A VERDADE COMO FERRAMENTA DE INVESTIGAÇÃO CRIMINAL À LUZ DO GARANTISMO PENAL

June 9, 2017 | Autor: Roberto Darós | Categoria: Direito Processual Penal, Direito Penal, Filosofia do Direito
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A verdade como ferramenta de investigação criminal à luz do garantismo penal

A VERDADE COMO FERRAMENTA DE INVESTIGAÇÃO CRIMINAL À LUZ DO GARANTISMO PENAL Revista dos Tribunais | vol. 952/2015 | p. 265 - 293 | Fev / 2015 DTR\2015\766 Roberto Antônio Darós Malaquias Mestre em Direito Processual. Especialista em Direito Constitucional, Ciência Policial e Investigação Criminal pela Coordenação de Altos Estudos de Segurança Pública da Escola Superior da Polícia Federal. Professor de Direito Penal, Direito Processual Penal e Direito Constitucional. Área do Direito: Penal; Filosofia Resumo: Esta pesquisa analisa o tema verdade como ferramenta de investigação criminal à luz do garantismo penal, examinando as linhas gerais de sua pragmática e tendo como critério analítico a concepção de averiguação, fixando como ponto de convergência a teoria da verdade e a teoria da investigação. Trata-se de discussão e análise crítica sobre a investigação partindo da concepção tradicional de conhecimento como crença verdadeira e justificada que a epistemologia deve se ocupar no contexto da justificação, utilizando-se alguns elementos fundamentais da análise pragmática da investigação. Toda investigação é um procedimento de averiguação e se caracteriza como uma forma especial de comportamento. O investigador tem o dever de se guiar por padrões éticos e morais. Investigar é procurar a verdade. Sem a noção de verdade e de acordo, não há investigação. Palavras-chave: Verdade - Investigação criminal - Conhecimento - Padrões de ação - Garantismo penal. Abstract: This study analyses the theme truth as a tool of criminal investigation in the light of criminal guaranteeism in examining the broad outlines of his pragmatic and having as a criterion to design analytical finding, fixing as a point of convergence the theory of the truth and the theory of the investigation. It is discussion and critical analysis of research starting from the traditional conception of knowledge as justified true belief and that epistemology should engage in the context of justification, using some basic elements of the pragmatics analysis of research. Every investigation is a procedure of inquiry and is characterized as a special kind of behavior. The investigator must be guided by ethical and moral standards. To investigate is look for the truth. Without the notion of truth and agreement, there is no investigation. Keywords: Truth - Criminal investigation - Knowledge - Patterns of action - Criminal Guaranteeism. Sumário: Introdução - 1.Quadro contextual - 2.Pragmatismo e investigação - 3.Verdade como adequação 4.Verdade como acordo - 5.Verdade e investigação criminal - 6.Investigação criminal e garantismo penal

Esta pesquisa efetua uma abordagem crítica e interpretativa sobre a verdade como ferramenta de investigação criminal à luz do garantismo penal, analisando as linhas gerais de sua pragmática e tendo como critério analítico a ideia de averiguação no contexto do sistema normativo brasileiro. Luigi Ferrajoli é o grande expoente idealizador dessa corrente filosófica denominada garantismo penal que surgiu no final do século XX, revolucionando a ciência jurídica, embora se perceba nitidamente suas profundas raízes penetrarem vigorosamente na ideologia iluminista do século XVIII. A mencionada escola se fundamenta na ideia tripartite que surgiu inovando a filosofia jurídica: modelo normativo, teoria crítica e filosofia política. Trata-se de um sistema de vínculos baseados no garantismo penal que tem como objetivo impor-se ao poder estatal para consolidar os direitos dos cidadãos, mediante uma abordagem técnica relativa aos níveis de efetividade das garantias individuais e processuais alicerçadas na dignidade da pessoa humana. Essa essência ética da cidadania encontra-se preceituada no diploma constitucional e deve ser expressada pelas práticas judiciais e pelo almejado amplo e irrestrito acesso à justiça. A teoria crítica se fundamenta na validade e na efetividade do direito, trazendo uma abordagem Página 1

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dogmática e filosófica sobre a diferença entre a normatividade e a realidade prática cotidiana que permite a fácil identificação das antinomias circunscritas na ciência jurídica. Assim, o garantismo penal se consolida como uma filosofia política que se explica na fundamentação ética determinada na específica diferença entre direito e moral diante da contextualização criada no perfil jurídico de sua própria validade. A teoria da verdade se impõe auxiliando a análise minuciosa, tendo em vista que o ordenamento jurídico brasileiro seguiu forte tendência à mera aplicação penal e as práticas processuais penais da teoria positivista o que o direcionou para a consolidação de um sistema reducionista e opressor radicalmente imperfeito. O parâmetro de análise eleito neste trabalho fixa como ponto de convergência a argumentação teleológica e os ensinamentos da deontologia. Assim, torna-se necessário o alinhamento de diversos conceitos dogmáticos e filosóficos para perfeita compreensão epistemológica. Ao se falar sobre teleologia e as influências específicas desse tipo de estudo, emerge o conceito de argumento teleológico1 que visa uma causa final. É aquele que possui um objetivo específico, um fim em si mesmo que busca sua essência conceitual, ou seja, a finalidade específica de todo objeto e de cada ser humano. A análise argumentativa segue no sentido da certificação dos objetivos primários e secundários para a perfeita executabilidade de técnicas e a correção de atos desviantes. A deontologia2 de Immanuel Kant3 se fundamenta em dois conceitos que lhe dão sustentação: a razão prática e a liberdade. Agir por dever é o modo de conferir à ação o valor moral, tendo em vista que a perfeição moral só pode ser atingida por uma vontade livre. O imperativo categórico no domínio da moralidade é a forma racional do dever-ser, determinando a vontade submetida à obrigação. Assim, abstrai-se a concepção que o predicado “ obrigatório ” da perspectiva deontológica designa na visão moral o “ respeito de si ” e, por via de consequência “ o respeito à lei”. A temática da verdade demonstra que os pressupostos metafísicos como portadores de verdade estão associados às escolhas que são feitas por aqueles candidatos que se apresentam como portadores de verdade (os enunciados, as sentenças e as proposições). Facilmente se observa que a compreensão do conceito de verdade deve seguir o caminho da inteligibilidade do objetivo a ser atingido, tendo em vista que se situa além do mero objetivo determinado na investigação, ou seja, a verdade é o próprio objeto. Percebe-se a necessidade de identificação do sujeito classificado como subjetivo e dos fatos que se fundamentam como objetivos, observando-se a total independência perante a vontade do indivíduo, tendo como pressuposto conceitual clássico de conhecimento como crença verdadeira e justificada. Seguindo o espectro da visão cognitiva, nota-se claramente que o esquema geral não se contamina (ou não deveria ser influenciado) por outros fatores como as crenças e os dogmas, transformando-se em conhecimento científico para domínio comum. Desta forma, a análise específica deste contexto introdutório, delineia-se também sobre a dualidade expressa nos empreendimentos tradicionais da epistemologia e da filosofia da ciência, tendo em vista a necessidade de se estudar minuciosamente a questão dos portadores de verdade. Desta forma, a análise da linha geral do tema verdade e sua pragmática4 terá como critério a ideia de averiguação e o parâmetro escolhido fixa como ponto de convergência a teoria da verdade e a teoria da investigação à luz do garantismo penal. É necessário que se faça uma análise independente da investigação, partindo-se do pressuposto de sua independência, descomprometida das concepções metafísicas ou epistemológicas para que possa lidar com a noção desses domínios em que ocorra o processo de investigação no contexto investigatório específico. As teorias da investigação e do método baseiam-se em abordagens epistemológicas restritivas ao ambiente da justificação, tematizando as regras metodológicas que se constituiriam em Página 2

