A vindima nos mosaicos hispano-romanos como expressão de um ecumenismo paradisíaco

May 30, 2017 | Autor: Cátia Mourão | Categoria: Dionysus, Roman Mosaics, Dionysos, Dionysiac Cult, Harvest, Paradeisos
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Descrição do Produto

M. JUSTINO MACIEL & CATIA MOURAO (Coord,) JORGE TOMAS GARCIA (Ed.)

IMAGENS DO PARADEISOS NOS MOSAICOS DA HISPANIA

1g11 ADOLF M. HAKKERT PUBLISHER AMSTERDAM 2016 -

-

CLASSICAL AND

BYZANTINE MONOGRAPHS Coord. by M. JUSTINO MACTEL AND CATIA MOURAO Edited by JORGE TOMAS GARCiA

VOL. LXXXV

IMAGENS DO PARADEISOS NOS MOSAICOS DA HISPANIA

ADOLF M. HAKKERT PUBLISHER -AMSTERDAM 2016 -

© Editora ADOLF M. HAKKERT PUBLISHER —AMSTERDAM, 2016

ISSN 1381-2955 ISBN 978-90-256.1310-5

© M. Justino Madel, Cátia MourAo e Jorge Tomas Garcia (EdicAo)

Este trabaiho é financiado por Fundos Nacioruxis atravdc da FCT Ciência e a Teenologia no finibizo do projecto UID/PAM/0041 7/2013.

Fotografia de capa Mogaico & Orfeu. Siglos 11-In. Museo de Zaragoza Espana2OL6



Fundaç& pans a:

A vindima nos mosaicos hispano-romanos como expressão do urn ecumenism 0 paradislaco Catia MOURAO

A

rnemória da minha bisavó Olinda e do men avô Antdnio;

a minha mae, Aim.

Resumo Neste texto que decorre da comunicaçäo por nos apreseinada no Encontro Ibdrico so Mosaicos Romanos, subordinado ao tema drnagens do Paradeisos nos mosaicos & Hispânia>, analisamos os tesselados ibdricos corn cenas de vindirnas, sublinharnos a

gn

profunda !igação ternática e narrativa corn aiguns exemplares que contemplarn diversu etapas e motivos do ideário vinicola e realçarnos o entrosarnento do dionisismo oulros cultos da Aiitiguidade, em especial as venusianos e as eleusinos. S& ainda a conformidade entre a dimensAo estétjca destas cenas, marcadas decorativismo e pelo dinarnismo, e a sua dimensao shnbolica, que evoca o ideal tempo ciclico, do regresso a Aurea £tas. copiosa e alegre. e da comunhao placida e o Homem, os deuses e nina Natureza paradislaca (na sua dupla expressão vegetal animal) em constante renovaçâo e etemo retomo.

t

Palavras-chave Vindima; vitivinicultura; culto; comunhão; Parade isos. Introduçào Particularmente caro nas regiOes rnediterránicas, onde a vitivinicultura d praticada d. a proto-história. o tema das vindimas cedo inspirou Os artistas e integrou a graniatica decorativa dos mais diversos objectos. alguns deles sem qualquer funçao utilitária directamente ligada a actividade ou As suas produçoes. Apesar de virias civiiizaçoes antigas. coma a egIpcia, incluIrern estas cenas da terrena no reportório fiinerário como se observa nas pinturas murais do türnuk —

Nakht, em Tebas, c. 16-14 aC,

—,

foi sobretuda corn as gregos e as rornanos q

ternática laica adquiriu urn carácter sagrado e urn simbolismo transcendente, de sen Hisloriadora de Axle (PhD). Jnves*igadora e Membro Integrado do IHA. FCSH. Universidade NOVAdC Lisboa. Portugal.

