A visibilidade Gay na telenovela brasileira

A visibilidade Gay na telenovela brasileira

Cassiano Celestino de Jesus

É impressionante como mudamos através dos tempos. Ao longo dos séculos mudam-se as crenças, costumes, comportamentos, imaginário e, obviamente, não pensamos e muito menos agimos da mesma maneira que dez anos atrás. Evoluímos? Não, passamos por um processo de transformação. O século XXI inaugura um período de quebra de tabus e de maior liberdade de expressão. Uma mudança importante se dá para as minorias: os homossexuais começam a sair do "armário" e passam a ocupar a cena pública. Tal identidade sexual tem saído dos bastidores e ocupado um lugar de destaque na frente das câmeras.
Mas, até que ponto a visibilidade de identidades sexuais não normativas, na mídia, contribui para desestabilizar a homofobia? A forma como os homossexuais são representados tem ajudado a desconstruir preconceitos e discriminações sobre eles? Como a orientação homossexual é apresentada aos telespectadores, principalmente, nas telenovelas, em horário nobre? É inegável o poder que a mídia desempenha, pois, além de informar, ela educa e interfere na construção da opinião pública.
A telenovela é um dos mais importantes produtos de entretenimento que, ao longo do tempo de sua existência, consolidou um espaço representacional incisivo no dia-a-dia dos brasileiros. Nelas, são tematizadas assuntos do cotidiano, promovendo uma aproximação e identificações múltiplas. Elas abrem espaço para problematizar questões essenciais da nossa sociedade que estão invariavelmente em pauta. Isso pode ser considerado merchandising social ou simplesmente ações socioeducativas.
As telenovelas brasileiras são provenientes das radionovelas, gênero de grande sucesso entre os anos de 1940 e 1950. Adaptadas da dramaturgia que já fazia parte da cultura latino-americana, tendo Cuba como maior expoente, as radionovelas tiveram enorme êxito no imaginário da população brasileira daquela época. Porém, com o surgimento e o crescimento do novo meio de comunicação no país – a televisão –, elas entraram em decadência, diminuindo gradativamente de quantidade até acabarem em ostracismo e desaparecimento total (década de 1970).
Com a década de 1970 e a consolidação da televisão na sociedade brasileira e da novela como seu carro-chefe, a Rede Globo (fundada em 1965) ascende como maior potencial na sua produção e comercialização. Com a já falida TV Excelsior (1970) e as crises financeiras da TV Tupi (fechada em 1980), a Globo assume o posto dominante no mercado, acompanhada de longe pela Rede Record, contratando profissionais de ponta, como Cassiano Gabus Mendes (da Tupi) e Janete Clair. A TV Tupi ainda manteve bons índices de audiência com a novela "A viagem" (1975), de Ivani Ribeiro, mas por fim não resistiu à concorrência da Rede Globo.
Porém, longe de ser um discurso que debate propriamente temas com grande profundidade, a telenovela se configura mais como um espaço de exposição. Na sua grande maioria, os problemas são apenas apresentados, de forma a não se discuti-los mais incisivamente. A professora Heloisa Buarque de Almeida, antropóloga e especialista no assunto, comenta que "a novela expõe esses temas, mas o debate é superficial, ou não há debate, é uma visão unidimensional".
É preciso ressaltar que os programas televisivos são narrativas que refletem e constroem imagens, representações e valores sociais. Assim, é importante estar atento na forma como os gays são apresentados aos telespectadores. Pois, o comportamento que tais personagens exercem, frente as telas, podem influenciar na edificação das condutas de opinião, e estereótipos.
Quase sempre os homossexuais são apresentados ao público de uma forma caricaturada e estereotipada. Aparecendo com um comportamento efeminado, agindo como se fossem mulheres, sempre com um alto índice de humor, e, as vezes, com algum problema psicológico. São representações completamente errôneas, que acabam sendo fixadas no imaginário das pessoas que assistem. Será mesmo possível que esta visibilidade contribua para desestabilizar o processo de violência contra os indivíduos que se declaram contrários à norma estabelecida pela sociedade, ou serve para reforçar estereótipos e preconceitos em torno destes? Não será mais um hipócrita golpe interessado somente em audiência?
Como citar este artigo?
JESUS, Cassiano Celestino de. A visibilidade gay na telenovela brasileira. Jornal do Dia. Aracaju, p. 04-04. jul. 2015.

Bibliografia utilizada:
CAMPADELLI, S.Y. A telenovela, instrumento de educação permanente.
Petrópolis, Vozes, 1980.

CAMPADELLI, S.Y. A telenovela. São Paulo, Ática, 1985.
BORELLI, S.H.S. e PRIOLLI, G. (coords.). A deusa ferida. Por que a rede Globo
não é mais a campeã absoluta de audiência. São Paulo, Summus, 2000.