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procedimentos lógicos de justificação ou validação, oferecendo critério para demarcar o conhecimento científico de outras formas de conhecimento. Assim, utilizando-se da fundamentação dogmática obtida com esta pesquisa, chegar-se-á a conclusão que toda investigação é um procedimento de averiguação onde se coloca um problema inicial com múltiplos elementos conceituais para comporem um diagrama racional no processo investigativo diante da expectativa violada e o quanto essas citadas diretrizes podem contribuir na aplicação do garantismo penal. Nota-se que em quaisquer áreas do conhecimento humano, o ato de investigar, de averiguar, deve seguir padrões de ação que foram estabelecidos pela sociedade, motivo pelo qual, criam critérios ligados às fases da investigação, ou seja, a investigação se caracteriza como uma forma especial de comportamento. Algumas das atividades mais comuns como as investigações criminais, científicas, filosóficas, religiosas, jornalísticas e tantas outras são práticas de averiguação de hipóteses que desempenham certos sistemas de regras. O investigador tem o dever de se guiar por padrões éticos e morais impostos pelos costumes e pela tradição, sem jamais se afastar do cumprimento às normas e princípios que regem a citada comunidade. Investigar é procurar a verdade que é um componente ineliminável. A abordagem das teorias clássicas da verdade traz luz à compreensão do respectivo conceito, sendo que, duas delas ganharam destacada notoriedade por defenderem a concepção de verdade como correspondência e esclareceram os significados dos termos verdade e verdadeiro. Ludwig Joseph Johann Wittgenstein e Bertran Arthur William Russel desenvolveram e fundamentaram a doutrina do atomismo lógico que, resumidamente, pode ser compreendida como uma visualização da verdade correspondente a proposições e fatos. Outra importante pesquisa foi fundamentada por John Langshaw Austin que trata da teoria das correlações entre convenções descritivas e demonstrativas, em que se afirma sobre o relacionamento das palavras com diversos tipos de situações específicas ou genéricas. Os atos da fala são qualificados pelos conceitos de verdade e falsidade. Assim, é necessário gerenciar uma abordagem sobre todas as mais destacadas teorias clássicas da verdade para ampliar os horizontes da análise racional referente à verdade como acordo e suas aplicações sobre a investigação criminal e sua aplicabilidade a teoria do garantismo penal. 1. Quadro contextual O objetivo de qualquer investigação é chegar à verdade inserida naquele contexto delimitado pelo caso concreto. Deve-se buscar uma correspondência da hipótese com o mundo, ou seja, o movimento que se produz tem um caráter eminentemente correspondente no sentido da adequação. Trata-se de discussão e análise crítica sobre a investigação partindo da concepção tradicional de conhecimento como crença verdadeira e justificada e da doutrina comum de que a epistemologia e a filosofia da ciência devem se ocupar no contexto da justificação, ou seja, deve se utilizar alguns elementos fundamentais na análise pragmática da investigação. “São considerações que, a nosso ver, se situam ainda em um nível preliminar, e que poderiam ser desenvolvidas em teorias específicas da verdade e da investigação, ou em uma teoria epistemológica combinada, da verdade e da investigação (…). Nossas discussões apenas procuram revelar aspectos gerais e fundamentais tanto da noção de verdade quanto da noção de investigação, por meio do que denominamos análise da pragmática da investigação.”5 Desta forma, o tema se circunscreve no estudo e análise da investigação com o objetivo de efetuar uma verificação dos aspectos que se destacam por intermédio de tratamento mais rigoroso e minucioso quanto às teorias específicas da verdade, da investigação ou da justificação que são as denominadas teorias do conhecimento, aliadas ao enfoque do garantismo penal e sua aplicabilidade no sistema jurídico pátrio. Prosseguindo na formulação de raciocínio específico e fixação de importantes conceitos, torna-se Página 3

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importante tratar da temática sobre as teorias clássicas da verdade sob o enfoque daquelas que mais se destacam, objetivando a pragmática da investigação como um processo de validação de hipóteses. Susan Haack6 faz um resumo fundamentado na cronologia das teorias da verdade, afirmando que os filósofos assumem diferentes concepções sobre os tipos de portadores de verdade e a interação relacional entre essas mencionadas teorias. “As teorias da coerência entendem que a verdade consiste em relações de coerência em um conjunto de crenças. Teorias da coerência foram propostas, por exemplo, por Bradley (1914), e também por alguns oponentes positivistas do idealismo, como Neurath (1932). Mais recentemente, Rescher (1973) e Dauer (1974) defenderam este tipo de abordagem. As teorias da correspondência entendem que a verdade de uma proposição consiste não em suas relações com outras proposições, mas em sua relação com o mundo, sua correspondência com os fatos. Teorias deste tipo foram sustentadas tanto por Russel (1918) quanto por Wittgenstein (1922), durante o período de sua adesão ao atomismo lógico. Austin defendeu uma versão da teoria da correspondência em 1950. A teoria pragmatista, desenvolvida nas obras de Peirce (1877), Dewey (1901) e James (1909), tem afinidades tanto com as teorias da coerência quanto com as da correspondência com a realidade, mas enfatizando também que ela é manifestada pela sobrevivência da crença ao teste da experiência, sua coerência com outras crenças. A explicação da verdade proposta por Dummer (1959), por sua vez, tem afinidades bem fortes com a concepção pragmatista.”7 Desta forma, observa-se com facilidade que as doutrinas acadêmicas afirmam as teorias da verdade demonstram diferentes concepções e, inexoravelmente, cada uma dessas mencionadas teorias clássicas assumem uma concepção específica que as identificam com relação aos portadores de verdade. Assim, verifica-se uma distinção entre definição e critério de verdade. A definição mostra o significado da palavra enquanto que o critério fornece o parâmetro para se afirmar que a sentença é verdadeira ou falsa. 1.1 Brevíssima análise das teorias clássicas da verdade Existe uma diversidade de teorias clássicas da verdade. Entretanto, duas se tornaram conhecidas e famosas nas esferas acadêmicas, tendo em vista que a concepção de verdade como correspondência criou o ambiente necessário para dar explicação clara ao significado do termo verdade. A primeira foi desenvolvida por Ludwig Joseph Johann Wittgenstein8 e, dentro do mesmo lapso tempo, também foi estudada por Bertran Arthur William Russel em que, ambos os autores, fundamentaram a doutrina do atomismo lógico que compreendia a teoria da verdade como correspondência entre proposições e fatos. A segunda teoria mais importante foi desenvolvida por John Langshaw Austin9 que trata da teoria das correlações entre convenções descritivas e demonstrativas, segundo a qual as palavras são relacionadas com tipos de situações ou mesmo situações específicas. 1.1.1 Teoria da Correspondência como congruência Bertran Arthur William Russell10 aborda a teoria da verdade em 1912, afirmando que uma crença será verdadeira quando houver correspondência entre verdade e falsidade. Para Russel, a teoria da verdade deve ser admitida como contrária à falsidade. Existe a necessidade de verdade e falsidade serem compreendidas como propriedades de crenças ou enunciados, tendo em vista que são propriedades que dependem de algo que está fora da própria crença. A verdade pode ser definida como correspondência entre a crença e o fato, tendo em vista que a unidade complexa é rotulada como fato que corresponde à crença. 1.1.2 Teoria da Correspondência como correlação John Langshaw Austin desenvolveu a teoria da correspondência da verdade como correlação que se comprova por intermédio de convenções descritivas e demonstrativas, afirmando que a noção de Página 4