202

fecundo vwtficante e enovado, e que aVnvoL asia duola dirnen sAo cultutal e crntua Asstm, estes signiticados conuntos, que scm duvida enccnitrararn particular expressEo na arte utuana (sende o Sorcófago this V,nduiwc, proveriiente de CastarJ’era do Rthateio e hoje no Muscu Nacional de Arqueologia, urn born exemplo), aeabaram por ecoar em c.das as restantes rnanJesiaçôes, fossern elas nserida s em eaficios de cuho, de habitaçAo on de exercicto politico, fossern em dornimos pnvado s ou pübhcos Quando marcam a arce grega e romana, as linagens de vindim as bern corno as dernats iue compöeir o reportóno vitw.nfcola e que corten’p[aff a p sa da va. o faørco do 1 —

vtnho, a prove enolOgtca e a custodia de recipientes virneos



são geralmente

contextuaUzadas to ideárto &onisIaco. par se ccnsid erarern 1 a a sOes mais ou nenos directas a mitica descoberta da ‘w inha, alegada propag acAo do sea cuitwo e produçEo

a

a

vmicola pelo deus 3 Baco e aincre aes efertos da 3 , ebnez patentes nas agitadas e alegres representacöes dos thiasoi divinos (considerados por alguns autores antigos, conio Plutarco, enquanto paradigma de ama felicidade eterna) e experhnentados nos seas elitsivos rftuais inistdricos, onde o nectar da “fruta de ’ Dion9 3 iso” era tido corno onte vda’ 1 92 e furcionava corno psicotrópico nd€itor a , fel.cidad 9 1 e’ naturalmente expanenciado pelos ritmos musicals que apelav am a danca e aus prazeres fisicos. No entanto. algumas des cenas de vmdirna sobretudo as executadas na dpoca severiana, aftura em que se tomaram mais populares por possve1 rnfluên cia 3 oriental podeni tambdrn revelar ama Iigação a outras personagens de veneraçAo major (sejam elas —



divindades e mistagogos do paganismo, ou nesmo o Messias do cristianismo). bern

corno ama relação corn cliferentes entrechos reilgiosos e profanos (como a sagração eucaristica da vida terena e a aspiraçào escatológica da vica além-tántulo, o..i o pragmatisrno dos trabaihos agricolas sazonais e a necess tdade de producAo de urn ‘APOLODORO, BthI,oteca 331 DIODORO SICUL O Thblzoteca H,stor,ca IV 2 3 OPIAjVO Cinegénca liZ 230 HIGI”/O Fabulas 130 1’/OIvO Dtonjs iaca KIL 330-4 70 ‘° A este respelto veja-se, por exemplo, MERRONY. 1998, p 449 dn the Roman neriod, the vintag’ng scene was frequentiy directly associatea in the same pavem ent with some element of the Dionysiac scene and thus coald be regarded as symbolical of one of the cult’s principa! charactenstics me and drhnkenness), 9O PLUTARCO, Cor.solaçao a Esposa, 4 3l PINDARO, Fragmento 89. PETR0NI0, Savyricon, 34 2 “ Estes rituais foram magistraimente descuros por Euripid (EURI es PIDES. 4s Bacantes; e a capacidade que Dionlsio tinha de trazer ajegria a todos foi refend a por Hesiodo (HESIODO, Teogonza 941), Plndaro (PINUARO, Fragmento 5) eo anOnimo autor do 50° lImo Orfico, dedicado a Listo Lanea (urn dos nomes de Baco). Por siia vez. Pausanias docum entou a celebração de fesuvidades em honra do deus, designadas por DJo,ws,a, em numerosas cidade s gregas (PAUSANIAS, Descnção do GrEc,a, 1-VIIJ) a&iw ILLANA, 1978, p. 394

203

t

-=

-

I 4

1

elernento base da dicta e cia economia dos paves civilizados, Cu ate o delejie degustativo, 0 obhvio das preocupaçöes da alma, C) tome gaudio do momento fugaz e a

prazer do convfvio social). Repreaeatacôes de viadimaa

na

mudvária hispâica

Contrariamente ao que sucede no None de Africa e em Franca, onde se encontam alguns mosaicos rornanos corn ilustraçoes intencionalmente realistas das ta:as vitivinicolas (Saint-Germain-en.Ga!, see, III, e Cherchel, sees, ffl-IV), na Peninsula Ibérica a rnusivária ate hoje descoberta privilegia urn irnaginário mitico e alegôrico

sobre

os labores cia

395 Assim, embora as tesselados hispAnIcos vinha.

atestem a

popularidade local da iconografia, sobretudo nos secutos II e Hi d.c. e rnais esporadicarnente

no sec. IV, näo

constituem reproduçöes

corn

valor documental destas

aetividades que tanto prosperararn no territOrio durante a ocupaçAo rornana 3 inciusivamente merecido literatura autOctone especializada

—,



tendo

mas ftrncionam,

outrossirn, como provas de uma eficaz aculturaçâo da rnitologia dionislaca, quer no que

respeita a hagiografia da divindade, quer no que toca a flinçao desta como proteeFora da vitivinicultura.

