A tomada do Altíssimo (parte 2)

June 3, 2017 | Autor: Def Yuri | Categoria: Hip-Hop/Rap, Artigos, Viva Favela
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A tomada do Altíssimo (parte 2) Autor: Def Yuri | 17/10/2001 | Seção: Def Yuri

Quatro horas da madruga, mando o piloto parar a viatura num trailer pra que a gente bata um rango, peço para o barraqueiro cinco podrões caprichados. A pista tá tranqüila! Pergunto para os irmãozinhos: "E o din din que a gente pegou ontem no morrão, fortaleceu?". Todos respondem: "Lógico!". O comentário na roda era sobre o sanhaço que rolou depois que saímos do morro. Parece que uns dois bonecos caíram, o homem lá é zuado: "Ainda bem que nós estamos fechados com ele, somos da família!". Paramos a viatura numa rua deserta. O piloto já sabe, é só deixar o motor ligado para a quilometragem aumentar e o cuzão do oficial de dia pensar que o trabalho está rendendo, geral dorme... O meu telefone toca, do outro lado uma voz assustada. Pergunto: "Quem é?". Respondem: "Sou eu, T1000!". "O que tá pegando?". Ele diz: "Mataram o patrão, os caras estão aqui zuando!". Saímos em disparada, a cidade ainda dorme, a adrenalina sobe sinistramente. Não quero nem saber quem tá lá, se eu bater de frente, já era. Chegamos com as luzes apagadas, o tiroteio é ensurdecedor. Falo para o pessoal: "Vamos invadir rápido, pois tem gente vindo para cá, gente que não é da nossa política". Continuamos o deslocamento, as vielas mais parecem um labirinto e o tiro tá comendo solto. Agora eu vejo o T1000, ele está trocando tiro com um cara todo equipado. "Será o B.S.? Quem será?", penso. O T1000 está em fuga, daqui uns minutos ele e seu perseguidor irão passar por mim, tenho que me entocar para dar o bote. O T1000 passa. Agora me encontro ao lado do perseguidor, que ao perceber a minha presença coloca a arma em posição sul e, com a mão esquerda, aponta para onde foi o T1000, é nessa fração de segundos que descarrego a PT.40 nele. Um tiro acerta na perna! Com certeza foi na femural, ele tenta conter os jatos de sangue, ele está surpreso! Não contenho as gargalhadas. Um homem surge do nada e pára, ele parece querer entender o que acontece. Acho que deve estar indo para o trabalho, sem pestanejar atiro na sua cabeça, nem me interessa quem é - ele é o meu álibi! Pego a PT e planto na mão dele. O porco ninja ainda agoniza e olha como se me xingasse, mas não adianta, a cena tá montada, falo para o porco mascarado: "Viu B.S., quis me atrasar, tive que te deitar! Não é nada pessoal, esse aqui é o meu ganha pão! A polícia é só um bico". Em seguida, começo a apertar o nariz dele, é só uma ajudinha, dentro de instantes ele vai morrer. Pelo walk-talk, peço prioridade, falo que um policial foi gravemente ferido e que necessito reforço, falo que um bando fortemente armado está nos atacando. O tiro tá comendo no morrão... Cessa o tiroteio. Observo à minha volta e a cena está perfeita: um policial morto, o seu algoz também, e eu vou posar de herói vingador. Me abrigo entre uns barracos, quando chegam em formação uns 5 ou 6 homens do B.S.. O primeiro me pergunta como foi o entrevero, explico que foi tudo muito rápido. Já os outros observam o companheiro caído. "É, parece que o cana que eu matei era o líder dessa missão". Uma senhora aparece e começa a gritar ao ver o que deduzo ser o seu marido esticado - ela nos chama de assassinos. Outros moradores vão aparecendo e iniciam o protesto. Passado alguns minutos, vários colegas chegam e junto vem a imprensa, muito bate-boca! Alguns policiais, ao verem o colega morto, fazem juras de vingança penso: "Pobre comunidade, só lamento!". A tensão está no ar, um jornalista pergunta se a cena não foi montada. Eu empurro o palhaço e mando ele se fudê! Os caras do B.S. saem fora, agora o lance é oficial. Os corpos são retirados e a população vem atrás. No céu, os helicópteros da gente e das emissoras de TV, é o circo! As pessoas gritam por justiça. Nós embarcamos em diferentes viaturas - é hora de picar a mula... O meu telefone toca, é o T1000! Ele diz: "Cumpadi, gostei da sua atitude. Vai ter forra, você é um verme de responsa! Se quiser pó pra dar uma narigada na hora do serviço é só chegar. Agora quem manda sou eu!". Eu respondo: "Estamos aí, patrão, para servir e proteger". A rapaziada na viatura ficou na maior felicidade. Pelo rádio, ouvimos notícias que nos informam que a situação está crítica, a população está queimando um ônibus na entrada da comunidade e atirando pedras em outros veículos. Eu quero que se foda! Eu quero é mais! Depois é só falar que o tráfico orquestrou tudo e vai ficar por isso mesmo, amanhã vamos ver o que vai sair no jornais. Falo para a equipe que tem várias geladas esperando a gente, assim é a vida... (pode continuar) Glossário:

B.S.: bonde suicida, comando de policiais especializados em operações não oficiais Dar uma narigada: cheirar cocaína Din din: dinheiro Picar a mula: ir embora Planto na mão dele: coloco na mão dele Posição sul - para baixo Podrões: cachorro-quente PT.40: pistola calibre .40 Sanhaço: confusão, tumulto Vai ter forra: depois a gente se acerta Verme de responsa: policial gente-fina, legal Walk-talk: rádio comunicador Zuado: nervoso

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