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verdade é informativa, tendo em vista que não pode ser eliminada sem o prejuízo de seu significado. Segundo a cátedra de Austin, a verdade é uma questão de relação entre palavras e o mundo, em que os enunciados são os mais adequados portadores de verdade, recusando a ideia de que as crenças e as proposições também sejam esses referidos portadores. A estrutura das sentenças de uma linguagem é essencialmente convencional. Assim, pode-se perceber que não existe isomorfismo estrutural entre um portador de verdade e um estado de coisas que, nos casos indicados, deverá ser convencionalmente estabelecida uma relação entre o portador de verdade e esses últimos. A linguagem é vista estruturalmente como pragmática para ser utilizada de diversos modos pelos falantes, conforme as circunstâncias e as dimensões do conhecimento, ou seja, a própria estrutura da sentença é convencional e as proposições espelham os fatos por intermédio de suas estruturas. 1.1.3 Teoria Semântica Alfred Tarski11 atribuiu certa oposição entre linguagem coloquial e linguagem formalizada, buscando uma definição de verdade que fosse materialmente adequada e também formalmente correta. Tarski pesquisou e desenvolveu a teoria semântica que teve uma pequena aceitação na área filosófica e foi vista durante muito tempo com certa restrição, tendo em vista a forma rigorosa de visualizar a verdade, transparecendo na definição da expressão sentença verdadeira, resgatando o sentido comum e filosófico da verdade. Assim, a teoria semântica afirma que a construção de uma linguagem formalizada é a especificação de um sistema sintático dotado de uma interpretação semântica. Sua análise segue a extensão dos resultados no domínio das linguagens formalizadas e, em proporções reduzidas, abrange também a linguagem coloquial. Trata-se de procedimento indireto e as sentenças gerais são formadas com fundamento em fórmulas abertas que contêm variáveis. Portanto, sendo o procedimento recursivo, Tarski afirma que uma sentença é verdadeira quando são satisfeitas todas as sequências de objetos e, via de consequência, será falsa quando não satisfizer nenhuma delas. 1.1.4 Teoria da Correspondência e Verossimilhança Karl Raimund Popper fundamentou a teoria da correspondência e verossimilhança por intermédio da definição de verdade aliada a conteúdo. Afirmou que a correta fundamentação de uma teoria da verdade deve se sintonizar com os fatos, sendo assim, objetiva ou absoluta, para se adequar ao objetivo principal da ciência. A análise da teoria de Tarski evidencia a característica correspondencial que é utilizada como diretriz para o mencionado estudo sobre a teoria da verdade. Popper criou critérios, além dos tradicionais conceitos de verdade, recusando-se a entender e definir verdade como evidência ou utilidade como se fosse fundamentada por uma teoria instrumentalista. Popper se rotula como um pesquisador absolutista falibilista, tendo em vista que nega ter qualquer método garantidor da aquisição do conhecimento, insistindo que existe uma verdade objetiva para a investigação científica. 1.1.5 Teoria da Verdade e Significado Donald Herbert Davidson12 analisa que os lógicos e os filósofos estão interessados em questões metateóricas (consistência, completude e decidibilidade) e, dessa forma, criam certas restrições quanto ao tratamento das línguas naturais como sistemas formais. Prossegue afirmando que a tarefa da teoria do significado não se resume em explicar palavras individuais, mas analisar a estrutura da sentença. Existe uma preocupação com os conteúdos demonstrativos dissimulados, porque a verdade é um predicado de proferimentos e não de sentenças. Essa teoria entende que não existe uma divergência absoluta entre linguagem natural e linguagem formalizada. Página 5

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Nota-se um contraste que vai delineando os interesses concorrentes entre ambas. Tal teoria parte do princípio que a concepção de linguagem é a demarcação entre linguagem formalizada e linguagem não formalizada. Argumenta sobre a impropriedade do estudo empírico da linguagem, tendo em vista os aspectos relevantes da linguagem objeto são determinados por estipulação. Davidson entende que a teoria adequada do significado explica como as sentenças dependem dessa significação, devendo ser consistente e possuir uma produtividade semântica. 1.1.6 Teoria da Verdade Aproximada e Adequação Empírica Partindo do pressuposto que o esforço de qualquer ciência consiste em corrigir falsidades e o objetivo maior é aumentar o grau de verdade que se define a partir da denotação primitiva, em que a verdade tem correspondência em interações causais complexas, surge a verdade aproximada de uma teoria científica que pode explicar a confiabilidade instrumental. Os realistas científicos entendem que uma teoria é bem sucedida se for aproximadamente verdadeira como instrumento de predição e, nesse sentido, Robert Neil Boyd13 faz emergir a sua cátedra, criando um critério epistêmico de avaliação das teorias para que se possa optar pela mais próxima da verdade. Seguindo diretriz diversa, Bastiaan Cornelis van Fraassen14 afirma que a confiabilidade instrumental das teorias científicas se resume na escolha entre duas teorias competidoras que se mostram empiricamente adequadas. Assim, visualiza a necessária adoção de critérios de natureza pragmática para se escolher uma das teorias competidoras, tendo em vista que os critérios epistêmicos conclusivos estão fora do alcance do pesquisador, sendo definido por intermédio de modelos. 2. Pragmatismo e investigação Para que haja a formação do processo de averiguação, necessário se faz analisar as situações, ou seja, trata-se de empreendimento por meio do qual se pode avaliar cada situação que é proposta na investigação e são denominadas situações-tipo. Toda investigação possui quatro momentos principais na formação do processo de averiguação. Inicialmente, verifica-se a colocação do problema em que múltiplos elementos conceituais tomam parte desse processo quando uma expectativa é violada. Posteriormente, ocorre a elaboração de uma hipótese mediante um cenário que se constituirá em contexto inicial ou básico de uma investigação, visando solucionar o problema. A seguir, a constituição de uma base de dados, com a qual a hipótese vai ser comparada e finalmente, a constatação do acordo entre a hipótese e a base de dados. Assim, mesmo que haja falhas na base de dados, a constatação do acordo entre hipótese levantada e a base de dados foi estabelecida, em que se constata a produção de algum conhecimento. Diante do contexto geral, constitui-se um âmbito investigativo que contém os elementos. Trata-se de argumentação, de caráter social e institucional, no contexto geral. Assim, chega o momento de constatar o acordo. Dadas as condições e as ferramentas colocadas à disposição do investigador, inevitavelmente o cientista diz ter encontrado o acordo que é a ideia de John Dewey: “chega-se a uma verdade através de um acordo”. Prossegue o mencionado filósofo afirmando que o compromisso prematuro com uma das escolas epistemológicas poderia criar algum obstáculo nas respectivas análises e até mesmo impedi-lo de ter a percepção necessária para outros aspectos do conhecimento humano e finaliza dizendo que uma atitude natural diante do conhecimento talvez seja mais produtiva. A investigação científica deve se fundamentar em um modelo de comportamento de investigar, sendo ações que um indivíduo realiza em determinado contexto. Nesse aspecto, existe uma enorme diferença entre a demonstração de uma investigação científica como classe de ações do investigador e outra forma como classe de representações que dela resultam. Página 6

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A investigação é uma atividade realizada no interior de uma instituição. O paradigma segue no sentido de matriz disciplinar, em que a comunidade científica possui suas crenças e concepções compartilhadas. O investigador adquire uma compreensão básica dos termos chaves que o idioma lhe possibilita por intermédio da tradição de seu trabalho investigativo. As teorias e os pressupostos empregados integram o sentido empírico dos termos teóricos criando um universo conceitual que possibilita a formação de um modelo institucionalizado. Desta forma, podem-se citar como principais ferramentas da investigação os modelos como projetos de máquinas nomológicas e como mediadores. A prática realizada por investigadores de determinada área revela a compreensão adequada dos modelos científicos. Portanto, quando os modelos se fazem presentes, desempenham papel fundamental como ferramentas da pesquisa. Consequentemente, a pesquisa em certos domínios se resume na exploração do mundo por intermédio de modelos oferecidos pela respectiva teoria que cria parâmetros e estruturam normas para a prática científica. 2.1 Objetivo principal da investigação A investigação se caracteriza como uma forma especial de comportamento e utiliza exemplos práticos para demonstrar que algumas das atividades mais comuns como a investigação criminal, científica, jornalística e diversas outras, são práticas de averiguação de hipóteses que desempenham certos sistemas de regras. A noção de verdade como acordo desempenha uma função importante no processo de investigação e, a partir de um problema o investigador projeta sua atividade investigativa com variados objetivos. Desta forma, a análise pragmática da investigação com a finalidade de verificar ou refutar uma hipótese por intermédio do estabelecimento de uma base de dados é uma possibilidade real. Portanto, a avaliação da hipótese levantada e a necessidade de sua averiguação levam o investigador a utilizar as pesquisas de campo e realizar experimentos, tendo como cenário o estudo da plausibilidade. Assim, estabelece-se uma base de dados que permitirá uma avaliação mais precisa da hipótese levantada. Dutra leciona que seria contrassenso pensar na possibilidade de se implementar uma investigação que pudesse ser desenvolvida sem a pressuposição fundamental da constatação do acordo entre uma hipótese e uma base de dados, tendo em vista que isso acarretaria sua inviabilidade. Trata-se da consistência entre a sentença que veicula a hipótese e aquelas sentenças que relatam a base de dados. “A verdade é, portanto, ineliminável, e é um constituinte essencial da investigação. Ela é um elemento operativo, revelado pela análise da pragmática da investigação. Enquanto acordo, a verdade é, de fato, o conceito chave revelado pela pragmática da investigação. Uma investigação que, neste sentido, não visa a verdade, não é realmente uma investigação. Assim, investigar é procurar a verdade, isto é, procurar estabelecer um acordo, é averiguar.”15 Prossegue em seu raciocínio, afirmando que a nova base de dados constituída com o prosseguimento da investigação permitirá o acordo, o que fará com que a investigação seja continuada e os próprios investigadores possam constatar o acordo. Finaliza utilizando-se de uma expressão metafórica onde afirma que a verdade é o próprio motor da investigação. 2.2 Averiguação de hipóteses A verdade é a finalidade da investigação. A noção de verdade como acordo está estreitamente relacionada com a ideia de pragmática da investigação e sua análise é um relato de como se desenvolvem as atividades em qualquer averiguação. Há certos elementos característicos que podem ser encontrados em qualquer tipo de investigação que são fatos específicos do comportamento humano e tem a finalidade de enfocá-la como uma forma de ação ou de comportamento direcionado para um fim. 2.3 Etapas da investigação Página 7

