A UNIÃO EUROPEIA DIANTE DO AVANÇO DA EXTREMA DIREITA E DA EXTREMA ESQUERDA

September 12, 2017 | Autor: Fernando Alcoforado | Categoria: Sociology, Economics, International Relations, Political Science, European Union
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A UNIÃO EUROPEIA DIANTE DO AVANÇO DA EXTREMA DIREITA E DA EXTREMA ESQUERDA Fernando Alcoforado* A crise econômica do sistema capitalista mundial que eclodiu em 2008 nos Estados Unidos levou a União Europeia à estagnação econômica com graves consequências políticas e sociais. Esta crise deu origem ao fortalecimento de partidos políticos de extrema direita e extrema esquerda em vários países. A ascensão dos partidos de extrema direita acontece em boa parte da Europa. O resultado das eleições para o Parlamento Europeu de 2014, que aconteceram em maio e cuja nova legislatura começa em julho, confirmou essa tendência e lançou um alerta: o crescimento expressivo da extrema direita e dos eurocéticos (que são contra a existência da União Europeia) no continente. Os partidos de extrema direita da Europa diferem entre si em poucas posições. Com inclinações nazifascistas ou nacionalistas, a maioria defende o fim da União Europeia, o fim do euro, o fortalecimento da unidade e identidade dos países, políticas mais radicais contra imigrantes, criticam o resgate financeiro de países em crise, são contra direitos de homosexuais, aborto, liberalismo e globalização, e combatem o que chamam de islamização. Suas principais legendas: Partido Nacional Democrata Alemão (NPD), Partido dos Verdadeiros Finlandeses (Finlândia), Aurora Dourada (Grécia), Partido da Independência do Reino Unido (UKIP), Frente Nacional (França), Partido da Liberdade da Áustria (Áustria), Jobbik (Hungria), Partido Popular da Dinamarca (Ver o artigo Extrema direita: Eleições no Parlamento Europeu refletem avanço do conservadorismo publicado no website ). Um detalhe importante é que alguns desses novos partidos compõem o que especialistas chamam de nova extrema direita que não buscam se associar à extrema direita fascista. Com os resultados das eleições deste ano, os partidos de centro-direita vão compor a maior bancada no parlamento europeu. Os principais motivos da ascensão dos partidos de extrema direita seriam o declínio do estado de bem-estar social, que constituiu uma espécie de identidade comum europeia após a 2ª Guerra Mundial, a atual crise financeira, a existência de mais de 25 milhões de desempregados no continente, o ressentimento e a descrença da população nos políticos aliado à vontade de mudanças. O que chama atenção é a crescente adesão dos jovens europeus a movimentos nacionalistas, principalmente através da internet. Os jovens revelam-se cada vez mais críticos para com os seus governantes e a União Europeia, preocupados com o futuro (emprego e educação), a identidade cultural e a influência islâmica na Europa. Além da ascensão dos partidos de extrema direita, ocorre também a dos partidos de extrema esquerda. As eleições legislativas antecipadas se aproximam na Grécia, e o partido da esquerda radical Syriza, que promete cancelar o programa de austeridade e anular a dívida pública, está muito próximo do poder. Na Espanha, o partido de extrema esquerda Podemos está se preparando para as eleições legislativas de 2015, com chances de vitória. Em Portugal, no Chipre e na Irlanda, os movimentos de extrema esquerda também têm atraído eleitores cansados do rigor econômico imposto "de cima" pela União Europeia e nostálgicos de um Estado de Bem Estar Social generoso. Seria o início de uma revolução? Seria mais uma reação de fúria, encarnada em uma crítica 1

