiva a distinção entre o sujeito (agente não psicológico "barrado") e a "pessoa" tem de ser feita. "O que está por trás da tela da riqueza da 'vida interior' de uma pessoa não é a 'realidade objetiva', mas o próprio sujeito..." (Žižek, p.123,2012). Esse vazio ou o nada "é" o sujeito e a nossa tarefa segundo Žižek (p.422, 2012), é não preencher esse vazio com nada evitando a projetar nele o lodo repugnante chamado "riqueza da personalidade", nenhuma riqueza de experiência pode preencher esse vazio. Assim, obtemos uma formulação que subverte a noção clássica e comum do sujeito como lugar da experiência fenomenal de si.
A sensação que nós temos é a da experiência de uma riqueza de nossa "vida interior", de uma profunda intimidade; em contraste com a nossa identidade pública ou simbólica ( pai, professor, etc.). A primeira lição da psicanálise diante disso, portanto, seria recusar a aceitar essa suposta "riqueza de nossa vida interior". Ela seria falsa, porque implicaria um distanciamento mentiroso, "cuja função seria salvar as aparências, tornar palpável (acessível a meu narcisismo imaginário) minha identidade sociossimbólica (Žižek, p.31, 2011). Para o filósofo, a ideologia agiria ao lado dessa suposta falsa intimidade e uma das maneiras de fazer a crítica da ideologia é desmascarar essa hipocrisia da "vida interior"( ou a separação de minhas crenças particulares da minha prática pública objetiva). Portanto, a pseudoprofundidade de uma pessoa denunciada aqui é colada em evidência e o eu psicológico pode ter sérias implicações diante dessas colocações. Esta constatação nos coloca diante da necessidade de investigar os desdobramentos teóricos e por conseguinte práticos em psicologia ao se levar até as últimas consequências as formulações e revisões conceituais anteriores.
Ademais, para Žižek uma ideia fundamental se segue após a conclusão do descentramento do sujeito, a saber, a noção fundamental de substituição primordial e a interpassividade. Ao afirmar a noção lacaniana de descentramento do sujeito, significa dizer, que os meus sentimentos mais íntimos podem ser externalizados, ou seja, podem ser deslocados para o outro, eu posso sentir, experimentar e agir através do outro. Essa noção de interpassividade representa segundo Žižek ( 2006), a condição necessária e mais fundamental para a constituição da subjetividade. Para se tornar um sujeito ativo a única maneira é se desvencilhar da passividade inerte característica da condição primordial da própria substância ontológica. Para min ser ativo tenho de sê-lo, através de um puro devir esvaziado de qualquer positividade ontológica colocando minha passividade em um outro.
Portanto, de acordo com o funcionamento da interpassividade, pode-se afirmar que diante da polêmica envolvendo o sujeito nas ciências humanas ele não é nem caracterizado como passividade nem por atividade autônoma, como pensam várias abordagens teóricas. Aqui se abre um espaço para a possibilidade de uma terceira via, característica muito presente da argumentação de Žižek, qual seja, a da interpassividade, que não caracteriza o sujeito nem como passivo diante das superestruturas, muito menos como ativamente autônomo. É necessário pensar para além dessa oposição. Logo a baixo um exemplo de como a ideologia nos coloca diante de uma dualidade perigosa:
Esta análise permite assim propor a ideia de falsa atividade, que não é alias, desprovida de interesse: eu penso que sou ativo, quando minha verdadeira posição encarnado no fetiche é passiva. E não encontramos algo de inteiramente equivalente a esta "falsa atividade" no paradoxo da predestinação? – as coisas estão previamente decididas, a minha posição subjetiva em relação ao destino é a de uma vítima passiva, o que me incita quanto à dimensão ativa do meu ser, a lançar-me numa atividade frenética incessante. Este foi o grande paradoxo da ideologia espontânea do capitalismo nos seus primórdios: em vez de imobilizar, essa teoria da predestinação, isto é, essa consciência de que tudo está perdido, leva-me a trabalhar freneticamente (Žižek, p.33, 2006).
Como podemos observar, ao articular a crítica da subjetividade com a crítica da ideologia, Žižek nos permite ampliar a compreensão de certos fenômenos e desse modo, criar possibilidades de escapar das armadilhar teóricas ou mesmo ideológicas. A afirmação da terceira via que quebra com a lógica dual e as falsas oposições é um exemplo fundamental na medida em que contribui até mesmo para elaboração de intervenções práticas, inclusive no campo da psicologia social comunitária.
Em um artigo intitulado "intervenções psicossociais em comunidade, contribuições da psicanálise" os autores trazem uma proposta praxiológica de intervenção em comunidades a partir da contribuição de conceitos da psicanálise lacaniana. E uma dessas contribuições se referia exatamente à noção de terceira via, aplicada à leitura política de um determinado grupo ou comunidade. Segundo os autores é preciso traçar outro caminho alternativo para além das alternativas marcadas, é construir a terceira via, "aquela na qual eu não escolho apenas entre duas ou mais opções no interior de um conjunto prévio de coordenadas, mas escolho mudar o próprio conjunto de coordenadas (Žižek citado por Junior e Ribeiro, 2009). Ou seja, a única possibilidade de transformação efetiva de todo ou qualquer grupo ou comunidade passa pela quebra da lógica dual, o que leva a priorizar em uma comunidade a construção conjunta de uma terceira via.
Esse exemplo posto a cima, das possíveis contribuições advindas de conceitos da "teoria social da psicanálise" para intervenções psicossociais, nos mostra a viabilidade teórica e também prática da aproximação conceitual que podemos fazer da análise do pensamento de Žižek com a teoria psicossocial, bem como, sua relevância para o avanço dos estudos da subjetividade na atual conjuntura social e política.





REFERÊNCIAS

ALVES, Giovanni. Trabalho e subjetividade; o espírito do toyotismo na era do capitalismo manipulatório. São Paulo: Boitempo, 2011.
BAZZANELLA, S. Os pressupostos da filosofia política de Slavoj Žižek. In: GUERRA, E. e TELES, I. (orgs). Lacunas do Real: Leituras de Slavoj Žižek. Florianópolis. Ed. NEFIPO. 2009. p.24, 26.
HARVEY, David. A condição pós-moderna. São Paulo: Edições Loyola, 1992.
ILLOUZ, Eva. O amor nos tempos do capitalismo. Rio De Janeiro, Ed. Zahar, 2011. P.11.
JUNIOR, N. L.; RIBEIRO. C.T. Intervenções psicossociais em comunidades: contribuições da psicanálise. Psicologia e Sociedade. São Paulo. v.21 n.1 p.91-99. 2009.
OLIVEIRA, W. Subjetividade sob uma perspectiva histórico-cultural. ITECH-instituto de terapia e estudo do comportamento humano. Campinas. Sem Data.
ŽIŽEK, S. DALY, G. Arriscar o impossível: conversas com Žižek. Martins Fontes. São Paulo. p. 79. 2004
ŽIŽEK, Slavoj. A subjetividade por vir. Lisboa. Relógio D´água. 2006 p.35, 36.
ŽIŽEK, Slavoj. Como ler Lacan. Rio de Janeiro. Zahar, 2006.p.10.
ŽIŽEK, Slavoj. Em defesas das causas perdidas. São Paulo. Boitempo, 2011. P.31.
ŽIŽEK, Slavoj. Menos que nada: Hegel e a sombra do materialismo dialético. São Paulo. Boitempo, 2012 p.123, 422.




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