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A investigação criminal, assim como a investigação científica, pode ser caracterizada como uma forma especial de comportamento porque se baseia em sistemas de regras que se fundamentam na prática de averiguação de hipóteses. Uma investigação possui um roteiro de etapas mínimas a serem seguidas: a demarcação do problema, a elaboração da hipótese, a constituição da base de informações e a subsunção da hipótese às informações contidas na base. A investigação é o desenvolvimento destas quatro etapas que se concretiza com a constatação da subsunção entre a hipótese eleita e a base de informações. A demarcação do problema se verifica por intermédio da apresentação da situação, do caso concreto, em que diversos elementos conceituais aparecem, ou seja, quando ocorre o fato típico, antijurídico e culpável. No exato momento em que acontece a violação do bem jurídico tutelado, dá-se a colocação do problema. O Estado tem o dever de proteger seus cidadãos e, desta forma, independentemente do comunicado, a autoridade estatal deve iniciar a investigação criminal. A elaboração da hipótese dar-se-á por intermédio da análise do contexto inicial da investigação criminal. É dispensável o questionamento aos pressupostos implícitos e irrelevantes como, por exemplo, catalogar a pergunta se houve crime diante do fato que iniciou a investigação criminal: a presença de um corpo humano sem vida. Irrelevante também serão questionamentos sobre a possibilidade da autoria recair sobre um extraterrestre, um espírito, um duende ou uma figura mitológica. Isso são informações insignificantes e alheias ao contexto básico inicial da investigação. É necessário também avaliar as hipóteses plausíveis. Suponha-se que, diante do corpo de delito que é o ambiente onde se encontra um corpo humano sem vida, o investigador queira admitir a hipótese de crime praticado por extraterrestre. Ora, isso não se configura uma hipótese plausível para o fato “corpo humano sem vida” e nem consta com tipo penal de um bem jurídico tutelado pelo Estado. A constituição da base de informações é formada com dados obtidos por intermédio da observação do investigador no local do crime, catalogação de informações, indícios e vestígios do delito, dados obtidos com testemunhas do fato criminoso, reconstituição do evento investigado, requisição e resultado de testes e laudos periciais. Finalizando as etapas, ocorre a subsunção da hipótese às informações contidas na base de dados que permitirá ao investigador ou cientista averiguar sua hipótese. Averiguar é constatar que existe uma coincidência entre a hipótese levantada e a base de informações estabelecidas. Sob o ponto de vista da pragmática da investigação não se pode dizer que o conhecimento seja crença verdadeira e justificada como fundamentado na epistemologia tradicional. Portanto, na óptica da investigação o conhecimento é crença em processo de averiguação. O conhecimento é hipótese em processo de investigação. Ao tratar deste assunto, deve-se ter em mente que o resultado esperado é demonstrar como as teorias da verdade estão associadas às teses metafísicas, partindo do pressuposto que a noção comum de verdade se concretiza no acordo. Para que se possa entender adequadamente o que é um portador de verdade, é necessário fixar que sentenças são sequências de símbolos bem formados segundo as regras de uma língua, ou seja, são os objetos de símbolos linguísticos. Os enunciados são acontecimentos ocorridos no mundo, melhor definindo, são aquelas ocasiões que se utilizam as sentenças. Assim, a ideia ou o conceito veiculados por sentenças e enunciados que possuem um significado comum são as proposições, em que se percebe a abstração de seu objeto. Uma sentença é um objeto linguístico que cria a diferença entre sentença e proposição. Uma explicação mais fundamentada para enunciado, sentença e proposição como possíveis portadores de verdade, reside na ideia que o enunciado leva em consideração a linguagem comum e se preocupa precisamente com o significado dos termos. Assim, pode-se entender que o enunciado é um evento de comunicação, estando presente cada vez Página 8

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que se utiliza uma sentença em determinada língua. Por exemplo: chove; está chovendo; está caindo água do céu; aqui existem três enunciados e também três sentenças, mas uma só proposição. As sentenças referem-se às linguagens formalizadas. É uma sequência de símbolos em uma língua ou linguagem, ou seja, é uma sequência que atenda a determinados requisitos de caráter sintático e, às vezes, semântico. São fórmulas corretas de uma determinada língua. As proposições são noções linguísticas. A linha de frente é uma sentença. A proposição ocupa uma posição de retaguarda para respaldar a sentença. Entretanto, o enunciado ocupa uma posição central. Willard van Orman Quine16 leciona que o proferimento de uma sentença ou sua inscrição é uma ocorrência de sentença. Essas são falsas. As ocorrências de sentença podem ser identificadas simplesmente com enunciados, proferimentos ou inscrições de determinadas sentenças analisadas sob um contexto ou mediante certas circunstâncias. A sentença-tipo é aquela que ocorre em diversos proferimentos e inscrições e são verdadeiras, ou seja, é uma ficção criada para se poderem identificar duas ocorrências, caso se trate da mesma língua, além de distinguir uma ocorrência da outra, quando se chega ao entendimento que foram feitas com os recursos de línguas diferentes. Trata-se, portanto, do mesmo tipo de ficção que se constrói para providenciar traduções entre sentenças-tipo diferentes, tendo como cenário ideal, a configuração de idiomas diferentes, em que a análise demonstra serem sinônimas. As noções de ocorrências de sentença e de sentença-tipo são ambas supérfluas, tendo em vista que não trazem explicações relevantes sobre as próprias sentenças, ou seja, não acrescentam conhecimento a respeito das noções de proposição e de enunciado. Observa-se que tais noções são interdependentes, mesmo se mediadas por outras noções novas. Isso não permite unificar as teorias sobre proposições, sentenças e enunciados, como foi afirmado anteriormente, mas demonstra claramente que essas mencionadas teorias possuem noções interrelacionadas. Ao recorrer à noção de acordo, podem-se reabilitar todos os portadores de verdade. Caso se queira dar uma maior ênfase para a proposição ou para os enunciados é plenamente possível. Entretanto, quando se busca uma interpretação mais flexível e ampla, pode-se optar por acentuar os três portadores de verdade: proposições, sentenças e enunciados. 2.4 Proposições como portadores de verdade Quando se diz que uma teoria é verdadeira, afirma-se que há certo tipo de acordo entre o que foi dito e o que é realmente. Assim colocada a questão com amplitude, Dutra afirma que não há problema quanto à noção de verdade. “O problema todo começa quando, para dar uma definição (mais) exata para as palavras ‘verdade’ ou ‘verdadeiro’, somos obrigados a ir além de seus contextos de uso, nos quais nossas intenções sobre a pragmática de nossa língua nos guiam em um emprego perfeitamente seguro desses termos. O que uma teoria da verdade pode fazer, então, é criar um contexto teórico no qual uma definição de ‘verdadeiro’, por exemplo, seja também perfeitamente clara. É isso o que almejam todas as teorias da verdade, tendo mais, ou menos, sucesso. Parte das críticas a elas dirigidas resulta de uma má compreensão dos contextos teóricos nos quais elas podem e devem ser avaliadas.”17 Portanto, percebe-se a necessidade de avaliação da teoria da verdade sob a óptica externa ao contexto, criando e delimitando de maneira adequada o novo ambiente de discussão que seja ontológico, tendo em vista que, nem toda crítica externa tem validade, mas torna-se imprescindível que se faça tal crítica diante da necessidade de se criar e delimitar o contexto da discussão. 2.5 Sentenças como portadores de verdade Trata-se de falsa aparência a ideia de que as sentenças permitem uma abordagem linguística como portador de verdade. É consenso geral afirmar que uma sentença é uma sequência de símbolos em uma língua. Página 9