radical do sistema capitalista que faz parte dessa ascensão populista que vem crescendo no Velho Mundo? Na Grécia, o programa eleitoral do Syriza é centrado na recuperação econômica do país e no fim do programa de austeridade econômica. O programa do Syriza prevê um corte da maior parte da dívida pública que é considerada impossível de pagar preconizando a adoção de medidas que não prejudiquem os povos europeus, além de propor uma conferência europeia sobre a dívida. Após quatro anos de austeridade, a Grécia está devastada não só economicamente, mas socialmente com a existência de pessoas sem abrigo e sem segurança social, elevado nível de desempregados, casas sem aquecimento, etc. Mesmo que o Syriza ganhe as eleições, dificilmente terá a maioria no parlamento da Grécia. Enfim, o Syriza não tem aliados. Vai ser complicado superar a crise da Grécia. Na Espanha, Uma nova forma de organização democrática está a agitar o mapa político espanhol. A plataforma Podemos ameaça diretamente o tradicional bipartidarismo PP (Partido Popular) e PSOE (Partido Socialista) que se revezam no poder na Espanha há vários anos. A plataforma Podemos preconiza a derrogação do Tratado de Lisboa de 2007, a saída do euro, a suspensão do pagamento da dívida pública (default), a nacionalização da banca e de quase todos os setores estratégicos da economia, quer o voto das pessoas humildes que historicamente depositavam sua confiança no PSOE e se sente muito decepcionada porque há uma distância enorme entre o que o PSOE propõe e o que depois faz. O sucesso do Podemos assenta na mobilização do que resta do movimento dos “indignados” e, sobretudo, na penetração no eleitorado socialista. Propõe-se transformar a indignação em mudança política. Os partidos de extrema esquerda como o Podemos na Espanha se formaram focando na luta contra a opressão exercida pela União Europeia e pelo FMI contra o Estado de Bem Esta Social e na defesa do bem-estar dos trabalhadores. Na Espanha, o Podemos se alimenta também de uma oposição à uma Alemanha superpotente que estaria tentada a "colonizar" Madri. O programa político do Podemos propõe uma estratégia unificada com outros países do Sul da Europa, que estão numa situação similar, considera que o Euro não serve ao país e o que interessa é a reestruturação da dívida. Esses partidos de extrema esquerda têm prosperado seguindo uma retórica abandonada pela esquerda moderada de luta por um projeto de emancipação econômica coletiva rejeitando uma simples adaptação ao sistema neoliberal. Em muitos países paira o sentimento de que os socialistas se venderam ao neoliberalismo como ocorreu na França de François Hollande e no Brasil com os governos do PSDB e do PT e que fracassaram na realização das mudanças econômicas e sociais prometidas. Para enfrentar os problemas gerados pelo neoliberalismo, os partidos de esquerda constituíram uma espécie de união sagrada com os de direita para aprovar medidas impopulares cuja eficácia ainda não foi comprovada. É importante observar que são de esquerda, em princípio, partidos e movimentos que se identificam com os interesses das classes subalternas. Diante do fracasso na construção do socialismo no mundo e da impossibilidade de sua realização no momento atual, vários partidos de esquerda, sobretudo os que conquistaram o poder político em vários países, aderiram ao que é designado como social-liberalismo. Michel Löwy, pensador marxista brasileiro radicado na França, onde trabalha como diretor de pesquisas do Centre National de la Recherche Scientifique, afirma que o espírito do 2

social-liberalismo – e os governos do PT no Brasil o representam muito bem – é o seguinte: “vamos fazer tudo o que pudermos pelos pobres com a condição de não mexer nos privilégios dos ricos”. Essa é a fórmula do social-liberalismo, com variantes. Cada país tem uma forma diferente de social-liberalismo, mas o funcionamento fundamental é esse (Ver o artigo 2014: o fim das ilusões desenvolvimentistas publicado no website ). Na Grécia, em Portugal e na Espanha, por exemplo, seus governantes socialdemocratas não aderiram sequer ao social- liberalismo abraçando, ao contrário, inteiramente as teses neoliberais, em nome do pragmatismo, com base nas quais assinaram os acordos de austeridade econômica com a União Europeia e o FMI que contribuíram para a estagnação econômica e o aumento do desemprego nesses países. Além disso, houve os escândalos de corrupção que, ao mancharem os partidos do governo, estão incitando os eleitores desgostosos a votarem em movimentos "antissistema". Os partidos da esquerda radical Syriza na Grécia e do Podemos na Espanha têm por objetivo romper com as teses neoliberais devastadoras da situação econômica e social desses países e de não adesão ao social-liberalismo que, em última instância, significa a manutenção do neoliberalismo com a concessão de “migalhas” aos mais pobres, como acontece no Brasil. Ao contrário da extrema direita que preconiza destruir a União Europeia, os partidos de extrema-esquerda buscam transformá-la. Não são contra a União Europeia, mas, sim, são a favor de uma União Europeia diferente Os partidos de extrema-esquerda se descrevem como antiliberal e pró-social (Ver o artigo Partidos radicais de esquerda preocupam Bruxelas publicado no website ). A raiz histórica da esquerda radical é o internacionalismo ao contrário da direita radical que tem uma raiz mais estrutural associada ao nacionalismo. Em escala europeia, a direita tem mais aceitação porque seu discurso é mais simples, ou mais simplista. Segundo analistas políticos, a adesão ao internacionalismo poderia condenar a extremaesquerda a ter um sucesso efêmero. Há quem admita que, para sobreviver, os partidos da esquerda radical em breve poderão, cedo ou tarde, ficar tentados a flertar com as ideias nacionalistas. O que alimenta o avanço da extrema-esquerda é a tendência de que o império das ideias que glorificavam o livre mercado parece estar no fim com o fracasso do neoliberalismo. O neoliberalismo enriquece ainda mais os ricos e condenam os trabalhadores à miséria em todo o mundo. O avanço dos partidos de extrema direita e extrema esquerda na Europa coloca na ordem do dia a necessidade de a União Europeia reformular sua política econômica que só beneficia a Alemanha e compromete a economia dos demais países dela integrantes com a política de austeridade sem a qual levará ao fim do bloco econômico. * Fernando Alcoforado, 75, membro da Academia Baiana de Educação, engenheiro e doutor em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona, professor universitário e consultor nas áreas de planejamento estratégico, planejamento empresarial, planejamento regional e planejamento de sistemas energéticos, é autor dos livros Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de Barcelona, http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era

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Contemporânea (EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe Planetária (P&A Gráfica e Editora, Salvador, 2010), Amazônia Sustentável- Para o progresso do Brasil e combate ao aquecimento global (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011) e Os Fatores Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV, Curitiba, 2012), entre outros.

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