A Viabilidade da Infraestrutura

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Investimentos em Infraestrutura

A viabilidade da

Infraestrutura Cresce a demanda por investimentos privados em IE, gerando iniciativas coletivas que buscam torná-los mais seguros e sustentáveis

O

s países em desenvolvimento enfrentam um imenso déficit de infraestrutura. Segundo o Banco Mundial, cerca de 1,2 bilhão de pessoas vivem sem eletricidade e 2,8 bilhões ainda preparam alimentos utilizando combustíveis sólidos, como

madeira; isso sem mencionar que 60% da população mundial não têm acesso à internet e 748 milhões de indivíduos, à água potável. Os países em desenvolvimento investem aproximadamente US$1 trilhão por ano em infraestrutura, mas seriam necessários entre 1 a 1,5 trilhão

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anuais adicionais até 2020 para atender à demanda. O problema é que os governos, diante de restrições orçamentárias cada vez mais severas, não têm condições de financiar esses investimentos sozinhos. Recentemente, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, veio a público falar sobre estímulos aos investimentos privados em infraestrutura brasileira, fazendo referência explícita aos fundos de pensão. A exemplo de Levy, organizações multilaterais, governos e investidores institucionais têm angariado esforços para promover esses investimentos, dando lugar a iniciativas coletivas como a Global Infrastructure Investor Association e o Global Infrastructure Facility, do Banco Mundial.

Encontros da primavera Em abril deste ano, ao participar da “Mesa Redonda Internacional de Mercados de Capitais e Mercados Emergentes”, encontro paralelo - organizado pelo Institute of International Finance - às Reuniões de Primavera do Banco Mundial e do Fundo Monetário Internacional na capital americana, Joaquim Levy declarou que “no futuro, detentores de ativos como fundos soberanos e grandes fundos de pensão deverão desempenhar um importante papel nos investimentos em infraestrutura no Brasil”. Tais investimentos devem ser estimulados via novos mecanismos de financiamento e um programa de concessões a ser anunciado nos próximos meses.

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Falando a uma audiência composta por aproximadamente cem autoridades, incluindo ministros da Fazenda e presidentes de Bancos Centrais e de desenvolvimento dos mais variados países, Levy salientou que o Brasil está preparado para receber os investimentos e oferecer segurança aos investidores privados. O governo cumprirá o seu papel de mitigar riscos com o auxílio de organizações multilaterais. “Instituições como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e Banco Mundial têm um papel importantíssimo não apenas em termos de financiamento, mas de transferência de conhecimento e know-how técnico. Esse é o futuro.” O ministro disse ainda que a atração de investimentos deve ser facilitada pela longa experiência brasileira na estruturação e emissão de instrumentos financeiros, a exemplo dos títulos atrelados à inflação com maturidade muito longa, entre outros. “Precisamos desenvolver essa base daqui para frente a fim de ajudar os investidores institucionais a se protegerem contra a inflação.”

Global Infrastructure Facility O Banco Mundial intensificou seus esforços em prol dos investimentos em infraestrutura ao congregar países com forte tradição na área como Austrália, Canadá, Japão e Cingapura e bancos de desenvolvimento, companhias seguradoras, gestoras de ativos, fundos de pensão, associações e centros de pesquisa numa ini-

“No futuro, detentores de ativos como fundos soberanos e grandes fundos de pensão deverão desempenhar um importante papel nos investimentos em infraestrutura no Brasil”

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ciativa denominada Global Infrastructure Facility (GIF), inaugurada oficialmente em outubro de 2014. O “Centro Global de Infraestrutura” tem a missão de propiciar e acelerar o progresso socioeconômico de países em desenvolvimento ao mesmo tempo em que busca transferir conhecimentos técnicos, financeiros, legais e regulatórios a parceiros locais e órgãos públicos. “Para detentores de ativos de longo prazo como os fundos de pensão e companhias seguradoras, a iniciativa busca oferecer uma gama de oportunidades sólidas de investimento em áreas demograficamente dinâmicas como Ásia, África e América Latina”, explica Nicolas Firzli, chefe de pesquisa do World Pension Council e membro do Conselho Consultivo do GIF. Essas regiões passam por um processo acelerado de mudança, abrindo espaço para trajetórias ambiciosas de desenvolvimento da infraestrutura, complementa o pesquisador. “Há trilhões de dólares em ativos disponíveis em busca de investimentos sustentáveis e estáveis de longo prazo”, afirmou o presidente do Banco Mundial, Jim Yong Kim, na cerimônia de lançamento do GIF. “O maior desafio não envolve o levantamento de recursos, mas a oferta de investimentos de infraestrutura sustentáveis e viáveis comercialmente que possam ser intermediados por instituições bancárias.” Kim explicou que a iniciativa foi desenhada para acumular experiências internas e externas ao Banco Mundial com