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Dutra leciona que a melhor maneira de analisar o que seja uma sentença é entender o conceito de símbolo, recorrendo à noção de ideia e superando as dificuldades de cognição. Torna-se extremamente abstrata a ideia de que um símbolo é um objeto físico que representa outro símbolo. “Estamos dizendo que a verdade é uma relação (ou um tipo de relação) entre objetos físicos. Ela seria uma relação que descobrimos entre certos objetos físicos ao investigarmos seu comportamento, de um ponto de vista físico, ainda que eles sejam criações nossas, como símbolos, xícaras e pires. A verdade, assim como o movimento, por exemplo, seria uma questão de enunciar uma lei da natureza. Ora, este nos parece um resultado contraintuitivo dessa possível abordagem. É por isso mesmo que as teorias sobre os símbolos sempre recorram a noções mentalistas, como a intencionalidade, pois nos parece preciso fugir desse resultado contraintuitivo de pensar que a verdade, tal como é o movimento, seja uma relação entre objetos físicos.”18 A definição de sentença, irrelevando as noções mentalistas correlatas, parece algo duvidoso que se confunde com a definição de proposição, conforme afirmam alguns filósofos da mente quanto a intencionalidade ineliminável, apesar da abordagem fisicalista. 2.6 Enunciados como portadores de verdade O enunciado é um evento. Os falantes de uma língua efetuam a correlação de sentenças com as situações fáticas em que poderiam ser enunciadas. Somente a prática linguística pode estabelecer as condições de verdade para o enunciado. Em síntese, o enunciado utiliza-se da sentença diante de uma circunstância determinada. Quando se pretende conceituar enunciado, Dutra recorre a ideia de circunstância, tendo em vista que se trata de um ato da fala humana como acontecimento, ou seja, um fenômeno linguistico que se verifica como um evento do mundo. “Ao dizer, então, que um enunciado é verdadeiro, estamos dizendo que é verdadeiro o ato de dizer uma sentença. Estamos afirmando que dentro do mundo há fenômenos verdadeiros, que existem circunstâncias verdadeiras, que certas ações são verdadeiras, já que falar é agir. E isso é um outro resultado que parece contrariar nossa compreensão comum, informal, baseada na pragmática da fala e no uso dos termos veritativos. Sob pena de defender mais uma vez uma ontologia esdrúxula, não podemos dizer que os enunciados são aquelas coisas que podem ser verdadeiras. Aqui, uma saída possível seria explicar o ato da fala recorrendo à noção de intencionalidade, mas, então, reintroduzimos a metafísica mentalista.”19 Leciona que a teoria da verdade propõe, por via oblíqua, uma metafísica. Entretanto, o que se busca é uma forma de lidar com a metafísica sem que seja com caráter dogmático. Prossegue afirmando que existe certa plausibilidade em pensar que proposições, sentenças e enunciados podem unificar o conceito de portador de verdade e que nos diversos contextos de investigação resultem em uma ciência unificada. 3. Verdade como adequação Para facilitar o entendimento por intermédio da planificação do raciocínio, fica evidente a necessidade de se distinguir certas opiniões como sendo verdadeiras ou falsas. O significado se fundamenta em predicado-qualidade-propriedade. É importante ressaltar que a verdade resulta de um acordo e, por via de consequência, a falsidade resulta de um desacordo. Portanto, fixando conceitos, deve-se entender também que a ideia aristotélica básica fundamenta a verdade como um acordo. Desta forma, para melhor compreensão da temática desta pesquisa, torna-se extremamente necessário analisar o significado do adjetivo verdadeiro e quais são as coisas que podem ser verdadeiras ou falsas. Portanto, esta pesquisa demonstrará que as opiniões podem ser verdadeiras quando forem entendidas como crenças-opiniões, que os filósofos interpretam por intermédio das orações ou sentenças de uma determinada língua. Assim, utilizando-se dos enunciados ou formas de realização, sendo reunidos em uma ou várias Página 10

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proposições que formarão um texto, em que o investigador sedimentará seu raciocínio lógico. 4. Verdade como acordo Para se abordar o tema verdade, é necessário que se tenha o entendimento que a primeira noção é sua formulação pragmática, em que se percebe posteriormente sua característica semântica. A verdade é um acordo que o investigador estabelece entre uma hipótese e as evidências que lhe favorecem, ou seja, é uma fórmula nominal para a ação que pode ser descrita de modo mais claro com o emprego de uma formulação verbal: a verificação. Trata-se de investigação etiológica em que o ponto é dizer que a avaliação onde se afirma a hipótese é verdadeira, com exclusão das demais. O investigador verifica a hipótese, ou seja, conclui ou declara que há um acordo entre a mencionada hipótese e outros fatos que são encarados como evidências favoráveis àquela referida hipótese, isto é, as provas. A formulação verbal é preferível tendo em vista que coloca em evidência o caráter pragmático que se deve conferir à noção de verdade, sem, todavia, dissimulá-la com formulações nominais, induzindo a pensar que a verdade é uma propriedade de determinadas coisas. O resultado será a reversão da abordagem tradicional, dando preeminência ao aspecto pragmático sobre os aspectos semânticos e sintáticos da linguagem. Dutra leciona que a verdade é um conceito chave que se sedimenta por intermédio da pragmática da investigação criminal, tendo em vista que sua natureza é instrumental e se constitui como elemento essencial e ineliminável que visa a verdade. Assim, a investigação tem como objetivo finalístico a verificação de uma hipótese que se fundamenta por meio de objetivos médios no estabelecimento de uma base de dados. Portanto, uma investigação que não visa a verdade, não se constitui como uma investigação. É importante ressaltar seu papel fundamental e indispensável no processo de investigação. O estudo da coerência entre a formulação da hipótese e o cenário descrito sob os auspícios dos dados iniciais do problema permitirá a avaliação da hipótese e sua averiguação. “As ações do investigador, como as de formular explicitamente sua hipótese, estudar sua plausibilidade mediante o pano de fundo e os dados iniciais do problema, projetar e realizar experimentos ou pesquisas de campo etc., tudo isso visa estabelecer a base de dados que vai permitir a avaliação da hipótese levantada, sua averiguação. Assim, a investigação é realizada para que se possa constatar – ou não – o acordo entre uma hipótese e os dados reunidos na base de dados, por meio dos experimentos e outros procedimentos investigativos.”20 Um evento observável e uma suposta causa, por exemplo, pode ser entendida quando um indivíduo sente febre, imediatamente se denota algum tipo de infecção no organismo. Portanto, trata-se de uma hipótese com critério de autorização. Para Bastiaan Cornelis van Fraassen,21 a teoria ou hipótese é empiricamente adequada, caso seja verdadeira sobre as coisas observáveis submetida a critérios de autorização. Desta forma, sob a análise pragmatista, a verdade será uma propriedade de sistemas estáveis de crenças, diante da capacidade de resistir às provas experimentais, sendo esse o aspecto coerentista que envolve a referida abordagem. Assim, a definição de adequação empírica vai afirmar se uma teoria ou hipótese é empiricamente verdadeira, caso seja verdadeira em relação às coisas observáveis. Isso pressupõe a demarcação do que é observável e o que não é observável. Para a primeira, pode ser obtida informação por intermédio dos cinco sentidos. A segunda obtém as informações por meio da ajuda de instrumentos. Nos dois aspectos, caso haja uma equivalência da verdade, sendo todas empiricamente adequadas, nota-se que a teoria é verdadeira. Desta forma, pode-se concluir que a verdade é um acordo entre hipótese e uma coleção de evidências, em que o conceito de acordo pode ser sintetizado como ferramenta para finalizar a investigação. Popper leciona que, em última análise, o critério de verossimilhança também teria caráter epistêmico, Página 11