No corpus encontrado, as cenas da vindima podern assurnir posicOes axiais marginais. No primeiro caso, podern

oti

afirmar-se no painet central como terna principal

(Banos de Ia Reina de Calpe, em Alicante. e talvez no desaparecido mosaico de DuratOn, em Segóvia, ambos possivelmente dos sees. 11-Ill) ou secundário (Ecija, sees. IT-HI). Já no segundo caso, podern

ocupar

os cantos (Merida, see. III, e Cordoba, see.

IV), ou as molduras de conjuntos dominados

pelo

cielo báquico (Murviedro, em

Sagunto, sees. Il-Ill), ou confinar-se a urn painel lateral justaposto a composiçôes afeetas

aos

cultos venusiano (Dornus do Anfiteatro, em Mérida, see. Ill) e Orfico

(Travesla de Pedro MarIa PIano, em Mdrida, sec. III), ou ainda combinados. de modo ora periférico

ora

acantonado, corn evocaçôes ao culto eteusino (no anterior e cm

Complutum, sees. IV-V).

.rnthao PIQUERO, 2008. 3 c

COLUMELA, Os Trabathos do Campo, XI, 2.67 e XII, 18-27. A este autor nascido as provincia hispanica cia Bëtiea juntamos outros nAo bispánicos mas cert&mente conhecidos a nivel local, como Plinio-o-Velho (IJis(dria Natural, XVII, 74). Varr,o (Os Assuntos do Carnpo. 1. 54). CatAo (Sobre a Agricuirura, XXXVI) e Vergffio (Gedrgicas, Ill, 89-108).

204

Salvo rat-as excepçôes, estas cenas são caracterizadas par uma vegetaço luxuriante e frutuosa, que pode brotar da ampla terra ou de exIguos vases (numa alusão directa a producão vinicola e ao dionisismo ritual ), e que cresce conformada corn a disposiçao 397

compositiva, ora desenvolverido-se em altura, come se chegasse ao firmamento (fazendo da parreira e do vinho elernentos facibtadores do contaclo directo, fisico e psiquico, entre os homens C 05 deuses, numa imagern simbólica da graça eterna), ora estendendo-se pelos lados e tomando a fundo, quaL rnanifestação panteista e paradisiaca cia generosidade dos deuses, responsaveis máximos pela abundância. Nesta profusão do elernento vegetal deificado onde a videira se afig-ura come o Arbusto Vital 398 pot —

exceléncia, sempre jovern e 3 feeundo e as uvas come urna encarnação do próprio deus , Baco (sendo disso exemplo a representaçAo da divindade corn o coipo em forma de cache num fresco de Pom1e1a ) 400



H

es eLementos arin’ais apequeparn-sc em escala e en

importância., ficando envoltos e submersos na prodigalidade transcendente da Natureza. Assim, tanto as ayes que debicam as frutos, quanto os humanos que os coihem tern urna relação

a

I

conjuntos, tornando evidente a sua dependéncia vivencial em ferdlidade dos solos e a benevolência dos deuses. Esta simbólica redução das

:111

proporçOes e das relevâncias dos figurantes tot-na-se particularmente notória nos cases dos vindimadores, porquanto Os seus corpos são tao diminutos e as suas idades tao