vistas à elaboração de projetos complexos de infraestrutura envolvendo entidades públicas e privadas, cuja concretização seria impossível por parte de instituições individuais. O GIF também deverá dar suporte à projetos já existentes que vêm sendo conduzidos por organizações parceiras em várias partes do mundo. “O envolvimento de bancos de desenvolvimento na iniciativa reforça o compromisso com esse trabalho conjunto que nos permitirá reunir recursos, experiências e instrumentos de financiamento, beneficiando os países que são parceiros do banco.” Na ocasião, o diretor gerente do World Bank Group, Bertrand Badre, afirmou que o GIF começaria a operar ainda em 2014. Inicialmente, está prevista uma fase de testes de novos modelos complexos de parceria público-privadas em países de baixa e média renda. O foco são os investimentos com viés climático, bem como os empreendimentos cujo propósito é estimular o comércio.

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O maior desafio está em oferecer investimentos sustentáveis e viáveis comercialmente que possam ser intermediados por instituições bancárias

Associação Global de Infraestrutura A crescente demanda por investimentos em infraestrutura também fez com que um grupo de dezenove investidores institucionais com grande experiência no assunto - incluindo os fundos holandeses APG e PGGM e os canadenses Canada Pension Plan Investment Board (CPPIB), Ontario Teachers’ Pension Plan e PSP Investments - lançassem a Associação Global

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de Investidores em Infraestrutura (Global Infrastructure Investor Association - GIIA) em março deste ano. Juntos, esses investidores possuem mais de €2,4 trilhões de ativos sob gestão, com aproximadamente €177 bilhões dedicados a ativos de IE. Segundo a própria associação, sua missão é servir como porta voz dos investidores em ativos não listados de infraestrutura, ajudando a aumentar a compreensão a respeito dos investimentos e do importante papel a ser desempenhado pelos entes privados. Segundo um representante da GIIA, “há um volume significativo de capital disponível que pode ajudar a construir e manter a infraestrutura numa época de restrições orçamentárias, promovendo, assim, o crescimento econômico”. A ideia é atuar como órgão representativo daqueles que investem em ações e outros papéis associados à classe de ativos, além de promover o engajamento de todos os stakeholders. Propõe-se, ainda, o levantamento de dados para estudo dos fatores que tendem a estimular ou desestimular os investimentos a fim de se estabelecer e promover o uso de boas práticas. A associação sem fins lucrativos, cujo financiamento se dará por meio de taxas pagas pelos seus próprios associados, também busca fortalecer a interação entre investidores, governos e reguladores do mundo todo, mitigando riscos oriundos dessas transações por meio de negociações diretas.

Em nota distribuída à imprensa, a associação declarou: “Na condição de membros da indústria de investimento em infraestrutura, temos enfrentado, individualmente, inúmeros desafios institucionais... Essa abordagem coletiva nos permitirá superar essas barreiras, garantindo a prosperidade dessa importante classe de ativos. Vamos trabalhar em conjunto com governos e reguladores para promover um ambiente político, legal, regulatório e tributário atrativo e estável para os investimentos em infraestrutura.” Ainda sem sede ou equipe permanente, a GIIA pretende se estabelecer em Londres tão logo tenha alcançado um número mais elevado de associadas.

Início lento Nicolas Firzli, membro do Conselho Consultivo da GIF (Banco Mundial), explica que tirando meia dúzia de fundos canadenses e californianos de grande porte, a alocação média das entidades nesse tipo de ativo - excluindo-se as ações listadas e os títulos municipais - gira em torno de 1,5% das carteiras, cuja gestão é normalmente delegada a asset managers especializadas, em geral subsidiárias de bancos australianos ou estadunidenses. “A baixa alocação é observada até mesmo em mercados sofisticados como o britânico, apesar dos esforços do governo e da Associação Nacional de Fundos de Pensão para estimular os investimentos em infraestrutura.”