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tendo em vista que seu procedimento define o mencionado critério em termos de verdade e conteúdo. Não visa a apenas atingir uma definição de verossímil, mas alcançar um critério, diante da realidade abordada sobre a verdade e a verossimilhança, tendo em vista que não é apenas definicional, mas também criterial. Tais teorias são subjetivistas ou epistêmicas, em que uma concepção da verdade adequada para os propósitos da ciência e seu progresso deve ser objetiva ou absoluta, o que significa correspondência com os fatos. Bastiaan van Fraassen observa que a noção de adequação empírica não pressupõe a noção de verdade como correspondência. A teoria ou hipótese é empiricamente adequada, ou seja, por meio dos critérios de autorização, em que ela é verdadeira sobre as coisas observáveis. O que interessa é o problema de como escolher entre duas ou mais teorias competidoras, todas empiricamente adequadas, isto é, todas elas sendo bem-sucedidas em dar explicações sobre certos fenômenos e permitir que se façam predições corretas. A única noção com valor epistêmico que se teria, leciona van Fraassen, é a adequação empírica que se procura definir em termos de modelos. Pode-se afirmar que, sob o ponto de vista pragmático, a verdade é acordo entre hipótese e prova, ou uma predição (ou explicação) confirmada que define a adequação empírica, dizendo que uma teoria ou hipótese é empiricamente verdadeira se ela é verdadeira em relação às coisas observáveis. 5. Verdade e investigação criminal Quando se propõe utilizar a verdade como ferramenta de investigação, faz-se necessário entender que um acordo pode ser quebrado a qualquer tempo. Entretanto, ele permanece válido pelo período que se mantiver intacto. O acordo pode também ser revisado. Mas enquanto não ocorrer tal revisão, sua validade se perpetua antes e depois dessa atividade. Eventualmente pode ocorrer a exigência de novas provas, a reformulação da hipótese, o pedido de revisão do acordo entre hipótese e prova, inclusive gerar uma mudança na concepção sedimentada pelo cientista ou investigador. Nesses casos, haverá a necessidade da utilização do termo verdadeiro, ocasião em que novos acordos serão consolidados. É necessário enfatizar que a formulação pragmática da verdade como acordo fundamenta-se na ideia de verificação, em que o investigador conclui que existe um acordo entre a hipótese e as evidências favoráveis que são as provas. O cientista ou investigador constata o acordo entre uma hipótese e uma evidência a partir do momento que percebe a predição confirmada, ou seja, quando o acordo entre o que se pensava e o que parece ser o caso concreto em questão. Nesse contexto, a investigação deve ser vista como ação e a definição de sua pragmática como prática dos investigadores em suas atividades e as ferramentas que utilizam para tal fim. A pragmática formal da investigação diante da teoria de Carnap e Popper é aquela que investiga o conteúdo das práticas cognitivas, segundo o entendimento sob o enfoque de uma abordagem semântica. Na abordagem sintática, caracteriza-se por formular conjuntos de regras metodológicas que sedimenta o conhecimento científico. Portanto, o comportamento do investigador ou cientista relativo ao conjunto de ações que desenvolve descrevendo sua atividade especializada como o uso da linguagem técnica, os métodos e procedimentos empregados na investigação, as estratégias empíricas, os instrumentos utilizados e os relatos, as descrições de aspectos comuns para as práticas ou contextos que apontem as noções veritativas e as ferramentas fundamentais da investigação. A ação caracteriza-se como o comportamento no ato de averiguar da prática investigativa. 6. Investigação criminal e garantismo penal A investigação criminal como ferramenta de busca da verdade processual deve ser identificada Páginapor 12

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parâmetros técnicos que se fundamentem na facticidade e na juridicidade. A verdade de uma teoria científica não é definitiva, mas certamente é possível se verificar especificamente as características de contingência e relatividade, via de regra, indefinidas na grande maioria dos casos concretos, mediante criteriosa análise que tenha como objetivo a aplicabilidade da teoria do garantismo penal. Luigi Ferrajoli22 leciona sobre a investigação criminal que se efetua em virtude do processo judicial e analisa a verdade em seu conceito mais harmônico. Afirma também que a relatividade contida na noção de verdade pode ser expressa segundo o conceito formulado por Popper sobre aproximação ou combinação sem que se associe a enganosa conotação ontológica ou espacial que, obviamente, estará ligada a um princípio regulador que saiba identificar a hipótese mais plausível. Assim, pode-se observar que a investigação criminal representa apenas a opinião do investigador ou cientista, sem que haja ponderação de argumentos de defesa ou acusação, ou seja, não tem como diretriz o princípio do contraditório e da ampla defesa. A análise sob o prisma de Jürgen Habermas23 traz uma interpretação diferente para este tema, lecionando que racionalidade e verdade são conceitos que instrumentalizam o acordo linguístico. Desta forma, a suposição pragmática caracteriza a diferença entre verdade e não verdade. Apesar do multiculturalismo dos demais povos, a verdade é imanente e transcende ao contexto, oferecendo validade ao discurso. Prossegue afirmando que a aceitabilidade pública da verdade24 e sua dependência com o mundo da ação pode ser verificada por intermédio das certezas comportamentais e os discursos justificados. Existe uma relação interna entre verdade e justificação. Desta forma, o que possibilita demonstrar que as crenças justificadas e coerentes são verdadeiras é a acessibilidade ao horizonte linguístico. Assim como Platão tentou atingir o mundo perfeito e virtuoso por intermédio da verdade que possui a mesma característica do bem metafísico, Habermas buscou demonstrar que existe uma verdade que supera a refutação social a fim de superar o elitismo e desenvolver uma sociedade justa e solidária que surge do conhecimento que as pessoas possuem e a consolidação de um horizonte amplo no contexto universal, onde a legitimação dos saberes tem origem na ideia que a filosofia aproxima o ser humano da verdade. Acreditar no contrário seria priorizar a imaginação em detrimento do intelecto argumentativo. Habermas afirmou que a reviravolta pragmática da linguagem não deixaria espaço para a dúvida sobre a existência de um mundo independente de descrições. Entretanto, esse tipo de dúvida se desfaz no paradigma linguistico, em que as verdades são acessíveis apenas na forma do racionalmente aceitável, sendo o critério para a objetividade do conhecimento uma migração da certeza privada para a ação pública da justificação. Para Habermas, a genealogia do conhecimento, da objetividade, da subjetividade e da intersubjetividade integram o paradigma linguístico. Portanto, somando-se essa visão habermasiana de verdade, será possível entender que o modo de descrever o comportamento dos investigadores nos contextos investigativos é o que se pode denominar de pragmática da investigação, tendo em vista a necessidade de se narrar o processo de averiguação em que as noções veritativas são empregadas com a intenção de se averiguar. Uma investigação criminal realizada por esses citados parâmetros verificará a subsunção entre a hipótese e as informações contidas na base de dados, por intermédio das atividades e procedimentos investigativos. Ronald Dworkin25 formula diversos raciocínios que se propõem a entender a semelhança entre o direito e a literatura para se desvincular da ingênua teoria metafísica da interpretação. Prossegue sua explicação no sentido dos julgamentos interpretativos que podem desencadear distintas objeções. Em primeiro plano, o texto a ser interpretado seria um produto do próprio julgamento, sendo que a interpretação se assemelha a criação e exerce certa restrição sobre os resultados finais. Prosseguindo na análise, afirma que a interpretação é fruto de reações subjetivas diferentes, em que o resultado não reflete a realidade do objeto, mas o modo como a leitura foi feita. Não se pode dar garantia de verdade ou falsidade. Página 13