1

tern-as que dificilmente conseguem alcancar as cachos, necessitando de trepar os altissirnos pes e petcorrer as longas ramificaçoes, ou de subir escadotes pat-a as coiherem Na ongem arcaica destas representaçöes ja a vinha prohferava e recobria os fundos das obras de arte, numa estetica marcada pelo horror nacia, e logo as vmdirnadores então —

mormente Sátiros

ostentavam urn infimo tarnanho, sendo pouco maiores do que os caches e muito menores do que Dioniso, cono se constata em nurnerosas ceramicas Aticas, onde o deus é colossal e preside aos trabaihos dos pequenos sâbditos enquanto —

degusta o vinho (Fig. I). NAo obstatite a intencional e sintornática desproporçäo entre *

soberanos e subalternos, os recolectores apresentavam se entilo barbados, corn

“ Sabre a smibologia do kra:er como elernento lirnrgico nab confinado ao dionisismo e alargado a outros cultos afectos a diferentes religiocs iniciaticas orientais, uide o aturado estudo de Justino Maciel, in MACtEL, 1988, pp.11 e 107-114. 398 Cfr. corn o conceito cnstao de Arvore da Vida In Genesis 2: 8-17. CFlEVALIER e GHEERBRANT, 1994, p. 693-694; BELFIORE, 2010, p. 624-629. 3 ° Este motivo conserva se nurn fragmento datIvel do Sec 1 d C que integra as colecçöes do Museo Archeologico Nazionale em Népoles (1tII’a) .

.

.

.

.

205

FIfIKaIaa iatracsa ar—sc aws

-ssa et-rs



a

compieiç&s vigorosas e em idades inequivocamente adultas. evidenciando o carActer simbélico das suas mInimas dsmensoes em reaØo S extensa e farta videira divirnzada.

/

Fig I



4

Dionisio corn Satiros vindirnadores, adultos e barbados Pormenor de vaso de figuras negras c 500 a C Museo Nazionale Etrusco di Villa Giuha Roma ItAlia Fotografla do Museu

Mesmo considerando Os casos veridicos em que as castas produzem cachos mais

volumosos, como o Bumasto, ou “übere de vaca”, e o Moscato Branco (originános da Magna Grecia e muito comum em toda a Bacia do Mediterrâneo), e em que as parreiras crescem sob sisWmas de conduçâo em aftur& como a enforcado ou a latada, a escala

humana nunca é tAo reduzida como nestas 401 representaçöes,

4

No perlodo helenistico e, sobretudo, na época romana imperial, esta tendéncia enfatizou-se e os vindimadores adultos foram paulatinaxnente substituIdos par jovens e crianças

(pisni).

ou amda por erotes juvenis e infantis, como se

ye

na esmagadora

maioria dos mosaicos em análise, para os quais se encontram paralelos norte-africanos em Sousse, El Djem, Dougga. Djemila , Hadrumetum e 403 402 Thysdrus e italianos na Piazza Armerina 404 e no Mausoléu de Santa Constança . E provável que esta regressA” 405 etaria nAo tenha sido motivada por uma sugestAo de tamanhos, mas sim por 401

Sobre as diferentes castas e o sistema de conduçâo em altura, usde VERGIL1O, Geórgzcas, III, 89-10 LOPEZ MONTEAGUDO, 2002, p. 160. BLAZQUEZ MARTiNEZ, 1984, p 70 403 IrA LOPEZ MONTEAGIJDO, 2002, p 160 MERR0NY, 1998, p 449 405 402

206

4a n

4 I

analogia cern o simbolisrno reluvenescente e eterno da parra (e de toda a videira) alias partilbado corn a hera, planta trepadeira que amiüde cresce nas vinhas em reglOes —

no1enhas, entrelaçando-se nas videiras (Fig. 2), sendo muitas vezes representada nos mosaicos so lade daquela (como no exemplar da Dennis do Anfiteatro, em Mends) ou corn solucöes gráficas, composifivas e utilitãrias semeihantes, também nascendo em vases, percorrendo molduras, omando o tirso báquico e servindo de atributo as figuras das Estacoes e dos Ventos. ambos alegorias do tempo cIclico . 4

Fig.