“A abordagem coletiva nos permitirá superar barreiras, garantindo a prosperidade dessa importante classe de ativos”

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Um caso emblemático é o da Plataforma Previdenciária de Infraestrutura (Pensions Infrastructure Platform), criada na Inglaterra no final de 2011. Até o momento, a iniciativa que congrega algumas das maiores entidades do país - e era vista como uma promessa em termos de desenho e oferta de projetos de interesse dos fundos de pensão - só conseguiu captar 20% dos recursos anuais que pretendia. Segundo Firzli, soma-se ao quadro de decepção, por assim dizer, o fato da maior parte desses recursos estar sendo investida em projetos “brownfield” de infraestrutura social já existente, como escolas, hospitais e outros ativos de baixo risco. “Não é bem isso que o governo quer. A demanda é por investidores para novos projetos.”

Risco-país O especialista também faz referência ao recente “Plano de Investimento para a Europa”, redigido sob o comando do novo presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, que pretende levantar cerca de 315 bilhões de euros em investimentos públicos e privados em IE nos próximos três anos. Fundos de pensão e companhias seguradoras foram obviamente convidados a participar da iniciativa. Entretanto, para que os investidores institucionais sintam-se estimulados a investir, argumenta Firzli, os governos devem levar em conta as suas verdadeiras necessidades, entre elas o respeito aos

direitos de propriedade e a estabilidade fiscal e regulatória. Afinal, os recursos ficarão comprometidos por longos períodos. “Os políticos europeus precisam se ater ao fato de que o principal objetivo do investimento institucional é gerar retornos ajustados a riscos para os futuros aposentados, não facilitar a vida de governos e tampouco ajudar a economia”, advoga. Frequentemente ignorado, o risco-país adquire particular relevância quando o governo desempenha, simultaneamente, o papel de proprietário (como no caso dos contratos de concessão), co-investidor ou co-gestor (a exemplo do que acontece nas parcerias público-privadas) e regulador, influenciando tanto os níveis de preços quanto a rotatividade. Em algumas situações, desempenha ainda o papel de cliente em níveis local e municipal, legislador, e, em casos de litígio, juiz e última instância. “Brechas em direitos de propriedade, insegurança regulatória, limitações à repatriação de capital e desvalorização da moeda são fatores fundamentais devido ao longo prazo dos investimentos, que podem acabar revelando-se péssimos negócios em função do risco-país”, argumenta Firzli. Esse tipo de risco não se limita a regimes autoritários ou países subdesenvolvidos. Há dois anos, Evo Morales decidiu nacionalizar os principais aeroportos da Bolívia, prejudicando a Abertis Infraestructuras S.A., concessionária espa-

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“O objetivo do investimento institucional é gerar retornos ajustados a riscos para os futuros aposentados, não facilitar a vida de governos ou ajudar a economia”

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nhola que os administrava. Similarmente, em 2013, o governo da Noruega comunicou a um grupo de investidores (incluindo fundos de pensão) a decisão unilateral de cortar tarifas no transporte de gás, desvalorizando a participação que eles possuíam (US$ 5,1 bilhões) na infraestrutura de transporte de gás natural do país. Situações de risco são comuns hoje em dia em países até pouco tempo considerados “infalíveis” como Escócia, Grécia e Islândia, entre outros.

Necessidades específicas Sendo assim, é preciso garantir proteção aos investidores institucionais contra desmandos dos governos, além de assegurar-lhes mecanismos robustos aos quais possam recorrer em casos de quebra de contrato.

A realização precoce de estudos detalhados acerca dos parâmetros específicos de cada projeto, como o setor (energia, transporte, social), ciclo de vida (greenfield ou brownfield) e tamanho também são fundamentais. “Infraestrutura física é difícil de vender e substancialmente mais complexa do que títulos públicos”, assinala Nicolas Firzli. Diante de tamanha complexidade e riscos ainda pouco mitigados, não surpreende que a maioria dos investidores institucionais hesite quando o assunto é investimento direto em infraestrutura. Até que os governos lhes ofereçam mecanismos de proteção adequados, estudos aprofundados e instrumentos transparentes, salientam especialistas, pouco adiantará convocá-los a participar de grandes projetos, independente de onde estiverem localizados.

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