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Dworkin afirma que existe uma dependência teórica e a análise desse assunto deve considerar as objeções mais congruentes em cada caso, de modo mais literal, independentemente da possibilidade de conhecimento da teoria, enfatizando que “se não tivéssemos opiniões especiais e distintas sobre o que considerar como observação, não poderíamos refutar teorias estabelecidas com observações novas”. Leciona que a demonstração da interpretação de cada pessoa relativa ao conjunto de posturas e convicções e suas circunstâncias essenciais pode conferir sentido diferenciado aos juízos de interpretação. Assim, retorna-se ao questionamento metafísico inicial sobre o que é a verdade? Qual é a essência ou a natureza da verdade? A metafísica é a disciplina filosófica que estuda a essência das coisas e sua existência. A epistemologia traz a indagação como se pode conhecer a verdade? O conhecimento é crença verdadeira e justificada? No sentido semântico, qual a definição da palavra verdade? Luigi Ferrajoli26 se contrapõe ao modelo autoritário em que prevalece uma visão substancialista no sistema jurídico mais preocupado com a punição do delinquente em detrimento de uma definição de condutas ilícitas e suas sanções e apresenta a teoria do garantismo penal como solução para o impasse em que vive a sociedade humana e as falhas desviantes do positivismo que se expressam no subjetivismo da decisão judicial e na determinação do desvio penal relevante que se agrava pela péssima origem da investigação criminal inadequadamente conduzida e gerenciada. Ferrajoli prossegue afirmando que a verdade substancial ou material não se submete a regras procedimentais e se posiciona contrária às ponderações axiológicas. Trata-se da verdade absoluta que desconhece limites e degenera em julgamentos privados de legitimidade. Isso permitirá o controle da atividade jurisdicional que busca uma verdade processual visando a reconstrução histórica dos fatos que são submetidos a juízo. Alerta também que a atividade jurisdicional investigativa utiliza-se de uma larga margem de discricionariedade artificialmente adquirida que deve ser reduzida por lei em busca da verdade substancial para que não se desnature o caráter cognitivo do raciocínio judicial. Neste contexto, a busca incondicional e absoluta da verdade real ensejando a presunção de inocência sobre a acusação com carência de provas, onde a verdade somente poderá ser admitida se fundamentada em provas produzidas mediante regras e procedimentos estabelecidos previamente. Assim, os meios para a obtenção da prova mostram-se tão importantes quanto os fins a que se propõe a jurisdição. Desta forma, a investigação criminal se posiciona com elevado grau de relevância para a instrução processual diante da inalcançável verdade absoluta, tendo em vista que o mundo fenomênico reproduzido no procedimento é uma verdade processual e o juiz não julga aquilo que testemunhou, mas somente os fatos que lhe foram conduzidos por intermédio de sinais do passado traduzidos em documentos, declarações etc. Outro fator determinante dessa realidade para Ferrajoli é o subjetivismo do conhecimento judicial na definição da ideia de verdade processual, tendo em vista que o magistrado se encontra posicionado em ambiente próprio, submetido às emoções, aos sentimentos pessoais, aos valores éticos inatos ou adquiridos, além de outras tendências que lhe subtraem a neutralidade para julgar. Este subjetivismo se estende à investigação criminal e a produção das provas de maneira extremamente nociva, militando contra a fidedignidade das referidas provas, impondo-se como fator limitativo da verdade. Quine afirma que a palavra verdade, não tem utilidade teórica, porque a essência de verdade não se submete a critérios. Diversos filósofos acreditam que o sentido semântico da palavra verdade se contrapõe ao conceito metafísico. O principal enfoque a ser discutido é a pragmática da investigação que se caracteriza com a apresentação de um problema, onde o investigador projeta sua atividade de averiguação pautada em objetivos medianos e finalistas. Página 14

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O objetivo final da atividade investigativa é a verificação da hipótese, ou seja, a subsunção do tipo descrito com as informações constantes no banco de dados relativo ao caso concreto. A verdade é um constituinte essencial da investigação criminal. O pragmatismo que envolve a atividade investigativa demonstra que a verdade é um elemento operativo que se caracteriza como conceito chave. Desta forma, investigar é o ato incessante de busca da verdade, procurando estabelecer um acordo entre hipótese e o banco de informações daquele caso. Quando se analisa a investigação como evento intencional, novamente se percebe que a verdade é a principal ferramenta da investigação. É o objetivo final para o qual a investigação será dirigida. Assim, os atos do investigador são determinados pela busca da verdade. O investigador tem o dever de se guiar por padrões éticos e morais impostos pelos costumes e jamais se afastar do cumprimento às normas e princípios que regem a citada comunidade. Portanto, o comportamento do investigador deve seguir determinadas regras de investigação, em que se permitirá variação mínima de conduta, plenamente previsíveis, relativas apenas a intelectualidade do ato de investigar, influindo somente na agilidade e eficiência da atividade investigativa. As regras metodológicas e as convenções delineiam e formatam o contexto investigativo e são consideradas ferramentas essenciais à prática investigativa. A investigação criminal para apresentar resultados eficientes deve ser guiada por regras que derivam das leis e de rigorosos padrões metodológicos oriundos de um código de conduta específico da categoria do investigador ou cientista. É necessário ressaltar que, caso não tenha ocorrido o crime, a investigação criminal resultará no falseamento da hipótese formulada. Entretanto, também se chegará a verdade indicando que não há criminoso porque o delito não ocorreu. Isso vale também para quaisquer outros tipos de investigações. As regras conferem à investigação um caráter intencional, tendo em vista serem prescrições com finalidade a apontarem o objetivo geral e os objetivos específicos da investigação. O ato de investigar é uma ação predeterminada dentro de um processo de averiguação em que o investigador executa essa atividade seguindo sua noção veritativa, apoiada ou não na noção de verdade, de compatibilidade, de adequação empírica ou qualquer outro elemento substitutivo. A investigação científica tem por objetivo apurar o grau de apoio empírico contido em uma hipótese que é exatamente a mesma intenção da investigação criminal que objetiva encontrar a autoria do delito e confirmar a materialidade daquele fato por intermédio da perícia técnica. A epistemologia tradicional entende que o conhecimento é crença verdadeira e justificada e se fundamenta no sentido dualista que repousa em crença e ação, tendo em vista que a filosofia da mente impulsiona para a ideia de que crença é, em certo parâmetro, o veículo necessário para a ação. Desde o tempo dos pensadores gregos clássicos como Platão e Aristóteles, as discussões sobre conhecimento, opinião e crença, geram polêmica e busca definir a noção e o tipo de crença, o assentimento e a força das ideias, a distinção entre crença e ficção. A noção de verdade é essencial para que o investigador utilize as regras como uma forma de consolidar os comportamentos, as práticas e as ações, tornando mais eficiente o comportamento do investigador e, consequentemente, a investigação criminal. A dicotomia que há entre uma série física e uma série psicológica de eventos na epistemologia tradicional se apresenta como uma superação da própria dicotomia que há entre crença e ação como se fosse possível separar os diversos processos ou eventos entre distintos acontecimentos mentais ou intelectuais, distinguindo conhecimento e crença. Não existem atividades meramente mentais ou intelectuais isoladas das atividades físicas. Toda e qualquer atividade ligada à investigação é uma ação, sendo ao mesmo tempo, atividade física e mental. Portanto, o relato de aspectos que se destacam no contexto investigativo torna-se elemento seguro para a análise da pragmática da investigação. Assim, pode-se afirmar que o conhecimento é a crença em processo de investigação. Página 15

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Investigar é procurar a verdade que se caracteriza como componente ineliminável e também como conceito chave, revelando-se por intermédio da pragmática da investigação. A verdade é o motor da atividade investigativa e sua ausência gera a ineficácia da investigação criminal, tendo repercussão direta na garantia dos direitos individuais e coletivos e na aplicabilidade da teoria do garantismo penal que busca a essência ética da cidadania preceituada no diploma constitucional. A validade e a efetividade do direito devem ser viabilizadas por intermédio de uma abordagem dogmática e filosófica que permite a fácil identificação das antinomias circunscritas na ciência jurídica. Desta forma, a filosofia política imposta pelo garantismo penal se fundamenta na determinação ética de proteção dos direitos individuais e na diferença entre o direito e a moral. AUSTIN, J. L. Philosophical papers. Oxford: Oxford University Press, 1979. DARÓS MALAQUIAS, Roberto Antônio. A função social do processo no estado democrático de direito. Curitiba: Juruá, 2010. DUTRA, Luiz Henrique de Araújo. Introdução à teoria da ciência. 3. ed. Florianópolis: UFSC, 2009. ______. Pragmática da investigação científica. São Paulo: Loyola, 2008. DWORKIN, Ronald. Taking rights seriously. Cambridge: Harvard University Press, 1978. ______. Levando os direitos a sério. São Paulo: Martins Fontes, 2002. FERRAJOLI, Luigi. Diritto e ragione: teoria del garantismo penale. 9. ed. Roma: Ed. Laterza, 2008. ______. Direito e razão: teoria do garantismo penal. 3. ed. Trad. Fauzi Hassan Choukr et all. São Paulo: Ed. RT, 2010. HAACK, Susan. Filosofia das lógicas. Florianópolis: Unesp, 2002. HABERMAS, Jürgen. Faktizität und geltung: beiträge zur diskurstheorie des rechts und des demokratischen rechtsstaats. Frankfurt am Main: Suhrkamp, 1998. ______. Direito e democracia: entre facticidade e validade. Trad. Flávio Beno Siebeneichler. 2. ed. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003. vol. I. ______. Verdade e justificação: ensaios filosóficos. São Paulo: Loyola, 2004. KIRKHAM, Richard L. Teorias da verdade. Porto Alegre: Unisinos, 2004. POPPER, Karl Raimund. A sociedade aberta e seus inimigos. Trad. Milton Amado. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: USP, 1987. QUINE, W. V. O. Pursuit of truth. Cambridge: Harward University Press, 1993. RUSSUELL, B. The problems of philosophy. Oxford: Oxford University Press, 1980. TARSKI, Alfred. A concepção semântica da verdade. Porto Alegre: Unisinos, 2007. VAN FRAASSEN, B. C. On the radical incompleteness of the manifest image. In: Suppe & Asquith (org.) PSA. East lansing, Mich: Philosophy of Science Association, 1977. BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de política. 13. ed. Trad. Carmen C. Varriale et all. Brasília: Ed. UnB, 2007. vol. I e II. DUTRA, D. J. V. Razão e consenso em Habermas: teoria discursiva da verdade, da moral, do direito e da biotecnologia. 2. ed. Florianópolis: UFSC, 2005. FARALLI, Carla. La filosofia del derecho contemporánea. tema y desafíos. 2. ed., 5. reimp. Madrid: Universidad Complutense, 2007. LOPES, José Reinaldo de Lima. O direito na história. 2. ed. São Paulo: Max Limonad, 2002. Página 16

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RAWLS, John. A Theory of Justice. Oxford University Press, 1996.