2— Associaçao espontànea entre a videira e a hera no Parque Nacional

da Peneda Gerês (None de

Portugal). Fotogratla de Cdtia Mourão, Apesar de igualrnente imberbes e identicarnente alusivos näo apenas a primeira etapa da produçao do vinho mas também a primeira Made do Hornem que equivale a Idade de —

Ouro, despreocupada, ociosa e abundante, durante a qual os homens eram corno filbos para os deuses e recebiarn destes o afecto e a indulgência corn que se tratam as erianças os pistil (cniancas ápteras) e os erotes (cnianças aladas) marcam de modes diversos as cenas de vindimas. Corn efeito, se os prirneiros Ihes conferern urn sentido literalmente —,

vivificante, podendo ainda acrescé-las de urn valor cémico pela dirninuta escala das figuras, os segundos transformam-nas em imagens de eternidade, eminenternente mIticas e alegónicas, cia medida em que estes protagonistas não são humanos nern reals, rnas sun miologicos, diinos e irnortais, clararnente resultarites de urn desdobrarnento helenistico de Eros , fliho de Afrodite 408



frequentemente representado nos cortejos

406

CHEVALIER e CHEERBRANT, 1994, p. 363 e 364; PEREIRA, in Introduçao a EURiPIDES, 1998, p. 12; BELFIORE, 2010, p. 624-629. 407 A titulo de exemplo veja se o mosaico cordobes corn cortejo de Baco (sec II d C) provernente de Alcolea a hoje no Museo ArqueolOgico cIa COrdoba, onde o Vento associado ao Outono e sobrepujado por urns foiha de parreira, diferenciando-se dos dennis que são encimados pot folbas cordiformes cIa hera. Sobre estepormenor, uide MOURAO, 2010, Vol.1, . 286 p. 40 MOURAO.2 010,Vol.1,p.8 4e257. 8

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207

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ic*ZIC&t EaLzThac ,av-

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indianos do Baco e entendido corno agenre inebriante dos sentidos atravës cia paixao, A semelhança da sua mae

-.-,

e aludern ao comportarnento irnaturo e As acçôes

inconsequentes dos adultos embriagados, fazendo uma associação directa enUe os efeitos do ainor edo 439 vinho tAo can acs poetas e artistas coevos (Fig. 3): lvfuitas vezes. bracos delicados, as lançou a A mar, de raslo afogaeado, sobre as chfres apertados de Baco. bern bebido; e quando a vinho se espalhou sabre as asas de Cupido,

[...] logo sacade, a pressa. as penas encharcadas [...] 0 vinho poe ajeito a coraçJo e torna-o pronto para afogueira; f..] e Venus. no vinho, tornou-sefogo no logo. OVIDIO, Ane de Ama,, 1,229-244.

Fig. 3



Dois casais amando-se sob uma videira. Pormenor de kyli,x de figuras negras. c. 500 aX’. Steatliche Museen Preussischer Kulturbesitz. Berlim. Fotografia do Museu.

A integraçAo dos erotes nas vindimas

— assirn como noutras cenas do contexto báquico,

onde assurneni diversas funçôes identicamente ligadas ao ciclo do vinho (guardiAes de recipientes vinicos no mosaico navarro da Villa de El Ramalete: enOlogos no pavimento malacitano & Antequera; carregadores de cestos no tesseiado badajocense cia Villa do Solana de los Barros)



. 410 denuncia a concomitAncia dos deuses Baco, Cupido e Venus

hem patente. alias, nas celebracoes das Vinalia e das Veneralia . Corn efeito, a alusAo 411 A triade rnistérica pode ser aferida no pavimento musivo emeritense cia Dornus do Anfiteatro (Figs. 4 a 6), que apresenta urn painel corn Venus



aqui figurada näo apenas

corno deusa do Amor, rnas tambérn corno na Peninsula Ibédca Os trés registos desenhados que se conhecem do conjunto mostram sensIveis difercnças sobretudo ao nIvel da forma dos quatro kantharoi posicionados nos cantos, das caracteristicas dos enrolarnentos das videiras, do nümero, da disposicäo e da acçâo dos 14 pequenos vindimadores. Relativamente ao primeiro pormenor, os desenhos de Muflof 415 mostram os vasos em forma de krater decorado corn gomos, de boca e de Martel larga, estreitando no fhste, de onde se desenvolvern asas laterais em “5” mais largo em cirna e mais estreito em baixo, alargando no bojo, e assentando numa nequena base