1 A teleologia é uma doutrina que estuda os fins últimos da sociedade, humanidade e natureza. Suas origens remontam há época de Aristóteles (384-322 a.C) com a sua noção de que as coisas servem a um propósito. DARÓS MALAQUIAS, Roberto Antônio. A função social do processo no estado democrático de direito. Curitiba: Juruá, 2010. p. 257-259. 2 O termo deontologia tem origem grega (dever, tratado + estudo) sendo introduzido em 1834 por Jeremy Bentham para referir-se ao ramo da ética cujo objeto de estudo é o fundamento do dever e a norma moral. Idem, ibidem. 3 Immanuel Kant nasceu em Könisgsberg (1724-1804), na Prússia. É um ilustre representante do Iluminismo, tendo direcionado seus estudos para a teoria do conhecimento, epistemologia, metafísica e ética. 4 O pragmatismo é a filosofia do significado e da verdade. O significado dessa doutrina é o mesmo que se verifica em seus resultados práticos. 5 DUTRA, Luiz Henrique de Araújo. Verdade e investigação: o problema da verdade na teoria do conhecimento. São Paulo: EPU, 2001. p. 11. 6 HAACK, Susan. Filosofia das lógicas. Florianópolis: Unesp, 2002. p. 127. 7 Idem, ibidem. 8 Ludwig Joseph Johann Wittgenstein nasceu em Viena (1889-1951), na Áustria. Filósofo austríaco, naturalizado britânico, foi um dos mais brilhantes estudiosos da virada linguística na filosofia do século XX. Foi o criador do atomismo lógico, apesar da versão de Russell ter sido lançada anteriormente em 1918. O único livro de filosofia que publicou em vida, o Tractatus Logico-Philosophicus, em 1922, exerceu profunda influência no desenvolvimento do positivismo lógico. 9 AUSTIN, J. L. Philosophical papers. Oxford: Oxford University Press, 1979, passim. 10 RUSSELL, B. The problems of philosophy. Oxford: Oxford University Press, 1980, passim. 11 Alfred Tarski nasceu em Varsóvia (1901-1983), no Império Russo, atualmente Polônia. Foi um lógico, matemático e filósofo. Escreveu sobre topologia, geometria, teoria da mensuração, axiomatização da álgebra e geometria, fundamentação da semântica, lógica matemática, teoria dos conjuntos, metamatemática, teoria dos modelos, teoria semântica da verdade, álgebra abstrata e lógica algébrica. Seu trabalho possui grande relevância filosófica. É considerado um dos maiores lógicos da história, juntamente com Aristóteles, Frege e Kurt Gödel. 12 Donald Herbert Davidson nasceu nos EUA (1917-2003). Foi filósofo e lecionou em diversas universidades americanas (Califórnia, Stanford, Rockefeller, Princeton e Chicago). Causou brilhante influência em inúmeras áreas da filosofia da mente, da linguagem e da teoria da ação. 13 Robert Neil Boyd nasceu em San Francisco, Califórnia (1948), nos Estados Unidos da América. É antropólogo e leciona na University of California, em Los Angeles. Possui dezenas de livros e trabalhos publicados, sendo a obra mais recente Sentimentos morais e interesses materiais: os fundamentos da cooperação na vida econômica (2004). 14 Bastiaan Cornelis van Fraassen nasceu em Goes (1941), na Holanda. Atualmente é professor de filosofia na Universidade do Estado de São Francisco/EUA, ensinando lógica, epistemologia e filosofia da ciência. É conhecido por ter cunhado o termo empirismo construtivo, por ocasião da publicação do livro denominado A imagem científica. Página 17

A verdade como ferramenta de investigação criminal à luz do garantismo penal

15 DUTRA, Luiz Henrique de Araújo. Verdade e investigação: o problema da verdade na teoria do conhecimento. São Paulo: EPU, 2001. p. 149. 16 QUINE, W. v. O. Pursuit of truth. Cambridge: Harward University Press, 1993, passim. 17 DUTRA, Luiz Henrique de Araújo. Verdade e investigação: o problema da verdade na teoria do conhecimento. São Paulo: EPU, 2001. p. 79. 18 Idem, p. 83-84. 19 Idem, p. 86. 20 DUTRA, Luiz Henrique de Araújo. Verdade e investigação: o problema da verdade na teoria do conhecimento. São Paulo: EPU, 2001. p. 149. 21 VAN FRAASSEN, B. C. On the radical incompleteness of the manifest image. In: Suppe & Asquith (org.) PSA. East lansing, Mich: Philosophy of Science Association, 1977, passim. 22 “La ‘verità’ di un discorso o proposizione empírica è sempre, insomma, una verità non definitiva ma contingente, non assoluta ma relativa allo stato delle conoscenze ed esperienze compiute in ordine alle cose di cui parla: sicchè, sempre, quando si dice è che queste sono (plausibilmente) vere per quanto ne sappiamo, ossia rispetto all’insieme delle conoscenze confermate che possediamo. Per esprimire questa relatività della verità di volta in volta raggiunta, si può bene usar la nozione suggerita da Popper di ‘approssimazione’, o di ‘accostamento’ o di ‘avvicinamento’ allá verità oggetiva, intesa questa come un ‘modello’ o una ‘idea regolativa’ che ‘siamo incapaci di eguagliare’ ma cui ci possiamo avvicinare: a condizione però che a tale nozione non siano associate fuorvianti connotazioni di tipo ontologico o spaziale, ma solo il ruolo di un principio regolativo che ci consente di asserire che una tesi o una teoria sono più plausibili o altre, a causa del loro maggior ‘potere di spiegazione’ e dei più numerosi controlli da esse superati con successo.” FERRAJOLI, Luigi. Diritto e ragione: teoria del garantismo penale. 9. ed. Roma: Ed. Laterza, 2008. p. 23. 23 HABERMAS, Jürgen. Faktizität und geltung: beiträge zur diskurstheorie des rechts und des demokratischen rechtsstaats. Frankfurt am Main: Suhrkamp, 1998, passim. 24 HABERMAS, Jürgen. Verdade e justificação: ensaios filosóficos. São Paulo: Loyola, 2004. p. 242. 25 DWORKIN, Ronald. Taking rights seriously. Cambridge: Harvard University Press, 1978, passim. 26 “Resta il fato che nell’intreccio di ‘sapere’ e ‘podere’ nel quale ho identificato l’attività giurisdizionale ci sono sempre margini più o meno ampi, ma oltre certi limiti irriducibili, di discrezionalità potestativa. Questi margini, nela misura in cui non sono esclusi artificialmente da norme giuridiche – attraverso finzione o presunzioni – sono nella pratica riempiti autoritativamente da ‘verità sostanziali’ rimesse allá decisione discrezionale del giudice. E possono estendersi al punto (ma in tal caso non sono affatto ‘irriducibili’) da escludere del tutto il carattere cognitivo della motivazione giudiziaria e perciò le condizioni di uso, nel processo, della parola ‘verità’. Il compito principale dell’epistemologia penale garantista è quello di elucidare le condizioni che consentono di restringere il più possibile questi margini e quindi di fondare il giudizio (su decisioni) sulla verità processuale anzichè (su decisioni) su valori di altro tipo.” FERRAJOLI, Luigi. Diritto e ragione: teoria del garantismo penale. 9. ed. Roma: Ed. Laterza, 2008. p. 37.

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