413 2006. p. 278. KUZNETSOvA-RESENDE, 1n LOPEZ MONTEAGUDO, 2004, p. 196. 414 ’In ROJO MEDINA, s.d. 4 210

I

cornea: ja na litografia conceolda por Ia 4 Torre os recepticulos tim forma de kyhx, ° decoraclos corn estnas ate ao oojo, sendo este hso, corn asas 1a:erat s em nas estreito era cina e largo em batxo, Ernbora os rnovmentos dos enrolamentos sejarn disserneihantes ‘sos trés registos. as vides cresceni todas pars o centro, ra direccão dos cantos do emblema, onde se bifurcarn e desenvolvem pan os lados, encontrandose e confundindose corn as suns correspondentes laterats, de modo a criar urn efetto visual urnficado, de referéncia estromatürgsca, pleno de movimento e corn urn ritmo cuase musical que pode evocar os alegres canrares das virdirn as Anda que tambdm diferentes em todos os documentos, em todos des os erotes parecem encarar as suns tarefas corn rn enrhousicssmós que pennite fazer a comparacão entre a felicdade 1 sentida durante as brincadefras e a euforia ébra infanti induzida nos ntuals

I

tmciátcos e

nas fesuvidades orgsásticas

ii

I ii 11 II g. 7

As ect do

sa arecdo mosaic de ac -me no corn va a seg do esenho e M Real Academia tIe Ia Historia. in LOPEZ MON TEAGUDO, 2004, p 196.

oz, na

No mosaico dos Banos de Ia Reina de Calpe (Figs, S e 9), hoje reduzido a metade da sua dimensao original. a vindima é novamente levada a cabo por erotes, desta feita aparentando idades menos tenras mas ainda jovens, a avaliar no sO pe!as atitudes (que parecem menos pueris e mais compenetradas), mas tambem pelas compleicôes morfolOgicas e pelas proporçes anatOmicas (ainda que conceb idas de forma muito insipiente, frustre e esquemática). Embora actualmente restem apenas dois dos erotes 416

in TORRE, 1835.

4

I I

211

Fr



originais, e

interessante notar que os seas corpos são integralmente preenchidos por

tessebs pretas, nAo apresentando qu&quer registo volurnétrico e contando apenas co

ama anotação cromAtica nos olhos, de iris esverdeada. Já a ünica ave conservada goz de ama coloraçfto mais variada e ampla, corn penas amarelas e verrnelhas. Estas c s alegres e vibrantes corno o canto das canoras seriant talvez partlihadas por outras av s entretanto perdidas, que outrora davarn a vindirna urn ambiente paradisiaco. imediataxnente agradável a

visão,

presumivelmente deleitoso para a audiçao e,

evetflu&rnente, prazenteiro pam os demais sentidos.

Figs. 8 e 9—

A es erda: Aspecto do mosaico corn vindirna, segundo desenho de Cavanilles. A direita:

Fragmento conservado do mesmo mosaico. In PAStES OVIEDO, 2007. p. 23.

E possivel que o mosaico segoviano de Duratén tivesse apresentado caracteristicas compositivas e cromáticas proxirnas do exemplar anteriormente referido, mas o sej desaparecirnento, a ausêneia de docurnentos desenhados e o catheter taconico descriçOes feitas an altura do sea achado impossibilitam quaisquer certezas neb 417 rnatérias. No conjunto de mosaicos da Domus de Race (sécs. IV-V), eneontrado em Compluhun (Madrid), é possivel inferir urn entrosamento do dionisismo e do venusianismo comt eleusismo. Embora a composiçäo principal evidencie o ambiente de excessOs r desordem e a grarnática decorativa objectivarnente afecta an deus que dá nom’ habitaçao apresentando-o em estado etIlico no painel central entre urna Ménade Satiro e Sileno, justapondo-Ihe outros dois painéis corn panteras afrontadas bebetid (craters e ainda mais urn corn dois Satiros trarisportando cestos para 0 lagar, onde : 417

Viáe MOIJRAO. 2010, Vol. 11, p. 198.

212

congcineres pisant as uvas 8 (uicando, porem. exciuldos cia cena os trabahos de apanha ’ 4 da uva), a relaço temática e sirnbókica corn outros tapeces cia rnesrna casa 419 que integrarn figuras de erotes (que poderao 1cr carregado urn krater entretanto desaparecido) e das quatro Estaçoes do Mo parece substanciar uma leitura sincrttica dos trés cultos. De facto, a presenca aiegorica das Tempora AnnE nesta dotnus evoca a noço de tempo ciclico e representa as actividades agricolas sazonais. entre as quais se insere a vindirna, todas elas originariarnente tuteladas por Deméterlceres e relacionadas corn os Mistérios de Elêusis, mas rapidamente associadas a . 420 Dion(sio/Bac o

E também corn este sentido de renovaçào e prosperidade anual dos solos que a Estaço do Outono torna a forma de urn vindimador quase real aiegórico



Mo fora o seu claro valor

no mosaico de Seleucus et Anthus (sec. III), em Mérida (Fig. 1 0)9 e no mosako das Estacöes (5Cc. IV), em COrdoba (Fig. 11). Em ambos os casos, as personificacoes sazonais coihem os grandes cachos das videiras que crescem cia própria —

terra, sendo que no prirneiro mosaico o corte C feito corn as mâos e no segundo corn urna foice (aqui lembrando a figura homéloga do tesselado italiano tardio da Catedral de Otranto, subordinado ao terna do Zodiaco).

Figs. 10 e 11

Vindimadores do Outono sos mosaicos de Seleucus €1 Anthus (see. 111, Muscu Nacional de Merida, fotografia de Guadalupe Lopez Monteagudo) e das Estacöes (finals do sec. IV d.C.. Museo —

ArqueoiOgico de Cordoba, in AA.VV., 20W, p. 173).

488

KUZNETSOVA-RESENDE, 2006, pp. 275-277. A autora ideniffica os carregadores e Os pisadores como camponeses humanos. Todavia, como envergam peles de feilno (pardalides) e transportarn cajados (peda), identiticamo-Los corno Sátiros. Um outro mosaico desta habitaçAo apresenta seis copeiros, em aiusao direcla a degustacao do vinho. 9 MOURAO, 2010, Vol. 1, pp. lie 83-85. Cfr. KUZNETSOVA-RESENDE, 2006, p. 279. A autora silo 420 desenvolve neste texto quaisquer consideraçoes sobre esta evoiuçAo. 213

Bern arreigada no sincretismo religioso dos romanos, a confluéncia do dionisismo e do eleusismo nâo se confinou a arte musiva e estendeu-se tambdm a escultura, come se prova no Sarcofago das Quafro EstacOes (sec. III) encontrado em Reguengos de Monsaraz (hoje no Museu Nacional de Soares dos Reis, no Porto), onde uma cena de pisa de uva em lagar se associa as figuras das Tempora AnnE, I deusa Ceres (e tambdm ao deus Oceano, seu contraponto masculino alusivo a abundancia das aguas) e ainda I junta de bois que lavra o campo . Sendo que . in ARSE Boletin Anual de Centro Arqueologico Saguntino, 38. Sagunto, pp. 163-199. =





ROJO MEDINA, s.d.

Raquel ROJO MEDINA



Pieza del Met



Mosaico



Sagwito.

Foiheto. Madrid: Arquivo Histórico Nacional. TORRE, 1835

Federico de Ia TORRE

>. Valencia. in Biblioteca Virtual Miguel de Cervantes, in Portal Antigu a. =







223

-



httmLtwww.cervantesvirtuaLcorwTichaObrahtml?Ref3 14509&portail ii

(consuLta

cm 23/03/2007).

Bucólicas. Georgieas. Madrid: Alianza Editorial. Col. El libro de bolsilo: Cldsicos de Grecia y Roma 68 ed, (traducâo

j

espanhola, introducAo e notas por Bartolomé Segura Rarnos. a partir do latim Ecloga,

]

VERGILIO, 2004

=

Publius VERG1L1VS Maro



Georgica),

Iltstória da Vida Privada. 1: Do Império Romano ao ano mil>>. Porto: EdiçOes Afrontamento, 28 ed. (traducâo portuguesa por VEYNE, 1990

=

Paul VEYNE (dir,)

-

Maria José Magalhâes, a partir do frances Histoire de la vie privéc, tome 1, ).

224

j

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